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Contratações públicas: princípio da isonomia versus privilégio das microempresas e empresas de pequeno porte

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Agenda 01/12/2014 às 10:29

O Principio Constitucional da Isonomia é atendido nas contratações públicas, especificamente frente a Lei Complementar nº 123/06, quando do tratamento diferenciado e simplificado no certame licitatório.

RESUMO: O cerne do presente trabalho monográfico é dispor sobre o princípio da isonomia nas contratações públicas, especificamente frente a Lei Complementar nº 123/06. Nesse aspecto, foi analisado o tratamento diferenciado concedido às microempresas e empresas de pequeno porte no certame licitatório, visando uma igualdade de condições para uma futura contratação pública. A base edificante deste estudo tem como ideia central o disposto no artigo 170, inciso IX e no artigo 179 da Constituição Federal de 1988, que estrutura a ordem econômica do país e serve de alicerce para a incidência do tratamento especial dispensado às micro e pequenas empresas, representadas atualmente como eixos estruturantes da economia brasileira. Assim sendo, a garantia do princípio da igualdade foi examinado frente às aquisições públicas com relação à Lei Geral de Licitações e Contratos Administrativos e o Estatuto das Micro e Pequenas Empresas. Ainda foi retratada a ideia insculpida no artigo 3º da Lei nº 8.666/93, bem como no artigo 47 da Lei Complementar nº 123/06, acerca do desenvolvimento nacional sustentável. Desta maneira, às microempresas e empresas de pequeno porte necessitariam de benefícios capazes de, por si só, garantir uma concorrência isonômica em relação às empresas de grande porte, igualando-as em suas desigualdades. Portanto, este preceito constitucional edifica-se como fonte suprema para a aplicabilidade destas prerrogativas especiais, na medida em que a Carta Magna estabelece garantias viabilizadoras de um tratamento diferenciado aos licitantes que se encontrem em situação desfavorecida. Não seria diferente com às micro e pequenas empresas que se amparam desses benefícios legais para conseguirem disputar em nível de igualdade com empresas de porte elevado, ratificando o ideal previsto na Lei Complementar nº 123/06.

Palavras-Chave: Contratações Públicas. Desenvolvimento nacional Sustentável. Interesse Público. Isonomia.  Microempresa e Empresa de pequeno porte.

ABSTRACT: The main core of this monographic material is to discuss the principle of equality in public procurement, specifically in what concerns the Supplementary Law No 123/06. In this case, it will analyze the differential treatment granted to micro and small businesses in the bidding process, in order to achieve equal conditions for future public procurement. The edification  based on the Article 170, subsection IX, and Article 179 of the Brazilian Federal Constitution of 1988, which structure the country’s economic order and function as the foundation for the incidence of the special treatment given to micro and small enterprises, both represented, currently, as the basis of the Brazilian economy. Therefore, this is a study about the guarantee of the principle of equality before the public acquisitions regulated by the Supplementary Law No 123/06, providing further information about the social function of the General Procurement Law and the Statute of Micro and Small Enterprises, as well as the idea inscribed on the Article 3 of the Law No 8.666/93 and the Article 47 of the Supplementary Law No 123/06, on national sustainable development. This way, micro and small businesses would need benefits capable of, by itself, guarantee an isonomic competition with the big companies, giving them equal conditions, despite their economic inequalities. Thus, the Constitution consolidates as the supreme source of the applicability of these special prerogatives, as it guarantees an isonomic treatment to all those who find themselves in a disadvantageous condition, and these benefits spreads to micro and small businesses, which are supported by them in order to compete on equal terms with large-sized companies, fulfilling thereby the principle found on the Supplementary Law No 123/06.  

Keywords: Public Contracting. National Sustainable Development. Public Interest. Equality. Microenterprise and Small Business.

