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A profissionalização do apenado como forma de reabilitação

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Agenda 18/08/2014 às 00:12

3 A SITUAÇÃO DO APENADO NO BRASIL

Hodiernamente, o discurso da problemática dos presídio e da situação dos encarcerados no Brasil tem sido massificado, a mídia trás a todo instante situações envolvendo a criminalidade crescente, a violência, a situação precária no sistema penal brasileiro, esta realidade preocupante esta longe de acabar enquanto não houver políticas públicas eficazes no combate à fome, a miséria, a falta de escolas, educação, marginalização e discriminação, tudo isso, motivo mais que suficiente para o estímulo à criminalidade dos menos favorecidos, empurrados que são ao cometimento de delitos para suprir suas mais básicas necessidades.

 A situação de precariedade do preso e do presídio no Brasil é extremamente crítica, o modelo de prisão que hoje temos, não esta cumprindo o seu papel, está longe de ser um instrumento de reabilitação. É utopia pensar que os presídios brasileiros são capazes de recuperar pessoas tão problemáticas, que encontram-se marginalizadas, incapazes de responsabilizarem-se até por suas próprias vidas. A população carcerária brasileira está complemente desassistida, sem falar nas desumanidades do cárcere, os programas criados para esse fim alcança uma minoria e trás mais desvalorização e marginalização para aqueles não alcançados.

Todo esse belo discurso eloqüente e intelectualizado pra nada serve se ficar apenas no papel, como frase feita “o papel aceita a tudo”, é preciso que haja o mais rápido possível uma ação capaz de mudar esse quadro, sabemos que essa ação passa pelo trabalho, ou melhor pela profissionalização do indivíduo encarcerado e o único ente responsável por isso é tão somente o Estado, criando formas de transformar essa massa carcerária em mão de obra ativa, voltando-se em forma de fomento para sociedade e para o próprio ente estatal.

Como bem ensina o festejado Mirabete, a obtenção do trabalho pelo apenado é um dos mais importantes instrumentos para o reajustamento social do condenado, merecendo preocupação do legislador, dispensando cuidados especiais muito antes da promulgação da Constituição Federal de 1988, com a Lei n° 7.210 de 11 de julho de 1984, Lei de Execuções Penais[212].

3.1 FUNÇÃO SOCIAL DA LEGISLAÇÃO

A Carta Maior em diversos artigos já mencionados delimita atribuições de um Estado Democrático de Direito, não somente em se falando de cidadãos desfrutando de sua liberdade, mas nestes dispositivos são referendados todos os sujeitos, libertos ou encarcerados, não se referindo com especificidade concernente ao trabalho do preso, portanto não deixando de estarem inseridos nesta norma mandamental.

A teor da Carta Constitucional no art. 5°, caput que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, portanto, observados os limites jurídicos e constitucionais da pena e da medida de segurança, todos os direitos não atingidos pela sentença criminal permanecem a salvo.[213]

Luiz Regis Prado estabelece seu preceitos a cerca do supra mencionado:

De primeiro, cumpre destacar que o preso, durante o cumprimento da pena, conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral (art. 38, CP). Também a Lei de Execução Penal preceitua com clareza que “ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei” ( art. 3.°). Com efeito o próprio texto constitucional determina ser assegurado aos presos “o respeito à integridade física e moral” (art. 5.°, XLIX), já que é expressamente previsto que “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante” ( art. 5.°III, CF)[214]

Destarte, os direitos e garantias fundamentais consagrados na Constituição Federal de 1988, inclui não somente os direitos civis e políticos, mas inseridos estão o direitos sociais[215], contudo, não estão limitados apenas àqueles previstos pelo texto constitucional, mediante a abertura proporcionada pelo artigo 5° §2° da Constituição Federal de 1988[216], que permite a aplicação de diversos dispositivos consagrados em matéria de direitos e garantias fundamentais, originando-se de princípios, leis e tratados internacionais[217].

Ancorados a estes direitos sociais impõem-se a observância de uma série de deveres e obrigações legais que são inerentes a sua condição de condenado, habitante do sistema prisional, submetendo-se às normas de execução da pena, sendo seus deveres inseridos no repertório normal das obrigações do apenado, como um ônus natural de sua vida na comunidade carcerária.[218]

3.1.1 Legislação Aplicada à Atividade Laboral do Apenado       

Em todo o ordenamento jurídico pátrio vimos normas disciplinando a atividade laboral do apenado, fica impossível apontar qual delas poderíamos destacar como mais importante, contudo sua importância depende da necessidade a cada caso concreto. Relacionamos a seguir legislações pertinentes ao trabalho do apenado, rol este elaborado por Maxwel Caixeta de Oliveira e Gáudio Ribeiro de Paula, vista por eles como de uma importância suplementar[219].

Primeiramente descritas na parte geral do Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, porém a Parte Geral foi totalmente alterada pela Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984), em seus artigos, in verbis: a) art. 34 § 1.° O condenado fica sujeito ao trabalho no período diurno e isolamento durante o repouso noturno; b) art. 34 § 2.° O trabalho será em comum dentro do estabelecimento, nas conformidades das aptidões ou ocupações anteriores do condenado, desde que compatíveis com a execução da pena; c) art. 34 § 3.° O trabalho externo é admissível, no regime fechado, em serviços ou obras públicas; d) art. 35 § 1.° O condenado fica sujeito a trabalho em comum durante o período diurno, em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar; e) art 35 § 2.° O trabalho externo é admissível, bem como a freqüência a cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou superior; f) art.39 caput. O trabalho do preso será sempre remunerado, sendo-lhe garantido os benefícios da Previdência Social; g) art. 83 inciso III- Comprovado o comportamento satisfatório durante a execução da pena, bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e aptidão para prover à própria subsistência mediante trabalho honesto.[220]

No intuito de uma maior integração social do detento, garantindo, assim uma melhor assistência por parte do Estado, a Lei de Execução Penal inserida em nosso ordenamento jurídico pela Lei 7.210/ 84, onde estão notadamente descritos todos direitos e obrigação do preso, assegurando-lhe proteção.

Os dispositivos asseguradores do direito ao trabalho resguardados pela LEP são: art. 28, 29, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 39, inciso V, art. 41, inciso II, III, IV, V e VI e § único, art. 44 e 50, incisos IV e VI, art. 55 e 83 caput, art. 114, inciso I, § único e art. 126, 127, 128, 129, 130, 138 e 200.[221]

Pode-se perceber então, que o direito do apenado ao trabalho, buscando, dessa forma, uma profissionalização foi amplamente acolhido pela LEP, como bem enfatiza Mirabete:

Não descurou a lei, também da recomendação de se dar ao trabalho prisional um sentido profissionalizante, como aliás, preconizam as regras mínimas da ONU (n° 7.5). Embora se tendo em conta as limitadas possibilidades do trabalho penitenciário, o propósito de profissionalização deve ser acentuado no trabalho penitenciário quando o preso não tem capacidade profissional. A aquisição de um ofício ou profissão, fator decisivo à reincorporação social do preso, contribuirá para facilitar-lhe a estabilidade econômica assim que alcançar a liberdade.[222]

Somente através do trabalho que se consegue transformar um presidiário ocioso em um indivíduo reabilitado, por isso deve-se cada vez mais, buscar meios para a completa regeneração do apenado, procurando um completo aproveitamento de seu tempo livre no presídio, ensinando-lhe uma profissão, para que ao ser posto em liberdade possa modificar sua vida e daqueles que estão a sua volta.

