Introdução
O presente trabalho tem como ponto central a matéria analisada pela Solução de Divergência nº 39 - Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) de 30 de dezembro de 2013, que analisa divergência entre duas Soluções de Consultas relacionadas à extensão da imunidade tributária de que gozam templos de qualquer culto em relação a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
No ano de 2006, Solução de Consulta SRRF09/Disit nº 212 foi no sentido de que a receita aferida por templos de qualquer culto não seria tributada pela CSLL, haja vista que, por força da Lei nº 8.981, de 1995, teria suas normas de apuração e pagamento equiparadas ao Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ).
Anos depois, em 2013, a Solução de Consulta SRRF08/Disit nº 4 veio em sentido contrário, afirmando que a referida extensão seria incabível, pois se refere somente a impostos, sendo uma ofensa ao princípio da legalidade específica entendimento diverso.
Sendo o conflito suscitado, a Cosit emitiu parecer no sentido de que seria inaplicável o conceito de imunidade a quaisquer contribuições sociais, incluindo a CSLL, levando a crer ser esta a tese mais adequada a ser adotada, como se pretende demonstrar.
Imunidades tributárias
A Constituição determina que determinadas situações materiais não sejam oneradas por tributos ou por algum tributo em especial. Complementando o desenho do campo sobre o qual será exercida a competência tributária - a competência para instituir tributos -, a Constituição exclui certas pessoas, bens, serviços e situações, deixando-os fora do alcance do poder de tributar. A título de exemplo, a União Federal pode tributar a renda, exceto a dos partidos políticos; pode tributar produtos industrializados, exceto o papel de imprensa A essas situações, atribui-se o nome de imunidade.
Imunidade tributária é a qualidade da situação que não pode ser atingida pelo tributo, em razão de norma constitucional que, à vista de alguma especificidade pessoal ou material dessa situação, deixou-a fora do campo sobre que é autorizada a instituição do tributo.
Luciano Amaro aponta como fundamento das imunidades a necessidade de preservação de valores que a Constituição reputa relevantes - a atuação de certas entidades, a liberdade religiosa, o acesso á informação, a liberdade de expressão, et caetera -, que faz com que se ignore a eventual ou efetiva capacidade econômica pela pessoa ou revelada na situação, proclamando-se,independentemente da existência dessa capacidade a não tributabilidade das pessoas ou situações imunes.
A imunidade não se configura como limitação do poder de tributar, e sim, simples técnica legislativa por meio da qual o constituinte exclui do campo tributável determinadas situações sobre as quais ele não quer que incida este ou aquele gravame fiscal, cuja instituição é autorizada em regra sobre o gênero de situações pelo qual aquelas estariam compreendidas - aqui, não existe nem preexiste poder de tributar.
A imunidade tributária deve ser interpretada de forma restritiva, nos termos do art. 150, §6º da Constituição Federal. Trata-se, aqui, do princípio da legalidade específica (ou estrita legalidade). O referido dispositivo legal exige lei específica para a definição de qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão relativos a impostos, taxas ou contribuições. A Constituição exige lei especialmente editada para tratar somente desses assuntos ou comando de lei que regule exclusivamente o próprio tributo. O objetivo visado com essa disposição é evitar que certas isenções ou figuras análogas sejam aprovadas no bojo de leis que cuidam dos mais variados assuntos
Imunidade Religiosa
O artigo 150 da Constituição Federal estabelece a imunidade religiosa ao vedar que a União, Estados, Distrito Federal e Municípios instituam impostos sobre templos de qualquer culto.
Justifica a imunidade dos templos o princípio da liberdade religiosa, consagrado pelo artigo 5º, inciso VI da Carta Magna, o qual estabelece ser inviolável a liberdade de crença, assegurando o livre exercício dos cultos religiosos e determinando que será garantido por lei a proteção aos locais de culto e suas liturgias.
Ademais, também o artigo 19, inciso I da Constituição Federal assegura que o Estado não adotará medidas que possam embaraçar o funcionamento dos templos, sendo certo que a tributação poderia configurar um obstáculo à liberdade de culto.
Apesar de ser o Brasil um estado laico, a instituição de tal princípio a nível constitucional revela o reconhecimento pelo Estado do sentimento religioso do povo, de forma a entenderem que as atividades religiosas, assim como o patrimônio, os serviços e a renda correlacionados à atividade são entes de domínio público (por possuírem função social), mas não são entes de Domínio Econômico (que integram o mercado).
Por tal razão, o §4º do artigo 150 da Constituição Federal restringe a imunidade dos templos ao patrimônio, renda e serviços relacionados com finalidades essenciais das entidades religiosas.
De tal forma, não é somente o templo (assim entendidos como locais de culto, ou seja, local de acesso público voltado à prática de um culto religioso), mas toda a atividade religiosa que ali se desenvolve serão imunes em relação a impostos. Isso implica dizer que a imunidade religiosa possui tanto o aspecto objetivo, como o aspecto subjetivo, possuindo uma imunidade mista.
Quanto ao aspecto objetivo, tal imunidade recairá sobre o imposto sobre prédio que caracterize um templo, não importando questões sobre a propriedade do imóvel.