SUMÁRIO: 1.INTRODUÇÃO2.LEI DE LICITAÇÕES PÚBLICAS E SEUS FINS. 2.1.Aspecto Histórico. 2.2.Licitação: Conceito e Preceito Legal. 2.3.Finalidades do Procedimento Licitatório. 3.ASPECTOS ESTRUTURAIS DA LICITAÇÃO PÚBLICA. 3.1. Diferenças entre Princípios e Regras..3.2. Princípios da Administração Pública.3.3. Princípios Norteadores do Processo de Licitação.3.4. Modalidades de Licitação.3.4.1. Concorrência. 3.4.2. Tomada de Preços. 3.4.3. Convite. 3.4.4. Concurso.3.4.5. Consulta..3.4.6. Leilão..3.4.7. Pregão.3.5. Dispensa e Inexigibilidade. 3.6. Fases do Procedimento Licitatório.3.6.1. Edital.3.6.2. Habilitação.3.6.3. Classificação.3.6.4. Homologação.3.6.5. Adjudicação.4.  O TRATAMENTO PRIVILEGIADO ÀS MICROEMPRESAS E EMPRESAS DE PEQUENO PORTE NAS CONTRATAÇÕES PÚBLICAS.4.1. Contratações Públicas e a Lei Complementar nº 123/06.4.2. Função Social das Contratações Públicas na Lei Complementar nº 123/06.4.3. O Desenvolvimento Nacional Sustentável como fonte legal para as aquisições públicas.5. O PRINCÍPIO DA ISONOMIA FRENTE À LEI Nº 123/06.5.1. Breve análise sobre o Princípio Constitucional da Isonomia.5.2. Definição e Distinção entre Microempresa e Empresa de Pequeno Porte.5.3. Caráter Privilegiado concedido às Microempresas e Empresa de Pequeno Porte.5.4. Peculiaridades no andamento licitatório concedido às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte.5.5. O Princípio da Isonomia frente à Lei Complementar nº 123/06.6. CONCLUSÃO.REFERÊNCIAS.


1.   INTRODUÇÃO

O presente trabalho versa sobre o princípio constitucional da isonomia frente ao caráter privilegiado dispensado às microempresas e empresas de pequeno porte nas contratações públicas, face ao que dispõe a Lei Complementar nº 123/06 (BRASIL, 2006), a Lei Geral das Licitações Públicas e Contratos Administrativos, Lei nº 8.666/93 (BRASIL, 1993), e o texto Constitucional de 1988 (BRASIL, 1988).

Dentro desta temática, busca-se esclarecer acerca da análise do princípio da isonomia frente à Lei Complementar nº 123/06 (BRASIL, 2006), especificamente com relação ao andamento licitatório diferenciado concedido às micro e pequenas empresas, para uma contratação pública eficaz.

Para essa abordagem, inicia-se esclarecendo o arcabouço histórico da licitação, de forma a apontar acerca do avanço significativo que alicerçou o procedimento licitatório ao longo dos anos. A seguir, apresenta-se o conceito e preceito legal estruturante do procedimento licitatório, bem como as finalidades precípuas que condicionam a sua aplicabilidade.

No Capítulo inaugural, enumeram-se os aspectos estruturais da licitação, a distinção entre os princípios e as regras. Observa-se ainda, o delineamento dos princípios estruturadores da administração pública, tanto os explícitos, dispostos no caput do art. 37 da  Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – CRFB (BRASIL, 1988), quanto aqueles implícitos, que foram destrinchados como forma de apontar o embasamento do procedimento licitatório. Além disso, especificaram-se as modalidades procedimentais em conjunto com as hipóteses de dispensa e inexigibilidade, bem como as fases que compõe o procedimento previsto na Lei Geral das Licitações Públicas e Contratos Administrativos (BRASIL, 1993).

