1 Aplicação dos Princípios Constitucionais Penais
Para se obter um efetivo resultado de ressocialização do condenado, atingindo desta forma a verdadeira finalidade da pena e evitando a contaminação do sistema carcerário por facções criminosas, se faz necessária a fiel aplicação dos princípios constitucionais penais, para que se tenha o mais puro e correto sentido da aplicação da lei penal e para que sua relação com a política criminal seja a mais proveitosa possível.
Conforme os ensinamentos de Lavorenti e Silva (2000, p. 121):
Há princípios de Direito Penal na Constituição, como também há princípios ou valores constitucionais pertinentes à matéria penal. Os primeiros apresentam um conteúdo específico e propriamente penalístico (princípio da legalidade, irretroatividade da lei, individualização da pena etc). Os outros têm um conteúdo que não corresponde exclusivamente com o Direito Penal, mas que condicionam a matéria criminal a ser disciplinada, devendo moldar toda a fisionomia do sistema penal. A Constituição não se limita mais, portanto, a estabelecer limites ao direito de punir do Estado, mas também disciplina os nortes do Direito Penal.
A influência dos valores constitucionais no sistema penal exercita-se no campo das relações entre política criminal e direito penal.
Os princípios constitucionais penais fixam limites ao direito de punir do Estado, sendo indispensável sua aplicação para fazer valer toda sistemática do sistema prisional, fazendo dele um instrumento na construção de uma sociedade mais justa. Neste sentido, veremos alguns deles, conforme seguem abaixo.
1.1 Princípio da legalidade
O princípio da legalidade está expresso na Constituição Federal, no artigo 5º, inciso XXXIX, fazendo parte dos direitos e garantias fundamentais, correspondente no Direito Romano ao nullum crimen nulla poena sine previa lege, que traduzindo significa: ”Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”.
O princípio da legalidade apresenta-se como um eficiente controle do poder de punir do Estado, propiciando a correta aplicação da lei penal e evitando arbitrariedades estatais.
Segundo o que dizem Lavorenti e Silva (2000, p. 127):
Por esse princípio, assegura-se a liberdade das pessoas contra o arbítrio do Estado, dado que torna certo, com anterioridade, o delito e a pena, demonstrando que só por aqueles fatos definidos como delituosos, e naquelas penas previamente fixadas, pode alguém ser processado e condenado.
Em sua versão política, o princípio representa o primado da lei e o fundamento do Estado de Direito. Contudo, não se deve prender ao formalismo da lei, entendendo que todo tipo penal é correto por provir de uma lei, porém, deve-se ir além, exigindo-se que referida lei esteja informada pela ordem de valores produzidos na Constituição.
Decorrem do princípio da legalidade, outros três postulados: da reserva legal, da anterioridade e da taxatividade.
O princípio da reserva legal garante ao cidadão que só através da lei, e anterior ao fato praticado, é que se pode definir como crime tal comportamento, e sua respectiva pena.
O princípio da anterioridade, também conhecido como princípio da irretroatividade, com previsão legal no artigo 5º, inciso XL da Constituição Federal, prevê que a lei somente pode alcançar fatos posteriores à sua edição. Desta forma, ocorre a irretroatividade da lei penal mais severa.
O princípio da taxatividade expressa a exigência de que as normas incriminadoras sejam claras, certas e precisas, evitando-se expressões ambíguas, equívocas e vagas.
De acordo com Luisi (1991, p. 24):
Em verdade entre o princípio da legalidade dos delitos e das penas, e as exigências do Estado Social não existem reais incompatibilidades. Os ditos Estados democráticos sociais tem inarredáveis compromissos com valores pregados pelo pensamento iluminista, principalmente a liberdade. E para resguardo do postulado da legalidade penal sem prejuízo da proteção penal dos bens coletivos e da justiça material, basta, como ensina F. Palazzo, que “o legislador saiba traduzir em leis precisas os valores e interesses substanciais” cuja tutela se propõe. Talvez uma “indeterminação” das leis penais possa, por vezes, viabilizar uma mais integral realização da justiça substancial, mas é, na maioria das vezes, a porta pela qual se introduzem formas variadas, e por vezes cruéis, de criminalidade legalizada.
