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Patentes em biotecnologia.

O presente artigo objetivou abordar aspectos atinentes à proteção patenteária de biotecnologias, de modo a desvelar paradigmas quanto à política patenteária, analisando aspectos do uso de patentes biotecnológicas.

Resumo: O presente trabalho objetivou a abordagem de aspectos concernentes à proteção patenteária de biotecnologias, de modo a desvelar paradigmas quanto à política patenteária, analisando aspectos positivos da utilização de patentes biotecnológicas em um âmbito de observância à função social e a um mínimo ético. Para tanto foram investigadas doutrinas e decisões judiciais nacionais e estrangeiras, objetando uma reflexão quanto aos aspectos positivos e negativos da patente, a política patenteária está diretamente ligada às condições socioeconômicas que perfazem cada país, assim como seu potencial em fomento à pesquisa biotecnológica. De acordo com os ditames da pesquisa realizada, não se pretende promover uma difusão dos direitos de propriedade às matérias biológicas em seu estado natural, uma vez que a mesma não atende desde a requisitos de atividade inventiva até o que é eticamente plausível. Os países que possuem proteção patenteária promovem não somente uma inserção na dinâmica de apropriação de biotecnologias pelo mercado, como também um maior investimento em pesquisas e desenvolvimento biotecnológico. Evidencia-se a necessidade de desenvolvimento de políticas de proteção dos direitos intelectuais de modo com que não ocorra uma estagnação e dependência de países menos desenvolvidos a recursos biotecnológicos estrangeiros. Todo o sistema mercadológico da ciência e da biotecnologia fundamenta-se nas bases do sistema patenteário, que não se constitui pela simples busca econômica e de progresso científico, mas pelos benefícios concernentes ao desenvolvimento do potencial nacional. E, nesse sentido, a patente transita do local para o global.

Palavras-chave: Patentes. Biotecnologia. Desenvolvimento. Função social. Direito.


1 INTRODUÇÃO

O presente artigo é fruto de um ano de pesquisas científicas que se destinaram ao estudo de uma temática muito abrangente e complexa, nos mais diversos âmbitos, porém, não menos atual e de suma importância ante o desenvolvimento biotecnológico brasileiro.

            Nesses moldes, fora estudado o desafio da pesquisa e desenvolvimento de biotecnologias sob o prisma da politica patenteária de microrganismos, levando-se em consideração o expressivo concurso dos preceitos éticos, objetivando não somente os aspectos mercadológico e desenvolvimentista.

            Para análise do conteúdo foram-se utilizados diversos prismas em âmbito nacional e internacional, além do disposto em nossa Constituição Federativa do Brasil de 1988.

A humanidade situa-se em um contexto de ascensão das mais diversas descobertas científicas, especificamente no que tange às esferas genéticas na manipulação de células-tronco, fomentando a necessidade de um estudo mais específico objetivando uma regulamentação que proteja e promova o desenvolvimento e difusão das biotecnologias, que se constituem de extrema importância para sociedade e comunidade científica internacional, priorizando a observância de parâmetros éticos e morais.

Ademais, são crescentes os avanços nas esferas biotecnológicas desde o século XX, suscitando a necessidade de uma proteção efetiva aos inventos biotecnológicos, especialmente quando falamos da manipulação genética dentre outros meios de manipulação de microrganismos para formulação de biotecnologias, com vistas ao provimento de recursos eficazes em âmbito médico, para a manutenção da vida. Para tanto, se fazem necessários investimentos de alto caráter financeiro, uma vez que as custas de uma pesquisa biotecnológica envolvem investimentos concernentes ao fomento da investigação e ensaios clínicos, necessários desde o desenvolvimento até a chegada da biotecnologia ao mercado.

Como salienta Faria:

 

O domínio das informações genéticas representa um ponto notável do desenvolvimento do saber e um salto tecnológico na ciência genômica, e reabre ao debate as implicações sociais, éticas e legais que deverão surgir dessas pesquisas. Nesse rol, incluem-se as patentes biotecnológicas [...]. (2001, p.1)

 

Em alguns países já se observa a incidência de precedentes que possibilitam a utilização do material genético com o escopo comercial e científico, uma vez que os estudos sobre a biotecnologia estão sempre evoluindo e perfazem um considerável mercado econômico em diversas áreas da medicina e da farmacologia, demonstrando a necessidade de enquadramento do Brasil como país que possui uma política de proteção patenteária aos inventos biotecnológicos com o objetivo de fomentar investimentos em seus setores de desenvolvimento científico-biotecnológico de modo a não estagnação da produção cientifica nacional e não dependência de recursos médicos estrangeiros.

