3. As conclusões
"O Justo e o injusto mudam de qualidade quando mudam de país (...)
"Engraçada essa justiça que um rio limita (...)"
PASCAL, Pensamentos
VICTOR HUGO encabeçando as primeiras edições de Le dernier jour d’un condamné, publicada a princípio sem nome de autor, só figuravam as poucas linhas que seguem:
Existem duas maneiras de constatar a existência deste livro. Ou bem houve, de fato, uma pilha de folhas amareladas e desiguais sobre as quais foram achadas, registradas uma a uma, as últimas reflexões de um pobretão; ou bem houve um homem, um sonhador ocupado em observar em proveito da arte, um filósofo, um poeta, talvez, que fez dessa idéia sua fantasia, que a tomou ou, melhor dizendo, foi tomado por ela, e que só conseguiu livrar-se dela jogando-a num livro.
Das duas explicações, o leitor escolherá a que melhor lhe convier.
Recente edição adverte que como se pode ver, na época em que o livro foi publicado, o autor não julgou necessário expor logo todas as suas idéias. Preferiu esperar que elas fossem entendidas e ver se, de fato, o seriam. E foram. Hoje, o autor pode desmascarar a idéia política, a idéia social, que ele quis divulgar adotando esta inocente e cândida forma literária.
Está portanto declarando, ou melhor, confessando em voz alta que O último dia de um condenado não passa de uma defesa, direta ou indireta, como preferirem, da abolição da pena de morte.
Segundo consta do prefácio da tradução de Annie Paulette Maria CAMBÈ o que ele planejou, o que ele gostaria que passasse à posteridade na sua obra, se por acaso ela o merecer, não é a defesa especial, sempre fácil e sempre transitória, deste ou daquele criminoso em particular, deste ou da-quele réu designado, é sim o discurso de defesa geral e permanente para todos os réus presentes e futuros.
É o grande ponto de Direito da Humanidade, apresentado e defendido em alto e bom som perante a sociedade, que é a grande Corte Suprema; é esta suprema recusa, abhorescere a sanguine, precedendo, para sempre, qualquer processo criminal; é a tenebrosa e fatal questão que palpita na escuridão de todas as causas capitais sob as tríplices espessuras de pathos com as quais é envolta pela retórica sangrenta das gentes do rei; é, em suma, a questão de vida ou morte (no caso da tese: a liberdade) despida, desnuda, livre de manipulações ruidosas do foro, brutalmente exposta e colocada onde ela tem que ser vista, no seu meio verdadeiro, no seu meio horrível; não no tribunal, mas sim no cadafalso, não perante o juiz, mas sim perante o carrasco (no caso acrescentamos: não em estéreis discussões, que se pretendem acadêmicas, quando se busca o conceito – com pseudo-erudição – como se a única razão de ser de uma ciência não fosse a sua aplicabilidade; ou se se pretende o direito como arte, da revelação e cognição dos valores da alma); diante da realidade da cela, cadeia, do ergástulo público; da realidade do injustiçado em seus direitos fundamentais.
O trabalho de pesquisa do pensamento jurídico, como regra e máximo quando se trata de liberdade, deve ser realizado com a crença de BRUNO, a ousadia e o risco intelectual de COPÉRNICO e GALILEU, como dito por NEWTON, ao apresentar suas teorias; alicerçado nos ombros de gigantes, buscando inspiração nas palavras de PASCAL, VICTOR HUGO e NORBERTO BOBBIO, dentre tantos outros; este que entende o principal problema vinculado aos Direitos do Homem (aos direitos fundamentais positivados em cada constituição, dir-se-á); não é tanto o de justificá-los ou declará-los, mas efetivamente protegê-los.
Protegê-los através dos instrumentos adequados em um ordenamento jurídico consentâneo com os valores do seu tempo.
Problema que em um primeiro momento é jurídico, e num sentido mais amplo, político, conforme se verificará neste trabalho.
Por isso, como na obra de VICTOR HUGO, vem este declarar e repetir que está pleiteando em nome de todos os possíveis réus, inocentes e culpados, perante todas as Cortes, todos os pretórios, todos os júris, todas as justiças.
Está endereçado a todos aqueles que estão preocupados com os direitos e as garantias fundamentais do homem.
Ambiciona despertar atenção para os Direitos do Homem no processo de integração regional do MERCOSUL; aquele como diploma que resulta da amarga experiência da Segunda Guerra Mundial, da evolução do pensamento da civilização, enfim, da humanidade; e não um projeto deste ou daquele governo transitório; ainda que sem a arte de VICTOR HUGO pretender ser um instrumento de divulgação dos Direitos do Homem, um incentivo ao seu conhecimento e aplicação integral.