É de suma importância ressaltar que o princípio da legalidade e seus postulados devem ser devidamente aplicados na execução penal, a fim de propiciar a justa aplicação da lei e a recuperação do indivíduo.
1.2 Princípio da intervenção mínima
O princípio da intervenção mínima caracteriza-se como um limitador do poder de punir do Estado. Este princípio foi criado para combater, em especial, o arbítrio legislativo e também judicial, e foi expresso na Declaração do Homem e do Cidadão de 1789, no artigo 8º, que dispunha: “Art. 8º. A lei apenas deve estabelecer penas estritas e evidentemente necessárias [...]”.
De acordo com o princípio da intervenção mínima, a norma penal e a pena de prisão devem ser aplicadas somente em último caso, quando forem extremamente necessárias para garantir a proteção jurídica.
Desta forma, a pena privativa de liberdade deve ser aplicada em casos subsidiários, optando-se por outras formas de penas alternativas à prisão, para beneficiar o condenado, como também toda a sociedade.
Segundo Luisi (1991, p. 26):
A Constituição vigente no Brasil diz ser invioláveis os direitos à liberdade, à vida, à igualdade, à segurança e a propriedade (artigo 5º caput), e põe como fundamento do nosso Estado democrático de direito, no artigo 1º do inciso III, a dignidade da pessoa humana. Decorrem, sem dúvidas, desses princípios Constitucionais, como enfatizado pela doutrina italiana e alemã que a restrição ou privação desses direitos invioláveis somente se legitima se estritamente necessária a sanção penal para a tutela dos bens fundamentais do homem, e mesmo de bens instrumentais indispensáveis a sua realização social. Destarte, embora não explícito no texto constitucional, o princípio da intervenção mínima se deduz de normas expressas da nossa Grundnorm, tratando-se, portanto, de um postulado nela inequivocamente implícito.
Apesar do princípio da intervenção mínima não estar explícito na Constituição Federal Brasileira e ter um caráter subsidiário do Direito Penal, sua observância é de fundamental importância para a criação de normas penais realmente necessárias e proporcionais aos bens jurídicos tutelados.
1.3 Princípio da humanidade
O princípio da humanidade assegura ao condenado todo o respeito à dignidade da pessoa humana, por isso se diz que este é um dos mais importantes princípios na execução penal.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 prevê, em seu artigo 5º, que “ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano e degradante”.
Consoante os ensinamentos de Lavorenti e Silva (2000, p. 130):
Em um Estado Democrático, a ressocialização não pode ser entendida como substituição coativa dos valores do condenado, ou manipulação de sua personalidade, senão como real intenção de ampliar as possibilidades de participação na vida social do condenado, por meio de ofertas de alternativas de futuro ao comportamento criminal. A pena privativa de liberdade deve conter programas que evitem, na medida do possível, os efeitos dessocializadores próprios da prisão. A pretensão ressocializadora pressupõe um vasto programa social em favor do apenado, fazendo possível sua reinserção social. Portanto, a idéia de ressocialização como adaptação e sujeição do condenado às idéias e comportamentos do Estado colide com o pluralismo e liberdade de idéias da democracia.
A Constituição Federal preceitua vários dispositivos em seu texto que consagram o princípio da humanidade, como é o caso do artigo 5º, inciso XLIX que “assegura aos presos o respeito, à integridade física e moral”. O artigo 1º, inciso III da Carta Magna prevê a dignidade da pessoa humana como um dos preceitos fundamentais do Estado Democrático de Direito.
A Lei de Execuções Penais, expressamente em seu artigo 40, observa a aplicação do princípio da humanidade, dizendo que “impõe-se a todas as autoridades o respeito à integridade física e moral dos condenados e dos presos provisórios”.
Também há tratados internacionais, como a Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) de 1969, no qual o Brasil ratificou, que dispõe no seu artigo 5º, inciso II que “ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada de liberdade deve ser tratada com o respeito devido à dignidade inerente ao se humano”.
