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Autonomia do Ministério Público Especial

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Agenda 04/09/2014 às 17:39

3 ANÁLISE DAS PRINCIPAIS DECISÕES DO STF

3.1 Ação direta de inconstitucionalidade nº 789-1-DF[42]

Trata-se de uma ação direta de inconstitucionalidade ajuizada, no Supremo Tribunal Federal, pelo Procurador-Geral da República com intuito de impugnar normas cristalizadas na Lei Orgânica do TCU. Os dispositivos vergastados estabelecem a competência da Corte de Contas para conceder férias, licença e outros afastamentos aos membros do MPCO, conferem prerrogativa de propor ao Congresso Nacional a fixação dos vencimentos dos integrantes do MPCO e, por fim, competência ao Presidente da TCU para dar posse aos membros do MPCO. Cumpre assinalar quer as normas acoimadas são reproduzidas em diversas Leis Orgânicas em todo território nacional, com raras exceções, principalmente o MPCO do Pará analisado no capítulo antecedente.

Os argumentos do Procurador-Geral da República se resume na inconstitucionalidade formal e material. A inconstitucionalidade formal reside no fato da iniciativa para iniciar o processo legislativo é do Ministério Público da União e a inconstitucionalidade material se reveste na ofensa do art. 128 da CF, pois teria a TCU criado um novo Ministério Público. Defende, ainda, que a criação de um Ministério Público junto ao TCU, como órgão autônomo, violaria os princípios da unidade e da indivisibilidade do Ministério Público, com arrimo no art. 127, §1º da CF. Assevera, por fim, que as funções do MPCO devem ser desempenhadas, no âmbito da União, por membros da instituição que integram a carreira do Ministério Público Federal e, no âmbito dos Estados, por integrantes da carreira do Ministério Público Estaduais.

O Ministro Celso de Mello, relator da ADI em análise, aduz que a Constituição do Brasil fortaleceu, significativamente, o Ministério Público, qualificando-o como instituição permanente e essencial à função jurisdicional do Estado e outorgando-lhe a incumbência de defender a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis.

O Ministro Celso de Mello citou as duas cisões doutrinárias acerca da posição do Ministério Público de Contas, nas palavras do Ministro:

A matéria é controvertida na doutrina, que se divida entre aqueles que veem o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União uma instituição autônoma, independente do Parquet federal (Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, ‘Ministério Público junto aos tribunais de Contas’, in Caderno de Direito e Justiça do Correio Braziliense, exemplar de 14/09/92), e aqueles, como Hugo Nigro Mazzilli (‘O Ministério Público no Tribunal de Contas’, in RT 650/40), que o consideram órgão integrante do Ministério Público da União[43].

Analisando o texto constitucional brasileiro, aduz que não há como recusar a existência de um Ministério Público especial junto aos Tribunais de contas, não obstante a ausência de menção a esse órgão estatal no rol descritivo constante do art. 128 da Carta Política, com socalco no art. 73, §2º, I e no art. 130 da CF de 1988. Ressaltou posição jurisprudencial que rechaçou a inconstitucionalidade concernente à qualificação da Procuradoria Junto ao Tribunal de Contas como órgão exercente de funções peculiares ao Ministério Público[44].

Reconhece a existência do Ministério Público Especial, cujas atividades acham-se restritas ao âmbito do Tribunal de Contas da União, com supedâneo no assento normativo constitucional.

Cumpre, ainda, fazer a mesma citação proferida pelo Ministro Celso de Melo, dada a sua importância para a matéria em análise e sua indubitável correlação com o tema tratado nas palavras de José Afonso da Silva:

[...] o art. 130 admite o Ministério Público especial, não mencionado no art. 128, junto aos Tribunais de Contas, portanto junto a órgão não jurisdicional [...]. Ao Ministério Público aos Tribunais de Contas só compete o exercício de suas funções essenciais de custos legis, porque a representação das Fazendas Públicas, aí, como em qualquer outro caso, é função dos respectivos procuradores, nos termos dos art. 131 e 132[45].  

Ocorre que o Ministro Celso de Mello aduziu que a mera previsão legal não basta para conferir ao Ministério Público Especial as mesmas prerrogativas jurídicas, no plano institucional, do Ministério Público da União. Nesse ponto, o relator começa sua fundamentação acerca da inexistência de prerrogativas institucionais.