            Os problemas estruturais quanto a atual lei de patentes e os estigmas ideológicos morais e religiosos dificultam a mudança de percepção acerca da importância  do sistema patenteário biotecnológico, gerando um desnivelamento de recursos tecnológicos entre os países que não possuem a proteção patenteária em detrimento dos que possuem.

            Em suma, o principal óbice acerca do direito de propriedade para biotecnologia não se limita ao crivo ético, mas essencialmente a caracterização dos requisitos materiais necessários à concessão da patente, bem como ao liame tênue entre descoberta e invenção.

            Como sabiamente expõe Vizzotto:

 

Não se pode olvidar que todo trabalho cientifico abrange abordagens de um conjunto sistematizado de ideias, de verdades logicamente encadeadas entre si, sendo elas um produto cumulativo, mas não um produto acabado de conhecimento; todo trabalho cientifico comporta conhecimentos em processo, comporta um conjunto geralmente de verdades provisórias, o que possibilita revisões constantes e novas descobertas; de modo que, na ciência, como já explicou Kelinger (1975), as verdades são sempre provisórias e passiveis de revisão. Sendo assim, um dos escopos desse trabalho é servir de fundamentação ao estimulo de novas discursões para o surgimento de novas ideias acerca do tema ora tratado, bem como de suas especificidades. (2010, p.20)

 

 

2 CONCEITOS GERAIS ACERCA DA PROPRIEDADE INTELECTUAL

 

 

A propriedade intelectual se constitui de um sistema abrangente formulado com o escopo de proteger e assegurar a exclusividade da atividade intelectual abarcando os campos literário, artístico e inclusive o campo industrial. Podendo estar ligada tanto a proteção de bens corpóreos como a proteção de bens incorpóreos. Este sistema é caracterizado por três campos distintos:

  1. Propriedade industrial: patentes “lato sensu”, marca, desenho industrial entre outros;
  2. Direito autoral: direito de autor, de software, entre outros;
  3. Proteção “sui generis”: cultivares, topografias, circuitos integrados e conhecimentos tradicionais. 

Na Constituição da República Federativa do Brasil, no art.5°, incisos XXVI e XXIX, temos expostos os direitos do inventor e da sociedade. Especifica também que são passíveis de patenteamento as invenções que atendam a três critérios básicos: novidade, atividade inventiva e aplicação industrial.

Tendo como finalidade desenvolver a Propriedade industrial no Brasil, foi criado em 1970 uma autarquia federal vinculada ao Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, o Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI), sendo este o órgão que concede as patentes.

Após as discussões que deram origem ao acordo “Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights[1] (TRIPS), em 1996 o Brasil, objetivando adequar-se ao panorama industrial mundial, tornou vigente a atual Lei de Propriedade Industrial (LPI), Lei n. 9.279/1996, que inovou em diversos aspectos e reforçou os critérios de aceitabilidade da patente (novidade, atividade inventiva e aplicação industrial) anteriormente dispostos na Constituição, agora materializado nos artigos 8º, 11, 13 e 15 da LPI.

 

 

3 CONTEXTO RELATIVO AO PATENTEAMENTO DE BIOTECNOLOGIAS

 

 

  1. Contexto Nacional

 

 

Em matéria de normatização e regulamentação do sistema patenteário nacional, possuímos a Lei de Propriedade Industrial n° 9.279, sancionada em 14 de maio de 1996, na qual vislumbramos em seu conteúdo normas que, em suma, nos fazem aferir que o Brasil se posiciona forma clara quanto ao patenteamento de determinadas Biotecnologias.

Os artigos que se referem ao objeto de nossos estudos são:

 

Art. 10 - Não se considera invenção nem modelo de utilidade:

[...]

VIII - técnicas e métodos operatórios ou cirúrgicos, bem como métodos terapêuticos ou de diagnóstico, para aplicação no corpo humano ou animal; 

IX - o todo ou parte de seres vivos naturais e materiais biológicos encontrados na natureza, ou ainda que dela isolados, inclusive o genoma ou germoplasma de qualquer ser vivo natural e os processos biológicos naturais.

[...]