Todavia, a realidade do sistema prisional brasileiro ainda é degradante e depende da aplicação efetiva do princípio da humanidade, para que se possa buscar a verdadeira finalidade da pena.
1.4 Princípio da individualização da pena e da pessoalidade
A Constituição Federal consagra o princípio da individualização da pena no seu artigo 5º, inciso XLVI, prevendo que “a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos”.
O princípio da individualização da pena é aquele que ajusta a pena prevista em lei ao caso concreto. O artigo 59 do Código Penal dispõe parâmetros para fixação da pena, levando em consideração a figura do condenado e o comportamento da vítima.
No entender de Lavorenti e Silva (2000, p. 131):
Afirma-se que a individualização da pena ocorre em três momentos complementares: o legislativo, o judicial e o executório ou administrativo. Na primeira etapa, são fixadas, para cada tipo penal, penas proporcionais à importância do bem tutelado e à correspondente gravidade da ofensa. No segundo momento, ocorre a individualização judiciária com escolha da pena aplicável. O último momento dá-se com a execução da pena, que também deve se ater ao princípio de humanidade já mencionado e com escora constitucional.
A individualização legislativa fixa a pena levando-se em conta a importância do bem jurídico protegido.
A individualização da pena, na fase judicial, é uma atividade discricionária do magistrado, vinculada à lei, onde o juiz fixa a pena de acordo com parâmetros legais, considerando a conduta do agente infrator e o comportamento do sujeito passivo.
A última etapa da individualização da pena se dá na fase da execução penal, que conforme o artigo 5º, inciso XLVIII da Constituição Federal “a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado”. O artigo 5º da Lei de Execuções Penais também prevê o princípio da individualização da pena, determinando a classificação dos condenados conforme sua personalidade e seus antecedentes criminais.
Mas, a realidade do cumprimento de pena no Brasil não respeita corretamente o princípio da individualização da pena, pois são misturados diferentes tipos de condenados, com diversos índices de periculosidade, o que leva a influenciar o indivíduo de baixa periculosidade à prática de outros delitos ainda mais graves. Logo, não é a toa que as prisões brasileiras são consideradas como “faculdades do crime”.
O princípio da pessoalidade está consagrado no artigo 5º, inciso XLV da Constituição Federal, prevendo que a pena aplicada ao condenado não pode passar de sua pessoa, não podendo atingir terceiros estranhos ao crime, ainda que vinculados por laços de parentesco ou de sangue. O mesmo diploma constitucional assegura a responsabilidade pessoal do condenado, prevendo a possibilidade da reparação de danos e a do perdimento de bens ser repassadas aos seus sucessores.
2. Alternativas à Pena Privativa de Liberdade
A reforma penal de 1984 introduziu na Parte Geral do Código Penal brasileiro, especificadamente no artigo 59, inciso IV, a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por penas alternativas. A Lei de Execuções Penais (Lei n.º 7.210/84) também prevê medidas alternativas à pena de prisão, como forma de estabelecer uma política criminal. Em 1988, com o advento da atual Constituição Federal, tem previsão expressa no artigo 5º, inciso XLVI, em suas alíneas, sobre as penas alternativas à pena privativa de liberdade.
Em 1998, seguindo as observações das Regras de Tóquio, foi criada a Lei das Penas Alternativas (Lei n.º 9.714/98), que ampliou o campo de aplicação das penas restritivas de direitos, mudando, desta forma, alguns artigos do Código Penal.
As penas alternativas ou restritivas de direitos são também conhecidas como penas substitutivas, pois primeiro é prolatada a condenação à pena privativa de liberdade e, posteriormente, o juiz aplica uma medida alternativa, substituindo a pena de prisão.
Segundo Foucault (1997) apud Luz (2000, p. 103):
A prisão não pode deixar de fabricar delinqüentes. Fabrica-os pelo tipo de existência que faz os detentos levarem: que fiquem isolados nas celas, ou que lhes seja imposto um trabalho inútil, para o qual não encontrarão utilidade, é de qualquer maneira não pensar no homem em sociedade; é criar uma existência contra a natureza inútil e perigosa; queremos que a prisão eduque os detentos, mas um sistema de educação que se dirige ao homem pode ter razoavelmente como objetivo agir contra o desejo da natureza? A prisão fabrica também delinqüentes impondo limitações violentas; ela se destina a aplicar leis e a ensinar o respeito por elas; ora, todo o seu funcionamento se desenrola no sentido do abuso de poder.
