(I)
No fim do ano passado (2007), estive 21 dias em Dubai. Fiquei impressionado em ver os homens locais vestidos de kandoura (branca) e as mulheres de abayah (preta) ou de burca (veste talar usada que tem, na altura dos olhos, um dispositivo que permite à mulher ver, sem ser vista). Visitei a mesquita de Jumeirah (Jumeirah mosque) e vi de perto a sua reverência para com o Alcorão em todos os lugares, presente inclusive nos rádios dos táxis.
Essa é uma das razões por que resolvi estudar esse modo maometano de encarar o mundo. Meus comentários a respeito dessa viagem estão disponíveis no meu sítio www.latimedireito.adv.br, no item artigos, subitem outros temas.
A civilização islâmica iniciou-se com a vida de Maomé (570-632), no século VI, mas não tem um fim, porque o islã, sua religião, representa uma força ponderável no mundo moderno.
Os muçulmanos compreendem cerca de um sétimo da população do globo, estendendo-se da África até a Índia, Bangladesh e Indonésia, passando pelo Oriente Médio e a antiga União Soviética.
Eles abraçam tanto a mesma religião quanto um mesmo modo de viver, pois o islamismo sempre exigiu de seus fiéis adesão não só a certas formas de culto como também a um conjunto de normas sociais e culturais.
Mais do que o judaísmo ou o cristianismo, ele tem sido uma grande experiência de construir uma sociedade de âmbito mundial, baseada numa plena identidade entre requisitos religiosos e um código rigoroso de existência cotidiana.
Essa prática de vida conheceu muitos êxitos, mesmo com características diversas de acordo com o tempo e o lugar, mas ainda está sendo levada a cabo, o que explica o fato de haver um extraordinário sentido de comunidade entre todos os adeptos, quaisquer que sejam suas raças, línguas e localizações geográficas.
Esse movimento cultural nasceu na Arábia. Na sua maioria beduínos, os árabes eram pastores de camelos, que viviam do leite de seus animais e dos produtos encontrados nos oásis, como as tâmaras.
As prolongadas guerras entre o Império Bizantino e o Persa tornaram a Arábia um caminho mais seguro para o trânsito de caravanas. Algumas cidades cresceram para dirigir e tirar proveito desse desenvolvimento mercantil; dentre elas destacou-se Meca, não só por situar-se na junção de importantes rotas comerciais, como também por ser, desde muito, um centro da religião local.
Lá está a caaba, santuário de peregrinação que serve como centro de romarias de muitos clãs e tribos diferentes. No interior da caaba fica a pedra negra, meteorito cultuado como miraculosa relíquia por crentes de diversas divindades.
Esse santuário e a vida econômica da área de Meca pertenciam à tribo dos coraixitas, aristocracia de mercadores e negociantes.
Maomé nasceu em Meca numa família dessa tribo. Órfão e ainda pequeno, colocou-se a serviço de uma viúva rica que mais tarde desposou, obtendo assim segurança financeira.
Até à meia idade viveu como próspero comerciante, conduzindo-se de modo pouco diferente de seus concidadãos. Mas em 610 passou por uma experiência religiosa que mudou o rumo de sua vida e de boa parte do mundo, pois a maioria dos árabes era politeísta, mas admitia uma vaga superioridade de um deus mais poderoso a que chamaram de Alá.
Em 610, ele acreditou ter escutado uma voz do céu que lhe dizia não existir outro deus senão Alá. Assim, de uma experiência de conversão, ele se tornou ferrenho monoteísta. Depois disso, recebeu novas mensagens que serviram de base para uma nova religião e que lhe ordenavam aceitar a vocação de profeta, para proclamar a fé monoteística aos coraixitas.
No início não teve grande êxito em fazer prosélitos, além de um círculo limitado, em virtude de os eminentes membros da tribo acreditarem que a criação de uma nova religião haveria de privar a caaba, e com ela Meca, de seu posto central na religião do lugar.
Mas a cidade de Yathrib (Medina), ao norte, não nutria tais preocupações. Os representantes do lugar convidaram Maomé a emigrar para lá, para ser o árbitro neutro das rivalidades locais. Em 622, Maomé e seus seguidores aceitaram o convite.
Como essa migração – a Hégira – assinalou o começo de uma mudança positiva na sorte de Maomé, os muçulmanos consideram-na o início de uma nova era.
Do jeito como os cristãos contam o tempo a partir do nascimento de Cristo, os maometanos começam o seu sistema de datação com a Hégira, no ano de 622 do calendário cristão.
