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O princípio da razoabilidade como instrumento de controle das desapropriações para a mobilidade urbana em Natal

Agenda 03/06/2014 às 14:48

O presente artigo encarta o processo de desapropriações para a mobilidade urbana na cidade do Natal e como a utilização do princípio da razoabilidade minimizou os gastos financeiros, bem como a lesão ao direito à moradia.

RESUMO

 

O presente artigo trata sobre a demonstração das obras de mobilidade urbana em Natal, para a Copa do Mundo de 2014, que prometem dar mais fluidez ao trânsito. As citadas obras para serem concretizadas necessitam de uma profunda mudança no cenário de algumas avenidas e do uso de um instituto que não é tão utilizado em terras natalenses, o instituto da desapropriação. Nestas discussões, demostra-se a importância da utilização do princípio da razoabilidade, desde as discussões prévias, até o momento de consecução das obras, visto que proporcionaram que o Poder Público minimizasse os gastos financeiros, bem como se reduziu sobremaneira a lesão ao direito fundamental à moradia.

 

Palavras-chave: Princípio da razoabilidade. Desapropriação. Mobilidade urbana. Copa do Mundo em Natal.

 

 

1 INTRODUÇÃO

 Ao dia 31 de maio de 2009, a FIFA anunciou a escolha das subsedes que acolherão os jogos da competição. A cidade do Natal, com isto, iniciou o processo de demolição do estádio João Cláudio de Vasconcelos Machado, o Machadão e a construção da Arena das Dunas.

As intervenções em mobilidade urbana para a realização da Copa do Mundo de 2014, apesar da demora para se iniciar, transformaram a cidade num canteiro de obras. Estas obras têm por objetivo a ampliação e integração da malha viária para a melhoria do fluxo de transporte coletivo e também da acessibilidade dos pedestres. (BRASIL, 2014).

As citadas obras de melhoria da estrutura física sugerem a eliminação de pontos de congestionamento, aumentando a fluidez do trânsito, bem como possibilitando a utilização de meios alternativos de transporte, a partir da criação de ciclovias e corredores exclusivos para ônibus. Estas intervenções criarão um eixo viário da Zona Norte às regiões centrais de atividade econômica, onde atualmente circulam vários várias linhas municipais e intermunicipais (BRASIL, 2014).

Nesse diapasão, para alargamento das vias, houve a necessidade da consecução de projetos que previram desapropriações em algumas vias na cidade do Natal. O presente artigo, diante disto, pretende demonstrar o arcabouço deste instituto, fundado na supremacia do interesse público, bem como aanálise do princípio da razoabilidade, que ao ser aplicado ao instituto da desapropriação, visa buscar a menor lesividade ao erário, além de ser um mecanismo de garantia de proteção ao direito fundamental à moradia.

2 DO PROJETO DE MOBILIDADE URBANA EM NATAL

 

As obras de mobilidade urbana em Natal foram divididas em dois lotes, o primeiro lote transformará as avenidas Capitão-Mor Gouveia e Jerônimo Câmara no primeiro binário de Natal, com investimento de R$ 114 milhões de reais, sob a responsabilidade da Empresa Industrial Técnica S.A. – EIT, tendo por prazo de entrega o mês de maio de 2014. (NOVO JORNAL, 2013).

Já o segundo lote está orçado em 222 milhões de reais, valor que será empregado na construção de cinco túneis e dois viadutos, sob a responsabilidade do consórcio formado pelas empresas Queiroz Galvão e Ferreira Guedes, envolvendo as ruas e avenidas Raimundo Chaves, Prudente de Morais, Capitão-Mor Gouveia, Lima e Silva, Jerônimo Câmara e Romualdo Galvão. (NE10, 2013b).

O projeto para a consecução do primeiro lote, denominado Complexo Viário da Urbana, concebia a necessidade de 339 desapropriações (NE10, 2013c), 449 famílias, segundo (NE10, 2013a), nos bairros das Quintas, Bairro Nordeste, nos imóveis localizados nas vias Napoleão Laureano, Industrial João Mota, Felizardo Moura e Capitão-Mor Gouveia, que vão ligar da Zona Norte à Arena das Dunas. (NE10, 2013c).