Fez uma análise normativa que permite, de acordo com o relator, a existência de cláusulas de garantia de ordem meramente subjetiva, desprovida de conteúdo orgânico- institucional, visando apenas a proteção dos membros do parquet de contas. A análise normativa dos preceitos constitucionais, conforme intelecção do relator, não se pode sustentar um organismo revestido de perfil institucional próprio, dotado de plena autonomia jurídica e investido das mesmas garantias de uma ordem objetiva que foram outorgadas pela ordem constitucional ao Ministério Público da União e dos Estados membros.

Aqui cabe um apontamento: o Ministro Celso de Melo fez uma interpretação literal, levando em consideração apenas dispositivos que constam a denominação do “Ministério Público Junto ao Tribunal de Contas”, olvidando de fazer interpretação sistêmica com os demais dispositivos concernentes ao Ministério Público e deixando de lado o aspecto prático da tese defendida.

O relator da ADI em análise traz à baila um argumento um tanto falível: o elevado grau de autonomia funcional conferido ao MPCO não se revela suficiente para identificar, o atributo da autonomia institucional, na extensão e com o conteúdo que a Constituição outorgou ao Ministério comum. Ocorre que a autonomia funcional só pode ser considerada plena e suficiente quando acompanhada da autonomia administrativa e financeira, sob pena da existência de uma falácia constitucional.

Aduz que o MPCO integra a organização administrativa do Tribunal de Contas da União, ainda que privilegiado por um regime jurídico especial, totalmente alheio à estruturação orgânica do Ministério Público da União. O relator, novamente, entende que o MPCO é parte da estrutura do TCU, porém cabe indagar-se: Qual a diferença do MPCO e um órgão interno com regime especial, como, por exemplo, a Auditoria Geral? Pela argumentação de Celso de Mello, não existe diferença alguma, pois ambos são órgãos de extração constitucional, sujeita a um regime jurídico especial e que integra a organização administrativa do TCU.

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Uma argumentação louvável do relator ao defender a existência do MPCO remonta a ideia que se estivesse o MPCO incorporado ao próprio Ministério Público da União, tornar-se-ia de todo dispensável a utilização, pelo legislador constituinte, da norma de extensão (art. 130 da CF de 1988), pois os membros do MPU possuem, por direito próprio, sem necessidade de expresso comando constitucional, eis que já dispõe a própria Constituição. Perfeita intelecção que condiz com a máxima hermenêutica de que o legislador não utiliza palavras desnecessárias.

O Ministro diz que, apesar do nomen juris, o MPCO vincula-se à estrutura administrativa da TCU e qualificam-se como servidores integrantes do próprio quadro de pessoal do TCU. Ouso discordar veementemente, pois tal afirmativa ensejaria na inexistência do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, ou seja, existiria apenas um órgão, vinculado ao TCU, que de Ministério Público só restaria a denominação, não podendo considerar um órgão essencial à função jurisdicional que incumbe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais, nos moldes do art. 127 da CF de 1988.

Finalizando seu voto, o relator aduz a máxima que é excessivamente reproduzida pelos doutrinadores pátrios: o Ministério Público não dispõe de fisionomia institucional própria e, não obstante as expressivas garantias de ordem subjetivas concedidas aos seus Procuradores pela própria Constituição encontram-se ele consolidado na “intimidade estrutural” dessa Corte de Contas.

Conforme argumentação acima trabalhada, a “intimidade estrutural”, dita por Celso de Mello, pode ser considerada como sinônimo de “órgão da Corte de Contas”, ou seja, um mero “braço” de competências especificas do TC. Quando o relator nega o direito de self-government do MPCO, está, na verdade, retirando a qualificação e as atribuições inerentes ao Ministério Público transformando-o em uma instituição travestida e fantasiada de MP.

Finalizando a análise do precedente jurisprudencial, a referida ADI é um marco histórico do MPCO, pois é com ela que se pacifica a existência do Ministério Público de Contas e delimita a sua autonomia clássica e majoritária, existente até os dias hodiernos. Com o voto do Ministro Celso de Mello, referendado pela unanimidade dos Ministros do STF, deixou-se de ser chamado Ministério Público junto ao Tribunal de Conta para ser chamado de Ministério Público Especial.