O sistema prisional brasileiro é obsoleto, corrompido e precário, não recupera ninguém, pelo contrário, torna o indivíduo pior do que antes. A prisão trata-se de uma “faculdade do crime”, por isso, na medida do possível, ela deve ser evitada, para que não contamine ainda mais o condenado, propiciando sua reintegração na sociedade; ou seja, a ressocialização é incompatível com a pena privativa de liberdade. Assim sendo, os objetivos principais das penas alternativas são: evitar a pena privativa de liberdade e ressocializar o delinqüente.
De acordo com Mirabete (1996, p. 264):
Diante da já comentada falência da pena privativa de liberdade, que não atende aos anseios de ressocialização, a tendência moderna é procurar substitutivos penais para essa sanção, ao menos no que se relacione com os crimes menos graves e aos criminosos cujo encarceramento não é aconselhável. O questionamento a respeito da privação de liberdade tem levado penalistas de numerosos países e a própria Organização da Nações Unidas a uma “procura mundial” de soluções alternativas para os infratores que não ponham em risco a paz e a segurança da sociedade. Há, realmente, uma orientação no sentido de restringir a pena privativa de liberdade aos casos de reconhecida necessidade.
Deste modo, as penas alternativas são formas de solução de combate ao aumento da criminalidade e de redução da superlotação nos presídios, oportunizando maneiras alternativas da execução penal, permitindo a harmonia do binômio sanção/reintegração social do condenado. Estima-se que 30% (trinta por cento) dos sentenciados com pena privativa de liberdade não tenham cometido crimes que exigissem a prisão.
Para Dotti (1980) apud Luz (2000, p. 55):
As alternativas para o sistema de penas constituem meios, métodos e formas de reação ao delito que atuam em todos os momentos do dinamismo penal. Através da cominação, quando o ordenamento positivo consagra novas modalidades de sanção; da aplicação, quando ao juiz se possibilitam meios para melhor escolha e mediação da pena; e da execução, quando os regimes dispõem de condições formais e materiais que atendam aos objetivos visados pelas diversas medidas de prevenção e repressão à criminalidade.
Mas não se trata de um simples processo de substituição assim como se mudasse o curso do sistema abolindo algumas penas e introduzindo outras sem que a este fenômeno se apresentassem as justificativas necessárias. Alternar não é somente a escolha como também um processo racional de escolha. Daí então ser possível falar-se de uma orientação filosófica e política subjacente aos mecanismos de alternativas que, portanto, reverterá numa doutrina jurídica. Essa composição de etapas é imprescindível para que se formem as bases racionais do sistema, evitando que o processo de alternação se transforme no mudancismo anárquico.
Assim sendo, é possível falar-se em alternativas para a pena de prisão (ou da pena de prisão), bem como de alternativas na pena de prisão. Na primeira hipótese, substitui-se a perda da liberdade por outra espécie de sanção; na segunda, escolhem-se novos meios e métodos para a aplicação e a execução da pena prisão.
Conforme o artigo 43 e seus incisos do Código Penal, as penas restritivas de direitos são aplicadas na forma de prestação pecuniária, perda de bens e valores, prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas, interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana.
O artigo 44, caput, do mesmo diploma legal prevê que “as penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade”, e nos seus incisos trata dos requisitos essenciais para a substituição da pena privativa de liberdade por uma pena alternativa, como: a pena privativa de liberdade imposta na sentença não poderá exceder a quatro anos; não pode ser crime praticado com violência ou grave ameaça à pessoa; o réu não poderá ser reincidente em crime doloso; que a culpabilidade, os antecedentes criminais, a conduta social, a personalidade do réu, os motivos e as circunstâncias indiquem que essa substituição seja suficiente.