Depois de inúmeros embates judiciais e audiências públicas com os proprietários e associações em geral, para diminuição do problema social que envolveria a remoção de inúmeras famílias, o prefeito de Natal, Carlos Eduardo Nunes Alves solicitou a modificação do projeto para que fosse feitas intervenções com a menor quantidade de desapropriações possíveis. (NE10, 2013c).

Segundo o secretário adjunto à época, Carlos Alexandre Varella Duarte, a partir da readequação do projeto as desapropriações teriam uma redução de até 90%. (NE10, 2013b). Depois de estudos e reuniões com representantes do Comitê Popular da Copa do Mundo 2014, Associação Potiguar dos Atingidos pelas Obras da Copa, do curso de Arquitetura da UFRN, do Conselho Estadual de Direitos Humanos e moradores da Avenida Capitão-Mor Gouveia conseguiram chegar a um denominador comum e a um novo projeto de mobilidade em que apenas cinco grandes imóveis, situados em áreas não residenciais, serão parcialmente desapropriados. (GIOVANNI, 2013).Pode-se ver que houve grande redução do número dos imóveis desapropriados, instituto que será narrado a seguir.

3 DA SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO E DO INSTITUTO DA DESAPROPRIAÇÃO

 

A atividade administrativa é um conjunto de ações dirigidas à satisfação de necessidades coletivas e à promoção dos direitos fundamentais que se desenvolve sob a égide da legalidade. (MEDAUAR, 2012, p. 124). O princípio da legalidade no âmbito do direito privado se difere do exercente da atividade administrativa. Para o direito privado tudo que não estiver disciplinado pelo direito estará no arcabouço da autonomia. (MEDAUAR, 2012).

Quando se consideram as relações sob a égide do direito público, a ausência de disciplina jurídica tem que ser interpretada como ausência de liberação para o exercício do poder jurídico, destarte, o que não for liberado em virtude de lei, nas relações de direito público será considerado proibido. (MEDAUAR, 2012).

Esta interpretação não deve ser feita de forma estanque, pois não se pode interpretar o princípio da legalidade com a exigência de disciplina legal literal e expressa, havendo necessidade apenas de considerar a existência de normas jurídicas em sentido amplo. (MEDAUAR, 2012).

O Direito Administrativo foi criado e desenvolvido baseado em duas ideias contrapostas, a proteção dos direitos individuais e a necessidade de satisfação dos interesses coletivos, donde a outorga de prerrogativas e privilégios demonstra-se necessária à Administração Pública, quer para limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do bem-estar coletivo, através do poder de polícia, quer através da prestação de serviços públicos. (DI PIETRO, 2011).

Para que a Administração Pública possa assegurar sua autoridade, necessária à consecução dos seus fins, pois, são lhes outorgados prerrogativas e privilégios que lhe permitem assegurar a supremacia do interesse público sobre o particular. Por conseguinte, estas prerrogativas ou privilégios são desconhecidos na esfera do direito privado, por exemplo, a autoexecutoriedade, a autotutela, o poder de expropriar, de instituir servidão, de ocupar temporariamente o imóvel alheio, o de requisitar bens e serviços, dentre outros. (DI PIETRO, 2011).

Ao lado destas prerrogativas, nada obstante, há a existência de determinadas restrições à Administração, que podem macular o ato administrativo, podendo haver nulidade e até a responsabilização daquele que o editou. Dentre as restrições podem-se citar a necessidade de observância da finalidade pública, bem como o respeito os princípios da moralidade administrativa e da legalidade, além da obrigatoriedade de publicidade dos atos administrativos. (DI PIETRO, 2011).

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A supremacia do interesse público, princípio que fundamenta o poder de polícia, demonstra-se presente tanto no instante da elaboração da lei, como no momento da execução do ato em concreto pela Administração Pública, inspirando o legislador e vinculando a autoridade administrativa em toda sua atuação. (DI PIETRO, 2011).