3.2 A IMPORTÂNCIA NA FORMAÇÃO PROFISSIONAL DO APENADO COMO ALTERNATIVA DIGNA

Historicamente a concepção de trabalho penitenciário estava vinculado ao castigo de uma idéia de vingança no cumprimento da pena de prisão, depois encarado como uma fonte de produção para o Estado, o trabalho foi aproveitado, nesse sentido, como tendências utilitárias dos sistemas penais e penitenciários, a utilização das penas das galés e dos trabalhos forçados, como o transporte de bolas de ferro, pedras e areia, moinho de roda, voltas de manivela, etc. hoje, porém essas fases já estão totalmente superadas. Na moderna concepção penitenciária a pena, necessariamente deve ter uma finalidade reabilitadora, marcando um sentido pedagógico objetivando a educação e o trabalho.[223]

Evidentemente que esta finalidade reabilitadora não se faz presente na grande maioria das penitenciárias, não assegurando ao indivíduos encarcerado condição básicas para que obtenha um tratamento adequado às suas necessidades de educação e profissionalização, porquanto o apenado vive em um mundo paralelo, necessitando ser moldado e reabilitado pois “nenhuma forma de execução penal terá real proveito se não se levar em conta a capacidade laborativa do presidiário, e fazê-la exteriorizar dentro das limitações de cada presidiário”.[224]

Nesse mesmo sentido assevera Arminda Bergamini Miotto[225]:

Se o condenado, antes da condenação, já tinha o hábito do trabalho, depois de condenado, recolhido a estabelecimento penal, o trabalho que ele exercer manter-lhe-á aquele hábito, impedido que degenere; se não o tinha, o exercício regular do trabalho, conforme as suas aptidões contribuirá para ir gradativamente disciplinando-lhe a conduta, instalando-se na sua personalidade o hábito da atividade disciplinada. Se o condenado não trabalhar na prisão, ou pelo menos, não o fizer regularmente, ao recuperar a liberdade não será capaz de fazer o esforço, que às vezes é verdadeira luta, para obter um trabalho e manter-se nele; ainda que o serviço social lhe consiga trabalho, ele talvez não saiba ou não queira fazer o esforço para manter-se na atividade. Não será de admirar-se que, nessas condições, ele venha a reincidir no delito.[226]

Na opinião de Michel Foucault o trabalho na prisão não tinha o objetivo de profissionalizar o delinquente, mas de ensinar a virtude que o delinquente poderia adquirir mediante o trabalho, que o motivo do trabalho penal não visava o lucro nem a profissionalização, mas constituía uma relação de poder, de uma forma econômica sem sentido, com um plano que submete o indivíduo a um ajustamento em um formato de produção. Não existia a preocupação na reabilitação do delinquente, mas procurava enquadrá-los e utilizá-los como instrumento político e econômico.[227]

Mas também reconhece que havendo ordem o trabalho tem o poder de regenerar os condenados:

A ordem que deve reinar nas cadeias podem constituir fortemente para regenerar os condenados; os vícios da educação, o contágio dos maus exemplos, a ociosidade [...] originaram crimes. Pois bem, tentemos fechar todas essas fontes de corrupção; que seja praticadas regras nas casas de detenção; que, obrigados a um trabalho que terminarão gostando, quando dele recolherem o fruto, os condenados contrariam o hábito, o gosto e a necessidade da ocupação; que se dêem respectivamente o exemplo de uma vida laboriosa; ela logo se tornará uma vida pura; logo começarão a lamentar o passado, primeiro sinal avançado de amor pelo dever.[228]

A finalidade mais importante da pena de prisão não é de punição, mais sim de prevenção e de reabilitação, trazer transformação aos indivíduos, ensiná-los a um convívio harmônico na sociedade, sem sombra de dúvida isso é o que não acontece, frequentemente aquele que detém o poder de punir é o mesmo que traz degradação e desumanidade.

Ressocializar não é reeducar o condenado para que se comporte como deseja a classe detentora do poder e sim a efetiva reinserção social, a criação de mecanismos e condições para que o individuo retorne ao convívio social sem traumas ou seqüelas, para que possa viver uma vida normal. Uma vez que o Estado não propicie esta reinserção social, o resultado tem sido invariavelmente o retorno à criminalidade, ou seja, a reincidência criminal. [229]

O trabalho dentro do sistema prisional não pode ser visto tão somente como um meio de evitar a ociosidade, “sem ocupação, sem nada para distraí -lo, a espera e na incerteza do momento em que será libertado [o prisioneiro] passa longas horas ansiosas, trancado em pensamentos que se apresentam ao espírito de todos os culpados”[230], servindo para ocupar o tempo e os pensamentos e para não ficar maquinando futuras práticas delituosas, o trabalho é uma forma de obter condições de efetuar o pagamento da pena pecuniária, para promover a indenização da vítima ou seus sucessores decorrente do crime, o trabalho podendo seu um poderoso instrumento de valorização pessoal e de ampliação dos próprios horizontes profissionais.[231]

As aptidões do apenado certamente terão de ser respeitadas, como a idade, condição pessoal, por exemplo doentes ou portadores de deficiência física, a capacidade e as necessidades futuras, portanto obrigado ao trabalho somente os condenados definitivo. Para o preso em prisão temporária o trabalho é facultativo, e poderá ser exercido somente no interior do estabelecimento penal[232].

 O preso temporário deve atender aos interesses da correta administração da justiça, quer porque impede que o réu se subtraia à aplicação da lei, porque poderá, estando em liberdade, pôr em risco a ordem pública ou prejudicar a instrução criminal, porém sendo esta a razão do trabalho ser executado somente dentro do estabelecimento carcerário[233]

Já o trabalho externo do apenado em regime fechado só será admissível em serviço e obras públicas realizadas por órgãos da administração direta ou indireta, ou de entidades privadas desde que tomadas as cautelas contra fugas e em favor das disciplinas, devendo ser com o consentimento do preso, (art. 36 da LEP). As atividades para o trabalho externo do preso não estão inseridas no rol das atividades jurisdicionais, incluídas no art. 66 da Lei de Execução Penal[234]

As jurisprudências dos nossos tribunais afirmam essa assertiva:  

500285 – JCP.46 REGIME DE TRABALHO – LEI PENAL – TRATAMENTO – OBJETIVOS EDUCACIONAIS – O deferimento, por parte do Juiz, do requerimento de preso condenado, autorizando o trabalho externo e gratuito à comunidade, não ofende a lei penal e muito menos a de execução penal, visto que o trabalho é elemento do tratamento reeducativo e, como tal, atende às aspirações do condenado ou internado e às necessidades da sociedade, estando, outrossim, previsto, de maneira coercitiva, no art. 46 do CP. (TJMG – Ag. 95/1 – Rel. Des. Edelberto Santiago – J. 11.06.1991) (JM 115/245) (RJ 177/140)

O condenado que cumpre pena pela prática de crime hediondo também pode receber autorização para ser beneficiário do trabalho externo, pois não há nenhuma incompatibilidade entre as regras da Lei n° 8.072/90 e o trabalho externo. No julgamento do HC 33.414-0-DF, de 18 de maio de 2004, sendo relator o Ministro Hamilton Carvalhido, da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça assim se pronunciou: A Lei de Execução Penal, ele mesma, às expressas admite o trabalho externo para os presos em regime fechado, à falta, por óbvio de qualquer incompatibilidade, por isso que acolhe o benefício, 'desde que tomadas as cautelas contra a fuga em favor da disciplina'[235]

O Ministro Hamilton Carvalhido julga mais um Habeas Corpus com pedido de concessão de trabalho externo:    

Ementa HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL.