A Lei que dispõe sobre os Juizados Especiais Criminais (Lei n.º 9.099/95) aborda também sobre as penas alternativas, disciplinando medidas despenalizadoras, que buscam evitar a pena de prisão. São elas: a composição civil dos danos, prevista no artigo 74, permitindo que o autor do fato e a vítima façam um acordo, que leva à extinção da punibilidade; a transação penal, prevista no artigo 76, admitindo que o promotor de justiça proponha ao autor da infração a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou de multa; e a suspensão do processo, prevista no artigo 89.
Segundo os ensinamentos de Luz (2000, p. 39):
É indiscutivelmente a via mais promissora da tão esperada desburocratização da justiça criminal (grande parte do movimento forense criminal já foi reduzida), ao mesmo tempo em que permite a pronta resposta estatal ao delito, a imediata (se bem que na medida do possível) reparação dos danos à vítima, o fim das prescrições (essa não corre durante a suspensão), ressocialização do autor dos fatos, sua não-reincidência, uma fenomenal economia de papéis, horas de trabalho etc.
Por fim, devem ser aplicadas as penas alternativas à pena privativa de liberdade para infratores que, diante as circunstâncias de seus delitos, não levem risco à segurança da sociedade, evitando-se, assim, a deterioração de seu caráter na prisão, de onde ele sairá mais perverso e revoltado.
3 Implantação de uma Política Criminal
O deprimente caos que assola o atual sistema penitenciário brasileiro, principalmente em relação à atuação das facções criminosas e também à presença da violência e da criminalidade alarmante na sociedade, se faz necessária a implantação de uma política criminal séria e eficiente para o combate de tais mazelas. A política criminal é uma maneira de se pesquisar o direito penal existente, fazendo uma avaliação crítica do seu teor, levantando suas deficiências, sugerindo reformas e melhoramentos voltados na necessidade de implementação de novas normas penais que possam suprir os anseios sociais. Seu objeto, portanto, é fornecer orientação aos colaboradores da lei para que o combate à criminalidade se faça em bases racionais, com meios adequados, e estabelecer críticas à lei vigente para as reformas recomendadas.
Na análise de opiniões para mudança e criação de novos institutos jurídicos, dividem-se duas vertentes de juristas com idéias diferentes. Os mais conservadores defendem que a solução da criminalidade seria endurecer as leis e aplicar penas mais severas para os criminosos de alta periculosidade, com o propósito de mantê-los por um longo período atrás das grades. Já a outra corrente defende idéias alternativas à prisão e de prevenção à criminalidade, pois o tamanho da pena não inibiria os crimes, mas sim a certeza da punição, seguindo as idéias do jurista italiano Cesare Beccaria, do século XVIII.
Conforme escreve Luisi (1991, p. 120):
A perspectiva exata para se aferir o mérito de Cesare Beccaria é a do Político de Direito Penal. Em verdade, o Dei Delitti e Delle Pene, é históricamente o primeiro e lídimo Manual de Política Jurídico-Penal, e mais latamente obra de Política Jurídica, Beccaria foi um crítico do “jus conditum”, isto é das leis e práticas penais de seu tempo, e um formulador de postulados novadores, que vieram a se transformar em leis, vigentes e incorporadas nos modernos Códigos Penais.
Para amenizar o problema do crime organizado e da crescente criminalidade que aterroriza a comunidade se deve valorizar os profissionais ligados à segurança, como agentes de segurança penitenciária e policiais, conferindo a esses profissionais uma melhor remuneração, aparelhamento e treinamento;acabar com a corrupção policial, principalmente para evitar que armas apreendidas cheguem às facções criminosas; criar um rito sumário e célere para expulsão de agentes do Estado que estejam envolvidos em corrupção e práticas ilegais, através de varas especiais;integração das polícias civis e militares, a fim de evitar uma disputa por poder entre as duas polícias;gerenciar a polícia como se fosse uma empresa.
