1 INTRODUÇÃO
A dignidade da pessoa humana é fundamento do Estado Democrático de Direito e da República Federativa do Brasil, como prevê expressamente o texto constitucional em seu artigo 1º, Inciso III, in verbis:
“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
(...)
III - a dignidade da pessoa humana;”
(grifo meu)
A priori, insta salientar que a conceituação do princípio da dignidade da pessoa humana é difícil, tendo em vista o seu abrangente significado, por ser um dado pré-constitucional, intrínseco a todo ser humano.
É certo que a dignidade da pessoa humana não é um direito criado pela Constituição Federal. Na verdade, por ser um dado preexistente à própria Carta Magna, o ordenamento jurídico não confere dignidade a pessoa, mas tem o dever de protegê-la em todas as esferas.
O Estado possui o direito-dever de punir os indivíduos que cometem infrações penais, a fim de resguardar a paz e segurança social, desde que respeitados os direitos da pessoa apenada.
No Brasil a prática de crimes tornou-se algo frequente, o que tem suscitado desconfortável sensação de insegurança e impunidade em grande parcela da sociedade.
Desta forma, a massa social mantêm uma postura vingativa em relação aos delinquentes, o que faz com que o Estado os trate com total descaso e insensibilidade. A principal consequência disso é grande esforço do Poder Estatal para punir mas em contrapartida um elevado desinteresse na implementação de medidas que levem dignidade àqueles que cumprem suas penas.
A prisão deveria ser uma instituição ressocializadora do preso, ocorre que ao invés disso tornou-se um lugar de tormentos físicos e morais, onde o encarcerado recebe castigos e onde não é respeitada à sua dignidade como ser humano. A prisão, que deveria reeducar, transformou-se em indústria do crime, tendo em vista que os presos tornam-se ainda mais frios, calculistas e capazes de conviver sob qualquer adversidade, sem medo e sem escrúpulos, pois já viveram tudo que há de pior.
Nessa esteira, o presente trabalho abordará sobre os direitos do preso trazidos pela Constituição Federal de 1988, à luz do principio da dignidade da pessoa humana. Tratará também sobre os fatores inerentes à ressocialização dos presos e a necessidade de reformulação do sistema prisional brasileiro, bem como a necessidade de inclusão dos encarcerados para que haja a efetiva redução da criminalidade, em decorrência da não reincidência.
2. OBJETO
O objeto a ser estudado neste trabalho é o principio da dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais dos presos trazidos pela Constituição Federal de 1988.
Problema
Dentre os problemas suscitados em torno da questão dos direitos do preso à luz da dignidade da pessoa humana e da realidade do sistema prisional brasileiro, destacam-se como principais os seguintes: Quais os direitos dos detentos à luz do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, fundamento da República Federativa do Brasil? A dignidade humana está presente nos estabelecimentos carcerários? Quais os fatores que influenciam ou determinam o desrespeito aos direitos da pessoa do preso? O Estado possui mecanismos suficientes para estruturar e organizar o sistema prisional brasileiro, fazendo com que os detentos tenham condições de uma existência digna nos estabelecimentos prisionais? Até que ponto o descaso do Estado e a indiferença da sociedade com os presos contribuem para a não reabilitação dos mesmos? A superlotação nos presídios gera rebelião? A sociedade tem condições de arcar com o ônus de não investir no sistema prisional, tendo em vista que a criminalidade aumenta dentro dos presídios e as facções criminosas só ganham mais poder para controlar seus “negócios externos” mesmo dentro da cadeia?
2.2 Hipótese
É possível que haja efetiva ressocialização dos presos com o investimento na estrutura prisional, mas também, é necessário que o Estado e a sociedade abandonem essa postura de desprezo e omissão quanto aos encarcerados. O reconhecimento dos direitos do homem no tocante ao processo penal é insuficiente na medida em que sua efetivação depende de questões culturais e principalmente da evolução civilizatória.
3. OBJETIVOS
3.1 Objetivo Geral
Demonstrar os direitos fundamentais do preso e a realidade do sistema prisional brasileiro.
Objetivos Específicos
-
Identificar o meio pelo qual o Estado pode reestruturar o sistema prisional e garantir a reabilitação e ressocialização do preso;
-
Expor os direitos do preso na Constituição Federal vigente;
-
Enumerar os problemas existentes no sistema prisional do Brasil;
-
Expor os direitos do preso na Lei de Execução Penal.
