SUMÁRIO: INTRODUÇÃO - 1. FENÔMENO INTERNET. 1.1 Conceito e surgimento -2. OS PROBLEMAS JURÍDICOS E AS TENTATIVAS DE REGULAMENTAÇÃO DA REDE – 3. A INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA NA INTERNET - 3.1 Os tributos incidentes. 3.1.1 O imposto sobre a circulação de mercadorias e serviços (ICMS). 3.1.2 O imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISSQN) - 3.2 A questão dos softwares. 3.2.1 As formas de comercialização via internet. 3.2.2 Os softwares "de prateleira" e "por encomenda". 3.2.3 Software "virtual" - 3.3 Os provedores de acesso à internet – CONCLUSÃO - BIBLIOGRAFIA
INTRODUÇÃO
A sociedade e os seus costumes têm sido, ao longo dos tempos, a grande fonte de inspiração do Direito, pois é da evolução de seus costumes, bem como, de seu desenvolvimento intelectual, o qual irá trazer avanços no campo científico-tecnológico, que ele irá se desenvolver na tentativa de regular as novas situações.
Assim como para o direito civil a biomedicina trouxe avanços nunca antes imaginados, fazendo com que situações ainda não previstas no mundo jurídico surgissem, para o direito tributário (assim como para outros ramos do direito, inclusive o civil) a informática e o desenvolvimento espantoso da internet tiveram este mesmo efeito.
Atualmente os operadores do direito, dos seus mais variados ramos, têm tido dificuldades para enquadrar essas novas questões, que surgem ao mesmo passo em que se desenvolvem as ciências tecnológicas.
Na tentativa de ajudar a esclarecer alguns dos problemas trazidos pelo desenvolvimento da informativa e pelo surgimento da internet, que têm suscitado polêmicas discussões na esfera tributária, desenvolveu-se o presente estudo.
O surgimento da internet e o seu desenvolvimento serão demonstrados, assim como serão abordados alguns problemas surgidos com ela e com a criação do software, que como se verá, é fruto de uma elaboração intelectual, constituindo um programa com sistemas de funções múltiplas que permitem a sua utilização através da distribuição de uma variedade de informações, que podem estar contidas ou não em um suporte físico.
Tratar-se-á, principalmente, das questões tributárias trazidas por essas inovações, mais especificamente, dos problemas envolvendo a incidência de impostos sobre os provedores de acesso a internet e sobre a comercialização dos softwares.
Pretende-se com isso, demonstrar alguns entendimentos existentes sobre o assunto, bem como, se posicionar sobre qual o imposto que irá incidir sobre tais atividades, se é que irão incidir, tendo em vista possibilitar aos demais juristas um melhor entendimento acerca do tema.
1 – O FENÔMENO INTERNET
A sociedade tem passado por diversas transformações ao longo dos tempos, principalmente em face dos avanços tecnológicos e científicos.
A internet surge neste contexto, como um grande fenômeno que revolucionou os meios, não só de informações, entretenimentos, entre outros, como também os de comércio, encurtando as distâncias e eliminando as fronteiras nacionais existentes.
O que se deve entender com isso, é que todas essas mudanças, em face da velocidade com que ocorrem, quase sempre demandam um período de adaptações para que possam fazer parte do dia a dia das pessoas.
No mundo jurídico, ocorre da mesma forma, uma vez que, essas nomenclaturas e figuras novas somente irão a ele se adequar, através da realização de um estudo aprofundado por parte dos operadores do direito, sempre tendo em vista os anseios da sociedade.
Portanto, convém primeiramente, entender o que é a internet e como surgiu, para que depois se possa tecer algumas considerações acerca do tema objeto do presente estudo.
1.1- Conceito e surgimento.
A internet ou WEB (World Wide Web –WWW) representa um conjunto de conexões de redes de computadores, ou ainda, um conjunto de meios tecnológicos utilizados para o acesso, distribuição e propagação de informações em redes interligadas de computadores.
Ela surgiu nos Estados Unidos por volta de 1968, tendo suas bases calcadas em estudos, realizados pelo departamento de defesa do governo americano, mais precisamente por uma de suas agências federais, a ARPA (Advanced Research Projects Agency), onde se buscava interagir pessoas e máquinas (computadores), no sentido de desenvolver a capacidade humana de pensar, dinamizando a sua forma de se comunicar e trocar informações.