3.2 Ação direta de inconstitucionalidade nº 2.378-1 GO[46]

Será analisado, no presente item, o prisma da autonomia administrativa e financeira constante no referido remédio constitucional, subtraindo-se da análise as outras fundamentações e outros aspectos, ou já trabalhado alhures ou de menor importância.

A ADI em análise foi ajuizada pelo Procurador-Geral da República com intuito de ver declarada a inconstitucionalidade de dispositivo da Constituição Estadual de Goiás que concede autonomia administrativa e financeira ao MPCO.

Aduz o peticionário que a Carta Magna não conferiu à autonomia administrativa e financeira ao MPCO, pois teria estendido aos membros do MPCO os direitos, vedações e forma de investidura próprios do Ministério Público Comum, com arrimo no art. 130 da CF de 1988.

O Ministro Marco Aurélio inicia sua divergência, pois os demais Ministros acompanham o entendimento do Ministro Celso de Mello, na ADI nº 789-DF, ou seja, negam a existência da autonomia administrativa e financeira. Alegavam que o MPCO não possui fisionomia própria, possuindo apenas as garantias de caráter subjetivas, sendo privado das autonomias institucionais.

Marco Aurélio, em seu voto, alegou que o Ministério Público é uma instituição voltada ao prol da sociedade e normas vergastadas visam uma atuação equidistante e independente. Asseverou, ainda, que os Estado organizam-se e regem-se pelas próprias Constituições que adotarem, fruto do Poder Constituinte derivado decorrente, com amparo no art. 25 da CF de 1988. Concluiu que ser aplicável ao MPCO o disposto no art. 127, § 2º, da CF de 1988, em decorrência do objetivo buscado pelas prerrogativas, sendo, portanto, a Constituição Estadual de acordo com os princípios da Constituição Federal.

O voto do Ministro Marco Aurélio constitui agouro de uma nova interpretação acerca do tema, sendo, apenas, criticável a pequena densidade intelectiva do voto, pois, de forma um tanto singela e superficial, preleciona de uma má aplicação do texto constitucional, até então em voga.

Passando a debruçar no voto vista do Ministro Carlos Ayres Brito, este sim, de uma forma mais profunda, critica à teórica majoritária, encampada pelo Ministro Celso de Mello. Inicia seu voto com uma digressão sobre a história do Ministério Público, concluindo a falta de autonomia, haja vista a vinculação do MP ao Poder Executivo, de acordo com a antiga Constituição:

Logo, se nem o Ministério Público geral era regrado como instância a gravitar em torno do seu próprio eixo, mas na órbita de um outro órgão público, natural seria que o Ministério Público Especial também figurasse como unidade interna aos Tribunais de Contas, a partir do TCU[47].

Começa ai a desconstrução tese adotada por Celso de Mello, pois remonta em uma interpretação histórica pretérita à Constituição Federal vigente, indo na contramão da melhor argumentação. Digo isso porque a Constituição de 1967, de caráter nitidamente autoritária, não especificava o papel do MPCO, logo ocorrendo uma dúvida: O MPCO era ou não era uma unidade orgânica distinta do Tribunal de Contas? Para solucionar a dúvida, a Carta Política vigente acrescentou uma novidade no texto constituição: acrescentou a locução “junto”. Lembrando, conforme explanado anteriormente, que a locução “junto” não deve ser encarada como sinônimo de “interior” ou “dentro”, mas deve ser entendida como forma de colaboração entre órgão. Logo, encontra-se a primeira mácula na retórica de Celso de Mello, haja vista sua eloquência se baseia de uma interpretação pretérita, indo de encontro com a real intenção do Constituinte Originário[48].

No mais, impreca por uma interpretação ampla do termo “direito”, constante no art. 130 da CF de 1988, pois a referida expressão tem caráter ambivalente, capaz de ser empregada tanto no sentido nas prerrogativas subjetivas, como nas prerrogativas institucionais. Para quem presa por uma interpretação voltada ao sentido normativo do texto constitucional, é a melhor tese a ser defendida. Porém, defende-se que há uma necessidade de a interpretação ser sistêmica e não se restringindo a um único diploma constitucional, sob pena de ver desvirtuado a real intenção da Constituição.

Aduz, ainda, que o rol apresentado no art.128 da CF de 1988 diz respeito ao Ministério Público atuante junto ao Poder Judiciário, mas fora dele, por isso que o MPCO não estaria arrolado no artigo mencionado, pois atua junto ao Tribunal de Contas, mas também fora dele. Translúcida a dicotomia apresentada por Carlos Ayres: a atuação judicial e a atuação administrativa.