(II)
Maomé mudou o nome de Yathrib para Medina (cidade do profeta) e conseguiu impor-se como governante da cidade. Conscientemente organizou seus convertidos numa comunidade tanto política quanto religiosa.
Em 630, após várias batalhas no deserto, entrou triunfante na Meca. Os coraixitas submeteram-se à nova fé e a caaba tornou-se o principal santuário do islã, como é ainda hoje.
Com a tomada de Meca, outras tribos em toda a Arábia aceitaram a nova religião. Maomé morreu em 632, tendo vivido o suficiente para ver bem sucedida a fé que ele havia lançado.
A doutrina é muito simples. A própria palavra islã tem o sentido de submissão, e a fé islâmica exige absoluta subordinação a Deus.
Alá significa o Deus criador todo-poderoso, a mesma divindade onipotente adorada por cristãos e judeus. Os muçulmanos acreditam não existir outra, senão Deus.
Para eles Maomé foi o último e o maior dos profetas. Ao pregar o monoteísmo estrito, ele ensinava que todos os homens e mulheres deveriam sujeitar-se inteiramente a Deus, pois o juízo divino estava iminente.
Os mortais têm de fazer uma opção fundamental: se decidirem por uma vida de serviço a Deus, serão guiados à bem-aventurança; se não o fizerem, serão afastados dela e tornar-se-ão irremediavelmente iníquos. No dia do juízo, aos fiéis será concedida uma vida eterna num paraíso carnal de delícias, enquanto os condenados serão mandados a um reino de fogo e tortura eterna.
As medidas práticas que o crente pode tomar são encontradas no alcorão, a compilação das revelações feitas por Deus a Maomé e, por conseguinte, a codificação definitiva do islã. Entre outras, contam-se: dedicação rigorosa à retidão moral e à compaixão, bem como fidelidade aos mandamentos religiosos, um regime de orações e jejum, peregrinação a Meca e recitação frequente de parte do alcorão.
Não é casual a semelhança do islamismo com o judaísmo e o cristianismo, pois havia muitos judeus em Meca e Medina. Assim, Maomé foi influenciado pelas duas religiões.
Os principais pontos de contato entre o islã e essas duas religiões são o estrito monoteísmo, a ênfase na moralidade e na compaixão pessoais e a adesão às escrituras reveladas.
Apesar de proclamar ser o alcorão a fonte suprema de autoridade religiosa, Maomé aceitava o Velho e o Novo Testamento como livros de inspiração divina. Tudo indica que ele se inspirou nas doutrinas cristãs sobre o juízo final e a ressurreição do corpo, com subsequentes recompensas e punições, e para fundamentar sua crença em anjos, já que acreditava que a primeira mensagem de Deus lhe fora trazida pelo anjo Gabriel.
Aceitava Cristo como um dos maiores, de uma longa linhagem de profetas. Não levava em consideração a doutrina cristã de redenção pelo amor e pregava uma religião sem sacramentos ou sacerdotes.
Todo o crente é diretamente responsável por viver a fé, sem intermediários. Em vez de ministros do culto, o islã tem estudiosos da religião, que podem comentar os problemas da fé e da lei islâmica.
Eles oram juntos em mesquitas, mas não existe nada parecido com a missa católica. A ausência de clero torna o islamismo mais semelhante ao judaísmo, parecença ressaltada pela ênfase dada à ligação indissolúvel entre a vida religiosa e a sociopolítica da comunidade inspirada por Deus. Mas, ao contrário do judaísmo, o islã aspirava ao universalismo e a um papel basilar na unificação do mundo, desde que começou a transbordar os limites da Arábia.
Após a morte de Maomé, teve início o movimento no sentido da transformação do islã numa força mundial. Seu sogro Abu Bakr (570-634) e seu discípulo Omar ibn al-Khattab (586-644) tomaram rapidamente essa iniciativa. Abu Bakr foi nomeado califa, que quer dizer representante do profeta.
Durante 300 anos, o califa serviria como o chefe religioso e político supremo de todos os muçulmanos.art. 184, lei 9610/98, art. 5º, VII c/c art. 29, I e Norma Técnica NBR 6023, da ABNT
(III)
Abu Bakr (570-634) morreu dois anos após sua ascensão. Omar ibn al-Khattab (586-644) o sucedeu no califado e continuou a dirigir as invasões árabes nos impérios vizinhos.