Art. 18 - Não são patenteáveis:

[...]

III - o todo ou parte dos seres vivos, exceto os microorganismos transgênicos que atendam aos três requisitos de patenteabilidade - novidade, atividade inventiva e aplicação industrial - previstos no art. 80 e que não sejam mera descoberta.

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Parágrafo único - Para os fins desta lei, microorganismos transgênicos são organismos, exceto o todo ou parte de plantas ou de animais, que expressem, mediante intervenção humana direta em sua composição genética, uma característica normalmente não alcançável pela espécie em condições naturais. (BRASIL,1996)

 

Segundo nos reporta o Estudo Comparativo dos Critérios de Patenteabilidade para Invenções Biotecnológicas em Diferentes Países do INPI, são considerados patenteáveis no Brasil:

 

[...] As composições que contenham material genético ou sequências de aminoácidos ou vírus, desde que devidamente caracterizadas como composições (ou seja, modificados em laboratório/ grifo nosso);

As composições contendo extratos, moléculas, substâncias ou misturas obtidas de ou produzidas apartir de vegetais, animais ou microrganismos encontrados na natureza, desde que devidamente caracterizadas como composições, não são consideradas como produtos biológicos naturais;

Processos de extração/ isolamento.[...] (2007, p. 15-16)

 

Não obstante o fato do Brasil não possuir uma política patenteária favorável ao fomento de Biotecnologias, o país possui um expressivo potencial científico e mesmo que deficiente em seus recursos de proteção intelectual aos inventos biotecnológicos nacionais, é viável que o país possa desenvolver se bem observadas e direcionadas a gestão dos recursos de proteção patenteária  já existentes. 

 

 

3.2 Contexto Internacional

 

 

As regulamentações observadas no panorama mundial no que tange ao licenciamento da patente biotecnológica demonstram que em diversos países é possível o patenteamento de material biológico “vida”, mas o que também se observa é que em alguns países ainda existe uma resistência à aceitação da patente biotecnológica por motivos de ordem ética, moral e até legal vigente.

Desse modo, para iniciarmos a análise do contexto internacional no âmbito de aceitação da patente biotecnológica e para que se verifiquem alguns aspectos característicos do sistema patenteário exterior, elencamos alguns países como Japão, Estados Unidos e União Europeia.

            Delinearemos uma perspectiva do contexto japonês acerca do patenteamento de biotecnologias por meio do referencial Estudo Comparativo dos Critérios de Patenteabilidade para Invenções Biotecnológicas em Diferentes Países.

            Nessa perspectiva percebe-se que há muitos anos o Japão vem buscando políticas de gestão pública, objetivando se caracterizar como potência mundial em diversos aspectos, essencialmente no que concerne à liderança científica internacional, para essa liderança se materialize o governo tem realizado investimentos no setor Biotecnológico.

A regulamentação da patente biotecnológica japonesa é feita por meio da Legislação Japonesa Relacionada à Propriedade Industrial, de 2004, e pelo Guia de Exames de Patentes e de Modelo de Utilidade.

É necessário destacar que em ambas regulamentações não existem muitas diligências acerca do patenteamento de material biológico, a não ser pela caracterização de métodos para tratamento no corpo humano por meio de cirurgias ou terapias, bem como métodos de diagnósticos médicos como matérias não patenteáveis.

            Os Estados Unidos possuem em suas bases um forte sistema patenteário gerado pelo alto índice de qualificação do potencial científico nacional e este fato não seria diferente no que tange às patentes em biotecnologia, uma vez que os Estados Unidos têm se destacado na produção e difusão de biotecnologias para todo o mundo.

Segundo o Estudo Comparativo dos Critérios de Patenteabilidade para Invenções Biotecnológicas em Diferentes Países, nos Estados Unidos a matéria patente biotecnológica é assim regulada em âmbito legal:

 

A atual base legal americana é constituída (a) pelo estatuto 35 USC, ou seja, o título 35 do Código dos Estados Unidos – United States Code Title 35 (USA, 2007a); (b) pelas regras: 37 CFR., ou seja, o título 37 do Código Federal das Regras de Patentes, Marcas e Direitos Autorais, que regula o escritório americano de patentes – United States Code Title 37 (USA , 2007b) e (c) pelos casos legais julgados pela corte americana através da interpretação da lei americana. Os detalhes de como uma patente deve ser examinada nos EUA estão no Manual de procedimento de exame de patente – Manual of Patent Examining Procedure (USPTO, 2006a). (2007, p. 39)

 

            O único óbice encontrado na legislação americana acerca do patenteamento de Biotecnologias é em relação à supressão do patenteamento de sequências de ácido nucléico de ocorrência natural e plantas silvestres.