No Capítulo subsequente, procurou-se enfatizar o caráter privilegiado concedido às microempresas e as empresas de pequeno porte nas contratações públicas, de maneira a apontar o embasamento constitucional e infra legal que condiciona a incidência do tratamento diferenciado, inclusive ressalta a ideia da função social nas aquisições públicas com relação à Lei Geral das Licitações (BRASIL, 1993) e a Lei Complementar nº 123/06 (BRASIL, 2006), ao fim, retrata a ideia insculpida no artigo 3º da Lei nº 8.666/93 (BRASIL, 1993), bem como no artigo 47 da Lei Complementar nº 123/06 (BRASIL, 2006), acerca do desenvolvimento nacional sustentável como fonte legal para as aquisições públicas.

Em continuidade, o Capítulo 4 é introduzido apontando como enfoque principal o princípio constitucional da isonomia frente à Lei Complementar nº 123/06 (BRASIL, 2006), de início, faz-se uma breve análise do princípio ora em destaque, no que concerne ao tratamento privilegiado, especificamente nas licitações públicas. Discorre ainda, sobre a definição e distinção entre o que seria microempresa e empresa de pequeno porte. Em seguida, trata-se do caráter diferenciado concedido às MEs e EPPs (microempresas e empresas de pequeno porte), com ênfase no tratamento especial dispensado as mesmas. Em seguida, aponta as peculiaridades transcritas no texto legal no andamento licitatório dispensado às microempresas e empresas de pequeno porte. Finalizando, expõe acerca do princípio da isonomia e a correta aplicação da Lei Complementar nº 123/06 (BRASIL, 2006) frente as aquisições públicas.

No presente material monográfico foram levantados os seguintes aspectos: a) O tratamento favorecido dispensado às microempresa e empresa de pequeno porte frente ao princípio constitucional da isonomia nas aquisições públicas; b) A observância do princípio da isonomia na Lei Complementar nº 123/06 (BRASIL, 2006).

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Quanto ao aspecto metodológico, utilizou-se para a confecção deste trabalho o método de abordagem dedutivo, em que foram indexados objetivos, ou seja, deduções acerca do assunto, para, consequentemente, obter-se uma resposta. Seguindo uma sequência lógica e coerente, conjuntamente, também se empregou o método qualitativo, quanto aos objetivos, diante da possibilidade de oferecer um maior detalhamento do caráter privilegiado dispensado às micro e pequenas empresas nas contratações públicas, empregando-se, concomitantemente, análise de material doutrinário, legislação, constituição e jurisprudências, de modo a fundamentar a presente Monografia. Assim, acredita-se que o entendimento sistematizado referendado pelos doutrinadores, bem como das Cortes Superiores acerca do tema proporcionará uma melhor compreensão e validade ao estudo monográfico.


2.LEI DE LICITAÇÕES PÚBLICAS E SEUS FINS

2.1.  Aspecto Histórico da Licitação

 De início, será conveniente esclarecer qual a origem do termo “licitação”, de onde ele vem e qual o seu real significado. Tal palavra deriva do latim “lacitatione” e tem como significação “arrematar em leilão”.

Inúmeros relatos históricos apontam que a licitação teve origem na Europa Medieval. A base fomentadora vem da razão da necessidade de aquisição de material, obra, serviço, cuja administração pública não tinha tais elementos, e o fazia através de contratações privadas, com a divulgação de avisos que informavam acerca do serviço a ser adquirido.

A posteriori eram publicados avisos informando aos interessados que apresentassem suas propostas ao Estado que tinha determinadas regras a serem previamente estabelecidas, através do sistema denominado “vela e pregão”, que tinha início através do instrumento convocatório, na hora e local preestabelecido, identificando-se, desde a Idade Média, o princípio da publicidade.

Com relação ao tal sistema “vela e pregão”, assim preleciona Meirelles (2012, p. 27):

[...] nos estados medievais da Europa usou-se o sistema denominado “vela e pregão”, que consistia em apregoar-se a obra desejada, e, enquanto ardia uma vela os construtores interessados faziam sua oferta. Quando extinguia a chama adjudicava-se a obra a quem houvesse oferecido o melhor preço. Reminiscência desse sistema medieval é a modalidade de licitação italiana denominada “estinzione di candela vergine”, em que as ofertas são feitas verbalmente enquanto se acendem três velas, um após a outra. Extinta a última sem nenhum lance, a licitação é declarada deserta; caso contrário acende-se uma quarta vela e assim sucessivamente, pois, para que possa adjudicar o objeto do certame, é obrigatório que uma vela tenha ardido por inteiro sem nenhum lance superior precedente.