LATROCÍNIO.CRIMEHEDIONDO.CONCESSÃO. BENEFÍCIO. TRABALHO EXTERNO. NECESSIDADE. OBSERVÂNCIA. REQUISITOS OBJETIVOS E SUBJETIVOS. LEI DE EXECUÇÃO PENAL. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA.

  1. A lei de Execução Penal, ela mesma, às expressas, admite o trabalho externo para os presos em regime fechado, à falta, por óbvio, de qualquer incompatibilidade, por isso que acolhe o benefício, "desde que tomadas as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina.".
  2. E tal ausência de incompatibilidade há de persistir sendo afirmada ainda quando se trate de condenado por crime hediondo ou delito equiparado, eis que a Lei 8.072/90, no particular do regime de pena, apenas faz obrigatório que a reprimenda prisional seja cumprida integralmente em regime fechado, o que, como é sabido, não impede o livramento condicional e, tampouco, o trabalho externo.
  3. Ordem parcialmente concedida. (HC 29680 / DF HC 2003/0137863-5 Rel. Min. HAMILTON CARVALHIDO (1112) Órgão Julgador T6 - SEXTA TURMA Data 07/10/2003.DJ 09/12/2003 p. 350 RSTJ vol. 191 p. 523).

Quanto a jornada de trabalho deverá ser não inferior à 6 horas e não superior a 8 horas diárias, terão descanso nos domingos e feriados, os serviços de conservação e manutenção do estabelecimento penal, poderá ser atribuído horário especial de trabalho e também aos presos que desempenham as atividades de “faxina” na administração e em enfermarias. As atividades de artesanatos devem ser limitadas (art. 32 §1° da LEP), tanto quanto possível o exercício da atividade artesanal, portanto não sendo proibidas, e sim, limitadas as atividades dessa natureza ( RJTA crim SP, 35/88)[236]

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Destarte se, o condenado que estiver trabalhando internamente no sistema penitenciário, ou externamente em obras, sob a coordenação da administração direta do sistema penitenciário, não terá o mesmo regime de um trabalhador comum, portanto não terá os mesmos diretos, salvo aqueles que estiverem trabalhando externamente, com vínculo empregatício com entidade privada, merecerá todos os direitos assegurados pela Constituição Federal e Consolidação das Leis do Trabalho[237]   

Romeu Falconi assevera quanto ao valor da laborterapia como um dos meios mais eficazes para a reinserção social: “desde que dela não se faça uma forma vil de escravatura e violenta exploração do homem pelo homem, principalmente este homem enclausurado[238]” e continua afirmando que:

Há na aquisição do hábito ao trabalho uma gama imensa de novas espectativas e perspectivas para o preso, já que espaventa o temor do horripilante futuro incerto que, como regra geral, aguarda o egresso. De partida ele poderá propor uma nova forma de relacionamento com a sociedade, desde que esta não se mostre tão arredia. [239]

Certamente, que o trabalho prisional trás, inclusive o sustento para a família do detento, se não houver um trabalho a prisão acaba por fabricar indiretamente delinqüentes, ao fazer cair na miséria a família do condenado: “A mesma ordem que manda para a prisão o chefe da família reduz cada dia a mãe à penúria, os filhos ao abandono, a família inteira à vagabundagem e à mendicância. Sob esse ponto de vista o crime ameaça prolongar-se”[240].

Mirabete concorda com essa assertiva “foucaultdiana”, afirmando que a aquisição de uma profissão ou ofício é fator decisivo à reincorporação do apenado a vida em sociedade, que poderá contribuir, facilitando-lhe a a estabilidade econômica, quando estiver fora das grades[241].

É preparando o indivíduo pela profissionalização ( mão-de-obra qualificada) pela segurança econômica que vai adquirindo, pela ocupação integral de seu tempo em coisa útil e produtiva e, conseqüentemente,pelo nascer da razão de viver, pelo reconhecimento dos direitos e deveres, das responsabilidades e da dignidade humana que se obterá o ajustamento ou reajustamento desejado. Evidentemente, a profissionalização deve combinar-se com a atividade produtiva e o processo de assistência social, devendo o condenado dividir seu tempo, conforme determinarem as leis complementares e os regulamentos, entre o aprendizado e o trabalho[242].

A existência do ser humano sempre esteve entrelaçada na sua profissão ou em algumas de suas atividades, mesmo em se tratando do homem criminoso, envolvendo toda sua vida nos atos criminosos, tirando dessas suas atividades delituosas seu sustento e de sua família, em alguns casos adquirem grande patrimônio, tornam-se grande empresários e passam a desfrutar de status social, inclusive com sua família, para muitos constitui essa atividade seu trabalho.

    Depois que esse indivíduo se encontra encarcerado deixando toda essa atividade para trás, poderá dar novo rumo à sua vida se encontrar na prisão uma estrutura que lhe ensine uma profissão.

    Como nos mostra Sidio Rosa de Mesquita Júnior:

O trabalho é um direito e uma obrigação do condenado, sendo que os preceitos constantes na LEP, bem como os inseridos no Código Penal, tem vasto apoio doutrinário. Historicamente, a preocupação com o trabalho sempre esteve presente em nosso ordenamento jurídico, o que se pode verificar com a inserção de vários artigos regulamentando o trabalho penitenciário. [243]               

    Em consonância com as Regras Mínimas da ONU[244], nas regras de números 71.4, 71.5, 72.2, determinam que o trabalho do preso será sempre como objeto de formação profissional do apenado, dessa forma contribuindo para aumentar a qualificação e a capacitação do preso para ganhar a vida de maneira honesta, preparando-o para a liberdade, sendo esta orientação que deve prevalecer e não, o Estado e o preso, estarem interessados nos benefícios pecuniários, não havendo restrições quanto o aproveitamento, por parte do Estado da mão de obra do condenado, desde que isso não desvirtue as funções e finalidades éticas do trabalho do apenado, funções e finalidades estas, que só se realizam se o trabalho estiver inserido no regime de execução da pena como um coadjuvante, éticas e utilitárias da sanção penal, devendo estas funções e finalidades estarem ressaltadas a de dar ou manter a capacitação profissional do preso[245]

    O trabalho dentro dos muros do cárcere tem recebido severas críticas; que o trabalho do preso não conseguirá resgatá-lo de seu meio criminoso; ou que é uma perda de tempo e dinheiro aparelhando uma estrutura prisional para fornecer trabalho aos detentos; enquanto o desemprego fora das grades aumenta cada dia. Realmente é preocupante o aumento do desemprego, mas não podemos confundir entre trabalho do preso e aumento do desemprego. O preso que trabalha não esta “tirando” a vaga de ninguém do mercado de trabalho, ele esta inserido em outro contexto, que tem como finalidade sua inserção no meio social, visando o dever social e o resgate da dignidade do apenado com um fim educativo e produtivo e, o que é pior é não qualificá-lo para o mercado de trabalho, pois dessa forma, desesperado e inútil, mais facilmente será atraído a voltar à delinqüir.[246]

Diante da opinião dos mais diversos doutrinadores, percebe-se a urgência da implantação de uma política de profissionalização do apenado, não somente para dar-lhe um trabalho e tira-lo do ócio ou para os efeitos do instituto da remição, mas para formar no indivíduo uma identidade.