Esses estudos foram baseados na teoria de J. C. R. Lickider, responsável pelo departamento de ciências do comportamento da ARPA, e ela consistia no entendimento de que, em se possibilitando uma transferência de dados e informações em escala macro-humana, este intercâmbio de idéias poderia originar uma unidade de informações nunca antes alcançada.
No inicio a "Rede Mundial" era utilizada apenas como instrumento da comunidade científica e do departamento de defesa americano para obter informações através de pesquisas nela realizadas, com a finalidade de preparar estratégias de defesa em caso de ataques ou bombardeios.
No entanto, a internet se desenvolveu e se popularizou, tornando-se hoje uma ferramenta fundamental no dia a dia tanto de empresas, como de pessoas comuns do mundo inteiro, que a utilizam para os mais variados objetivos.
O funcionamento da internet se dá, basicamente, pela transferência de informações, através de uma linguagem comum ou protocolo, que possibilita aos usuários individuais interagir, com qualquer outra rede ou usuário individual que seja também parte do sistema.
Com isto, se quer dizer, que na Internet várias barreiras foram rompidas por um simples motivo, todos falam a mesma linguagem, qual seja, o protocolo IP.
Tudo aquilo que é transmitido pela internet é transformado, em seu ponto de origem, em "pacotes" de informações, todos devidamente identificáveis pelo seu próprio endereço e contendo instruções de destino. Estes pacotes são enviados através de redes interligadas, para serem remontados no ponto de destino.
O usuário para ingressar na rede e poder usufruir de toda a gama de serviços que ela oferece, necessita ter um computador, um programa denominado de "browser" e, geralmente, uma linha telefônica (pois hoje já existem meios que dispensam o uso da linha convencional). Além disso, são necessários os chamados provedores de acesso (que fornecem os recursos técnicos e materiais), que efetivamente concretizam a entrada dos usuários na "Grande Rede".
Como se pode perceber, são muitas as inovações trazidas pela internet e por tudo que a cerca. Todo esse avanço, no entanto, trouxe os mais variados problemas para o mundo jurídico.
2 – OS PROBLEMAS JURÍDICOS E AS TENTATIVAS DE REGULAMENTAÇÃO DA REDE
Cumpre registrar-se, antes de qualquer comentário, que é preciso ter a consciência de que todos esses problemas, os quais serão adiante demonstrados, devem ser considerados como apenas uma amostra do que ainda esta por vir. Isto porque, o atual estágio de desenvolvimento da internet é tido como rudimentar por alguns especialistas, isto, levando-se em consideração as possibilidades de sua utilização no futuro.
A internet fez com que alguns conceitos jurídicos fossem revistos, principalmente os conceitos de distâncias e fronteiras, vez que, ela rompeu as barreiras mais tradicionais dos diversos espaços jurisdicionáveis. Além disso, com as suas mais variadas formas de utilização, como por exemplo, a transferência de imagens e sons, correio eletrônico, home-banking, os sites com diversas formas de prestação de serviços e o comércio eletrônico, promoveu uma certa insegurança jurídica no meio social.
Na tentativa de explicar essas transformações provocadas pelo surgimento da internet, o advogado Eury Pereira Luna Filho [1] diz que:
O que se tem na internet – ou aquilo a que se assiste estar ocorrendo ali – é a conversão de uma economia baseada em trocas de mercadorias e serviços palpáveis, tangíveis – para usar o termo mais especialístico -, para outra economia em que se dá a conversão desses bens, serviços e valores para a sua expressão virtual, eletrônica, projetando-se – como já dito – do reino da matéria, para o reino dos inputs e bits eletrônicos.
Dentro do campo da tributação, todas essas mudanças ocorridas, também trouxeram diversas questões de ordem prática e que devem ser abordadas pelos estudiosos do direito para que se preserve a confiabilidade a qual deve sempre existir nas relações jurídicas entre fisco e contribuinte.