No Brasil, o sistema licitatório passou por inúmeras transformações, de modo a ocasionar uma desenvoltura da máquina pública. As licitações já eram utilizadas em larga escala para compras e alienações de bens e serviços, antes mesmo da promulgação da Constituição Federal de 1988, porém, foram com o surgimento de Leis, Decretos, Resoluções e com novas Constituições que houve o aprimoramento do instrumento procedimental em análise.

O seu primeiro registro se deu com o Decreto nº 2.926/1862 (BRASIL, 1862) que regulamentou as contratações de serviços do antigo Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, estruturando-se dentro do âmbito federal com o Decreto nº 4.532/1922 e sendo sistematizado pelo Decreto nº 200/1962 que disciplinou a reforma administrativa na seara federal, expandindo-se posteriormente às administrações estaduais e municipais. Ao longo dos anos, inúmeras foram as regulamentações existentes acerca do assunto, passando por um processo de estruturação, para que assim suprisse as inúmeras lacunas existentes, bem como a redução de interpretações diversas acerca do mesmo ponto, surgindo assim o Decreto-Lei nº 2.300/86 (BRASIL, 1986), reestruturado em 1987 pelos Decretos-Lei nº 2.348 (BRASIL, 1987) e 2.360 (BRASIL, 1987), criando o Estatuto das Licitações e Contratos Administrativos.

Com a promulgação da Constituição de 1988 (BRASIL, 1988) novos rumos foram dados a Administração Pública, atribuindo a Licitação um alicerce constitucional, ou seja, impondo a obrigatoriedade do Estado a utilizar o processo licitatório como única forma de contratação, em regra, tendo como base, todos os preceitos legais ali impostos, constituindo crime a sua inobservância tanto no âmbito da administração direta quanto da indireta.

Em 1993, com o surgimento da Lei 8.666/93 (BRASIL, 1993), é que houve a devida regulamentação do procedimento licitatório, apontando aspectos processuais e procedimentais a serem aplicados indistintamente em todas as esferas e entes da Administração Pública. Através desse entendimento, percebe-se que o sistema licitatório veio se aprimorando consideravelmente ao longo dos anos, de maneira a garantir um maior respeito aos gastos públicos porventura realizados.

2.2. Licitação: Conceito e Preceito Legal

Saliente-se que cada doutrinador interpreta o conceito de licitação de maneira peculiar. Alguns apresentam de forma mais sucinta, outros preferem destrinchar mais palavras para definir o real conceito do que seria licitação e qual a sua finalidade, ao fim, observa-se que todos apenas buscam apresentar a real amplitude do que seria o procedimento licitatório. No posicionamento de Meirelles (2010, p. 54):

Licitação é o procedimento administrativo mediante o qual a Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa para o contrato de seu interesse, inclusive o da promoção do desenvolvimento econômico sustentável e fortalecimento de cadeias produtivas de bens e serviços domésticos. Como procedimento, desenvolve-se através de uma sucessão ordenada de atos vinculantes para a Administração e para os licitantes, o que propicia igual oportunidade a todos os interessados e atua como fator de eficiência e moralidade nos negócios administrativos. Tem como pressuposto a competição.

Diante do exposto, Meirelles (2010, p. 273) abarca a ideia de que o intuito do procedimento licitatório é selecionar a proposta mais benéfica a Administração Pública, para a aquisição de bens e serviços, através de uma sadia competição, sempre respeitando os ditames legais impostos.

Acompanhando os regramentos elencados pelo referido doutrinador, Gasparini (2011, p. 529) apresenta a presente ideia que a seleção das propostas segue os parâmetros objetivos dispostos no instrumento convocatório, uma vez que, o presente edital é rotulado como lei interna das licitações e contratações públicas.