3.2.1 A Remição pelo Trabalho

3.2.1.1 Breve Histórico da Remição

O instituto da remição teve origem no Código Penal Espanhol de 1822 com “la redención de penas por el trabajo”, e posteriormente empregado para diminuição de pena nas Ordenações Gerais dos Presídios da Espanha em 1834 e 1928. [247]

No Direito Penal Militar da Guerra Civil Espanhola[248], vem o instituto da remição, aplicado aos prisioneiros vencidos da guerra civil e prisioneiros por crimes especiais e por crimes políticos, visando abreviar o tempo de carcere pelo trabalho, tendo em vista o excesso de presos durante a guerra civil, instituído pelo Decreto n° 281 de 28 de maio de 1937, em 14 de março de 1937 passou a abranger também os condenados por crimes comuns. [249]

Pela ocasião da reforma do Código Penal Espanhol em 1944, o instituto foi incorporado, constando do art. 100 daquele diploma legal “e hoje com o Código Penal Espanhol de 1995, foi definitivamente suprimido o instituto da remição da pena pelo trabalho, na tentativa de aproximar a pena real da pena nominal”. [250]

O instituto da remição aparece pela primeira vez incorporado ao nosso ordenamento jurídico quando da reforma do Código Penal em 1984, através da lei 7.210 de 11 de julho de 1984, uma nova proposta ao sistema prisional, com a finalidade de abreviar, através do trabalho parte do tempo de condenação, podendo o condenado que cumpre pena em regime fechado ou semi aberto, remir através do trabalho uma parte do tempo da condenação. [251]

3.2.1.2 Definição e Procedimento do Instituto da Remição

Na acepção etimológica do vocábulo remição, provém do latim “redimire” que significa tirar do cativeiro, do poder alheio, resgatar, reparar-se de uma falta, reabilitar-se. A grafia remissão do latim “remissio” denota o sentido de perdão, clemência ou renúncia, o que não é o caso, porque o condenado não está recebendo perdão de parte de sua pena por parte do Estado, em contrapartida na ortografia oficial no sentido de resgate é remição de remir, não remissão de remitir.[252]

Para Cezar Roberto Bitencourt “remir significa resgatar, abater, descontar pelo trabalho realizado dentro do sistema prisional, parte do tempo da pena à cumprir”.[253]

Pode-se definir a remição nos termos da lei brasileira, como um direito do condenado em reduzir pelo trabalho prisional o tempo de duração da pena privativa de liberdade cumprida em regime fachado ou semi aberto. Trata-se de um meio de abreviar ou extinguir parte da pena. Oferece-se ao preso um estímulo para corrigir-se, abreviando o tempo de cumprimento da sanção para que possa passar ao regime de liberdade condicional ou à liberdade definitiva.[254]

    Como se depreende no art. 126 da Lei de Execuções Penais, o instituto da remição é computado da seguinte forma: a cada três (3) dias trabalhados será remido um (1) dia da condenação. In verbis:

Art. 126 - O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semi-aberto poderá remir, pelo trabalho, parte do tempo de execução da pena.

§ 1º - A contagem do tempo para o fim deste artigo será feita à razão de 1 (um) dia de pena por 3 (três) de trabalho.

§ 2º - O preso impossibilitado de prosseguir no trabalho, por acidente, continuará a beneficiar-se com a remição.

§ 3º A remição será declarada pelo juiz da execução, ouvido o Ministério Público.[255]

    Contemplando-se várias opiniões a respeito da interpretação do art. 126 da Lei de Execução de Penal, percebe-se que a grande maioria dos doutrinadores pesquisados pactuam com a opinião de Mirabete, lesionando que “pelo desempenho da atividade laborativa o preso resgata uma parte da sanção, diminuindo o tempo de sua duração, não há tecnicamente, um abatimento no total da pena; o tempo remido é contado como de execução da pena privativa de liberdade”, havendo decisões calculando o tempo de pena remida como pena efetivamente cumprida, e não simplesmente abatido do total da sanção aplicada [256]

    Não há qualquer razão ou fundamento jurídico plausível que autorize sustentar que os dias remidos não devem ser somados aos dias de pena cumprida, e tanto isso é verdadeiro que o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, em julho de 2005, por seu E. Conselheiro César de Oliveira Barros Leal, emitiu parecer no processo nº 08001.008223/2004-59, em que figura como interessado o DEPEN – Departamento Penitenciário Nacional, enfatizando o acerto de tal interpretação e propondo a alteração do art. 128 da LEP visando evitar, definitivamente, interpretações que levem a entendimento diverso[257].            

    Vale destacar o mesmo entendimento de nossos Tribunais, já consolidado no Superior Tribunal de Justiça:

A remição pelos dias trabalhados, consoante dispõe o art. 126 da LEP, deve ser considerado como de pena efetivamente cumprida (RESp 303.466-RS, DJU 25.11.2002, re. Min. Jorge Scartezzini. p. 255. 5ª Turma). A remição pelo trabalho, [...] deve ser compreendida na mesma linha conceitual da detração, computando-se o tempo remido como de efetiva execução da pena restritiva da liberdade (RESp.188.219-RS,DJU27.08.2001).[258]

    Luiz Regis Prado complementa esse entendimento afirmando que o tempo remido será computado também para a concessão de livramento condicional e indulto, consoante art. 128 da Lei de Execução Penal, e não apenas para fins de abreviar o cumprimento da pena privativa de liberdade, incorrendo no delito de falsidade ideológica aquele que falsamente comprovar prestação de serviço, instruindo pedido de remição, conforme art.130 da Lei de Execução Penal.[259]

    No Superior Tribunal de Justiça, a 6ª Turma decidiu que o tempo de remição deve ser computado para a eventual concessão do livramento condicional, do indulto e também da progressão de regime prisional (REsp 62.462/RS, DJU 17.06.96).[260]

    O mesmo tribunal prima pela recuperação da dignidade, reeducação e reintegração do condenado:

O art. 126 da Lei de Execuções Penais, que dispõe sobre a remissão (sic), pelo trabalho, de parte do tempo de execução da pena, deve ser interpretado em consonância com a concepção teleológica do instituto, que visa à recuperação da dignidade, à reeducação e à reintegração do condenado. Sendo assim, a remissão (sic) pelos dias trabalhados deve ser considerada como efetiva execução da pena restritiva de liberdade (STJ, REsp 445.460/RS, 6ª T., rel. Min. Paulo Medina, j. 26-6-2003, DJ, 25-8-2003 p. 378).[261]

    A remição deverá avançar passo a passo ao logo da execução da pena, de maneira que o preso deverá assinar uma espécie de ponto, ou ficha laborativa, devendo ser remetida à Vara de Execuções Penais ou orgão judiciário competente para homologação[262]. Depois de homologada a ficha é juntada ao processo, que remetida ao setor de cálculo, será debitados os dias remidos do total da pena efetivamente comprida, esse cálculo abrangerá também, como já mencionado supra, quando da concessão de livramento condicional e indulto.

    A administração do presídio encaminhará ao juiz da execução a cópia de registro de todos os presidiários que estão efetivamente trabalhando, com os dias trabalhados e entregue a cada um dos condenados a relação de seus dias remidos. Deverão ser comprovadas jornada de no mínimo 6 horas e no máximo 8 horas para obter o deferimento do juiz de execução. A remição será declarada pelo juiz da execução e ouvido o Ministério Público.[263]

    A Lei de Execução Penal previu que o trabalho do preso deve ser remunerado, no art. 29, estipula que: “o trabalho do preso deve ser remunerado, mediante prévia tabela, não podendo ser inferior a três quartos do salário mínimo”. Essa remuneração servirá para atender a indenização pelos danos causados pelo crime; assistência à família; pequenas despesas pessoais; ressarcimento ao Estado e colocado em caderneta de poupança para o preso.[264]

    O art. 41 da Lei supra citada: “Constituem direitos do preso”, II - “atribuição de trabalho e sua remuneração”.[265]

    O Código Penal, no art. 39 também prevê a remuneração do trabalho do preso: “o trabalho do preso será sempre remunerado, sendo-lhe garantido os benefícios da Previdência Social”.[266]

    A Declaração Universal dos Diretos Humanos ( 1948), também é frequentemente esquecida em se tratando dessa matéria quando preconiza em seu “art. 23,inciso II-Todo homem, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho”, nessa esteira protegendo também a remuneração pela atividade laboral do preso[267].