Os que julgam e condenam, por vezes, conforme assevera VICTOR HUGO, dizem a pena (de morte) necessária. Em primeiro lugar, porque é importante eliminar da comunidade social um membro que já a prejudicou e que poderia prejudicá-la outra vez. – Se se tratasse apenas disso, a prisão perpétua seria suficiente. Para que a morte? Retrucam que se pode escapar de uma prisão? Melhorem as rondas! Se não têm confiança na solidez das grades, como ousam manter feras em cativeiros? Indaga!
Mas, objetam eles, - é preciso que a sociedade se vingue, que a sociedade puna. - Nem uma coisa nem outra. A vingança cabe ao indivíduo, a punição a Deus.
A sociedade está entre os dois.
O castigo está acima dela, a vingança abaixo. Nada tão grande nem tão pequeno lhe convém. Não deve ‘punir para vingar-se’; deve corrigir para melhorar.
Transformem assim a fórmula dos criminalistas, nós a entenderemos e a adotaremos.
Como VICTOR HUGO acreditamos que o edifício social do passado apoiava-se sobre três colunas: o padre, o rei, o carrasco.
Já faz tempo que uma voz disse: Os deuses estão indo embora! Depois outra voz levantou-se e gritou: Os reis estão indo embora! Já é hora de uma terceira voz levantar e dizer: O carrasco vai embora. Já dizia em 15 de março de 1832:
Assim, a velha sociedade terá ruído pedra após pedra; assim a providência terá completado o desmoranamento do passado.
Aqueles que sentiram falta dos deuses, pode-se dizer: Deus fica. Aqueles que sentem falta dos reis, pode-se dizer: A Pátria fica. Aqueles que lamentariam o carrasco, não há nada para se dizer.
E a ordem não desaparecerá junto com o carrasco, não pensem isso. A abóbada da sociedade futura não desmoronará por não possuir esta pedra angular hedionda. A civilização não é outra coisa que uma série de transformações sucessivas. O que verão agora? A transformação da penalidade. A doce lei de Cristo penetrará enfim o código e por ele irradiará a luz. O crime será visto como uma doença e esta doença terá seus médicos que substituirão os juízes, seus hospitais[57] que substituirão os cárceres. A liberdade e a saúde serão parecidas. Onde aplicava-se o ferro e o fogo, deitar-se-á o bálsamo e o óleo. Tratar-se-á pela caridade o mal que antes era tratado pela cólera. Será simples e sublime. A cruz substituindo a força. E só.
O Supremo Tribunal Federal prima em não aplicar o Decreto nº 678/92,[58] o que já ocorreu, em especial, quanto a aplicação do artigo 366 do Código de Processo Penal,[59] que determina a suspensão do processo criminal nos casos de réus ausentes, citados por edital.
Invocamos, novamente, o magistério de Membro da Comissão de reforma do Código de Processo Penal, René Ariel DOTTI, afirmando que os redatores do projeto de alteração do art. 366 do CPP aprovaram uma exposição de motivos que esclarece alguns fundamentos do designo de legge que viria a receber, na Câmara dos Deputados, o n.º 4.897, de 1995.
O primeiro deles enfatiza que a Convenção Americana de Direitos Humanos – Pacto de São José da Costa Rica - é integrante do ordenamento jurídico-constitucional brasileiro. (DOU, de 25.11.1994, Seç. I, p. 17860) [60]
Após quase vinte anos de atraso, por seu Vice-Presidente da República, no exercício do cargo de Presidente da República, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso VIII, da Constituição, e considerando que a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), adotada no âmbito da Convenção dos Estados Americanos, em São José da Costa Rica, em 22.11.1969, entrou em vigor internacionalmente em 18.07.78, na forma do segundo parágrafo de seu art. 74; considerando que o Governo brasileiro depositou a Carta de Adesão a essa Convenção em 25.09.1992; considerando que a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) entrou em vigor para o Brasil em 25.09.1992, de conformidade com o disposto no segundo parágrafo de seu artigo 74; decretou:
Art. 1º - A Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), celebrada em São José da Costa Rica, em 22.11.1969, apensa por cópia ao presente Decreto, deverá ser cumprida tâo inteiramente como nela contém.
Art. 2º - ...