JUSTIFICATIVA
Segundo pesquisas recentes, sete em cada dez presos que deixam o sistema penitenciário no país, voltam ao crime. Logo, temos uma das maiores taxas de reincidência do mundo. O preso não tem sua dignidade respeitada nas cadeias públicas, o inferno a que são submetidos só os fazem se afundar cada vez mais e enxergar que o único caminho possível para suas vidas é o crime.
Com o alarmante aumento da criminalidade no Brasil, faz-se necessária uma reflexão acerca do que o Estado e a sociedade, juntos, podem fazer para implementar medidas de reeducação e ressocialização dos presos a fim de acabar com a reincidência. E principalmente, sobre a dignidade da pessoa humana, fundamento do Estado Democrático em que vivemos, como garantia intrínseca a todo e qualquer ser humano, inclusive, a pessoa do preso.
REFERENCIAL TEÓRICO
5.1 Constituição Federal de 1988
A Constituição Federal de 1988 foi denominada de “Constituição Cidadã”, haja vista que deixou de lado os interesses do Estado e voltou-se à defesa dos direitos humanos de todos os cidadãos, estabelecendo, os direitos e garantias fundamentais, inclusive, os direitos inerentes aos presos.
Foi construída com o intuito de reinstituir o regime democrático, fundado no Estado de Direito e nos direitos e garantias fundamentais. A ideia era criar um constitucionalismo de valores e esses valores encontram fundamento na dignidade da pessoa humana. Por isso, a Constituição trata do ser humano individualmente considerado, a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado Democrático de Direito veda qualquer possibilidade de sacrifício de, no mínimo, uma subsistência digna, que é um dado pré-constitucional, inerente a todas as pessoas.
Significa que a Magna Carta respeita ao máximo a pessoa humana, dando-lhe o mais alto valor e protegendo-o em todas as esferas. Por isso, aos olhos do ordenamento jurídico pátrio, cada pessoa é vista com um valor indisponível e próprio, tendo direito ao livre desenvolvimento, porém, sendo visto e tendo seus direitos protegidos também como membro de uma sociedade, de matrimônio, igrejas, grupos sociais e do próprio Estado.
Partindo do princípio de que a Constituição Federal de 1988 visa, principalmente, o bem-estar e o respeito à dignidade da pessoa humana, não há que se falar em distinções entre pessoa humana e pessoa do preso. Afinal, o preso também é um ser humano e a ele são conferidos todos os direitos e garantias fundamentais inerentes a qualquer outra pessoa.
Nesta linha, vejamos alguns direitos trazidos pela CF/88:
“Art.5ºTodos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
III- ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
XLVII- não haverá penas:
a)de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;
b)de caráter perpétuo;
c)de trabalhos forçados;
d)de banimento;
e)cruéis;
XLVIII- a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado;
XLIX- é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;
L- às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação;
Desta feita, observa-se que alguns desses direitos não são resguardados pelo Estado. Principalmente no que concerne aos estabelecimentos prisionais e suas funções.
Pela Carta Maior, o preso tem o direito fundamental e indisponível de ver respeitada à sua integridade física e moral. Todavia, sabemos que a realidade do sistema prisional no Brasil é outra. A cadeia tem única e exclusiva função de trancafiar os indivíduos, de qualquer jeito.
Quanto à integridade física, podemos citar como exemplo, dentre muitos outros que existem, as barbáries que acontecem no Complexo Penitenciário de Pedrinhas/Maranhão, onde presos são mortos e esquartejados por outros encarcerados, que chegam a filmar as cenas do show de horror.
Nesse caso, qual o posicionamento adotado pelo Estado? Sua função é a de garantir a integridade física dos presos, no entanto, a criminalidade dentro dos presídios é tão horrível quanto fora.
Ocorre que é mais fácil ao Poder Estatal fechar os olhos e se manter inerte quanto à acontecimentos do gênero, tendo em vista que a sociedade e a mídia pouco se importam com essas pessoas humanas (grifo meu), que estão encarceradas, pois são consideradas à escória da humanidade.
No tocante à integridade moral, apenas baseado nos fatos acima narrados, podemos concluir que é impossível que haja integridade moral num “estabelecimento do horror” como os estabelecimentos prisionais no Brasil.
Quanto aos demais direitos, tendo em vista a realidade das prisões brasileiras, é impossível que não haja tratamento desumano e degradante, o que torna à pena substancialmente cruel.