Neste contexto, como saber, a que tributo estará sujeito o site de hospedagem? Se o provedor de espaço (que viabiliza espaço para armazenamento de conteúdo) loca bens? Se a imunidade constitucional alcança o chamado "livro eletrônico"? Se o provedor de acesso deve ser ou não tributado? Qual a definição de estabelecimento comercial para efeitos de tributação? A que tributação estará sujeito o software? Além de outras questões que estão dificultando ainda mais a já conturbada relação entre o estado e o sujeito passivo da relação tributária.
Algumas entidades internacionais reconhecidas e tradicionais, na tentativa de minimizar esta insegurança, bem como, de evitar que o desenvolvimento da internet fosse por ela prejudicado, buscaram regulamentar a "Rede Mundial", no sentido, de estabelecer direcionamentos a serem seguidos por todos os países.
No presente estudo, em virtude da quantidade de problemas enfrentados na internet, buscar-se-á delimitar a análise de dois problemas, quais sejam, os ligados a tributação dos provedores de acesso e do chamado e-commerce, no que diz respeito a comercialização dos softwares.
Sendo assim, em se tratando de comércio eletrônico, o principal documento para sua regulamentação é a Lei modelo de UNCITRAL (United Nations Commission on International Trade LawI, que traduzindo significa, Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional) para o comércio eletrônico com guia para aplicação, elaborado em 1996, tendo sido atualizado em 1998 (este modelo pode ser encontrado no endereço: http://www.uncitral.org).
Este documento, assim como outros que existem com o mesmo objetivo (como exemplo tem-se a "Cartilha sobre Comércio Eletrônico e Propriedade Intelectual" publicada pela WIPO/OMPI - Organização Mundial da propriedade Intelectual - em 2000), tratam principalmente de problemas que envolvem as relações comerciais, tais como, os que se referem a segurança das redes, propaganda nela veiculada, privacidade e dados pessoais, contratos e pagamentos eletrônicos, bem como, de tributação e política de comércio eletrônico de uma forma geral.
No Brasil foi criado em 1995 pela portaria interministerial nº147, do Ministério das Comunicações e do Ministério de Ciência e Tecnologia, o Comitê Gestor de Internet, que no entendimento do professor Tarcisio Queiroz Cerqueira [2], ainda necessita de uma maior expressão e poder de regulamentação, pois se limita a normatização técnica e à administração da rede. No entanto, ele considera como positivo, o fornecimento, por parte do Comitê, de subsídios quanto a temas de relevância jurídico-legal, tendo em vista, os problemas envolvendo matérias jurídicas e técnicas em se tratando da Internet.
O Comitê Gestor de Internet é quem fornece, entre outros documentos, as "Recomendações para o Desenvolvimento e Operação da Internet no Brasil", que tratam de forma bem abrangente dos assuntos envolvendo a normatização técnica e administrativa da rede, dentre eles destacando-se:
- a implementação de um Código de Ética a ser seguido na Internet Brasil;
- a necessidade de se adotar padrões internacionais de DNS-Domain Name System por todas as redes conectadas à Internet Brasil;
- o fornecimento, pelos provedores de acesso, além dos serviços usuais utilizados para conexão, de serviços de informações necessários à proteção mínima dos usuários conectados, como, por exemplo, filtros de portas que são utilizadas por serviços reconhecidamente nocivos, conforme padrões estabelecidos pelos órgãos oficiais de suporte à Internet Brasil: o NBSO-NIC Br Security Office e o CERT – Computer Emergency Response Team, com sede na Suíça, os quais trabalham em conjunto com a Polícia Federal e com organizações internacionais de combate a crimes cometidos na Rede;
- o estabelecimento, pelos provedores de acesso, de meios que tornem possível a identificação de práticas ilícitas ocorridas através da rede, evitando que contas de usuários sejam utilizadas por terceiros ou sejam abertas contas com dados falsos e ainda, que o cadastramento e recadastramento das contas dos usuários sejam feitos de uma forma em que se possa ter dados cadastrais completos e que permitam a obtenção da identificação da pessoa natural ou jurídica que utiliza a Internet;
- a manutenção/registro/arquivamento de dados de conexão: assim como os serviços de telefonia e transmissão de dados, os provedores devem passar a manter, por um prazo determinado, os dados de conexões e chamadas realizadas por seus clientes e respectivas máquinas, para fins judiciais (identificação do endereço de IP, data e hora de início e término da conexão e origem da chamada);
- o fornecimento de extrato completo pelos provedores de acesso - a exemplo dos serviços de telefonia, bancário e de cartões de crédito – de forma que os usuários de Internet possam se sentir mais seguros de poder verificar utilização indevida de suas contas;
- o fornecimento de manuais de orientação para que os usuários possam navegar na rede com mais facilidade e segurança, orientados sob formas de controle de conteúdo.