A União Europeia se destaca no âmbito da politica patenteária de biotecnologias por alocar um grande número de empresas produtoras de biotecnologias. Na União Europeia observa-se a incidência da Diretiva 44/98 e da Convenção Europeia de Patentes (EPC)  para a regulação das patentes biotecnológicas.

A Diretiva 98/44/CE, de 6 de julho de 1998, promulgada pelo Parlamento Europeu, relativa à proteção jurídica das invenções biotecnológicas, dispõe de forma muito expressiva quanto os benefícios do patenteamento de biotecnologias ante o desenvolvimento e progresso gerado pelas mesmas, dispõe também sobre a necessidade de investimentos nos setores de pesquisas biotecnológicas que se materializam por meio de uma proteção jurídica eficaz.

Não obstante aos benefícios anteriormente dispostos, a Diretiva também salienta sobre as questões éticas, sobre os tratados que restringem o âmbito de abrangência da patente biotecnológica. Especificando da seguinte maneira as restrições a proteção patenteária biotecnológica:

 

Art.4- (1) Não são patenteáveis: a) As variedades vegetais e as raças animais; b) Os processos essencialmente biológicos de obtenção de vegetais ou animais.

Art.5- (1) O corpo humano, nos vários estádios da sua constituição e do seu desenvolvimento, bem como a simples descoberta de um dos seus elementos, incluindo a sequência ou a sequência parcial de um gene, não podem constituir invenções patenteáveis.

Art.6- (2) Nos termos do disposto no n1, consideram-se não patenteáveis, nomeadamente: a) Os processos de clonagem de seres humanos; b) Os processos de modificação da identidade genética germinal do ser humano; c) As utilizações de embriões humanos para fins industriais ou comerciais; d) Os processos de modificação da identidade genética dos animais que lhes possam causar sofrimentos sem utilidade médica substancial para o Homem ou para o animal, bem como os animais obtidos por esses processos.(98/44/CE)

 

            A Convenção Europeia de Patentes (EPC) possui um caráter de unificação do sistema europeu de patentes e possui como um de seus focos a regulamentação da matéria patenteária biotecnológica, explicitando inclusive as restrições para o patenteamento da mesma como procedimentos cirúrgicos, diagnósticos entre outros. Como expõe Simon:

 

O EPC permite principalmente patentes sobre invenções gene-tecnológicas, métodos para produção de fármacos (patentes de processo) e para os próprios fármacos (patentes de produto). 

São ilícitas, todavia, as patentes sobre descobertas, Art. 52 II, procedimentos cirúrgicos, de diagnósticos e terapêuticos, Art. 52 IV, procedimentos principalmente biológicos, procriação de plantas  e animais, e tipos de plantas e espécies de animais, Art.53. (2005, p. 473)

 

O sistema patenteário internacional constitui-se assim de politicas com características bem definidas, especialmente no que tange a delimitação do âmbito de abrangência da proteção intelectual de biotecnologias.

Na dinâmica de restrição do patenteamento de específicos materiais biológicos nos países estudados observa-se a incidência do crivo ético, objetivando um progresso idôneo quanto às bases morais e politicas.

 

 

4 CRITÉRIOS DE PATENTEABILIDADE: O QUE É DESCOBERTA O QUE É INVENÇÃO?

 

 

Em conformidade com a Lei n. 9279/1996, os critérios necessários para obtenção da patente são:

A novidade é quando uma determinada invenção atende a um mínimo de acessibilidade quanto ao seu entendimento, sendo a mesma, desconhecida perante a sociedade e dos especialistas da área pretensa à carta-patente, inovando em todos os aspectos científicos.

A aplicação industrial é a possibilidade de se produzir e se utilizar em caráter industrial determinando invento.

A atividade inventiva, por vezes confundida com a novidade, deve conferir ao estado da técnica de determinado invento já existente mais funcionalidade, além de se constituir de uma criação peculiar advinda de uma significativa atividade intelectual.

Ademais, é necessário que o invento não se enquadre em nenhum impedimento caracterizado pelas leis nacionais para que a carta-patente seja concedida.