Em 636 os árabes aniquilaram um exército bizantino na Síria e se espalharam por toda a área, ocupando importantes cidades da Antioquia, Damasco e Jerusalém. Em 637 destruíram o principal exército dos persas e investiram contra sua capital, Ctesifonte. Em 651, a conquista do império havia se completado. Em 646 roubaram o Egito ao Império Bizantino e logo espraiaram-se pelo norte da África. Em 711 atravessaram o Mediterrâneo e entraram na Espanha. Assim, em menos de um século, toda a Pérsia e grande parte do velho mundo romano haviam sido conquistadas pelo islã.
Muito embora o nível da expansão não fosse a religião, o entusiasmo religioso desempenhou papel vital em fazer com que os árabes, até então desprovidos de governo, acatassem ordens do califa e em lhes instilar a ideia de que estavam executando a vontade de Deus.
A inspiração que lhes proporcionava a religião chegou no momento certo, em termos da fraqueza de seus inimigos. Assim, o islã logo se propagou por uma vasta extensão territorial entre o Egito e o Irã e, desde então, lá se radicou.
Enquanto ampliavam suas conquistas, enfrentavam suas primeiras divisões políticas de gravidade. Em 644 morreu o califa Omar ibn al-Khattab, que foi substituído por Uthman ibn Affan (570-656), governante débil. Os insatisfeitos com ele reuniram-se em torno de Ali ibn Abi Talib (600-661), primo e genro do profeta. Com o passar do tempo, cristalizaram-se num partido religioso minoritário, o dos xiitas, grupo esse que sustentava que só os descendentes de Ali poderiam ser califa ou exercer qualquer autoridade sobre a comunidade muçulmana. Os que, porém, defendiam o verdadeiro desenvolvimento histórico do califado e que vieram a se comprometer com suas praxes eram chamados de sunitas.
Em 661, o triunfo do clã dos omíadas, integrado na tribo dos coraixitas, inaugurou um período mais estável na história do califado, que durou até 945, concentrando suas forças nos antigos territórios bizantinos na Síria. Seus sucessores, os abássidas, em 750, deram mais realce aos elementos persas e mudaram sua capital para Bagdá, perto das ruínas da antiga capital persa.
Os abássidas desenvolveram sua própria administração muçulmana e imitaram o absolutismo persa. Os califas prostraram seus inimigos, cercaram-se de complexas cerimônias palacianas e patrocinaram generosamente uma literatura sofisticada.
É esse o mundo descrito em As mil e uma noites (Alf Lailah Oua Lailah), uma coletânea de histórias de deslumbrante esplendor oriental, obra clássica da literatura persa, que consiste numa coleção de contos orientais. Uma presença certamente dominante nessas histórias foi H?r?n al-Rash?d (763-809), que governou como califa de 786 a 809. Ele comportava-se de modo extravagante, atirando moedas nas ruas, dando presentes suntuosos a seus favoritos e condenando os inimigos a penas severas.
No século X começou a declinar o poder abássida, seguindo-se um prolongado período de descentralização. O empobrecimento gradual de sua base econômica, a riqueza econômica da bacia do Tigre-Eufrates, foi a principal causa da crescente debilitação abássida.
Os soldados turcos, que cercavam os últimos califas abássidas, logo compreenderam que poderiam assumir o poder real no Estado. Em 945 o império abássida esfacelou-se, quando uma tribo xiita capturou Bagdá. De 945 até o século XVI a vida política islâmica foi marcada pelo localismo, com diferentes régulos, mais frequentemente turcos, que assumiram o poder em varas áreas.
Na verdade, nesse período, o domínio islâmico expandiu-se também para a atual Turquia e a Índia. Mais tarde surgiram novos impérios islâmicos, que controlaram grande parte da Europa oriental e do Oriente Próximo desde o século XV até 1918.
A sua cultura e a sociedade foram cosmopolitas e dinâmicas. Tendo herdado a sofisticação de Bizâncio e da Pérsia, permaneceu centralizada nas encruzilhadas do comércio a longa distância entre o Extremo Oriente e o Ocidente, porque a vida urbana contrabalançava a agricultura.
Devido à importância do comércio, havia grande mobilidade geográfica. Como o alcorão pregava a igualdade de todos os muçulmanos, as pessoas talentosas tinham oportunidades nas cortes. A alfabetização era extraordinária, ricamente disseminada, e muitos podiam subir socialmente através da educação.
Além disso, havia notável tolerância para com outras religiões. Permitiam espaço dentro de seus próprios Estados para judeus e cristãos, considerados como “gente do livro”, porque a bíblia era vista como precursora do alcorão.