O que se observa com a analise dos assuntos abordados, é que o objetivo principal dessas recomendações é a adoção de meios de acesso (telefonia, cabos e outras tecnologias) que permitam identificar, de forma inequívoca, a origem da chamada, para que os provedores de acesso possam rastrear a origem de ataques à segurança da rede, os seus serviços e os seus usuários. Com isso, tem-se o objetivo de agir de forma eficaz e preventiva no combate de quaisquer atos ilícitos, garantindo desse modo, a idoneidade de qualquer comunicação.
Pôde-se perceber com tudo o que se viu, que são vários os problemas que surgiram juntamente com a internet, e que tem havido por parte dos países, uma tentativa, ainda que de forma tímida, de regulamentar essas novas situações jurídicas.
3 – A INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA NA INTERNET
Passar-se-á a estudar agora, o tratamento que vem sendo dado, em face da legislação tributária em vigor, a dois problemas de grande importância para o ordenamento tributário, relativos a tributação dos softwares e dos provedores de acesso.
3.1- Os tributos incidentes
A comercialização de bens através da internet, pelas diversas situações jurídicas que faz surgir, pode sujeitar a incidência de vários impostos, tais como, o imposto sobre importação e exportação, a renda auferida, os produtos industrializados, a circulação de mercadorias e serviços, bem como, o imposto sobre serviços.
Para efeitos do presente trabalho, dar-se-á uma pequena noção sobre o ICMS (Imposto sobre a circulação de mercadorias e serviço) e o ISS (Imposto sobre serviços de qualquer natureza) que são os impostos que mais geram debates doutrinários a respeito da sua incidência ou não, tanto sobre a comercialização de softwares, como sobre o serviço prestado pelos provedores de internet.
3.1.1- O imposto sobre a circulação de mercadorias e serviços (ICMS)
O antigo ICM da Constituição anterior foi ampliado pela Constituição de 1988, passando a incidir também, sobre as prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e sobre os serviços de comunicação.
O chamado ICMS é um imposto de competência dos Estados e do Distrito Federal, tendo legitimidade para cobrá-lo o Estado onde se dá a ocorrência do fato gerador, ou em caso de importação, o Estado em que se localize o estabelecimento do importador.
Sua função é predominantemente fiscal, sendo uma importante fonte de receita para os Estados. No entanto, nada impede que seja utilizado com função extrafiscal, podendo ser seletivo em razão da essencialidade das mercadorias e serviços (art. 155, § 2º, inciso III da Constituição Federal de 1988).
As hipóteses em que incidirá o referido imposto estão definidas no artigo 2º da Lei Complementar nº 87/96 e as suas alíquotas serão fixadas pelos Estados, cabendo ao Senado Federal, através de resolução, estabelecer as alíquotas aplicáveis às operações e prestações interestaduais e de exportação, sendo ainda, facultado a ele fixar alíquotas máximas e mínimas nas operações internas.
O contribuinte do imposto, nos termos do que dispõe o artigo 4º da referida Lei Complementar, é qualquer pessoa, seja ela física ou jurídica, que realize, com habitualidade ou em volume que demonstre o intuito comercial, operações que envolvam circulação de mercadorias ou prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e ainda, serviços de comunicação, mesmo que as operações e as prestações se iniciem no exterior. Podem ainda ser contribuintes do ICMS, o responsável e o substituto tributário, nos termos estabelecidos em lei.
A sua base de cálculo, via de regra, corresponde ao valor da operação que envolve a circulação de mercadorias, ou ainda, ao preço do serviço. Na ausência de indicação desses valores, a base de cálculo será, com relação à circulação de mercadoria, o seu preço corrente ou de seu similar no mercado atacadista no local da operação ou na região; e com relação ao serviço, o seu valor corrente no local da prestação.