    Existe regras específicas determinando quais os condenados se enquadram como beneficiários do instituto da remição pelo trabalho.

A remição é um direito privativo dos condenados que estão cumprindo a pena em regime fechado ou semi aberto, não se aplicando, assim, ao que se encontra em prisão alberque, já que a este incube submeter-se aos papéis sociais e às expectativa derivadas do regime, que lhe concede, objetivamente, a liberdade do trabalho contratual. Pela mesma razão, aliás, não se concede remição ao liberado condicional. Também não tem direito à remição o submetido a pena de prestação de serviço à comunidade, pois o trabalho, nessa espécie de sanção, constitui, essencialmente o cumprimento da pena. [268]

    Também “o condenado por crime político não esta obrigado ao trabalho(art. 200, LEP), nem o preso provisório(art 31, parágrafo único, da LEP), mas, desejando trabalhar, terão os mesmos direitos que os demais presos”, é o que ensina Cezar Roberto Bitencourt.[269]

    Mirabete leciona a respeito daqueles condenados que não podem ser beneficiados pela remição:

Não tem direito à remição, porém, aqueles que se encontram submetidos à medida de segurança da internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, ainda que essa internação possa ser objeto de detração penal. Ainda que se trate de superveniência de doença mental durante a execução da pena, o condenado não estará cumprindo as regras do regime fechado ou semi aberto, pois aquele que se encontra recolhido em hospital de Custódia e Tratamento, ou estabelecimento similar, não esta obrigado a trabalhar e eventual realização de tarefas tem finalidade meramente terapêutica, diversa da finalidade da remição. [270]

    Desta forma, após analise do instituto da remição vimos claramente que o trabalho executado pelo condenado pode ser base de sustentação para sua reabilitação e retorno à sociedade, sendo esta uma das funções da pena de prisão a de reeducação, como estabelece o art. 28 da Lei de Execução Penal “o trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva”, mediante isso, o trabalho executado para a remição poderá ser um forte aliado para a reabilitação do apenado, nesse sentido podendo ser um instrumento de valorização pessoal e de ampliação dos próprios horizontes profissionais.[271]

    Desde a incorporação em nosso ordenamento jurídico da Lei de Execução Penal, a remição tem sido um importante meio de humanização, mesmo com tão poucos presos sendo beneficiados, o trabalho mostra-se um novo ânimo para reabilitação do recluso, necessária a estimulação para atividade laboral de acordo com o direito e a justiça, gerando a sensação de que o trabalho realmente compensa.[272]

3.2.1.3 Estrutura Oferecida nos Presídios com Objetivo da Remição

Quando o instituto do remição foi criado em 1822, pelo Código Penal Espanhol, sua primordial função era de abreviar o tempo de prisão pelo trabalho dos prisioneiros da Guerra Civil Espanhola, por causa do grande número de condenados, visando a diminuição da pena.

No ordenamento jurídico brasileiro o instituto da remição surgiu através da Lei de Execução Penal, também com essa mesma finalidade, a de “reduzir pelo trabalho prisional o tempo de duração da pena privativa de liberdade”, “oferecendo ao preso um estímulo para corrigir-se abreviando o tempo de cumprimento da sanção para que possa passar ao regime de liberdade condicional ou à liberdade definitiva[273]”.

Hoje o trabalho dentro do cárcere como objeto do instituto da remição, tem sido visto de forma diferenciada, não somente para abreviar o tempo de prisão do apenado, com uma função mais humanística, educativa e produtiva, servindo de um aliado para sua completa reabilitação, contribuindo para que este possa estar aprendendo uma profissão ou ofício, visando sua readaptação ao convívio social.

Alexandre Painhas em sua dissertação assevera que:

A Lei de Execução Penal oferece critérios bem definidos quanto a proteção da exploração do trabalho carcerário, prevenindo que o puro desejo de lucro dos empresários venham tirar proveito da “mão de obra barata”, consoante o art. 34 da Lei de Execução Penal que; “o trabalho poderá ser gerenciado por empresa pública, com autonomia administrativa, e terá por objeto a formação profissional do condenado”, cabendo, portanto o trabalho ser supervisionado pela entidade responsável, porém também entende que o Estado não tem nenhuma capacidade de estruturar os presídios brasileiros para uma completa profissionalização dos presos que estão sob sua custódia, se não houver a participação dos empresários, ainda que visem lucro, devendo este trabalho ser vigiado pelo Estado, que, dessa forma atende sua missão, a de capacitar profissionalmente o preso[274]

Certamente que existem alguns benefícios, mas também alguns inconvenientes, é que os arranjos institucionais favorecem o trabalho do detento à expensas da mão-de-obra do cidadão não preso, em virtude das vantagens que o trabalho dentro de uma prisão teria frente ao mercado. Os presos não são empregados no regime da Consolidação das Leis Trabalhistas. Com isso, as empresas economizam até 60% dos custos de mão-de-obra ao não pagar benefícios, como férias, 13º salário e Fundo de Garantia. A empresa também poupa na instalação da unidade de produção, pois usa a infra-estrutura do presídio, como galpões, água e energia elétrica, também os presos faltam menos ao trabalho do que um operário comum[275]

O trabalho aumenta a chance de ressocialização do preso. É uma forma de prevenir a reincidência quando ele ganha liberdade, 10 % do salário dos presos alimenta um fundo que paga o trabalho de outros detentos na manutenção das unidades prisionais. O trabalho ocupa os condenados, diminuindo as tensões na cadeia e os motivos para rebeliões ou fugas. Os presos adquirem noções de hierarquia, cumprimento de horários e metas de produção[276].

Embora a remuneração não seja o fulcro maior do trabalho do preso, a mesma somente pode ser realizada de acordo com a Lei de Execuções Penais, sendo a prática comum o recebimento de até três quartos de um salário-mínimo, o que pode configurar, para muitos, numa exploração de mão-de-obra[277].

Entretanto, a maioria dos trabalhos que são oferecido nos presídios brasileiros são manuais e invariavelmente monótonos e de repetição, não oferecem nenhum atrativo e não denota nenhuma profissionalização, como na teoria propõe o sistema penitenciário e a Lei de Execução Penal, o que não permite ao apenado disputar melhores colocações no mercado de trabalho, ao reencontrar a liberdade, dessa forma servindo somente para passar o tempo e para efeito da remição, não trazendo o benefício de um aprendizado prático ao detento, sendo um trabalho “meramente simbólico” [278].

Como pode-se observar, existem prós e contras sobre o trabalho do preso, sendo este um dos fatores motivacionais desta pesquisa. Independente dessa controvérsia, e com o propósito de oferecer ao condenado os meios necessários à sua reintegração social[279]

3.2.2 Remição pelo Estudo por Analogia In Bonam Partem

Existe uma grande divergência doutrinária a respeito da remição pelo estudo por analogia in bonam partem. O art. 126 da Lei de Execução Penal deixou uma lacuna quando não previu a remição pelo estudo.