Brasília, 06 de novembro de 1992; 171º da Independência e 104º da República. ITAMAR FRANCO
Anexo ao Decreto que promulga a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) - MRE extraímos o PREÂMBULO que afirma:
Os Estados americanos signatários da presente Convenção,
Reafirmando seu propósito de consolidar neste Continente, dentro do quadro das Instituições democráticas, um regime de liberdade pessoal e de justiça social, fundado no respeito dos direitos essenciais do homem,
Reconhecendo que os direitos essenciais do homem não derivam do fato de ser ele nacional de determinado Estado, mas sim do fato de ter como fundamento os atributos da pessoa humana, razão por que justificam uma proteção internacional, de natureza convencional, coadjuvante ou complementar da que oferece o direito interno dos Estados americanos.
Considerando que esses princípios foram consagrados na Carta da Organização dos Estados Americanos, na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e na Declaração Universal dos Direitos do Homem e que foram reafirmados e desenvolvidos em outros instrumentos internacionais, tanto de âmbito mundial como regional.
Reiterando que, de acordo com a Declaração Universal dos Direitos do Homem, só pode ser realizado o ideal do ser humano livre, isento do temor e da miséria, se forem criadas condições que permitam a cada pessoa gozar dos seus direitos econômicos, sociais e culturais, bem como dos seus direitos civis e políticos; e
Considerando que a Terceira Conferência Interamericana Extraordinária (Buenos Aires, 1967) aprovou a incorporação à própria Carta da Organização de normas mais amplas sobre direitos econômicos, sociais e educacionais e resolveu que uma convenção interamericana sobre direitos humanos determinasse a estrutura, competência e processo dos órgãos encarregados dessa matéria..."[61]
Portanto, em vigor para fins e efeitos de Direito interno o Pacto de São José da Costa Rica que implica em profundas e sensíveis alterações no Direito brasi-leiro, do que, aparentemente, não tinha se apercebido a doutrina e os tribunais.[62]
A Convenção Americana de Direitos Humanos proíbe expressamente o prosseguimento do processo-crime em casos de réus ausentes citados por edital desde que entrou em vigor no Brasil no ano de 1992; contudo, o Supremo Tribunal Federal somente passou a conceder a ordem em Habeas Corpus após estar em vigor o artigo 366 do Código de Processo Penal, no ano de 1996.
Durante quatro anos milhares de réus citados por edital e ausentes nos processos foram condenados; muitos deles ainda estão nas barras das prisões, contrariando disposição expressa da legislação em vigor.
Nilmário MIRANDA,[63] em artigo titulado Direitos Humanos, Soberania e Desafios da Nacionalidade para o Terceiro Milênio afirma que o motivador estudo sobre a relação axiológica entre a efetiva proteção aos direitos humanos e o Estatuto Constitucional de 1988 inicia-se precipuamente com a constatação topológica dos princípios fundamentais da República Federativa do Brasil elencados na abertura da Constituição, inseridos, desde logo, em seu artigo inaugural: "I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; e V - o pluralismo político".
Expressa-se, portanto, inequívoca intenção do legislador constituinte originário em conferir primazia aos direitos e às garantias fundamentais da pessoa humana no ordenamento normativo constitucional, em dissenso com o tradicionalismo das constituições brasileiras pretéritas, também incluída nesse contexto a Carta liberal de 1946, saudada por muitos por seu diferencial democrático.
Todas elas, indistintamente, inauguravam a redação de seus respectivos tex-tos constitucionais contendo normas e disposições pertinentes à organização do Estado brasileiro.[64]
Prossegue o enunciado constitucional, em seu artigo 4º, incluindo expressamente no rol dos princípios regentes das relações internacionais a serem estabelecidas pelo Estado brasileiro: a "prevalência dos direitos humanos" ( inciso II).[65]
Compreende-se nesse enunciado a inamovibilidade valorativa dos direitos humanos como postulado funcional e deliberativo das ações do governo brasileiro. Não por outro motivo, observa-se sua presença entre os princípios fundamentais da vigente carta política.[66]
Significa com isso dizer que o tópico relativo a inafastável permanência dos direitos humanos deverá, desde logo, manter-se por exigência constitucional como conteúdo programático a orientar a agenda diplomática pátria. Acresce-se de forma concomitante a adjuração pela "cooperação entre os povos para o progresso da humanidade" (inciso IX) na formulação da política externa brasileira.[67]
Outrossim, a efetiva inserção internacional do Brasil no contexto da globalização, requer, prioritariamente, o aprimoramento do Estado democrático mediante a interseção normativa entre nosso diploma constitucional e o direito internacional, na permanente manutenção das garantias e dos direitos fundamentais da pessoa humana.