Asseverou que diante do texto constitucional indagou dois apontamentos, nos dizeres do Carlos Ayres Britto:

A constituição republicana parificou tão somente os membros de ambas as espécies de Ministério Público, porque sua real intenção foi a de atribuir relevo sistêmico desigual às respectiva instituições, ou tal igualação não passou de uma simples opção legislativa por uma estrutura de linguagem mais sintética, restando implícito que somente faz sentido conferir idêntico regime normativo aos membros do Ministério Público de Especial se estes puderem atuar sob o guarda-chuva de uma instituição paritariamente forrada de prerrogativas quanto as que vigem para o Ministério Público Geral?[49]

A resposta vem em seguida, quando responde que o segundo apontamento ser o mais correto, devendo ser considerada implícita o regime jurídico no plano subjetivo e, de igual monta, no plano objetivo, com arrimo, inclusive, no princípio da isonomia institucional. Releva logo em seguida uma das máximas do presente trabalho: A autonomia administrativa de uma instituição que cada membro individualmente ganha plena possibilidade factual de atuação.

Quando se falar que o MPCO é um órgão distinto da Corte de Contas, se produz, automaticamente, a ideia de uma atuação administrativamente autônoma, pois, do contrário, implica reconhecer que o Ministério Público Especial não passa, nos dizeres de Carlos Ayres, de um sub-órgão[50] das Cortes de Contas.

O TC, apesar da distinção feita pela própria Constituição, revela-se um tribunal administrativo comum sui generis ou incomum, ou seja, detém certa semelhança com o Poder Judiciário, pois em vários dispositivos constitucionais estende as normas aplicáveis no Poder Judiciário aos Tribunais de Conta. Portanto, uma analogia deve ser construída, partindo do pressuposto que o Ministério Público atuante no Poder Judiciário possui autonomia institucional, também o MPCO deveria possuir as garantias institucionais.

Convém afirmar que existem doutrinadores que defendem a tese da natureza judicante dos Tribunais de contas, o que corrobora ainda mais a tese acima exposta. Dentre os doutrinadores destacam-se Seabra Fagundes, Pontes de Miranda e Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, conforme elenca o Conselheiro do TCE/PE, Valdecir Pascoal:

Não é hoje o fervoroso debate doutrinário acerca da natureza jurídica das decisões dos Tribunais de Contas. Possuem natureza judicante ou administrativa? Esclareça-se, de início, que uma decisão judicante não necessariamente é aquela originária do Poder Judiciário. A decisão pode ser judicante (capaz de dizer definitivamente o direito), mesmo advinda de um órgão administrativo. É o caso, por exemplo, dos países que adotam o chamado contencioso administrativo. Por este sistema, um órgão administrativo pode ter competência para dar a última palavra sobre determinada questão que envolva a Administração Pública, sem que as partes possam recorrer ao Poder Judiciário. Mesmo assim, uma parte minoritária da doutrina, tendo à frente Pontes de Miranda e Seabra Fagundes, seguidos hoje, dentre outros, por Jorge Ulisses Jacoby Fernandes, defende a força judicante da deliberação do Tribunal de Contas que julga contas dos administradores públicos( artigo 71, II, da CF)[51]

Por fim, aduz que a função do controle externo se reveste de um verdadeiro princípio constitucional, com supedâneo no princípio da prestação de contas corolário ao republicanismo, e, com isso, deve reconhecer a equivalência jurídica entre o MPCO e o Ministério Público Geral.

No mais, o MPCO atua perante os Tribunais de Contas, essa atuação se refere em opinativos que implicam de fiscalizar, diligenciar, investigar, denunciar, representar e outras atividades proativas. Logo, não se pode permitir que o TC detenha a autonomia administrativa e financeira e o MPCO, órgão soberano que atua ao lado do TC, não o detenha. Ambos são encarregados de funções fiscalizatórios e necessitam das mesmas proteções constitucionais.

Infelizmente, os Ministros Marco Aurélio e Carlos Ayres Britto foram vencidos e foi consagrada, novamente, a tese esposada pelo Ministro Celso de Melo. Fica-se, porém, os ensinamentos de Carlos Ayres de Britto que, em conjunto com as demais fundamentações apresentadas nesse trabalho acadêmico, demonstra que a melhor interpretação a ser seguida pelo interprete é da autonomia completa e acabada do MPCO.