A analogia pode ser utilizada para encontrar o enquadramento jurídico necessário para uma determinada situação, quando o legislador deixou de observar um detalhe na previsão legal, ficando esta deficiente na sua aplicação pratica. A doutrina e a jurisprudência são uníssonas quando admitem a analogia se for utilizada para beneficiar o acusado, réu ou apenado, ou seja, somente se apresenta como analogia in bonam partem[280].

Quanto a utilização da analogia in bonam partem na execução da pena, certo é que está se valendo de um dispositivo já existente, no qual possibilita a remição pelo trabalho, pode-se usar tratamento idêntico para os apenados que estudam ou desenvolvem qualquer atividade educacional durante o cumprimento da pena, sendo este o posicionamento mais moderno da doutrina[281] e dos Tribunais[282] estando condizentes com a realidade atual[283].            

No entanto após proposta para a alteração do instituto da remição cujo proponente foi o conselheiro Maurício Kuehne, juntamente com a comissão formada para a reforma da Lei de Execução Penal, no sentido da permissão da remição pelo estudo, dispondo do aproveitamento de forma cumulada pelo trabalho, ou freqüência e aproveitamento de curso regular profissionalizante, e de qualquer nível devidamente autorizado, parte do tempo de execução da pena[284].      

E diante das múltiplas opiniões e correntes favoráveis e desfavoráveis por parte de nossos doutrinadores e de tantas controvérsias dos nossos tribunais, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 341, a fim de suplantar as dúvidas e hesitações a cerca da remição pelo estudo que reza: “A freqüência a curso de ensino formal é causa de remição de parte do tempo de execução de pena sob regime fechado ou semi-aberto”.[285]

O estudo é uma garantia constitucional fundamental da pessoa estando previsto no art. 6°caput a Constituição da República, qual, através de sua redação dada pela Emenda Constitucional nº 26, de 2000, estabelece: São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.[286]

Portanto, deve-se entender que o estudo é uma forma de trabalho intelectual, dessa forma os apenados que se empenham nos estudos, distanciando-se do ambiente pernicioso na prisão estão buscando sua melhor qualificação para sua reinserção na sociedade, provavelmente terão melhores possibilidades em obter ocupação honesta, assim após a Súmula 341, podem ter o efeito da remição no período que destinou para a sua instrução[287]

3.2.3 Remição Ficta

O Estado tem obrigação de proporcionar ao condenado a oportunidade de trabalho no presídio, por ser este um direito do preso valorizado como direito social, preconizado no art. 6° da Constituição Federal de 1988. Se o preso não tem a sua disposição uma atividade que lhe dê a oportunidade de remir sua pena pelo trabalho, por omissão do Estado ou por condições materiais do estabelecimento penitenciário, não há como negar o direito à remição pelos dias que o condenado deveria ter desempenhado seu labor[288].

 A esta modalidade de remição chama-se remição ficta, quando ao preso compete desempenhar uma atividade laborativa descrita na Lei de Execução Penal que manifestando em seu texto, mas esquecendo-se da realidade dos presídios brasileiros, segundo o qual o Estado concede o direito remicional e não tem condições de oferecer trabalho a todos, neste caso deve-se conceder o direito à remição aos presos que não trabalham?[289]

Segundo Mirabete mediante alguns argumentos, não é possível a remição:

  1. a concessão do benefício igualaria o preso que trabalha e o que não trabalha;
  2. a remição só é possível diante do registro mensal dos dias de trabalho de cada condenado;
  3. a falta ao trabalho já é considerada como falta grave. Mas assevera que o direito do preso é a “igualdade de tratamento, salvo quando a exigência da individualização da pena”.(art.41, XII). Que tratamento igualitário somente existe quando se concede trabalho a todos os presos ou, se isto não ocorrer, se concede remição a todos.[290]

Luiz Regis Prado tem uma opinião contrária: “Uma vez que a própria lei exige, claramente, para o reconhecimento do direito à remição, o efetivo exercício de atividade laborativa pelo sentenciado, não bastando eventual predisposição pessoal para fazê-lo”[291].

Também na Mesma opinião Cezar Roberto Bitencourt: “Quando a lei fala que o trabalho é direito do condenado está estabelecendo princípios programáticos, como faz a Constituição quando declara que todos têm direito ao trabalho, educação e saúde”[292]

No entanto, se foi concedido ao preso o benefício da remição, e não foi atribuído um trabalho, não implica a obrigatoriedade por parte da Estado em remunerá-lo, assim, se não há a prestação do serviço, não poderá haver a contraprestação que é o pagamento pelo trabalho realizado, violando dessa forma o tratamento de igualdade[293].

3.3 A ASSISTÊNCIA AO EGRESSO E AO PREEGRESSO

Conforme o magistério de Mirabete é considerado egresso o liberado definitivamente pelo prazo de um ano, a contar da saída do estabelecimento penal, contando com a assistência pós penitenciária durante este prazo de um ano a partir da data que foi posto em liberdade, também é considerado egresso o liberado condicional durante o período de prova, que poderá ser de inferior, superior ou igual a um ano, durante este tempo gozará da assistência pós penitenciária, dependendo das condições de cada beneficiários. Em ambos os casos, passando este prazo, que não poderá ser prorrogado, o beneficiário perderá a qualificação jurídica de egresso. [294]

Renato Marcão assevera que o objetivo da assistência é de prevenção para futuros delitos e de orientação ao retorno à convivência em sociedade, apoiando o egresso para reintegrá-lo na vida em liberdade e na concessão, se houver necessidade do fornecimento de alimentação e alojamento em estabelecimento adequado, por dois meses, prorrogável uma única vez, devendo ser comprovado mediante solicitação idônea de esforço na obtenção de emprego, existido uma valorização ao mérito do egresso que busca através do trabalho, meios para sua própria reinserção na sociedade[295]

Na Regra Mínima da ONU[296] de número 64, prevê um tratamento mais humano e adequado ao ser ele posto em liberdade.

O dever da sociedade para o condenado não termina ao ser ele posto em liberdade. Portanto, seria preciso poder contar com órgãos oficiais ou privados capazes de levar ao condenado que recupera a liberdade uma eficaz ajuda pós penitenciária, que vise diminuir os preconceitos contra ele e contribua para a sua reinserção na comunidade[297]

A assistência adequada ao egresso para que possa superar o desafio da reinserção no meio social e se readaptar a uma nova realidade, certamente não é uma tarefa das mais fáceis, justamente porque, dependendo do tipo de delito praticado, o egresso não poderá voltar a viver no ambiente de antes da condenação, portanto, se assim proceder, estará tentado a cometer os mesmos delitos e não servirá para nada todo o esforço da reabilitação intra muros, se após colocado em liberdade, não for ele assistido por um programa que lhe encaminhe a uma nova vida.

Apesar de toda essa dificuldade encontrada pelo egresso, a maior delas diz respeito à discriminação por parte da sociedade, sua ansiosa busca pela dignidade perdida durante os anos de reclusão através de um trabalho que dê para si e para seus dependentes, não somente condições de sobrevivência, mas a importância de uma formação profissional, para sua realização pessoal, é na

maioria das vezes dolorosa, obstinada e decepcionante que acaba em reincidência.[298]         

César Roberto Bitencourt afirma que a reincidência é vista como um fator determinante e considerada como um ou o mais importante indicador da falência da prisão e pode ser um resultado atribuível aos acontecimentos, como o fato do egresso não encontrar trabalho ou por não ser aceito pelos demais membros, não delinqüentes, da comunidade[299].