Dentro dessa atitude de tolerância, um dos primeiros califas empregou um cristão como seu principal secretário, os omíadas protegiam um cristão que escrevia poesias em árabe e a Espanha moura assistiu ao maior florescimento da cultura judaica entre a antiguidade e os tempos modernos. Fruto dessa florescência foi a obra de Moshé ben Maymon, também chamado desde o Renascimento como Maimônides (1135-1204), profundo pensador religioso, às vezes cognominado “o segundo Moisés”, e que escrevia tanto em hebraico como em árabe.
(IV)
Havia uma grande exceção na norma muçulmana de tolerância e do igualitarismo: o tratamento dispensado às mulheres.
Os homens com sucesso sentiam-se ansiosos por preservar e enaltecer suas posições e honra. Para isso, mantinham e expandiam suas propriedades materiais, categoria essa que incluía as mulheres.
A fim de que elas tivessem valor máximo para o statu quo de um homem, era preciso garantir-lhes a inviolabilidade. O alcorão permitia a um homem casar-se com quatro mulheres. Elas tinham grande valor, e as casadas eram segregadas de outras companhias masculinas.
Um homem de posse tinha também várias criadas e concubinas. Todas essas mulheres viviam numa parte de sua residência chamada de harém, onde eram guardadas por eunucos, isto é, homens castrados.
Como as mulheres eram bens móveis, esses costumes contribuíram para aviltá-las e dar ênfase a atitudes de dominação na vida sexual. As relações homossexuais entre homens eram toleradas na classe superior, mas baseavam-se também no sistema de dominação, geralmente de um adulto poderoso sobre um adolescente.
Eram igualmente interessantes os caminhos principais para a devoção a uma vida particularmente religiosa.
Os ulemás eram letrados; sua tarefa consistia em estudar e dar conselhos sobre todos os aspectos da religião e da lei religiosa. Defendiam a tradição e a observância rigorosa da fé, exercendo forte influência sobre a vida pública.
Os sufistas os complementavam, pois eram pessoas místicas. Valorizavam a contemplação e o êxtase. Não tinham nenhum programa comum e na prática comportavam-se de modo muito diverso. Alguns eram daroeses, ou dervixes rodopiantes, assim conhecidos por causa de suas danças. Os faquires eram encantadores de serpentes nos mercados. Outros ainda se dedicavam à meditação e não praticavam quaisquer ritos exóticos.
A possibilidade de os ulemás e os sufistas coexistirem lado a lado constitui, em si mesma, indicador extraordinário do pluralismo cultural muçulmano.
Mais notável ainda é o fato de esses dois grupos existirem juntamente com representantes de outra concepção, os estudantes e praticantes da filosofia e da ciência.
Os filósofos árabes eram na verdade chamados de fayllasufs, por se dedicarem ao cultivo daquilo que os gregos denominavam de filósofos, nas vertentes aristotélica e neoplatônica.
Na época em que as escolas filosóficas foram fechadas em Atenas, por ordem do imperador Justiniano (Flavius Petrus Sabbatius Justinianus – 483-565), os filósofos gregos migraram pra o leste, e as obras de Aristóteles e de outros pensadores foram traduzidas para o siríaco, um dialeto semita.
A partir daí a filosofia grega entrou aos poucos na vida do islã e passou a ser cultivada pela classe dos fayllasufs, que acreditavam ser o universo racional e que uma atitude filosófica em relação à vida era a suprema vocação inspirada por Deus.
Avicena (Ibn Sina – 980-1037) leu praticamente todas as obras de Aristóteles na cidade de Bucara, no Extremo Oriente, antes de chegar aos 18 anos, e procurava conciliar as emanações neoplatônicas com as doutrinas peripatéticas.
A grande dificuldade era harmonizar a filosofia grega com a religião árabe, pois acompanhavam suas fontes gregas na crença – oposta à doutrina islâmica – de que o mundo é eterno e de que não existe imortalidade para a alma individual.
Muhammad ibn Muhammad ibn Tarkhan ibn Uzalagh al-Farabi (870-950) ensinava que uma elite esclarecida poderia filosofar sem ser enleada pelas compulsórias crenças comuns das massas. Jamais atacou essas crenças, por considerá-las necessárias à manutenção da coesão social.
Ao contrário, Avicena lecionava uma filosofia menos racionalista que em muitos pontos se aproximava do misticismo dos sufistas. Por fim, Abu al-Walid Muhammad ibn Ahmad ibn Munhammad ibn Ruchd, conhecido pelo nome de Averróis, distorção latina do antropônimo árabe (1126-1198), de Córdova, na Espanha, era um aristotélico rigoroso que levava duas vidas: uma particular, como racionalista extremo, e outra pública, como crente e censor da fé oficial.