O princípio da dignidade da pessoa humana, dentro desta matéria, reforça que o apenado deve ser tratado, acima de tudo, como PESSOA HUMANA, digna de um tratamento que atenda suas necessidades básicas, ao mesmo tempo que cumpre a pena prevista. E principalmente, a ideia de que toda pessoa merece uma segunda chance para trilhar os seus caminhos, e que o Estado tem a obrigação de fornecer os meios pelos quais os presos possam se reabilitar, se ressocializar, se reeducar, para finalmente, voltar ao convívio da sociedade.
Lei de Execuções Penais e os Direitos do Preso
A Lei de Execuções Penais, em seu artigo 10, determina que é dever do Estado prestar assistência ao preso e ao internado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade, nos seguintes termos:
1 – Assistência Material: fornecimento de alimentação, vestuário e instalações higiênicas;2 - Assistência Saúde: atendimento médico, farmacêutico e odontológico, tanto preventivo, quanto curativo;3 - Assistência Jurídica: destinada àqueles que não possuem recursos para contratar um advogado;4- Assistência Educacional: o ensino do primeiro grau é obrigatório e é recomendada a existência de ensino profissional e a presença de bibliotecas nas unidades prisionais.5- Assistência Social: deve amparar o preso conhecendo seus exames, acompanhando e auxiliando em seus problemas, promovendo sua recreação, providenciando a obtenção de documentos e amparando a família do preso. A assistência social também deve preparar o preso para o retorno à liberdade.6 - Assistência Religiosa: os presos devem ter liberdade de culto e os estabelecimentos deverão ter locais apropriados para as manifestações religiosas. No entanto, nenhum interno será obrigado a participar de nenhuma atividade religiosa.7 - Assistência ao egresso: orientação para reintegração em sociedade, concessão (quando necessário) de alojamento e alimentação por um prazo de dois meses e auxílio para a obtenção de um trabalho.
Todavia, apesar da Lei de Execução penal preocupar-se em "assegurar ao condenado todas as condições para a harmônica integração social, por meio de sua reeducação e da preservação de sua dignidade" (CAPEZ, 2007, p.27), sabemos que o Estado não protege os direitos do preso previstos no ordenamento jurídico, tendo em vista que, de forma arbitraria, executa a pena ignorando completamente princípios básicos, como o da dignidade da pessoa humana. E é dessa maneira, que o Poder Estatal transgride quanto àqueles indivíduos que cometeram crimes.
Medidas Ressocializadoras
O objetivo principal da cadeia deve ser o de reabilitar o preso, apostando na sua reforma moral. É função do Estado aplicar medidas com o escopo de melhorar a condição social do indivíduo encarcerado. Os apenados devem estar cientes de suas responsabilidades enquanto partes integrantes da sociedade, do próprio Estado e da Nação.
Logo, temos como principal meio de reinserção social, a educação e o trabalho do preso aliados com o tratamento digno dentro dos presídios.
No Brasil, o trabalho nas prisões existe desde o Estado Imperial, após uma mudança no conceito de prisão, que passou a objetivar a reabilitação do criminoso.
Ocorre que só o trabalho, sem a verdadeira qualificação dos penitenciários, não é suficiente para garantir a ressocialização dos mesmos. Isto por que, o mercado de trabalho é altamente concorrido e além das altas taxas de desemprego no Brasil, o apenado carregará consigo o estigma de “bandido” pelo resto da vida, por causa de uma sociedade preconceituosa e intolerante que insiste na ideia de isolar do seu convívio qualquer pessoa que tenha cometido um crime no passado. A sociedade também precisa de reabilitação neste sentido.
Mas, voltando ao papel do Estado, é importante perceber que o essencial é adotar um programa que ajude a desenvolver as competências e habilidades do preso, que favoreçam a sua inclusão social, não os deixando paralisar-se pelas dificuldades que serão encontradas na volta ao convívio com a sociedade.
É necessário que haja também, a obrigatoriedade de acesso ao ensino médio e superior para os detentos que cumprem pena em regime fechado.