O realce definitivo à integração do ordenamento jurídico brasileiro às normas internacionais observa-se pela redação do § 2º do artigo 5º da Constituição Federal:
Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.[68]
Assinala CAPPELLETTI como outra tendência evolutiva de nossa época: ‘l justicia suprancional o transnacional generada a partir del desarollo del constitucionalismo moderno.[69]’
Ora, acresce que, com a Constituição de 1988, o novo Estado de Direito Democrático quis assumir, plena e solenemente, as suas responsabilidades internacionais nesta matéria; do mesmo passo, contraiu a responsabilidade de formar todos aqueles que, juristas ou não, têm a ver, pela sua profissão, pública ou privada, com os direitos e as liberdades fundamentais do Homem, e de cuja ação ou omissão pode desde logo brotar, mesmo involuntariamente, uma qualquer ofensa ou violação de um qualquer desses direitos ou dessas liberdades garantidas.
Todavia, por motivos que não cumpre aqui analisar, as Universidades não acompanharam as novas responsabilidades assumidas desde a Constituição Cidadã, pelo poder político atual. Ao invés do que há muitos anos se passa em número elevado de Universidades da América do Norte e da Europa ocidental[70] - e, nos últimos anos, até, em certas Universidades da Europa Ocidental (dentre elas da Polônia) – não foi ainda criada, em muitas das nossas Faculdades, uma cadeira autônoma dedicada à proteção internacional dos Direitos do Homem.
A Declaração Universal – que inúmeros internacionalistas contemporâneos colocam num nível idêntico ao da própria Carta das Nações Unidas -, como aliás as demais declarações que aqui se publicam e até certas disposições de convenções, universais e regionais, são ‘testemunhos’ das chamadas fontes não convencionais dos direitos do homem.
A segunda guerra mundial importou uma mudança fundamental na consideração dos interesses principais e fundamentais do homem.
Toda sua preocupação, até então, havia perseguido o crescimento de seus direitos a partir do Estado que se lhe reconhece-se. Contudo, a conflagração trouxe consigo o desatino generalizado, o homem foi avassalado pela turbulência de prioridades impensadas, mesquinhas, irracionais. Perdeu individualidade, porque a destruição compreendia a todos. Enfim, o direito foi submetido, e um Estado, por si só, não podia reparar todo o dano causado.
O Pacto de Versalles de 1919, que criou a Sociedade das Nações, havia pensado seus interesses a partir da universalidade política. O homem não foi motivo central do acordo, dado que sua participação contava em função de sua qualidade de cidadão de um país determinado, donde resolvia suas conveniências e conflitos singulares.
Em mudança, a Carta que se explicita em 1945, criando a Organização das Nações Unidas (ONU), proclama os direitos do homem, consagrados essencialmente na Declaração Universal de 1948.
O mundo assistiu então a uma mudança de observação.
O primordial era o homem e seus direitos fundamentais, sem importar sua nacionalidade, credo, posição política ou econômica.
Desafortunamente, se entendeu que a Declaração dos Direitos do Homem e do cidadão tinha valor somente político-filosófico e moral, mas não jurídico.
Ela não foi considerada como um documento juridicamente vinculante, porque se encontra órfã de instituições, procedimentos e sanções dirigidos a garantir sua efetiva aplicação.[71]
Não obstante, esta foi a primeira demonstração que desbordou o marco de interesse nacional para elevar suas manifestações ao seio da internacionalidade.
Os direitos humanos, concebidos em função da tutela principal que merecem por sua condição e qualidade, se interpretaram em uma concepção unívoca.
Mas, a proteção processual, isto é, a outra face da declaração, não foi de igual tratamento; a aplicação desaparelhada e condicionada a mútuos reconhecimentos, tais como o princípio de reciprocidade no conceito de conciliação, lavaram a necessidade de acordar convênios de relações mútuas, a pactos internacionais que estabeleceriam uma pauta uniforme de proteção: o Convênio de Roma, cujo marco institucional é o Conselho da Europa; e o Pacto de São José da Costa Rica, são expressões eloqüentes deste desejo de proteger aos direitos humanos dotando-lhes de um corpo legal de apoio que privilegia suas disposições por sobre as leis de direito interno.
Na atualidade a idéia de universalizar a proteção dos direitos humanos, da passo a uma corrente um tanto mais restrita, que não perde sua dimensão internacional: a regionalização das instituições de defesa dos direitos fundamentais.