Em seu auge, entre 850 a 1200 aproximadamente, a filosofia islâmica foi muito mais avançada e rica do que qualquer outra coisa parecida encontrada nos registros bizantinos e cristãos ocidentais.
Antes de seu declínio, os fayllasufs distinguiram-se tanto no estudo da ciência natural como na especulação filosófica. Filósofos e cientistas ascendiam a posições de riqueza e poder pela prática da astrologia e da medicina.
Entre os muçulmanos, a astrologia era uma ciência aplicada, intimamente ligada a observações astronômicas precisas, o que lhes permitia empregar seu conhecimento ao rumo dos fatos humanos, sobretudo da sorte dos clientes ricos.
(V)
Avicena (Ibn Sina – 980-1037) descobriu a natureza contagiosa da tuberculose e observou que a doença pode propagar-se pela contaminação da água e do solo. Sua principal obra médica é o enciclopédico al-Qanun, ou Cânone da Medicina, aceito na Europa até fins do século XVII.
Ab? Bakr Muhammad ibn Zakar?ya al-R?zi (865-925), conhecido pelo nome latino de Rasis e também Rhazes ou Al-Razi, foi o maior clínico do mundo medieval. Seu feito principal foi a descoberta da diferença entre o sarampo e a varíola.
Os muçulmanos superaram todos os demais povos medievais na organização de hospitais e no controle da prática da medicina. Na Pérsia, na Síria e no Egito havia uns 34 grandes hospitais organizados de modo bem moderno; cada qual contava com alas para doenças diferentes, um dispensário e uma biblioteca.
Outros grandes avanços científicos deram-se nas áreas da ótica, da química e da matemática.
Os físicos fundaram a ciência da ótica e tiraram várias conclusões importantes com relação à teoria das lentes e da velocidade, transmissão e refração da luz.
A química foi produto da alquimia, invenção dos gregos helenísticos, o sistema da crença que se baseava no princípio de que todos os metais eram em essência o mesmo e que, portanto, metais menos nobres poderiam ser transmutados em ouro, se fosse possível descobrir o instrumento correto para isso – a pedra filosofal.
Em matemática, sua maior realização foi unificar a geometria dos gregos com a numerologia dos indianos. Tomando de empréstimo deles o que os ocidentais conhecem como “algarismos arábicos”, inclusive o zero, foram capazes de desenvolver uma aritmética baseada no sistema decimal e também fizeram progressos na álgebra (ela própria uma palavra árabe). Ampliando a geometria grega e aplicando-a aos movimentos celestes, lograram grande progresso na trigonometria esférica. Assim unificaram e aprofundaram todas as obras de conhecimento matemático.
Os árabes primitivos foram excelentes na composição da poesia. O mais famoso foi Ghiyath Al Din Abul Fateh Omar Ibn Ibrahim Al Khayyam (1048-1131), desde que os Rubaiyat (em português, “quadras” ou “quartetos”) ficaram famosos no Ocidente a partir da tradução de Edward Marlborough FitzGerald (1809-1883), em 1839. Outros grandes poetas foram Musharrif Od-Dîn Sa'adi (1193-1292) e Chama al-Din Muhammad Hafiz (1325-1390).
Nas atividades artísticas foram ecléticos. Sua principal inspiração era a arte de Bizâncio e da Pérsia. A arquitetura foi uma das mais importantes de suas artes; o desenvolvimento da pintura e da escultura viu-se inibido pelo preconceito religioso contra a representação da forma humana.
Entre seus principais elementos contavam-se as cúpulas bulbosas, os minaretes, os arcos em forma de ferradura e as colunas retorcidas, juntamente com o emprego do rendilhado de pedra, a alternância de faixas de preto e branco, mosaicos e caligrafia árabe como artifícios de decoração.
As suas artes menores incluíam a tapeçaria, magníficos trabalhos em couro e a fabricação de sedas brocadas, marchetaria, vidros esmaltados e cerâmica pintada.
Na maioria, os produtos dessas artes eram decorados com arabescos, frutas e flores, inscrições árabes e animais fabulosos. A arte dava ênfase toda especial ao puro aspecto visual. Sem qualquer função na educação religiosa, tornou-se altamente abstrata e não figurativa. Por esses motivos, a arte muitas vezes parece mais secular e “moderna” do que qualquer outra anterior aos tempos modernos.