Por sua vez, a conceituação abordada por Di Pietro (2012, p. 34) afirma que:

[...] licitação é o procedimento administrativo pelo qual um ente público, no exercício da função administrativa, abre todos os interessados, que se sujeitam as condições fixadas no instrumento convocatório, a possibilidade de formularem propostas dentre as quais selecionará e aceitará a mais conveniente para celebração de contrato.

Segundo Carvalho Filho (2011, p. 218), o conceito de licitação pode ser compreendido como o procedimento administrativo vinculado através do qual os entes da Administração Pública e aqueles outros por ela controlados efetivam a seleção da “melhor proposta entre as oferecidas pelos vários interessados, com dois objetivos – a celebração de contrato, ou a obtenção do melhor trabalho técnico, artístico ou científico”.

Por fim, ainda estatui sobre o tema Odete Medauar (2004, p. 213), ao esclarecer que a licitação, no ordenamento brasileiro, se caracteriza como o processo administrativo no qual a sucessão de fases e atos conduz “à indicação de quem vai celebrar contrato com a Administração”, além do que, objetiva escolher “quem vai contratar com a Administração, por oferecer proposta mais vantajosa ao interesse público. A decisão final do processo licitatório aponta o futuro contratado”.

Utilizando como escopo o referido entendimento, o termo “licitação” representa o processo formal e obrigatório a ser observado por todos os entes da Administração Pública Direta - União, Estados, Distrito Federal e Municípios -, bem como da Administração Pública Indireta - Autarquias, Fundações, Empresas Públicas e Sociedade de Economia Mista -, excetuando-se em determinados casos em que as Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista, não necessitariam realizar tal procedimento, por estarem desempenhando atividades eminentemente de direito privado, para aquisição de materiais, equipamentos, contratação de serviços, obras, alienações, concessões, permissões e locações firmadas com particulares, através de uma seleção de propostas, onde será escolhida a mais vantajosa para a Administração Pública, assegurando-se, desde o início, condições de igualdade a todos os concorrentes.

Tem-se que a obrigatoriedade do procedimento licitatório advém da impossibilidade do Poder Público escolher livremente qualquer fornecedor. Esse impedimento decorre de um conjunto de imperativos que norteiam a atividade jurídica administrativa do Estado, quais sejam a isonomia, a impessoalidade, a moralidade e a indisponibilidade do interesse público, preceituado no texto Constitucional (BRASIL, 1988) em seu art. 37, caput, “a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Munícipios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”.

Diante dos inúmeros conceitos aqui abordados acerca do procedimento licitatório, conclui-se que para o correto andamento, em todas as licitações de compras e serviços, necessário será seguir alguns critérios norteadores para um eficiente contrato administrativo, quais sejam: uma proposta vantajosa, um procedimento formal adequado, uma garantia aos princípios da ampla defesa e da isonomia, bem como da eficiência e da probidade administrativa, e por fim, o devido respeito e vinculação das partes ao instrumento convocatório e a ampla concorrência.

Respeitados esses elementos básicos norteadores, pode-se seguir com o andamento administrativo normal, uma vez que já foi garantido o devido respeito às normas estruturais, observando sempre a garantia constitucional da finalidade pública, para que assim, ocorra a consequente firmação do contrato administrativo. Tal contrato consiste basicamente em um acordo de vontade firmado entre a Administração Pública e o particular, o qual apresenta contextualização política, econômico e social, conforme preleciona Justen Filho (2010, pp. 11-12), no seguinte aspecto:

Relevância política: ‘em um Estado Democrático, os bens ou serviços dos particulares somente poderão ser obtidos mediante a observância de certos procedimentos e dentro de limites específicos’. O Estado e o particular celebram o acordo mediante consenso de ambas as partes.