Por exemplo, a Resolução 2200 C, XXI, de 09.12.1996 ditada pela Assembléia Geral da ONU solicitou à Comissão das Nações Unidas sobre Direitos Humanos, que estudava, entre outras coisas, a questão de estabelecer instituições regionais apropriadas para desempenhar certas funções relativas a observação do pactos.[72]
De igual modo, entre 1976 e 1979 se instigou ‘a los Estados de áreas en las que todavia no existem delegaciones regionales que se ocupen de los derechos humanos, a considerar la adopcion de acuerdos com vistas a la creación en sus respectivas regiones de los mecanismos apropriados para promover y proteger los derechos humanos.[73]"
Desta maneira, conforme afirma OSVALDO A. GOZAÍNI, cujo trabalho embasa o presente, se podem distinguir três tipos de manifestações que internacionalizam a preservação dos direitos fundamentais a partir de uma situação própria, a saber:
O direito das comunidades, por exemplo a Comunidade Européia,[74] dentro da qual o respeito aos direitos básicos constitui uma parte integrante dos princípios legais gerais, cuja observância garante o Tribunal de Justiça; procurando a proteção desses direitos, em consonância com as tradições constitucionais comuns aos Estados membros, de maneira que se garantisse no contexto e nas aspirações da Comunidade.
A dimensão continental, que ocupa no caso a OEA, sobre tudo a partir de 1959 quando se cria a Comissão Interamericana sobre Direitos Humanos, e em especial desde que firmado o Pacto de São José da Costa Rica. Similar inspiração inspiração conta a Carta de Addis Abeba, que originou a Organização para a Unidade Africana; como a Liga dos Estados Arábes, fundada em 1968.
A dimensão internacional, pensada, V. gr.: na Corte Internacional de Justiça,[75] com sede em Haya, para solucionar as diferenças entre os Estados parte, com tanto que declarem reconhecer como obrigatória ipso facto e sem convênio especial, respeito a qualquer outro Estado que aceite a mesma obrigação, a jurisdição da Corte em todas as controvérsias de ordem jurídica que versem sobre: a), a interpretação de um Tratado; b), qualquer questão de direito internacional; c), a existência de todo fato que, si foi estabelecido, constituiria violação de uma obrigação internacional; d), a natureza e extensão da reparação que se há de fazer pelo quebramento de uma obrigação internacional (art. 36, inciso 2º, do Estatuto da CIJ).
Com efeito, as fontes do direito internacional dos direitos do homem não se esgotam nos tratados internacionais; constituem ainda suas fontes ‘o costume internacional como prova de uma prática geral aceita como constituindo o direito’ (cf. art. 38º, n.º I, al. b, do Estatuto do Tribunal Internacional de Justiça) e os chamados ‘princípios gerais de direito reconhecidos pelas nações civilizadas’ (cf. art. 38º, n.º I, al. c), e mais precisamente o seu parecer relativo às reservas à Convenção sobre a prevenção e a repressão do crime de genocídio (‘Recueil’, T. I. J., 1951, p. 23), trata-se de princípios que ‘obrigam os Estados, mesmo fora de qualquer laço convencional’.
O Estado e o mercado, sozinhos, parecem sem condições de enfrentar a crise econômica, social e ambiental em que estamos mergulhados, e de resolver os desafios colocados pelos novos tempos, pelo MERCOSUL.
A sociedade está sendo chamada cada vez mais para formular alternativas.
A mesma crise que enfraquece o Estado nacional tende a fortalecer as organizações da sociedade civil.
O que significa uma sociedade civil global?
A globalização implica a importância crescente do nível supraterritorial, ou aterritorial, das instâncias globais, e portanto, a possibilidade e necessidade de desenvolvimento de uma sociedade civil global, o que significa uma esfera que seja não-capitalista/não-Estado ou anticompetitiva/anti-hierárquica para os esforços democráticos.
Daí, as discussões sobre a reforma da ONU e de instâncias interestatais; sobre novos padrões, como o direito de comunicar-se; sobre o funcionamento dos movimentos sociais globais; sobre a inter-relação das organizações interestatais, as ONGs e os movimentos sociais globais, que vão além dos direitos eleitorais/territoriais.
A sociedade civil global não é um paraíso de liberdade desterritorializada, solidariedade, preocupação ecológica ou tolerância pluralista. Mas pode ser o espaço para civilizar e superar as estruturas/processos/ideologias capitalistas, estatísticas, tecnocráticas etc.
