Antes de entrarmos no mérito da questão sobre a possibilidade ou não do contribuinte requerer a restituição em determinados casos do valor pago do ICMS na forma de substituição tributária, temos que entender o que significa essa forma de tributação e como ela opera.
O regime de substituição tributária está previsto na Constituição Federal de 1988, artigo 150, § 7º, o qual estabelece que a lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente.
Portanto, a Substituição Tributária é o regime jurídico pelo qual atribui a responsabilidade pelo recolhimento do imposto devido em relação às operações ou prestações de serviços a outro contribuinte. Tratando de ICMS, a cobrança ocorre de forma antecipada e tem-se como base de cálculo uma estimativa de preços que serão praticados na venda ao consumidor final, que se chama IVA (Imposto sobre o valor agregado).
Para facilitar o entendimento, iremos criar um exemplo pratico e didático da situação. Suponhamos que um fabricante de material para veículos, localizado no Estado do Ceará, venda para uma determinada loja de autopeças (revenda), também localizada no Estado do Ceará, 100 peças a preço unitário de R$ 10,00, portanto o pedido total será de R$ 1.000,00. Vejamos agora o passo-a-passo do calculo da Substituição Tributária (ST) no fornecedor e cliente revenda.
Dados do exemplo: Alíquota de ICMS: 17%; IVA do Setor de Auto Peças = 40%
Fórmula a ser utilizada:
((Preço de Venda x IVA) + Preço de Venda) x Alíquota ICMS) (-) (Preço de Venda x Alíquota ICMS) = ICMS com Substituição Tributária
Resultado:
( ((R$ 1.000,00 x 40%) + R$1000,00) x 17% ) – ( R$ 1.000,00 x 17% ) = ICMS com Substituição Tributária
( (400 + 1000 ) x 17%) - 170 = ICMS com Substituição Tributária
(1400 x 17%) - 180 = ICMS com Substituição Tributária
238-180 = R$ 58,00
Sendo assim, o fabricante de peças emitirá a NF-e para seu cliente no valor de R$ 1.058,00 referente ao valor da mercadoria (R$ 1.000,00) acrescido do ICMS com Substituição Tributária de R$ 58,00.
Após a compreensão sobre o que significa a Substituição Tributária, iremos tratar sobre a polêmica que envolve esse tema atualmente no tocante a restituição de valores recolhidos a titulo de ICMS na forma de substituição tributária.
Com a aprovação da Emenda Constitucional 03/93, que inclui o paragrafo 7º no artigo 150 da Constituição Federal, muitas questões foram levantadas a respeito da restituição do imposto recolhido.
O §7º do artigo 150 da Constituição Federal determina:
Art. 150 – omissis
§ 7º - A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido.”
Nota-se que a segunda parte do §7º (sublinhado) trata apenas da restituição do valor recolhido quando o fato gerador não ocorrer, ou seja, não trata de restituição quando o imposto foi pago indevidamente, seja por qual motivo for.
A partir dai iniciou uma enorme polemica sobre a restituição, pois segundo o artigo colacionado a restituição ocorreria apenas quando o fato gerador presumido não se realizasse.
Os Estados, entendendo que a restituição imediata e preferencial prevista no parágrafo acima transcrito somente se daria quando o fato gerador presumido não ocorresse, não alcançando situações nas quais o mesmo ocorresse com valor distinto do previsto, firmaram o Convênio ICMS 13/97, cuja ementa é “harmoniza procedimento referente a aplicação do §7º, artigo 150, da Constituição Federal e do artigo 10 da Lei Complementar 87/96, de 13.09.96”, o qual dispõe, em sua Cláusula Segunda, abaixo transcrita, o não cabimento de restituição ou mesmo cobrança complementar quando da efetiva ocorrência da operação presumida em valor inferior ou superior ao presumido.