Relevância econômica: o contrato com o particular representa a satisfação das necessidades do Estado – ‘revela-se como economicamente mais vantajoso que o Estado promova a contratação de particulares para o desempenho de atividades necessárias à satisfação das necessidades coletivas. Ao invés de adquirir a propriedade de bens e instrumentos necessários à execução de serviços e à satisfação de necessidades coletivas, o Estado recorre à iniciativa privada.

Relevância político econômica: “os gastos públicos são um fator essencial para a promoção do desenvolvimento econômico e social”, na consecução das políticas públicas.

Foi com a introdução da Lei ordinária nº 8.666 de Junho de 1993 (BRASIL, 1993) no ordenamento jurídico pátrio que surgiram as delineações mais eficazes acerca de todo o procedimento licitatório, uma vez que, a mesma foi edificada com o intuito de complementar o determinado pelo art. 37 da CF/88 (BRASIL, 1988). Ela surgiu para disciplinar e organizar toda a sistemática no campo da licitação pública para aquisição de bens, serviços e compras, prevendo, ainda casos em que não seria necessária a tramitação desse processo. Conforme preceitua Carvalho Filho (2011, p. 20) ao afirmar que o “Estatuto é, por assim dizer, a fonte legislativa primária disciplinadora das licitações”.

Em continuidade, oportuno será trazer à baila o conceito inaugural de licitação trazido por Silva (2010, p. 672) esclarece que “constitui um princípio instrumental de realização dos princípios da moralidade administrativa e do tratamento isonômico dos eventuais contratantes com o Poder Público”.

O intuito basilar da Lei nº 8.666/93 (BRASIL, 1993) é tornar o procedimento licitatório mais transparente e, consequentemente, escolher a proposta mais benéfica ao interesse público, propiciando, desde o nascedouro a eficácia da igualdade entre os participantes. As normas ali inseridas são gerais, via de regra, na medida em que, elencam pontos estruturais de todo e qualquer procedimento licitatório, não vindo a estabelecer diretrizes específicas para cada tipo, observa-se isso no art. 1º da 8.666/93 (BRASIL, 1993):

Art. 1o  Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

Parágrafo único.  Subordinam-se ao regime desta Lei, além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

Oportuno será delinear a noção jurídica para as chamadas normas gerais. De início, a elocução “normas gerais” é dignificada da seguinte maneira no inciso XXVII do art. 22 da Constituição Federal (BRASIL, 1988):

Art. 22 Compete privativamente à União legislar sobre:

XXVII - normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as Administrações Públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1º, III (BRASIL, 1998).

Igualmente, o art. 175 da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988) evidencia a necessidade prévia de licitação para os casos de concessões e permissões, dois nomes do direito Administrativo brasileiro, Mello e Di Pietro trazem conceitos desses institutos, conforme abaixo:

Concessão de serviço público é [...] o instituto através do qual o Estado atribui o exercício e o serviço público a alguém que aceita prestá-lo em nome próprio, por sua conta em risco, nas condições fixadas e alteráveis unilateralmente pelo Poder Público, mas sob garantia contratual de um equilíbrio econômico-financeiro, remunerando-se pela própria exploração do serviço, em geral e basicamente mediante tarifas cobradas diretamente dos usuários do serviço. (MELLO, 2010, p. 701).

Permissão, [...] em sentido amplo, designa ato administrativo unilateral, discricionário e precário, gratuito ou oneroso, pela qual a Administração Pública faculta ao particular a execução de serviço público ou utilização privativa do bem público. (DI PIETRO, 2012, p.236).

Assim sendo, após os apontamentos acima delineados, observa-se que o procedimento licitatório busca uma correta concretização dos ideais insculpidos na Carta Magna de 1988 conjugados com as leis infraconstitucionais esparsas para a ocorrência de certame eficaz e isonômico.