O ICMS tem o seu lançamento realizado nos termos do artigo 150 do CTN, ou seja, se dá por homologação, uma vez que, os contribuintes o recolhem a cada mês, com base nos seus cálculos e sem que estes ainda nem tenham sido examinados pela autoridade administrativa. Somente após o pagamento é que a administração irá ou não homologar (de forma expressa ou tácita) a apuração do valor do tributo realizada pelo contribuinte.
A ele é aplicado o princípio constitucional da não cumulatividade, disposto no artigo 155, § 2º, inciso I da Carta Magna, significando isto dizer, que o imposto devido em cada etapa do ciclo econômico, deve obrigatoriamente ser abatido na etapa seguinte, de modo que o valor efetivamente recolhido na venda final de um produto, seja exatamente o valor da alíquota prevista sobre o seu valor final.
Esse princípio não pode sofrer nenhuma limitação que não seja a já estabelecida pela própria Constituição Federal no item II do § 2º do artigo 155, relativa aos casos de não-incidência e isenção.
Para os ilustres Marco Aurélio Greco e Anna Paola Zonari de Lorenzo [3] "O cerne da não-cumulatividade está no direito de compensação (como um direito pleno, sem restrições) que o contribuinte tem de deduzir em determinado período, do ICMS devido pelas saídas, o valor do ICMS pago pelas entradas.".
Caso alguma norma seja criada tendo em vista a restrição da compensação de créditos do ICMS fora das exceções previstas no texto constitucional, pode qualquer contribuinte prejudicado, via controle difuso, argüir a inconstitucionalidade dessa norma, para que o Poder Judiciário faça valer o princípio da não-cumulatividade, e conseqüentemente, o direito de compensação do contribuinte.
3.1.2- O imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISSQN)
O imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISSQN) é da competência do município e está disposto no artigo 156, inciso III, que estabelece:
Art.156. Compete aos Municípios instituir imposto sobre:
I-(...);
II-(...);
III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar;
Esse tributo tem uma função fiscal bastante relevante, sendo importante fonte de receita tributária dos Municípios, que muitas vezes deixam de arrecadá-lo por falta de estrutura administrativa.
O seu fato gerador compreende a prestação dos serviços de qualquer natureza, constantes na lista anexada ao Decreto-Lei nº 406/68 e que não estejam na esfera de competência tributária dos Estados, realizados por empresa ou profissional autônomo, independentemente de ter ou não estabelecimento fixo (o STF tem entendido que o estabelecimento é irrelevante para fixação do local da prestação do serviço, sendo necessário para tal fixação considerar o local em que efetivamente se realizou o serviço).
A citada lista de serviços foi inclusive objeto de discussões a respeito de ser ela exemplificativa (o que poderia tornar bem abrangente a hipótese de incidência do ISS) ou taxativa (que restringiria o fato gerador às hipóteses constantes na lista de serviços estabelecida pela Lei Complementar).
Sobre o tema manifestou-se o STF entendendo ser a lista taxativa, no entanto, possibilitou sua aplicação analógica o que, com o devido respeito à decisão, não poderia ter ocorrido. Isto porque, não se pode, por analogia, aumentar o rol de serviços descritos na lista, por ter ela natureza de norma definidora da hipótese de incidência do tributo o que acabaria por resultar em exigência de tributo não previsto em lei (art. 108, § 1º).
Com isso pode-se entender também, que os Municípios podem, através de lei ordinária, descrever o fato gerador do ISS, devendo, no entanto, esta competência ser exercida tendo como parâmetro (limite) a lista de serviços definida pela lei Complementar nº 56/87 e que foi alterada pela Lei complementar nº 100/99.
O serviço deve ser entendido, para efeito do imposto em estudo, como uma obrigação de fazer, e que implica em esforço humano para a sua satisfação.
O contribuinte deste imposto é a empresa ou o trabalhador autônomo que presta serviço tributável ou ainda o responsável tributário, figura esta instituída por alguns municípios com amparo no artigo 128 do CTN.
O lançamento via de regra, e feito por homologação (art. 150 do CTN), no entanto, como ocorre com qualquer outro tributo, pode ser lançado de ofício pela autoridade administrativa.