Indo mais além, não há necessidade de uma alteração do texto constitucional, apesar de preferida, devido à cultura constitucional brasileira que demonstra uma tanto quanto literal e gramatical. O fenômeno da mutação constitucional pode ser empregado sem nenhum medo, no caso em exame, conforme Mendes, Coelho e Branco:

[...] por vezes, em virtude de uma evolução na situação de fato sobre a qual incide a norma, ou ainda por força de uma nova visão jurídica que passa a predominar na sociedade, a Constituição muda, sem que as suas palavras hajam sofrido modificação alguma. O texto é o mesmo, mas o sentido que lhe é atribuído é outro. Como a norma não se confunde com o texto, repara-se, aí, uma mudança da norma, mantido o texto. Quando isso ocorre no âmbito constitucional, fala-se em mutação constitucional[52].  

Foi a partir do voto do Ministro Carlos Ayres Britto, bem como dos seus trabalhos acadêmicos[53], que os próprios procuradores de contas começavam a defender uma nova denominação para a sua instituição secular, começavam, portanto, a defender a denominação mais condizente com as prerrogativas e garantias do Ministério Público atuante ao lado dos Tribunais de Contas. Com isso, surgiu a denominação, mais apropriada a nosso ver, Ministério Público de Contas que preza pela função desempenhada, ou seja, o auxílio à fiscalização das contas públicas. Deixando de lado a designação separatista e preconceituosa, afirmando-se como uma instituição não diferente do Ministério Público comum, sendo apenas separadas por funções distintas, porém tangenciáveis.     

3.3 Ação direta de inconstitucionalidade nº 160-4/TO[54]

A ação em análise foi julgada em momento anterior em relação a ADI estudada anteriormente, porém carrega uma nítida importância doutrinaria como se verá mais adiante.

Visto isso, passa-se a examiná-la.

Trata-se de uma ação de impugnação constitucional contra a Constituição Estadual de Tocantins, ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil que tem o desiderato de considerar inconstitucional, além de outras matérias, a concessão de autonomia funcional e administrativa ao MPCO.

O relator, Ministro Octávio Gallotti, asseverou que a Constituição do Estado do Tocantins feriu a CF de 1988, pois destoa do sistema da Carta Federal. De acordo com o relator, seguidos pela maioria da Corte, o MPCO pertence apenas as garantias subjetivas, com socalco no art. 130 da CF de 1988, sendo abarcado, inclusive, pela independência funcional, principalmente, em detrimento do TC.

A única passagem digna de nota é a diferenciação do relator entre independência funcional e autonomia funcional, alhures defendida nesse trabalho. Ocorre que o relator seguiu a linha mestre do voto de Celso de Mello e asseverou que o MPCO possui a independência funcional, de caráter subjetivo e interno, e não possui autonomia funcional, de caráter objetivo e externo.

A divergência foi a cargo dos Ministros Néri da Silveira e Sepúlveda Pertence que defendem uma homogeneidade de conceitos entre independência funcional e autonomia funcional. Imprescindível faz uma citação de um excerto do voto do magistrado Néri da Silveira:

Não se pode compreender o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, enquanto Ministério Público, não dotado de uma independência funcional, o que significa a sua não sujeição a qualquer forma de hierarquia, quer no próprio Tribunal de Contas, quer a outro órgão da Administração. Do contrário, não teriam os seus membros as condições de exercer, com prerrogativas de Ministério Público que é, a missa precípua de fiscal da lei. A autonomia funcional tem, aqui, à ideia de independência funcional[55].    

Discorre-se no item 2.2 que autonomia funcional e independência funcional não se confundem, apesar da notável semelhança ortográfica. Não deixa-se de notar uma verdade confusão terminológica que acaba por confundir o interprete, logo ofusca os olhos que até mesmo o guardião máximo da constituição e mais alta corte do país pode, também, cometer imprecisões. A singela observação positiva se adorna no fato da concessão da autonomia funcional ao MPCO, mesmo que sob fundamento equivocado.  

Sobre o autor
Ítalo Medeiros Cisneiros

Pós-graduação em Direito Constitucional pela UNIDERP. Graduação em Direito na UNICAP-PE.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Monografia apresentada à Universidade Católica de Pernambuco como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Msc. Glauco Salomão Leite.

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