Já o aspecto subjetivo da imunidade, se refere ao §4º do artigo 150 da CF, vale dizer, somente estarão imunes a renda, o patrimônio e os serviços legados à finalidade essencial do templo, sendo que não haverá imunidade da atividade religiosa se não houver um templo a qual a atividade está associada.
A não aplicação do artigo 57 da Lei nº 8.981/95.
Conforme determina o §4º do artigo 150 da CF, a imunidade dos templos se limita às atividades essenciais que os templos venham a desenvolver, como, a prática do culto, a formação de sacerdotes e ministros, e a assistência espiritual aos crentes.
Se os templos passarem a desenvolver atividades que pressuponham concorrência com terceiros inicia-se o campo do Domínio Econômico, encerrando a imunidade estabelecida constitucionalmente, pois o templo passará a revelar capacidade contributiva.
O limite entre atividade essencial e atividades “exteriores” à atividade religiosa é determinada pelo princípio da razoabilidade, mas, mantendo-se o templo fora do Domínio Econômico, a ele estará garantida a imunidade. Por outro lado, caso seja configurado atividade que envolva Domínio Econômico, a imunidade afetará a concorrência, pois não pagarão imposto, enquanto outras entidades terão esse ônus, ferindo o princípio de isonomia tributária.
Contudo, é certo que, enquanto a atividade do templo se mantém fora do Domínio Econômico, a imunidade se vê assegurada. Ingressando no Domínio Econômico, a imunidade não pode ser ferramenta que afetará a concorrência.
Assim sendo, como dito anteriormente, a imunidade é instituto previsto constitucionalmente de interpretação restritiva. Nesse tocante, o artigo 150 da Constituição Federal estabeleceu, em seus incisos, a extensão das imunidades concedidas, não estabelecendo que as contribuições sociais também seriam objeto de imunidade.
Ademais, como dito alhures, a Contribuição Social sobre Lucro Líquido pressupõe a existência de lucro, ou seja, pressupõe que atividade exercida esteja integrada ao Domínio Econômico, razão pela qual este tipo de tributo não está inserido no rol das imunidades.
Por fim, o artigo 57 da Lei nº 8.981/95 estabelece que o CSLL obedecerá as mesmas regras de imposto de renda das pessoas jurídicas quanto às normas de apuração e pagamento de tal imposto, de forma que não pode ser interpretado como uma forma de isenção de CSLL em relação aos templos de qualquer culto.
Contribuição sobre o Lucro Líquido (CSLL)
A CSLL foi instituída pela Lei n. 7.689/88 e trata-se de ônus que incide sobre o lucro líquido das pessoas jurídicas.
Estão sujeitas ao pagamento da CSLL as pessoas jurídicas e as pessoas físicas a elas equiparadas, domiciliadas no País. A alíquota da CSLL é de 9% (nove por cento) para as pessoas jurídicas em geral, e de 15% (quinze por cento), no caso das pessoas jurídicas consideradas instituições financeiras, de seguros privados e de capitalização.
Aplicam-se à CSLL no que couberem, as disposições da legislação do imposto sobre a renda referentes à administração, ao lançamento, à consulta, à cobrança, às penalidades, às garantias e ao processo administrativo, mantidas a base de cálculo e as alíquotas previstas na legislação da referida contribuição (Lei nº 7.689, de 1988, art. 6º , e Lei nº 8.981, de 1995, art. 57 ).
O pagamento deverá ser efetuado nas agências bancárias integrantes da rede arrecadadora de receitas federais
Importante frisar que as entidades sem fins lucrativos de que trata o inciso I do art. 12 do Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999 , não se enquadrem na imunidade ou isenção da Lei nº 9.532, de 1997 , e devem apurar a base de cálculo e a CSLL devida nos termos da legislação comercial e fiscal.
O mesmo se afirma no tocante as associações de poupança e empréstimo, isentas do imposto sobre a renda, entretanto são contribuintes da contribuição social sobre o lucro líquido.
Somente são isentas da CSLL as entidades fechadas de previdência complementar, relativamente aos fatos geradores ocorridos a partir de 1º de janeiro de 2002.
As entidades sujeitas à CSLL deverão ajustar o resultado do período com as adições determinadas e exclusões admitidas, conforme legislação vigente, para fins de determinação da base de cálculo da contribuição.
As entidades sujeitas a planificação contábil própria apuram a CSLL de acordo com essa planificação.
Para melhor ilustrar, segue quadro, criado pelo doutrinador Eduardo Sabbag, contendo as principais informações sobre o tributo:
Contribuição para Seguridade Social |
Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) |
Previsão |
Art. 195, I, “c”, CF c/c Art. 28 da Lei n. 9.430/96 |
Fato Gerador |
Auferimento de lucro |
Base de Cálculo |
Lucro, após certos ajustes (alíquota: 9%) |
Sujeito Passivo |
Pessoas jurídicas ou equiparadas |
Sujeito Ativo |
Secretaria da Receita Federal do Brasil (SRFB) |
Bibliografia
AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 18ª edição. São Paulo: Saraiva, 2012.
SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 4ª edição. São Paulo: Saraiva, 2012.
www.receita.fazenda.gov.br
SCHOUERI Luís Eduardo Schoueri. Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2011.
www.receita.fazenda.gov.br