A alíquota do ISS é fixada pelos Municípios, podendo a União, através de Lei Complementar, estabelecer alíquotas máximas (art.156, § 3º, inc. I da CF). Com esta finalidade foi criada a Lei Complementar nº 100/99 que fixou a alíquota máxima desse imposto em 5% (cinco por cento).
Falar ou não de uma base de cálculo irá depender do tipo do ISS, ou melhor, do tipo de contribuinte.
O ISS é considerado do tipo direito quando incide na prestação do serviço realizada pessoalmente pelo próprio contribuinte do imposto. Neste caso, no entendimento do jurista Hugo de Brito Machado [4], é impróprio se falar em alíquota e base de cálculo simplesmente por não haver o que calcular, vez que, o imposto é fixo, sendo definido de acordo com a natureza do serviço prestado ou de outros fatores a ele pertinentes e não em função do valor recebido pelo serviço.
Quando se fala em ISS do tipo indireto deve-se entender como sendo aquele que incide sobre a prestação de serviços por empresas, e que tem como base de calculo o faturamento desta empresa, incluindo-se neste, todo gasto decorrente de atividade desenvolvida diretamente na área de prestação de serviços, perfeitamente caracterizado e identificado, mas que não tem condições de ser apropriado quantitativamente a uma fase ou atividade específica do serviço.
Pode-se entender, desta forma, que dentro do faturamento, sobre o qual incide o ISSQN, não consta apenas o esforço humano (prestação do serviço), também estão inclusos na base de cálculo os gastos desprendidos na realização de determinado serviço.
Com relação a restituição do ISS o princípio geral contido na Constituição é da plena restituição, ou seja, verificado o erro de direito ou erro de fato, nasce de imediato a pretensão à devolução, pois se dá por caracterizada a ilegalidade na cobrança efetuada pelo Fisco, tendo o legislador constitucional, por este motivo, estabelecido a imediata e preferencial restituição.
No entanto verifica-se que o artigo 166 do CTN representa uma exceção a esta regra, determinando que:
Art. 166. A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la.
Com o devido respeito à posição contraria, sendo esta no sentido de que mesmo havendo transferência dos encargos, não se aplica o artigo supramencionado, propõe-se aqui o entendimento de que, como exceção, entenda-se, somente nos casos em que ocorrer a transferência do encargo referente ao ISS (comprovado pelo perito), e que se pode aplicar a regra constante no artigo 166 do CTN.
Este tem sido o entendimento do Supremo Tribunal Federal, ao dispor na Súmula nº 546 que: "Cabe a restituição do tributo pago indevidamente, quando reconhecido por decisão, que o contribuinte de jure não recuperou do contribuinte de facto o quantum respectivo".
3.2- A questão dos softwares
De acordo com o artigo 1º da Lei nº 9.609/98 o software é:
Art. 1. A expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos baseados em técnicas digital ou análoga, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados.
Observada a definição, pode-se dizer que o software representa uma criação intelectual de um programa que, no entanto, tal qual um livro ou uma partitura, necessita de um suporte físico (disquete ou Compact disc) para a distribuição das informações nele contidas.
Esse conceito abrange a definição, de uma forma geral, não só do chamado "software de prateleira" como também do "software por encomenda". Todavia, não se amolda a este conceito o "software virtual", uma vez não ter este, qualquer suporte físico, ou seja, não ter qualquer exteriorização.
Com isso, pode-se perceber, que para o estudo da tributação do software, este deve ser analisado em suas três formas, quais sejam, o software tido como "de prateleira", o tido como "por encomenda" e o chamado "software virtual" (no sentido de que, inexistindo suporte físico, este não se torna materialmente perceptível).
3.2.1- As formas de comercialização via internet
Antes de tratar do software analisando a ocorrência ou não da incidência tributária em cada uma de suas três formas, deve-se estabelecer a distinção entre o comércio eletrônico que utiliza a internet apenas como um meio, havendo a entrega física da mercadoria posteriormente ao consumidor, e o comércio eletrônico que se realiza de forma digital, havendo a transferência digitalizada do produto ao consumidor, uma vez que, o software, se considerado como mercadoria, pode ser negociado tanto de uma como de outra forma.