Esta supremacia viabiliza intervenções do Estado em relação ao exercício de direitos e liberdades individuais como ocorre, de forma máxima, através da desapropriação, com fundamento no bem-estar geral. Vale ressaltar que não se trata de superioridade do interesse do governo presente no domínio eminente, de forma autoritária e arbitrária, mas sim fundada no interesse público contido na utilidade social do comportamento ou omissão administrativa em questão. (CARVALHO, 2009).

O instituto da desapropriação, forma de restrição do estado sobre a propriedade, pois, não se furta da observância de todo arcabouço principiológico e legislativo do Direito Administrativo e das vinculações da Administração Pública.

Desde a primeira constituição brasileira, a imperial de 1824, até a constituição atual, excetuando-se as terras onde se cultivem plantas psicotrópicas legalmente proibidas, o instituto da desapropriação é verificado, donde se a Administração Pública tiver necessidade de uso e emprego da propriedade do cidadão, ele deve indenizar previamente do valor dela. (DI PIETRO, 2011).

“A desapropriação é o procedimento administrativo pelo qual o Poder Público ou seus delegados, mediante prévia declaração de necessidade pública, utilidade pública ou interesse social, impõe ao proprietário a perda de um bem, substituindo-o em seu patrimônio por justa indenização”. (DI PIETRO, 2011, p. 161).

O citado procedimento expropriatório se desenvolve por meio de uma sucessão de atos, culminando na incorporação do bem ao patrimônio público. Este procedimento comunga de duas fases: declaratória e executória. Na primeira, o Poder Público declara a utilidade pública ou interesse social do bem para as desapropriações. (DI PIETRO, 2011).

Normalmente se costuma afirmar que o decreto tem natureza declaratória, mas assim não o é, porquantoo citado decreto tem natureza constitutiva, sendo seus efeitos produzidos a partir desta data, sendo equivocado se imaginar que o decreto seria de mera declaração de um direito preexistente. Sem o decreto, não há possibilidade da formalização da desapropriação. (JUSTEN FILHO, 2009).

Consoante o disposto no artigo 2º do Decreto-lei 3365/41, toda espécie de bens pode ser desapropriadas: imóveis, caso mais frequente, móveis, semoventes, sendo também admitida a desapropriação do espaço aéreo e do subsolo, caso sua utilização, pelo poder público ou por seus delegados, acarretar prejuízo patrimonial ao proprietário do imóvel. Além disto, são também passíveis de desapropriação o aspecto patrimonial do direito de autor, arquivos e documentos com valor histórico. (MEDAUAR, 2012).

A declaração expropriatória pode ser feita por intermédio do Poder Executivo, por meio de Decreto, ou pelo Legislativo, por intermédio de lei. No caso das desapropriações da Av. Capitão-Mor Gouveia, o prefeito de Natal, por meio de decreto procedeu com esta declaração, por exemplo, com o Decreto a seguir:

“DECRETO Nº 10.042 DE 14 DE AGOSTO DE 2013.

Declara de utilidade pública para fins de desapropriação o imóvel que especifica e dá outras providências.

O PREFEITO MUNICIPAL DE NATAL, no uso de suas atribuições legais, e com fundamento no Decreto-Lei nº. 3.365, de 21 de junho de 1941, com as alterações da Lei nº. 2786, de 21 de maio de 1956 e no Decreto 6.587/2000, combinado com o art. 55, inciso VII da Lei Orgânica do Município de Natal,

DECRETA:

Art. 1º Ficam declarados de Utilidade Pública para fins de desapropriação os imóveis abaixo identificados:

1.1. Parte do imóvel, a seguir discriminada, de domínio útil do Serviço Social da Indústria - SESI, nos termos do processo administrativo nº. 26906/2013-99 – SEMURB, localizado na Avenida Capitão-Mor Gouveia, nº. 1480, Lagoa Nova - Natal/RN, correspondente a área afetada do terreno de 169,05m², com os seguintes limites e dimensões:

Ao Norte: com área remanescente do próprio terreno, com 2,85m;

Ao Sul: com área remanescente do próprio terreno, com 2,80m;

A Leste: com a Avenida Capitão-Mor Gouveia, com 59,40m;

A Oeste: com área remanescente do próprio terreno, com 59,40m.