Quando concebemos a questão da patenteabilidade de material biológico, estamos negligenciando o quesito da atividade inventiva ou estamos caracterizando descoberta como invenção?

Não se pode olvidar que os maiores conflitos no âmbito de aceitação da patente biotecnológica, mais especificamente da patente de material biológico, se dão pela perspectiva de que muitos cientistas corroboram da consideração do fato de se detectar ou descobrir determinado material biológico como uma invenção, ato tal que é contrário a ética e os valores morais da sociedade, pois ali não incidem uma estrutura de interferência intelectual  de modo a obtenção uma invenção, não sendo legitima  a pretensão de se patentear a matéria descoberta.

Desse modo, o que delimitará a existência da invenção é a constatação da manipulação do material biológico gerando um novo organismo (substância, proteína, entre outros) evidenciando a interferência humana e intelectual para que o novo organismo possa existir, caracterizando o objeto pretenso à patente no critério da atividade inventiva.

Por fim, é necessário frisar que diante do exposto consideramos que dever-se-iam as solicitações de patenteamento atender de forma restrita ao caráter  técnico da atividade inventiva gerando uma blindagem eficaz contra a proteção intelectual ilegítima de material biológico natural.  

 

 

5. FUNÇÃO SOCIAL DA PATENTE

 

 

            A função social é prevista em nosso ordenamento pela Constituição da República de 1988:

 

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

XXII - é garantido o direito de propriedade;

XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;

[...]

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

[...]

II - propriedade privada;

III - função social da propriedade; (BRASIL,1988)

 

No que obsta ao texto constitucional observamos que o direito de propriedade assim como a expressa recomendação do cumprimento da função social estão diretamente ligados ao fomento de uma vida digna à sociedade.

E, ainda, nessa perspectiva aferimos que a definição de propriedade segundo o crivo da função social está direcionada ao atendimento das demandas da sociedade e a um mínimo produtivo em concordância com a área afeta a mesma, sendo estes preceitos uma obrigação do proprietário para com a sociedade.

Portanto, podemos considerar a função social como um entrave ao uso negligenciado da propriedade, que por meio de normas constitucionais objetiva que a propriedade seja legitimamente útil atendendo ao proprietário e a sociedade.

Na Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969 assim como nas disposições nacionais vislumbramos uma determinação concernente à função social, que discorre sobre a propriedade como meio de proporcionar bem-estar social suprindo  as demandas da sociedade nos mais diversos âmbitos, ademais essa determinação impõe sanções ao descumprimento da função social subordinando o uso e o gozo dos bens da propriedade privada ao atendimento das demandas de direito fundamental.

Por fim, concluímos que a função da propriedade é direito fundamental que deve ser assegurado pelo judiciário por meio da fiscalização do cumprimento da função social segundo os preceitos constitucionais e se necessário aplicando sansões cabíveis ao descumprimento dos parâmetros da mesma.

No âmbito das patentes biotecnológicas o preceito da função social é essencial uma vez que, os inventos biotecnológicos se constituem de grande importância para a humanidade devendo servir de base para um progresso pautado nos valores de uma sociedade idônea. 

 

 

6 QUESTÕES ÉTICAS ACERCA DO PATENTEAMENTO DE BIOTECNOLOGIAS

 

 

Em âmbito mundial vislumbra-se um panorama desenvolvimentista no fomento de biotecnologias cada vez mais expressivo desencadeando um excesso de demandas com a finalidade do patenteamento de biotecnologias. Contudo, a proteção patenteária no que tange as biotecnologias tem se caracterizado como protagonista de sérios conflitos em âmbito ético, moral e ideológico.

Os conflitos éticos e ideológicos a cerca da patente biotecnológica é na sua maioria ocasionada pela discordância e receio acerca da monopolização dos inventos biotecnológicos.

 E nesse sentido, a conscientização da premente necessidade de regulamentação e a conseqüente implementação de legislação adequada terá como papel quebrar paradigmas e preconceitos do senso comum pelo fato da população acreditar que a patente cria um monopólio quanto à atividade patenteada, mas como Bruno Torquato Naves especifica:

 

É bom entender que patentear não implica em apropriação, mas em um direito de excluir que outros explorem comercialmente a aplicação de determinada invenção. A patente divulga o conhecimento, tornando-o público. Assim, várias novas técnicas podem ser desenvolvidas a partir dessa divulgação (2010, p. 2)

 

O uso ético, pertinente e normatizado das patentes constitui grande ferramenta de desenvolvimento biotecnológico para o Brasil.