A aquisição da auto estima passa pela satisfação de se sentir aceito, esta é a ponte que leva a dignidade, ninguém poderá se sentir digno se não se sentir bem consigo e com o meio social onde vive, sobretudo, se a assistência por parte do poder público for deficiente, se houver demora no atendimento ao egresso, se essa dificuldade tiver como causa a pouca instrução ou falta de qualificação para a execução de algum trabalho pela falta de um atendimento na instituição carcerária, provavelmente o próximo passo será a reincidência.

A população pré-egressa é composta por uma população de jovens e adultos em situação de espera entre escolaridade e trabalho, e após o cumprimento da pena, esta população carrega consigo também esta realidade, com uma agravante, uma dupla exclusão. Dessa análise do antes e depois da passagem pelo sistema penitenciário verifica-se que o foco que se dá aos delitos e aos seus agentes é errôneo, uma vez que a mera punibilidade sem um instrumento de recuperação e abertura de novas possibilidades é totalmente falho, além de não cumprir com a função primordial do direito, que não é a mera punibilidade.

Dentro do sistema carcerário o que temos é um ambiente de degradação marcado pela superlotação, pela ociosidade, e pela violência. O egresso do sistema prisional, na retomada de sua liberdade e do convívio na sociedade, tem como dificuldades além do estigma do cárcere, a falta de qualificação profissional e o baixo nível de escolaridade, o que torna a busca por um trabalho uma grande luta, tornando-se muitas vezes um fator de desesperança e angústia que acaba fazendo acreditar que não lhe resta outra opção que não o retorno à criminalidade. [300]

A prestação de assistência ao liberado, deve ser essencialmente complementar daquele que já foi iniciada e desenvolvida na instituição penitenciária, se por ventura já teve, o ideal é que já tenha tido algum tipo de tratamento de reabilitação, pois qualquer procedimento inadequado poderá anular o resultado das tarefas realizadas no estabelecimento com a finalidade de reeducar o condenado na sua reinserção social. “Necessária, então essa assistência ao egresso visando continuar ou promover seu reajustamento consigo mesmo ou com os outros, numa adaptação racional a seu meio sócio cultural”[301]

O art. 11 da Lei de Execução Penal elenca as áreas de assistência ao egresso: material; saúde; jurídica; educacional; social e religiosa. Mirabete relaciona a assistência basicamente em três espécies mais importantes: primeiro a moral ou religiosa, com aspirações reformadoras, tem como base nas leituras bíblicas e meditação, a educação moral conceituada em sentido amplo pode ser exercido como parte da assistência a todos os condenados, a fim de fortalecer o sentido ético de sua formação. A educação intelectual vem em segundo, proporcionando instrução elementar necessária, e por último e a mais fundamental, a assistência social que tem como base que o egresso não deve ser marginalizado socialmente, portanto deve continuar a fazer parte da sociedade, dessa forma fortificando os laços com sua família.[302]

O número 59 das Regras Mínimas da ONU estabelece que:

para um bom aproveitamento dispensado ao egresso ou pré egresso, o regime penitenciário deve empregar um tratamento individualizado conforme suas necessidades, todos os meios curativos, educativos, morais, espirituais e de outras naturezas, que que dispõem devem ser empregadas[303].

A assistência pós penitenciária deve ser oferecida e não imposta se compreende a assistência material, moral, social ou jurídica, devendo abranger todos os meios para evitar a reincidência sem envolver o egresso com o estigma de sua condição de ex sentenciado, devendo ser realizados gestões tendentes a fazer o processo de reintegração social eficaz evitando os problemas de desorientação e desamparo que a crise da libertação pode provocar no egresso[304]

3.3.1 Os Patronatos

Os Patronatos são instituições criadas com o objetivo de atender o egresso e o pré egresso prestando assistência aos albergados, desde que beneficiados com saída temporária para trabalho externo, colaborar na fiscalização do cumprimento das condições do livramento condicional ou suspensão condicional da pena, ou estejam cumprindo a pena no regime aberto e que podem sair durante o dia, permanecendo na casa do albergado durante a noite, tem também a atribuição de orientar quanto às penas restritivas de direito, fiscalizar o cumprimento das penas de prestação de serviço à comunidade acompanhar aqueles que prestam serviço à comunidade ou cumprem limitação de final de semana, atuando em todo o acompanhamento da execução penal, conforme estabelecem os artigos 78 e 79 da Lei n. 7.210/84, Lei de Execução Penal (LEP) [305].

É por intermédio dos Patronatos que são feitos os convênios com as empresas públicas e particulares para a implantação de atividade laboral dentro das penitenciárias, disponibilizando dessa forma o trabalho para a remição, também promovendo a inclusão social do apenado com o objetivo da futura inserção no mercado de trabalho, àqueles que terminaram o cumprimento da pena, através de apoio social, psicológico, financeiro, sendo que essa atividade dos Patronatos na maioria das vezes, atinge também os familiares do preegresso e do egresso[306].

O Patronato pode atuar, secundariamente, prestando assistência judiciária a condenados que se encontram em unidades prisionais, patrocinando a concessão, aos encarcerados, de benefícios como o livramento condicional, progressão de regime, unificação de penas, remição, indulto e comutação de pena. A sua atuação também se dá no Hospital de Custódia e Tratamento, onde tem como objetivo identificar os internamentos realizados de maneira irregular e, a partir daí, regularizar a situação dos internos ou, se for o caso, impetrar Habeas Corpus para que retornem à liberdade, ou atuar também junto a delegacias de polícia, acompanhando indiciados, aqueles que se encontram presos e, de um modo geral, quem está sendo investigado pela polícia[307]    

Mirabete comentando a cerca da Lei de Execução Penal, assevera que a lei federal não dispõe sobre como deve ser efetuado a composição de um Patronato, colocando a cargo dos Estados sua regulamentação, existindo algumas orientação por parte dos doutrinadores que o Patronato deve valer-se da colaboração especial de profissionais ou estudantes de Direito, Medicina, Serviço Social, Psicologia, Sociologia, estando sob a supervisão do Conselho Nacional de Política Criminal da Central de Apoio ao Egresso (CENAE), que terá a finalidade de incentivar a criação de novos Patronatos, ampliando as experiências de assistência aos egressos, que têm contribuído nos locais onde existem para a redução do índice de reincidência.[308]

O Patronato do Paraná, por exemplo, pode muito bem servir de modelo a ser seguido por todo país, desenvolvendo projetos como: confecção de Carteira de Trabalho de egressos e de condenados à pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos, em parceria com o Ministério do Trabalho; acompanhamento psicoterápico dos condenados em gozo do livramento condicional, e aos indicados para participar de grupos de Alcoólicos Anônimos e Narcóticos Anônimos; captação e busca de vagas do mercado de trabalho mediante convênio com a Secretaria de Estado do Emprego e Relações do Trabalho/Agência do trabalhador/SINE; inscrição do egresso e do apenado junto ao terminal de consultas de vagas do SINE instalado no próprio Patronato. Além desses projetos, foram estabelecidos diversos convênios com instituições que ofertam cursos profissionalizantes, tais como o SENAC e a Secretaria de Estado do Emprego e Relações do Trabalho, objetivando atender aos beneficiários sob a responsabilidade do Patronato Penitenciário, através de programas de formação profissional, com isenção de taxa de matrícula, facilitando a integração do egresso à sociedade[309].

Alguns outros Estados da Federação estão se mobilizando, tentando minimizar a degradação provocada pelo cárcere, procurando uma melhor assistência ao egresso e ao préegresso, são eles, também bons exemplos.