1.2. Parte do imóvel, a seguir discriminada, de propriedade da empresa Sua casa Material de Construções Ltda., nos termos do processo administrativo nº. 27020/2012-81 – SEMURB, localizado na Avenida Capitão-Mor Gouveia, nº. 1224, Nossa Senhora de Nazaré - Natal/RN, correspondente a área afetada do terreno de 612,75m², com os seguintes limites e dimensões:

Ao Norte: com Avenida Jerônimo Câmara, com 4,85m;

Ao Sul: com Avenida Capitão-Mor Gouveia, com 2,95m;

A Leste: com Passagem de pedestre, com 236,60m;

A Oeste: com área remanescente do próprio terreno, com arco de 1,75m+230,40m+arco de 5,25m.

Art. 2º Os imóveis de que trata o artigo anterior serão desapropriados visando a reestruturação geométrica da Avenida Capitão-Mor Gouveia.

Art. 3º Fica a Procuradoria Geral do Município autorizada a adotar as providências necessárias à efetivação desta desapropriação de forma amigável ou judicial, se for o caso, assinando em nome da Prefeitura Municipal de Natal, acordos, termos e escrituras.

Art. 4º As despesas decorrentes da presente desapropriação correrão à conta de dotação própria do orçamento vigente.

Art. 5º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

Palácio Felipe Camarão, em Natal, 14 de agosto de 2013.

CARLOS EDUARDO NUNES ALVES

Prefeito” (NATAL, 2013a).

Conforme se pode perceber, o ato declaratório indicou o sujeito passivo da desapropriação, a descrição do bem, a declaração de utilidade pública, que poderia ser também de interesse social, a destinação específica do bem, (FRANÇA apud DI PIETRO, 2011), no caso, a reestruturação geométrica da Av. Capitão-Mor Gouveia.Ademais, segundo França apud Di Pietro (2011) o fundamento legal e os recursos orçamentários destinados ao atendimento da despesa.

Não obstante a declaração de utilidade pública ou interesse social não ter poder suficiente para a transferência do bem para o patrimônio público, mas ela incide compulsoriamente sobre o proprietário, sujeitando-o, depois disso, a partir daí, às operações materiais e aos atos administrativos e judiciais que sejam necessários à efetivação da medida. (DI PIETRO, 2011).

Esta declaração se demonstra como decisão executória do Poder Público, pois não depende de título fornecido pelo Poder Judiciário para iniciar os procedimentos sob o bem.O particular, caso se sinta lesado, pode impugnar o ato judicialmente pelas vias ordinárias, bem como por Mandado de Segurança, tendo a possibilidade de solicitar pedido liminar para sustar o procedimento da expropriação, até a declaração de validade, feita pelo Judiciário, da validade do ato. (DI PIETRO, 2011).

Quanto ao direito de penetrar no imóvel, não há que se confundir com a posse. Consoante o Decreto-lei 3.365/41, que regulamenta o instituto da desapropriação, as autoridades administrativas ficam autorizadas a penetrar nos prédios contidos na declaração de utilidade pública, podendo, caso haja oposição, solicitar auxílio de força policial. (DI PIETRO, 2011).

Apesar da dicção deste dispositivo, o preceito contido no citado Decreto-lei há de ser interpretado com as atuais disposições constitucionais para a plena recepção, pois, não obstante não haver previsão de necessidade de autorização judicial, em respeito ao princípio da inviolabilidade do domicílio, caso o proprietário não concorde com a entrada do expropriante, então haverá necessidade de requisição judicial, sendo vedada, portanto, a entrada compulsória. Caso a desapropriação aqui em Natal fosse motivada para reforma agrária, segundo a LC 76/93, apenas com autorização judicial seria possibilitado ao expropriante a promover a vistoria e avaliação do imóvel. (DI PIETRO, 2011).

