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Da possibilidade do Ministério Público aditar a queixa para incluir co-réu ou partícipe excluído pelo querelante.

Natureza jurídica da sua intervenção nos casos do artigo 48 do CPP. Princípio da indivisibilidade da ação penal privada

Agenda 01/11/2002 às 00:00

Sem dúvida nenhuma, a atual ordem constitucional do país conferiu ao Ministério Público prerrogativas que ao longo dos anos vinham sendo perquiridas, sobretudo em se tratando de um Código de Processo Penal vetusto, que veio adquirindo sobrevida mercê das várias legislações extravagantes, que, apesar de insuficientes, deram contornos diferentes ao referido Estatuto, mormente nos delineamentos da Ação Penal.

Nesse contexto, somos favoráveis ao pensamento do Ilustre Professor Sérgio Demoro Hamilton , para quem diante da nova Carta Política, e , em especial relevo ao seu artigo 129 , I , vários dispositivos processuais penais restam superados, com especial destaque aos concernentes ao arcabouço da Ação Penal Pública, onde, por exemplo a figura do assistente deixou de existir nas Ações penais Públicas, e outras interpretações, como a do artigo 29 do Estatuto Processual Penal de péssima redação, revela-se impreciso, situação que não faz parte do estudo em comento.

O que nos interessa na presente resenha é, de uma forma rápida, trazer a discussão sobre a possibilidade de Ministério Público, na conjugação dos artigos 48 e 45 do Código de Processo Penal, aditar a queixa para incluir co-autor ou partícipe do crime excluído pelo querelante. Antes de tecer comentários sobre a discussão doutrinária acerca do tema, antecipamo-nos de forma árdega , mas modesta, para asseverar que não.

Se o artigo 5º , LIX da Constituição Federal erigiu à categoria de Direito Fundamental a possibilidade de queixa subsidiária, insofismável se torna discorrer que a Ação Penal Exclusivamente Privada permanece íntegra ao talante de quem tenha qualidade para intentá-la, situação que encontramos ressonância nos artigo 30 e 31 do Código de Processo Penal.

Assim , evidentemente , diante de uma interpretação sistemática e teleológica do nosso ordenamento jurídico , percebemos significativas diferenças que norteiam os Princípios da Ação Penal Pública e os da Ação Privada, enfatizando, sem dúvida , que a maior delas é no que tange a sua indivisibilidade, que afeta diretamente a possibilidade da provocação da jurisdição penal.

Nas primeiras, malgrado o próprio Supremo Tribunal Federal entender que não lhe alcança, em face da não ocorrência da preclusão a doutrina pacificamente entende que tal princípio tem sua gênese no Princípio da Obrigatoriedade da referida Ação, situação que não se mostra forçosa reconhecer, lógico que quando há inércia do Promotor de Justiça em incluir na denúncia eventuais co-réus e partícipes, não quando em vista de autos de inquérito policial ou outras peças de informação verifique categoricamente a sua não participação, e, ainda assim, a lei lhe confere a possibilidade de aditamento até a sentença final, ex vi do artigo 569 do Diploma Processual.

Entretanto, na segunda hipótese de Ação a indivisibilidade se mostra mais densa, a lei entregou ao alvedrio do ofendido a conveniência e oportunidade da propositura da ação, ou seja, ao contrário do Princípio da Obrigatoriedade que rege a Ação Pública, na Ação Penal Privada, mesmo diante da constatação da materialidade e autoria do delito, pode o ofendido deixar de provocar a persecução penal em juízo. Mas tratando-se de vários réus a queixa em face de um a todos aproveitará, e como conseqüência, a renúncia em favor de um a todos estender-se-á, conforme inteligência dos artigos 48 e 49 da Lei em comento.

Entretanto, a possibilidade de o Ministério Público aditar toda e qualquer Ação privativa do ofendido e ato contínuo intervir em todos os seus termos (artigo 45 CPP) e o poder-dever de zelar pela sua indivisibilidade (artigo 48, segunda parte, CPP) fez surgir na Doutrina a discussão a respeito da possibilidade de aditamento da referida queixa, por parte do Ministério Público , para incluir eventual co-réu ou partícipe excluído pelo Querelante. Os professores Weber Martins Batista, Fernando Tourinho, Tornaghi, Sérgio Demoro Hamilton, Afrânio Silva Jardim e outros sustentam tal possibilidade, dentro do prazo do artigo 46, § 2º, entendo que neste caso estaria o parquet velando pela indivisibilidade da Ação Penal, obedecendo ao comando do artigo 48, CPP, situação já admitida também pelo nosso STF. Contra , os professores Damásio de Jesus, Júlio Fabrinni Mirabette e Paulo César Pinheiro Carneiro e Dante Busana, tendo como principal argumento o fato de que nestes casos o Ministério Público assume posição de assistente do ofendido e que a não inclusão de co-réu ou partícipe eqüivale a renúncia tácita. Damásio cita que em momento algum os artigos 45, 46 § 2 e 48 do CPP autorizam tal prerrogativa. Sustenta o mestre que,"se a Ação Penal Privada só pode ter início em face da vontade do ofendido, seria estranho que o Ministério Público, titular apenas da Ação Penal Pública, pudesse intervir contra a vontade daquele, violando os princípios da oportunidade e disponibilidade" ( Código de Processo Penal Anotado/Damásio de Jesus. - 14 ed. - São Paulo : Saraiva, 1998, pág 53). Há orientações de que o artigo 49 só tem aplicação, quando o fendido , ao oferecer a queixa, declara expressamente que está renunciando em relação a alguns dos partícipes do crime.