            Com a Declaração Universal da UNESCO e a Lei de Biossegurança, temos esperança de que as pesquisas científicas que estão sendo desenvolvidas possam contar com o aprimoramento dos ditames jurídicos em vigor. E que, sejam reguladas por uma lei que garanta a segurança dos métodos de aplicação dessas de modo com que os recursos fomentados objetivem uma menor discriminação de classes e uma maior acessibilidade aos cidadãos aos seus benefícios, utilizando de forma benéfica e ética os direitos de propriedade intelectual para a Biotecnologia.

 

 

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

 

Por fim devemos ponderar que o fomento de biotecnologias a sociedade é realizado desde os primórdios da humanidade na produção de alimentos, medicamentos e recentemente na manipulação genética, fomentando a produção de inventos salutares para a sociedade. A saúde humana vem se tornando um objeto da biotecnologia e, ante os inventos, é papel do Direito regular e inovar sempre em observância aos preceitos éticos. Neste âmbito, Bruno Hammes cita: “O progresso técnico trouxe perspectivas grandiosas a progredir sem nos libertar dos desafios que as acompanham. Somos chamados a progredir e a desenvolver soluções.” (2002, p.138)

Contudo, para que se possibilite a progresso ao fomento de biotecnologias vislumbramos a premente necessidade de proteção para os inventos que dela derivem, haja vista que, para a produção da biotecnologia são essenciais investimentos financeiros e profissionais qualificados das quais somente se é viabilizado com a proteção dos direitos de propriedade intelectual salutares para alavancar o desenvolvimento biotecnológico nacional.

Não podemos olvidar, que se constitui tendência internacional a permissibilidade quanto o patenteamento de biotecnologias utilizando-se de um cunho de maleabilidade ou elasticidade na análise dos requisitos necessários para obtenção da proteção seja ela intelectual ou patenteária, das biotecnologias de modo a enquadrá-las nos critérios necessários promovendo para a biotecnologia a salvaguarda de todas as beneficies que o sistema propriedade intelectual promove, dentre elas o incentivo financeiro para a pesquisa e promoção de novas biotecnologias.

Analisando essas descobertas científicas por uma perspectiva econômica, podemos aferir que o mercado econômico mundial apresenta um panorama favorável ao fomento dos recursos necessários à pesquisa biotecnológica, acirrando uma forte concorrência em âmbito industrial. Não obstante o momento economicamente favorável pelo qual a pesquisa biotecnológica situa-se, observa-se que em locais onde não existem um sistema de proteção intelectual há um menor grau de desenvolvimento, despertando para a necessidade do desenvolvimento de políticas de proteção dos direitos intelectuais, de modo com que não ocorra uma estagnação e dependência de países menos desenvolvidos a recursos médicos e biotecnológicos estrangeiros.

Com os inúmeros avanços nas pesquisas científicas deve-se estabelecer não somente critérios de restrição, como a análise das reais necessidades humanas, e nesse sentido o patenteamento de biotecnologias não deve se fundamentar pela simples busca ao progresso científico, mas essencialmente pelos benefícios concernentes ao desenvolvimento do potencial nacional criativo e empreendedor e prospecção da demanda tecnológica, gerando crescimento e desenvolvimento.

 

 

REFERÊNCIAS

 

 

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[1] Em tradução livre: “Acordo Comercial sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual”.

Sobre os autores
Bruno Torquato de Oliveira Naves

Doutor (2007) e Mestre (2003) em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas); graduado em Direito (2000) pela PUC Minas. É Professor do Mestrado em Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável da Escola Superior Dom Helder Câmara; Professor Adjunto IV na PUC Minas, membro e pesquisador do CEBID - Centro de Estudos em Biodireito; autor de livros, capítulos e artigos de Direito Civil, Direito Ambiental, Bioética e Biodireito.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GOIATÁ, Sarah Rêgo; NAVES, Bruno Torquato Oliveira. Patentes em biotecnologia.: Patentear vida ou objetivar o uso positivo da patente na política de desenvolvimento da Biotecnologia. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4459, 16 set. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/33625. Acesso em: 22 dez. 2024.

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Financiamento: PROBIC/PUC Minas.

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