A segunda fase do procedimento da desapropriação, denominada executória, pode ser administrativa ou judicial, sendo este o ato em que o Poder Público adota as medidas necessárias à efetivação da desapropriação, para que possa integrar o bem ao patrimônio público. (DI PIETRO, 2011). No caso daqui de Natal, o ente competente é o mesmo que editou o ato declaratório, ou seja, o Município do Natal.

Podendo ser, nada obstante, qualquer entidade pública ou particular que aja por delegação do poder público, abrangendo, pois, autarquias, fundações governamentais, empresas públicas, sociedades de economia mista e concessionárias e permissionárias de serviços públicos. (DI PIETRO, 2011).

A fase executória será administrativa, quando houver acordo entre o expropriante e o expropriado a respeito da indenização ou judicial, caso não haja acordo, sendo a ação ajuizada pelo Poder Público, com fulcro no Decreto-lei 3365/71. Iniciado o processo judicial, caso as partes acordem o quantum indenizatório, a decisão judicial será apenas homologatória, valendo como título para que para a transcrição no Cartório de Registro de Imoveis. (DI PIETRO, 2011).

Quanto ao procedimento expropriatório aqui em Natal tem-se o exemplo de ação que foi ajuizada pelo Município de Natal para a fase executória, discutindo o valor da indenização a qual inicialmente foi fixada em R$ 78.303,96. (NATAL, 2013b). No curso do processo judicial, apenas questões relativas ao preço ou vício processual que podem ser discutidas. (DI PIETRO, 2011).

Caso não ocorra a reestruturação geométrica da Av. Capitão-Mor Gouveia, os expropriados podem exigir de volta o seu imóvel, através o direito à retrocessão.

É pacífico na jurisprudência que o expropriado pode fazer valer seu direito, caso o expropriante não dê ao imóvel uma destinação pública, por exemplo cedendo para terceiros, não cabendo este direito se houver destinação pública diversa daquela mencionada no Decreto, mas apenas se houver desvio de poder. (DI PIETRO, 2011).

Além de todos os procedimentos citados, merece destaque no âmbito do instituto da desapropriação a observância ao princípio da razoabilidade, posto que se pode reduzir, destarte, a quantidade de desapropriações necessárias, ocasionando a menor lesividade aos direitos fundamentais, conforme se verá a seguir.

4 O PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE COMO INSTRUMENTO DA MENOR LESIVIDADE NAS DESAPROPRIAÇÕES

 

Os direitos fundamentais são irrenunciáveis porque se imbricam à essência humana, à dignidade do homem. Não se pode, destarte, renunciar ao direito de viver, à liberdade, à igualdade, aos direitos da personalidade. Cabe, nesse diapasão, ao Poder Público, através de seu poder-dever, velar pela possibilidade de exercício dos direitos fundamentais, tornando-os indisponíveis, não obstando, entretanto, que se possa fazer um processo de escolha, a partir da ponderação dos bens, utilizando-se o princípio da proporcionalidade. (BONIFÁCIO apud OLIVEIRA, 2012), bem como o princípio da razoabilidade, para aqueles que entendem que há diferença.

Através do seu poder-dever, o Poder Público, conforme já narrado, possui prerrogativas para assegurar a supremacia do interesse público, em relação dos direitos individuais. Apesar dessas prerrogativas de poder de polícia, o Poder Público, para ter a maior eficiência nas suas ações, deve observar preceitos como o da razoabilidade para que, com isto, o ato que visa o bem comum possa ter a maior confluência e menor lesão aos direitos individuais.

Há quem entenda que razoabilidade e proporcionalidade são conceitos sinônimos. (CARVALHO, 2009, p. 154). A razoabilidade é um dever de harmonização geral como individual, ou seja, dever de equidade, e de harmonização do direito com as condições externas, portanto, dever de congruência. Destarte, na razoabilidade não se analisa a relação entre meio e fim, tal como na proporcionalidade, mas sim entre critério e medida. (ÁVILA apud CARVALHO, 2009).