“Cláusula segunda. Não caberá a restituição ou cobrança complementar do ICMS quando a operação ou prestação subseqüente à cobrança do imposto, sob a modalidade de substituição tributária, se realizar com valor inferior ou superior àquele estabelecido com base no artigo 8º da Lei Complementar 87, de 13 de setembro de 1996”.
Caso o fato gerador seja presumido sob determinado valor, mas a efetiva operação concretize-se em valor superior ao anteriormente presumido, em abstrato poderão os Estados cobrar o imposto incidente sobre a diferença, contudo, e, caso estes se abstenham de fazê-lo, estarão efetuando dispensa de tributo em modalidade de renúncia-benefício fiscal.
Consequentemente, quando os Estados acordaram em não efetuar cobrança complementar quando a operação presumida ocorrer com valor superior ao presumido, concederam, dentro de sua competência, uma renúncia-benefício fiscal.
Todavia, o fato de os Estados dispensarem a cobrança de eventuais diferenças a maior, provenientes de divergências entre valor presumido e efetivamente ocorrido na substituição tributária, não lhes permite apropriarem-se da eventual diferença a menor, quando o fato efetivamente ocorrido se dá em valor inferior ao presumido.
O convênio 13/97 foi aderido por quase todos os Estados da Federação. Entre os que não aceitaram, estão São Paulo e Pernambuco, que optaram por criarem legislações próprias para permitir que o contribuinte pudesse restituir o que pagava a maior por conta dessa forma de cobrança.
Ocorre que, em 2002, contrariando todas as expectativas e jurisprudências, o pleno do STF decidiu pela constitucionalidade do Convenio 13/97, gerando grande reviravolta nos processos em andamento.
Após essa reviravolta provocada pela decisão do STF, os Estados de Pernambuco e São Paulo, revogaram as legislações que autorizavam a restituição e entraram com duas ADIN’s no STF para declarar inconstitucional as suas próprias leis, com o objetivo de cessar as cobranças anteriores.
Diante disso, com as ADINs, as discussões foram reabertas no STF, ganhando mais força após o Recurso Extraordinário proposto por uma empresa petrolífera receber o status de Repercussão Geral deixando o assunto praticamente na estaca zero, onde todas as possibilidades continuam em aberto, incluindo a suspensão de todos os processos que ainda estavam em andamento.
Ressalta-se que o STF já discutiu parcialmente essas duas ADINs em 2003, de forma conjunta e aguarda apenas um voto de desempate, posto que a votação ficou completamente dividida sobre o assunto, diferentemente da decisão de 2002.
Portanto, como a questão ainda está em discussão no STF e tudo pode ocorrer, iremos demonstrar algumas possibilidades em que podemos pleitear a restituição dos valores recolhidos.
De forma superficial, entendemos que as restituições podem ser pleiteadas quando ocorrerem as seguintes hipóteses: Quebra ou perda de produtos inseridos nessa sistemática; aumento da pauta no mesmo exercício em que foi publicado o ato majorador; aquisição de combustível e outros bens para consumo próprio; Inclusão do IPI na base de cálculo do ICMS substituição tributária; Pagamento a maior devido a pauta ser maior do que o valor real praticado.
Portanto, como essas votações no STF podem ser muito demoradas, é importante que sejam tomadas o quanto antes as medidas judiciais para garantir esse Direito, posto que a cada ano vai caindo na faixa prescricional o direito do contribuinte reaver esses valores.
Se a posição do STF for revertida, o ganho será grande de quem entrar agora, se for mantida, perde-se apenas o serviço, posto que neste caso a sugestão é que o instituto processual de Mandado de Segurança seja utilizado para se evitar custas e principalmente sucumbência.
Os setores mais afetados, desde que não sejam optantes do Simples, são: supermercados de todos os portes, revenda de automóveis, postos de combustíveis, revenda de pneus, casas de materiais de construção, autopeças, farmácias, entre outros setores que poderão ser viáveis ou não, dependendo do volume que o produto afetado representa no seu faturamento.