É antes um habitat que deve ser construído contínua e coletivamente, do que uma estrutura já existente e representada, ainda imperfeitamente, pelos movimen-tos sociais internacionais.
O desenvolvmento de uma sociedade civil global depende e, ao mesmo tempo, estimula a democratização, a desconcentração e a descentralização das organizações interestatais e instituições capitalistas globais. Uma sociedade civil global requer a noção de cidadania planetária, que já não pode ser simplesmente o universalista religioso, o cosmopolita liberal ou o internacionalista socialista.
A transição gradual do capitalismo industrial ao de informação, as múltiplas crises de crescimento e uma propagação da consciência ecológica impõem a necessidade de alternativas em busca de uma política eticamente informada e consciente.
A construção de uma esfera pública transnacional estará balizada por dois importantes princípios: o interesse público internacional e o patrimônio comum da humanidade.
Os direitos humanos e o interesse público internacional erguem limites à afirmação das soberanias, e, segundo Celso LAFER, se expressam "através da instauração do ponto de vista da humanidade como princípio englobante da comunidade mundial".
A noção de patrimônio comum da humanidade também reconhece interesses superiores da comunidade internacional em face do impasse entre interesses públicos e privados internacionais.
Os dois princípios acarretam uma revolução no Direito Internacional Público, tradicionalmente baseado no conceito de soberania, ao transformá-lo em Direito Geral da Humanidade ou, retomando a expressão romana, Direito das Gentes.[76]
A integração, frente a globalização das relações internacionais, pode ser interpretada como um instrumento de proteção ou de defesa ante dita tendência ou como mecanismo para aproveitar a mundialização.
Ela faz que os Estados integrem em blocos e que busquem neles as fórmulas para este fenômeno através do aperfeiçoamento institucional.
A eficácia institucional se converteu no eixo central da projeção do MERCO-SUL, por quanto não cabe aceitar a possibilidade de que se prossiga com êxito a constituição do Mercado Comum do Sul, sem órgãos eficazes, técnicos, capazes de dar respostas adequada e oportuna às multiplas variáveis que vão surgindo, capazes também de interpretar de um modo uniforme ao direito da integração e resolver os conflitos e controvérsias que puderem emergir de sua aplicação, não obstante, do ponto de vista institucional e político, o projeto integracionista do MERCOSUL se aproxima mais do modelo europeu da UE, isto é, tendencialmente comunitário, do que no norte-americano, exclusivamente livre-cambista. A despeito dessa vocação unificacionista no planos político e econômico, o MERCOSUL evitou o "salto supranacional", mantendo, tanto em sua primeira fase de transição como durante o processo em curso de acabamento de sua união aduaneira, um esquema essencialmente intergovernamental de tomada e implementação de decisões.[77]
A edificação do MERCOSUL hã que ser alicerçada à luz dos Tratados, Pactos e Convenções de Direitos Humanos, da adesão irrestrita a Corte Interamericana de Direitos Humanos, da possibilidade do cidadão postular perante a referida Corte contra as violações de direitos.
O salto para o Tribunal Transacional para julgar matérias decorrentes das relações do MERCOSUL é inexorável e mais seguro que a arbitragem.
O nosso entendimento é que a Convenção Americana sobre Direitos Humanos – este proibindo a prisão por dívida – e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos – este proibindo a prisão apenas por não poder alguém cumprir com um obrigação contratual – são, por disposição expressa da Constituição Federal em vigor, normas de Direito internacional às quais deve ocorrer a interpretação sistemática da norma constitucional, atendendo esta aos princípios daqueles. Portanto, revogada a possibilidade de prisão do depositário prevista na Constituição Federal. Ainda, se tanto, que se entenda que há paridade entre a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e as normas internas, estas, no que concernem a prisão do devedor, que porque depositário infiel, quer nos moldes da alienação fiduciária, cédula rural, sonegação fiscal, etc; posto que lex posterior derogat priori.
Se o Supremo Tribunal Federal entende que a Convenção Americana de Direitos Humanos sita em estamento inferior à Constituição Federal, não poderia, como tem feito, afirmar que há a prisão civil por dívida em nosso ordenamento jurídico, pois a matéria, então, é de competência do Superior Tribunal de Justiça.
"Deixarei contudo que o pouco que aprendi seja conhecido, de modo que alguém melhor do que eu possa adivinhar a verdade, provando e refutando meus erros com seu trabalho. Isso me dará prazer,pois terei sido um meio para trazer à luz a verdade."
Albrecht Dürer