Majoritariamente, a doutrina possui entendimento que, à luz do atual regime constitucional-administrativo, razoabilidade e proporcionalidade, como princípios, equiparam-se, havendo, diante disso, sinonímia de significação jurídica, em seu perfil dogmático, que se visualiza a partir da estruturação dos seus respectivos conteúdos, fundados no nosso atual texto constitucional. (OLIVEIRA, 2006).

A razoabilidade, independentemente de ter critério de distinção com a proporcionalidade, impede o desequilíbrio ao haver exercício das competências públicas, afastando, diante disso, eventual arbitrariedade que incuta instabilidade nas relações sociais. (CARVALHO, 2009).

A razoabilidade, ademais, mantém estreita relação com a definição substancial do interesse público. (OLIVEIRA, 2006).Não há adequada persecução do interesse público sem o necessário coeficiente de razoabilidade. Somente com observância do princípio é que o sistema juridiciza validamente o exercício da atividade administrativa. (OLIVEIRA, 2006, p. 239).

Razoabilidade e economicidade limitam a atividade do administrador. A economicidade impõe à Administração que faça a otimização da atividade, no âmbito do plano econômico-patrimonial. Já a razoabilidade impõe o mesmo dever de otimização, mas em arcabouço diferente ao do plano dos custos-benefícios, mas sob o prisma axiológico-normativo, retirado da observância dos princípios e valores constitucionais relacionados à intervenção administrativa. (OLIVEIRA, 2006).

A razoabilidade se mostrou presente no processo expropriatório em diversas etapas, tais como nas audiências públicas realizadas para a discussão com a população, além da visualização de outros projetos feitos, por exemplo, pelo Departamento de Arquitetura da UFRN e de associações civis.

Percebe-se, diante deste escorço realizado que no âmbito das desapropriações com o objetivo de mobilidade urbana para Copa do Mundo de 2014, o princípio da razoabilidade e da economicidade mereceu especial guarida, pois o excesso de desapropriações seria lesivo para os cofres públicos, bem como não seria a maneira mais eficiente de se conseguir o objetivo.

 

5 CONCLUSÃO

 

O princípio da razoabilidade institui a exigência de racionalidade, equilíbrio e sensatez no exercício da função administrativa. (FRANÇA apud OLIVEIRA, 2006, p. 155). A vinculação da Administração ao cumprimento do princípio da razoabilidade é que permite afirmar que a “superioridade do interesse público em face do particular” não se esgota em si mesmo, ao desabrigo da normatividade constitucional. (OLIVEIRA, 2006, p. 239).

Toda privação, total ou parcial, no âmbito dos direitos patrimoniais do administrativo, no exercício de competência administrativa, pré-ordenada para determinado resultado, deve sustentar um grau de adequação, exigibilidade e equilíbrio frente às posições jurídico-subjetivas afetadas com a sua concretização, sob pena de invalidade. (OLIVEIRA, 2006).

Percebe-se, portanto, diante do que foi narrado no presente artigo, que para as obras de mobilidade urbana em Natal para a Copa do Mundo de 2014, e para outras obras que possam ser feitas, precipuamente aquelas que restrinjam direitos fundamentais, demonstra-se deveras importante a regulação da conduta através do princípio da razoabilidade.

Ademais, não há razão jurídica para que, num Estado Democrático de Direito, não se promova a ampla e prévia participação dos administrados potencialmente passíveis de serem atingidos pelas hipóteses legais da tomada da decisão administrativa. (OLIVEIRA, 2006).

Nesse diapasão, foi salutar a participação da sociedade em geral na discussão das desapropriações e nos projetos de mobilidade, visto que se conseguiu convergir para um denominador comum, reduzindo-se as desapropriações que afetariam mais de quatrocentas famílias para apenas cinco imóveis comerciais. Caso o Poder Público tivesse utilizado sua prerrogativa do Poder de Polícia desconectado dos anseios populares e da visualização dos diferentes projetos, estar-se-ia diante de claro fomento da onerosidade aos cofres públicos e de lesão eminente ao direito fundamental à moradia de inúmeras famílias.