Nos artigos 17 a 21 do EJA, entende-se como instrução escolar e formação profissional do preso:
a) obrigatoriedade do ensino fundamental;
b) ensino profissional ministrado em nível de iniciação ou de aperfeiçoamento técnico;
c) adequação do ensino profissional da mulher à sua condição;
d) possibilidade de convênio com entidades públicas ou particulares, que instalem escolas ou ofereçam cursos especializados;
e) previsão de dotar cada estabelecimento com uma biblioteca para uso de todas as categorias de reclusos, provida de livros instrutivos, recreativos e didáticos.
Pode-se considerar a não obrigatoriedade do acesso ao Ensino Médio e Superior do apenado, como afronta à Constituição Federal, no seu artigo 208, inciso II, que preceitua a progressiva universalização do ensino médio gratuito e o acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística.
Não há por que tratar o preso como desigual, restringindo-lhe os direitos fundamentais previstos na Carta Magna, neste caso específico, o direito ao acesso à educação em todos os seus níveis.
A Educação para os jovens e adultos encarcerados, não é um benefício que o Estado os concede. Na verdade, é um direito subjetivo intrínseco à todo ser humano e previsto tanto na legislação brasileiro quanto na internacional e faz parte da proposta de política pública de execuções penais. Tendo por objetivo abrir caminhos para que o apenado tenha a tal almejada reinserção social e, garantir a plena cidadania, que também é um fundamento do Estado Democrático e da República Federativa em que vivemos.
5.3. A realidade atual do sistema prisional brasileiro.
A situação do sistema penitenciário brasileiro é das piores possíveis. As rebeliões e fugas de presos são uma resposta às condições desumanas e degradantes a que são submetidos.
Apesar da legislação proteger os direitos do preso, a realidade é outra. Além da violação dos direitos à integridade física e moral do preso, a pena passa a ter um caráter cruel e massacrante aos apenados.
Pesquisas recentes informam que, em média, 70% dos ex-detentos voltam a delinquir e acabam retornando à prisão. Conclui-se então que a principal saída para acabar com a reincidência e em decorrência ter a efetiva diminuição da criminalidade, é o apoio ao condenado, para que ele possa se ressocializar definitivamente.
Os fatores estruturais fazem com que os presídios enfrentem a superlotação, insalubridade, tornando-o um ambiente propício a contagio de doenças.
Há também o problema da má alimentação dos presos, tendo em vista que são tratados como indigentes, escória da sociedade, recebem o alimento mal e porcamente pelos funcionários das cadeias. Outros fatores são: o uso de drogas e a falta de higiene.
Os detentos adquirem diversas doenças nas prisões. As mais frequentes são tuberculose, pneumonia, hepatite e as doenças venéreas em geral. Conforme pesquisa realizada nas instituições prisionais, cerca de 20% dos apenados no Brasil são portadores da AIDS, em decorrência da violência sexual e do homossexualismo praticado pelos presos, bem como o uso de drogas injetáveis.
A soma desses fatores, juntamente com a falta de segurança dentro dos presídios, resultam nas rebeliões, que muitas vezes terminam com vários mortos, como no caso recente da rebelião no presídio de Parintins, e as fugas de presos.
Essas rebeliões são uma forma de chamar atenção do poder estatal para a forma desumana à qual eles são submetidos. É um grito de desespero de quem não aguenta mais essa pena cruel que lhes foi cominada.
6. REFERÊNCIAS
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MIRABETE, JulioFrabrini. MANUAL DE DIREITO PENAL. São Paulo :Ed Atlas,1985.
NUCCI, Guilherme de Souza. MANUAL DE DIREITO PENAL. 3 ed. Revista e Atual e Amp. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2007.
BADARÓ, Gustavo. PROCESSO PENAL. Série Universitária. São Paulo: Elsevier e Campus Jurídico, 2012.
OLIVEIRA, Maristela Cristiana de Oliveira; SÁ, Marlon Marques. Redução da Maioridade Penal: Uma abordagem Jurídica. [capturado em 2014 jun 03]. Disponívelem:<http://www.escoladegoverno.pr.gov.br/arquivos/File/artigos/justica_e_cidadania/reducao_da_maioridade_penal_uma_abordagem_juridica.pdf>.
SEVERINO, Antônio Joaquim. METODOLOGIA DO TRABALHOCIENTÍFICO. 23ª Ed. São Paulo: Saraiva : 2010.
GRECCO, Rogério. CURSO DE DIREITO PENAL. 12ª Ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2010.
JÚNIOR, Dirley da Cunha. CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL. 4ª Ed. Bahia:Editora JusPodivm, 2010.