2.3. Finalidades do Procedimento Licitatório

Usando como base o art. 3º, caput, da Lei 8.666/93 (BRASIL, 1993), a licitação pública apresenta três finalidades, quais sejam: a observância do princípio da isonomia; a busca pela melhor proposta, estimulando a competitividade entre os concorrentes e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável, dentro dos parâmetros da Moralidade e da Probidade Administrativa, conforme segue:

Art. 3o  A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos (BRASIL, 1993).

Em continuidade, incumbe afirmar que segundo o preceituado no artigo acima transcrito, a finalidade precípua para um correto andamento licitatório eficaz depende da conjugação desses três objetivos, de maneira a viabilizar uma competição com igualdade de condições, desde que respeitado a própria competitividade entre os licitantes, para consequente desenvolvimento nacional sustentável.

Acerca da alteração do artigo ora em comento, Gasparini (2011, p. 530) afirma ser “claro que a promoção do desenvolvimento nacional, objetivo fundamental da República, encontra-se albergada no princípio do interesse público”. Em contrapartida, Meirelles (2010, p. 275) estende-se mais, abordando os fundamentos que trouxeram a inserção dessa terceira finalidade às licitações, com a seguinte ideia que o intuito de se buscar um desenvolvimento econômico sadio e eficaz para o fortalecimento da conjuntura social, gera cada vez mais o crescimento do país, na medida em que tal finalidade serve como propulsor de um incentivo maior aos aspectos ligados a pesquisa e incentivos do setor público cada vez mais eficiente, fundamenta-se tal posicionamento no art. 3º, inciso II, da Carta Magna, que insere o desenvolvimento nacional como um dos objetivos da República Brasileira, o art. 170, incisos I e VIII, que trata da ordem econômica nacional, o art. 174, que delimita as funções do estado, como agente regulador da atividade econômica e o art. 219, que dispõe acerca dos incentivos ao mercado interno e o desenvolvimento cultural e socioeconômico do país.

Coadunado com a ideia trazida no caput do art. 3º da Lei 8.666/93 (BRASIL, 1993) tem-se o § 2º do referido artigo, ao mencionar os seguintes critérios de desempate, no julgamento das propostas:

[...]

§ 2o   Em igualdade de condições, como critério de desempate, será assegurada preferência, sucessivamente, aos bens e serviços:

II - produzidos no País;

III - produzidos ou prestados por empresas brasileiras.

IV - produzidos ou prestados por empresas que invistam em pesquisa e no desenvolvimento de tecnologia no País. 

Além da Lei 12.349/2010 (BRASIL, 2010) ter elencado em seu bojo o desenvolvimento nacional sustentável como finalidade da licitação pública, a mesma, inovou, ao apontar também medidas que seriam necessárias para a efetiva concretização de tal finalidade, dentre as quais se destaca a possibilidade de estabelecer margem de preferência até 25%, sobre os produtos manufaturados e serviços de origem estrangeira, nos processos de licitação para produtos manufaturados e para serviços nacionais que atendam as normas técnicas brasileiras.

Cabe mencionar, portanto o ensinamento de Mello (2010, p. 525) acerca das finalidades da licitação pública, entre as quais enumera três: a proteção a supremacia do interesse público e a boa aplicação dos recursos governamentais, quando tenta buscar a proposta mais benéfica, o devido respeito aos princípios da igualdade e da impessoalidade, ambos previstos no texto constitucional de 1988 (BRASIL, 2010), quando da abertura do certame, e, por fim, obediência a ideia da probidade administrativa, insculpida nos arts. 37 e 85, V, da Carta Constitucional 1988 (BRASIL, 1988).

Assim sendo, o gestor/agente público diante da necessidade de licitar deve, obrigatoriamente, respeitar as suas finalidades básicas. Ademais, as licitações são conduzidas por uma série de princípios basilares da Administração Pública e por princípios específicos, os quais passarão a ser analisados a seguir.

Sobre o autor
Savio Verdiano

Graduando em Direito, estagiário do Tribunal Regional Eleitoral - TRE/SE, dedicado a publicar trabalhos que sirvam como meio estruturador para um maior conhecimento jurídico.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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