 

 6 REFERÊNCIAS

 

BRASIL. CONGRESSO NACIONAL. Programa de Mobilidade Urbana da Cidade de Natal - Projetos. Disponível em: <http://www.copatransparente.gov.br/acoes/programa-de-mobilidade-urbana-da-cidade-de-natal>. Acesso em: 24 fev. 2014.

CARVALHO, Raquel Melo Urbano de. Curso de Direito Administrativo: Parte geral, intervenção do estado e estrutura da administração. 2. ed. Salvador: Jus Podivm, 2009.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2011.

GIOVANNI, Bruno. Carlos Eduardo convoca Comitê Popular da Copa e anuncia que não haverá desapropriações. 2013. Disponível em: <http://blogdobg.com.br/carlos-eduardo-convoca-comite-popular-da-copa-e-anuncia-que-nao-havera-desapropriacoes/>. Acesso em: 25 fev. 2014.

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 4. ed. rev., atual. São Paulo: Saraiva, 2009.

MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 16. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.

NATAL (Município). Decreto nº 10042, de 14 de agosto de 2013. Declara de Utilidade Pública Para Fins de Desapropriação O Imóvel Que Especifica e Dá Outras Providências. 2585. ed. Natal, RN, 15 ago. 2013. Disponível em: <http://portal.natal.rn.gov.br/_anexos/publicacao/dom/dom_20130815.pdf>. Acesso em: 15 fev. 2013.

NATAL. 3ª Vara de Fazenda Pública da Comarca de Natal. Decisão nº 0806577-72.2013.8.20.0001. Município do Natal. SESI - Serviço Social da Indústria. Relator: Cícero Martins de Macedo Filho. Natal, RN, 16 de outubro de 2013. Diário de Justiça do Estado. Natal, 17 out. 2013.

NE10. Obras de mobilidade em Natal não terão desapropriações. 2013. Kivia Soares. Disponível em: <http://ne10.uol.com.br/canal/esportes/copa-2014/noticia/2013/07/18/obras-de-mobilidade-em-natal-nao-terao-desapropriacoes-431545.php>. Acesso em: 20 fev. 2014.

NE10. Obras de mobilidade no entorno da Arena das Dunas em Natal terão 5 túneis e 6 viadutos. 2013. Kivia Soares. Disponível em: <http://ne10.uol.com.br/canal/cotidiano/nordeste/noticia/2013/09/10/obras-de-mobilidade-no-entorno-da-arena-das-dunas-em-natal-terao-5-tuneis-e-6-viadutos-441760.php>. Acesso em: 20 fev. 2014.

NE10. Prefeitura altera projeto de mobilidade da Copa em Natal e reduz desapropriações. 2013. Kivia Soares. Disponível em: <http://ne10.uol.com.br/canal/esportes/copa-2014/noticia/2013/02/20/prefeitura-altera-projeto-de-mobilidade-da-copa-em-natal-e-reduz-desapropriacoes-400246.php>. Acesso em: 18 fev. 2014.

NOVO JORNAL (Natal). Prefeitura inicia as obras do primeiro lote de mobilidade urbana: O PROJETO TEM UM INVESTIMENTO DE R$ 114 MILHÕES DE REAIS E ESTÁ SOB A RESPONSABILIDADE A EMPRESA INDUSTRIAL TÉCNICA S/A (EIT). O PRAZO PARA A ENTREGA DOS SERVIÇOS É MAIO DE 2014. 2013. Disponível em: <http://www.novojornal.jor.br/_conteudo/2013/10/cidades/24007-prefeitura-inicia-as-obras-do-primeiro-lote-de-mobilidade-urbana.php>. Acesso em: 10fev. 2014.

OLIVEIRA, Arrison Henrique Souza de. A Ação Popular como instrumento de concretização da Democracia Participativa. 2012. 31 f. Dissertação (Graduação) - Curso de Direito, Ufrn, Natal, 2012.

OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade no direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros editores, 2006.

 

 

Sobre o autor
Arrison Henrique Souza de Oliveira

Bacharel em Direito - UFRN Pós-graduando em Direito Constitucional Lato Sensu - UFRN Funcionário Público Federal

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