Na Bahia, a Secretaria da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos, através da Coordenação de Educação e Desenvolvimento, em convênio com a Fundação Dom Avelar Brandão Vilela, possui o Programa Liberdade e Cidadania que visa a colocação dos egressos no mercado de trabalho, principalmente, através de atividade autônoma, como empreendedor de seu próprio negócio, por meio da doação de carrinhos para venda de alimentos (hot dog, côco, milho verde, churrasco e pipoca), de máquina fotográfica e acessórios, material de barbearia, enfim, kit de material necessário para a realização de atividade relacionada à aptidão do beneficiado, além de acompanhamento dessas atividades. Além disso, considerando a necessidade de intervir no período “pré saída” dos internos das unidades prisionais, é oferecido o Curso Preparando para a Liberdade, estimulando-os a serem agentes de transformação de sua própria realidade, promovendo e/ou fortalecendo sua autonomia e a auto-estima[310].

Em Goiás, destaca-se o programa assistencial que encaminha os egressos para tratamento de dependência química[311]

No Estado do Amazonas, há o Programa de Capacitação Profissional e Apoio Assistencial a Internos, Egressos e Familiares do Sistema Penal de Manaus, que visa qualificar a população carcerária, egressos e familiares para o mercado de trabalho, oferecendo cursos profissionalizantes, projetos de inclusão social através da poesia, arte, música e do fomento à cultura, incluindo também os egressos e albergados na rede pública de ensino.[312]

Como citado supra, a criação dos Patronatos é responsabilidade dos Estados da federação e são poucos os governantes dos Estados brasileiros que incentivam sua criação, deixando essa tarefa a cargo do Departamento Penitenciário Nacional, somente alguns possuem uma visão mais ampla e moderna da necessidade urgente de assistência ao egresso e ao preegresso, portanto na grande maioria dos Estados brasileiros essa assistência é deficiente, o que é uma causa inegável do alto índice de reincidência, que hoje é de 85% [313], dos presos que recebem a liberdade, voltam a cometer novos delitos.

3.3.2 As FUNAP's           

Com a denominação de Fundação Estadual de Amparo ao Trabalhador Preso, a FUNAP é uma instituição criada em 1976, no Estado de São Paulo, enquanto era Secretário dos Negócios de Justiça em São Paulo, o professor doutor Manuel Pedro Pimentel, em 30 de agosto de 1977, foi sancionada pelo Decreto n° 10.235, tido como o estatuto da FUNAP, com uma efetiva participação no sistema penitenciário de contribuir para recuperação social do preso e para a melhoria de sua condição de vida, através da elevação do nível de sanidade física e mental, do adestramento profissional e do oferecimento de oportunidade de trabalho remunerado[314].

O trabalho executado pela FUNAP de São Paulo, tem um posicionamento que busca evitar a reincidência dos egressos, oferecendo formação profissional e trabalho remunerado aos presos, também coordenam e executam programas de educação, cultura esportes e geração de renda, seu custeio é mantido com recursos públicos e recursos financeiros advindos de produtos e serviços produzidos pelos presos[315].

A FUNAP de São Paulo está sendo exemplo para todo o país, desenvolvendo e avaliando programas sociais para os egressos e preegressos das 144 penitenciarias do Estado que já tem instaladas 16 oficinas utilizadas para a capacitação profissional dos presos e para gerar recursos para a continuidade dos programas da FUNAP, sendo sua missão a de reinserção social de egressos e préegressos estimulando seu potencial como indivíduos, cidadãos e profissionais, promovendo a articulação entre o setor público e privado organizações não governamentais e comunidade, para sedimentar ações comuns a fim de diminuir a reincidência do egresso[316].

A FUNAP do Distrito Federal, com a mesma finalidade e usando o modelo da FUNAP de São Paulo, foi criada em fevereiro de 1987, uma fundação de direito privado, sem fins lucrativos, dotada de autonomia técnica, administrativa, financeira e operacional e vinculada à Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal com o de objetivo de é preparar o preso para seu reingresso na sociedade ao término da pena. Essa ressocialização acontece principalmente através do trabalho, considerado como um processo além de terapêutico, necessário para preparar o preso para a liberdade[317]

Atualmente, nas penitenciária administradas pela FUNAP há uma panificadora, que fornece para a rede escolar; uma confecção, inclusive com seção de serigrafia, que fornece uniformes para vários órgãos governamentais e particulares; uma funilaria, que originalmente fazia reparos em automóveis mas atualmente se dedica à fabricação de traves de futebol, tabelas de basquete e consertos em carteiras escolares para escolas públicas; e uma marcenaria, que conserta móveis e armários para repartições públicas e escolas, realizando, ainda convênios com a administração pública e com entidades privadas para a realização de trabalhos externos[318].

São essas instituições as mais expressivas no Brasil que merecem ser destacadas pelo trabalho que têm feito em prol da reabilitação do preso brasileiro.

3.3.3 As APAC's

A associação de Proteção de Assistência ao Condenado, a APAC, foi Fundada em 18 de novembro de 1972, na cidade de São José dos Campos em São Paulo, era algo novo, totalmente inusitado e revolucionário, nunca antes experimentado no sistema prisional brasileiro[319].

Um grupo de voluntários cristãos, sob a liderança do advogado e jornalista Dr. Mário Ottoboni, passou a freqüentar o presídio Humaitá para evangelizar e dar apoio moral aos presos. Tudo era empírico e objetivava tão somente resolver o problema da Comarca, cuja população vivia sobressaltada com as constantes fugas, rebeliões e violências verificadas naquele estabelecimento prisional. O grupo não tinha parâmetros nem modelos a serem seguidos. Muito menos experiência com o mundo do crime, das drogas e das prisões. Mesmo assim, pacientemente foram sendo vencidas as barreiras que surgiam no caminho. Em 1974 essa equipe que constituía a Pastoral Penitenciária percebeu que somente uma Entidade Juridicamente organizada seria capaz de enfrentar as dificuldades e as vicissitudes que permeavam o dia a dia do presídio. Assim, com uma pastoral juridicamente organizada, o preso teria resguardado o seu direito de ser assistido, pois sempre que necessário, a APAC poderia aplicar o remédio jurídico conveniente para garantir este direito.[320].

Dessa forma o método APAC foi sendo elaborado, devido a ineficiência do sistema penitenciário brasileiro em recuperar os detentos. No Brasil, a média de reincidência chega aos 85%, com o método APAC, esse índice de reincidência foi reduzida para 5% nas cerca de 160 unidades implantadas em todo o Brasil. Esse método revolucionário de administrar as cadeias sem armas, sem polícia, sem algemas, onde são os próprios presos quem cuidam de tudo, da administração, da limpeza, da segurança. O método se baseia no voluntariado trabalhando tanto no regime fechado, como no semi-aberto e no regime aberto. No fechado, o apenado trabalha com atividades múltiplas, no semi-aberto participa de oficinas profissionalizantes e no regime aberto, o recuperando trabalha prestando serviços à comunidade, visando sua reinserção social. Além disso, o apenado conta com assistência jurídica, assistência à saúde e tem como um dos pilares a família. Por isso, os presos devem cumprir pena na cidade onde reside sua família[321].

No dia 09/07/1995 foi fundada em São José dos Campos/SP, a Fraternidade Brasileira de Assistência aos Condenados, sob a presidência do advogado e jornalista Mário Ottoboni. A FBAC é a entidade que congrega, supervisiona e fiscaliza todas as APAC’s do Brasil e orienta a aplicação do método APAC no exterior. É filiada à Prison Fellowship International – PFI, organização consultiva da ONU para assuntos penitenciários[322].

Sobre a autora
Sandra Mafra

Especialista em Direito Constitucional.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Monografia apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito pela Universidade do Vale de Itajaí. Orientador Prof. MSc: Sandro Cesar Sell.

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