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Na verdade duas situações devem ser abordadas: a primeira é que verificada a co-autoria ou participação em crimes de Ação Penal Privada, a não inclusão de um ou outro já obsta o prosseguimento Ação Penal por ofensa ao Princípio da Indivisibilidade, a não ser nos casos em que se encontre dentro do prazo decadencial, cuja eventual omissão pode ser suprida. Em outros casos, havendo ou não renúncia expressa, a persecução penal resta contaminada.

A outra situação é a de que dentre aqueles que se filiam a segunda corrente acima exposta, pecam os que conferem ao Ministério Público o status de Assistente do Ofendido, posição que, s.m.j, não se mostra vislumbrada pelo nosso ordenamento jurídico, sobretudo por se tratar o Ministério Público de defensor de interesses públicos, o que mostrar-se-ia incoerente se figurasse como assistente de ofendido em Ação Penal Privada.

Assim é que, tanto quando adita a Ação exclusiva do ofendido, nos termos do artigo 45 do CPP, como quando vela pela sua indivisibilidade (artigo 48), está o Ministério Público exercendo tão somente a função de custos legis no processo, ou seja, de verdadeiro fiscal da lei. É preciso interpretar o artigo 45 em comento , no sentido de que aditar, realmente, significa incluir o que se mostra omisso, visto que o interesse público que se busca, por exemplo, é a não condenação de um réu supostamente inocente e, dentro dessa seara, que o princípio da indisponibilidade da referida Ação não fique prejudicado. Aditar aqui, significa incluir algum fato omitido na queixa, como circunstâncias qualificadoras ou genéricas, zelar pela legitimidade das partes, pela observância dos prazos, incluir elementos coligidos a vista de inquérito policial omitida na peça vestibular, etc.., mas nunca incluir co-réu ou partícipe.

Verificando o Promotor de Justiça, categoricamente, a participação ou co-autoria, e a sua omissão por parte do querelante, deve ele se valer de duas possibilidades: estando transcorrendo ainda o prazo de seis meses, contados da data em que o ofendido veio saber quem é o autor ou autores do delito, deve requerer ao juiz vista ao mesmo afim de que demonstre interesse em incluí-los ou não, sendo afirmativa a resposta do ofendido prossegue-se a Ação Penal, sendo negativa, tranca-se. Comportando eventual recurso do ofendido em caso de rejeição da inclusão de co-réu por parte do juiz, com pronunciamento posterior do Ministério Público após a resposta do réu; num segundo caso, transcorrido o lapso de seis meses, deve o Promotor requerer o trancamento da Ação Penal, obviamente por se tratar de renúncia tácita.

Importante acrescentar que pode o ofendido omitir co-réu ou partícipe, sob o argumento de que os mesmos não participaram da empreitada delituosa ou de que não se trata de participação ou co-autoria. Aqui também cabe ao Promotor, ao compulsar os autos, e , constatado o equívoco do ofendido , adotar as providências acima expostas, cabendo ao juiz decidir. Destaco, de novo, o Ministério Público no caso em tela é fiscal da lei, não é parte nem assistente.

Por fim, mister esclarecer que o aditamento aqui exposto, não encontra simbiose com o aditamento da queixa subsidiária da Ação Penal Pública, insculpida no malfadado artigo 29 do nosso Código de Processo Penal. Neste caso, a Ação jamais perde sua essência pública, aliás Promotor de Justiça inerte que adita queixa subsidiária mereceria repúdio por parte do Procurador Geral de Justiça. Aqui, no aditamento, o Ministério Público é parte legítima , independente de negligência do "querelante", como faz supor o citado artigo. Devemos interpretar o dispositivo de forma a creditar ao substituto a posição de garantidor do Princípio da Obrigatoriedade, eis que Pública a Ação e como conseqüência verdadeiro substituto processual, quedando-se inerte o Ministério Público.

Mas a inércia do Promotor é a falta de sua manifestação, o que não ocorre com a não propositura da Ação no prazo legal, por motivos outros , de forma fundamentada, como quer fazer de forma pouco técnica, o artigo 29 da referida lei.

Mas, uma vez aditando a referida queixa, dizer que o Ministério Público exerce função de fiscal da lei se configura uma verdadeira falácia. Aqui a Ação não é privativa do ofendido, tampouco se torna em face da inércia Ministerial. O promotor retoma sua posição de parte, formando um verdadeiro litisconsórcio ativo como o querelante e, neste caso, inexoravelmente, pode aditar a queixa substitutiva para incluir co-réu ou partícipe excluído pelo querelante substituto, assim deve ser interpretada a norma. Ostentará, então, o estado de parte principal em caso de negligência do ofendido, desfazendo - se o litisconsórcio.

Esta é o nosso modesto entendimento, sob censura, que espera ao menos chamar a ordem o debate, por amor ao tema.

Sobre o autor
Antônio Olegário Gomes Neto

bacharel em Direito, técnico judiciário do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GOMES NETO, Antônio Olegário. Da possibilidade do Ministério Público aditar a queixa para incluir co-réu ou partícipe excluído pelo querelante.: Natureza jurídica da sua intervenção nos casos do artigo 48 do CPP. Princípio da indivisibilidade da ação penal privada. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 60, 1 nov. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3419. Acesso em: 22 dez. 2024.

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