É necessário empregar os recursos conforme as necessidades e não de acordo com as pressões do momento; investir na perícia criminal para investigação e apuração de crimes, não permitindo, desta forma, a impunidade dos criminosos;instalação de bancos de dados para mapear delitos e reunir informações sobre criminosos; aumentar a eficiência da justiça brasileira. Um processo judicial, no Brasil, demora em média doze anos para ser concluído. Muitas vezes, o crime prescreve e o criminoso fica sem punição.
O excesso de formalismo só causa descrença na justiça;garantir o anonimato aos juízes responsáveis pela aplicação e execução das penas de integrantes de organizações criminosas. O modelo do “juiz sem rosto” foi adotado com sucesso no combate aos cartéis colombianos e às máfias italianas;combate ao consumo de entorpecentes. Reprimir o consumo é mais prático, econômico e eficiente a combater o narcotráfico; ampliar, a curto prazo, ao menos 150 (cento e cinqüenta) mil novas vagas no sistema prisional nacional para reduzir a superlotação existente, construindo presídios menores, que possibilitam maior controle sobre os sentenciados;criação de um código penitenciário nacional, que regule as relações entre os presos e a administração penitenciária;restabelecer a obrigatoriedade do exame criminológico para avaliação do condenado sobre a progressão do regime de cumprimento de pena;endurecer a legislação penal e acabar com o direito à progressão de pena e quaisquer outros benefícios, como o indulto para membros de facções criminosas ou para condenados por crimes violentos;destruir a movimentação financeira das facções criminosas.
De acordo com Lavorenti e Silva (2000, p. 137):
Vocábulos como combate, luta, eliminar, passam a ser as palavras de comando e a busca de um Direito Penal e processual adequados a uma luta eficiente torna-se uma meta a ser alcançada. O direito penal consolida-se como um instrumento adequado e altamente intervencionista da política diante da violência e do delito, um Direito Penal politicamente funcionalizado. O direito penal deixa de ser a ultima ratio para se tornar a prima ratio.
É importante rastrear esses recursos, bloqueá-los e evitar a abertura de empresas que lavem dinheiro para o grupo; criar um órgão nacional de inteligência para orientar o combate ao crime organizado, usando escutas telefônicas em investigações policiais, infiltração de agentes secretos nas facções criminosas, identificando suas lideranças e responsabilizando-os naquilo que fizerem de errado, realização de uma forte repressão ao tráfico de drogas, evitando que a droga entre no país. Os narcóticos financiam as facções criminosas. Sem sua principal fonte de renda, elas perdem poder; criação de uma polícia de fronteira, que fiscalizaria toda a divisa do Brasil com os outros países da América do Sul;funcionamento mais rigoroso das prisões de segurança máxima sob o Regime Disciplinar Diferenciado, não sendo permitidas visitas íntimas, banho de sol apenas uma hora por dia, não ter tempo máximo de internação, podendo o preso cumprir a totalidade de sua pena neste regime, fazer uma lei especifica para o delito de crime organizado, com penas severas para seus membros, contudo, se fossem aplicadas tais medidas, certamente os problemas das facções criminosas e da criminalidade no Brasil seriam amenizados.
4 Prevenção da Violência e Criminalidade
A função da política de prevenção criminal é a redução e o controle da violência e das práticas delituosas. Prevenir a criminalidade é muito vantajoso para toda a sociedade, a prevenção da criminalidade corresponde a um conjunto de ideias e medidas voltadas a evitar e controlar ações contrárias às leis, além de preservar o direito à dignidade da pessoa humana, não apenas dar cumprimento à pena, vista em sua função meramente punitiva, mas humanizá-la, enfatizar seu sentido pedagógico, terapêutico, esclarecendo que era seu objeto prioritário recuperar o condenado, não importando o crime que houvesse cometido.
As normas legais e as penas também devem seguir seu caráter preventivo, ético e pedagógico. A criação de medidas educativas e curativas, além da prevenção da criminalidade, busca respeitar o direito da personalidade humana, objetivando a reabilitação do indivíduo.
Até mesmo a Organização Mundial de Saúde estabelece como prioridade, na saúde pública, a prevenção da violência e da criminalidade. A violência é um grande problema de saúde pública, pois está diretamente ligada ao grande crescimento da mortalidade por causas externas.
A prevenção da criminalidade apresenta-se em quatro fases distintas:
A Primeira fase é destinada a evitar a delinqüência futura, visando principalmente a educação e a orientação de crianças e adolescentes. É necessária a implantação de um programa de educação integral e o oferecimento de cursos profissionalizantes aos jovens, para afastá-los da ociosidade;
A Segunda fase, busca impedir que a criminalidade cresça. Compreende medidas de diagnóstico e de combate rápido dos problemas existentes. Propõe uma política comunitária preventiva através da polícia comunitária, evitando-se o uso exagerado de bebidas alcoólicas, instituindo-se a lei “seca” para limitar o funcionamento de bares, combatendo-se o consumo de entorpecentes que levam os viciados a praticar violência e outros delitos;
A Terceira fase,visa obstar que indivíduos que tenham condutas desviadas e anti-sociais, ou seja, que os criminosos em potencial pratiquem algum dano à sociedade, com a criação de um juizado especial preventivo para acompanhar essas pessoas, contando com a parceria da iniciativa privada e de ONG’s;
A Quarta fase é aquela que procura a reabilitação e a ressocialização do condenado, não apenas dar cumprimento à pena, vista em sua função meramente punitiva, mas humanizá-la, enfatizar seu sentido pedagógico, terapêutico, esclarecendo que era seu objeto prioritário recuperar o condenado, não importando o crime que houvesse cometido.
Acima de tudo, é de fundamental importância erradicar as desigualdades e exclusões sociais existentes no Brasil. O aumento da violência, o desenvolvimento da criminalidade, a delinqüência juvenil, a prostituição infantil e o aparecimento de facções criminosas são favorecidos pela desigualdade social. Garantir direitos fundamentais, como o acesso à educação, à saúde, ao trabalho, à moradia são imprescindíveis para o desenvolvimento democrático de uma sociedade justa e para a promoção dos direitos humanos.
5 CONCLUSÃO
Diante do exposto em relação às funções da pena observa-se que todas elas tem a sua relevância, e em geral acabam uma complementando a outra, pois que isoladamente elas não alcançam os objetivos que devem atingir. Por isso a teoria adotada no Brasil se da pela unificação das funções retributivas e preventivas, tendo em vista que unificadas as referidas teorias é possível chegar a um equilíbrio quanto a real função da pena.
Já na atualidade é triste a cruel realidade que se encontram os estabelecimentos penais no Brasil. A violação dos direitos fundamentais dos presos demonstra que os princípios constitucionais não são aplicados como deveria durante a aplicação da pena.
Os problemas carcerários são inúmeros, dentre os quais: superlotação, ociosidade dos detentos, desrespeito aos direitos humanos, corrupção, aparecimento do crime organizado, todas essas mazelas prisionais só vêm a corroborar com a ineficácia da aplicação da pena privativa de liberdade.
Mas problemas como criminalidade, violência e crime organizado não é privilégio só do Brasil, outros países, inclusive nações desenvolvidas, apresentam as mesmas mazelas sociais.
Assim, observa-se a ineficácia do sistema prisional brasileiro, a discrepância entre a lei e a realidade, bem como a falta de medidas que procurem solucionar ou ao menos minimizar as condições desumanas, no que tange o tratamento de presos nos estabelecimentos prisionais do país e também sobre a ressocialização do reeducando. Uma das sugestões seria a construção de mais unidades prisionais com o intuito de desafogar os sistemas superlotados.
O sistema penitenciário brasileiro, diante o exposto, em nada tem colaborado para a reinserção social do sentenciado; pelo contrário, contribui para que aqueles presos que ainda tinham alguma esperança de recuperação, devido o convívio no cárcere, a entrarem para a criminalidade organizada, pois os presídios, na verdade, são universidades do crime.
Por fim, são necessárias soluções de combate às organizações criminosas e à crescente criminalidade, como a aplicação devida dos princípios constitucionais penais, para que se possa realmente obter a ressocialização do condenado. Também é importante, quando possível, empregar penas alternativas à prisão.
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