No primeiro exemplo, as compras de mercadorias via Internet se desenvolvem através do acesso pelo comprador ao site do vendedor, onde o primeiro faz o pedido, acorda sobre as condições e forma de pagamento, e, por último, recebe o produto comprado em sua residência.
Neste caso, não importa, para efeitos de tributação, que o comprador esteja em Estado do país diverso de onde esteja o vendedor, pois o pedido de compra formulado somente utiliza como meio a internet, da mesma forma que poderia utilizar o telefone, o fax ou o correio. Não importa o meio utilizado porque o fato gerador do ICMS não se perfaz com nenhuma dessas operações e sim com a circulação das mercadorias oriundas das mesmas.
Isto significa dizer, que o fato gerador do ICMS somente ocorre no momento da remessa, por parte do vendedor, da mercadoria, ou seja, e a saída da mercadoria do estabelecimento do vendedor que representa a materialização da hipótese de incidência descrita no artigo 1º, inciso I do Decreto-lei n.º 406/68:
Art. 1o O Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias tem como fato gerador:
I – a saída de mercadorias de estabelecimento comercial, industrial ou produtor;
Sendo assim, o ICMS será devido quando da saída da mercadoria do estabelecimento do comerciante e pago ao Estado onde se encontrar este estabelecimento, seja ele matriz ou filial.
Como se pode observar, nas compras em que a internet é utilizada apenas como meio, não há qualquer dificuldade em se apontar qual seja o estabelecimento do contribuinte (dificuldade esta que como se verá mais adiante, é encontrada na "venda digital"), pois com a realização da operação que transfere a propriedade da mercadoria, esta irá sair (circular), seja de um armazém ou de um deposito do vendedor, para ser entregue ao comprador.
No presente caso, a tributação não ocorre efetivamente na internet e sim em face de um contrato de compra e venda celebrado pela internet e que levou à circulação de uma mercadoria, uma vez que, conforme dito anteriormente, na operação de compra e venda realizada, não se praticou nenhum ato que incorresse na hipótese de incidência de qualquer imposto, a não ser o pago pelo impulso telefônico que também ocorreria se efetivado por fax ou pelo próprio telefone, sobre o qual incide o ICMS, em face do serviço de comunicação prestado.
Deve-se ressaltar, para fins práticos, que existem decisões do Supremo Tribunal Federal no sentido da não incidência do ICMS na importação de produtos, quando esta for feita por pessoa física ou por empresa prestadora de serviços, incluindo-se aqui também a que utilizou como meio a internet. Como exemplo, tem-se o voto o Ministro Ilmar Galvão [5], que justificou a sua decisão dando as seguintes elucidações:
Recurso extraordinário. Constitucional. Tributário. Pessoa física. Importação de bem. Exigência de pagamento do ICMS por ocasião do desembaraço aduaneiro. Impossibilidade.
1. A incidência do ICMS na importação de mercadoria tem fato gerador operação de natureza mercantil ou assemelhada, sendo inexigível o imposto quando se tratar de bem importado por pessoa física.
2. Princípio da não-cumulatividade do ICMS. Pessoa física. Importação de bem. Impossibilidade de se compensar o que devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal. Não sendo comerciante e como tal não estabelecida, a pessoa física não pratica atos que envolvam a circulação de mercadoria.
Recurso extraordinário não conhecido." (grifos no original)
Na prestação de serviços utilizando como meio a internet (como exemplo tem-se a prestação de um serviço de consultoria realizado através de e-mail), assim como na compra e venda, não existe qualquer dificuldade em relação a tributação, uma vez que, o serviço será tributado pelo ISS, desde que esteja incluso na lista de serviços tributáveis pelo referido imposto (o serviço de consultoria esta contido no item 22 da lista de serviços regulada pela Lei Complementar nº 56 de 15.12.1987) e no Município onde se localizar o escritório onde o serviço for prestado.
No entanto, na hipótese de comercialização de produtos ou de prestação de serviços por via exclusivamente digital (caso se considere que existe a prestação de serviço exclusivamente pela via digital), vários problemas surgem principalmente no que diz respeito aos conceitos tradicionais de mercadorias, de serviços e de estabelecimento comercial. Isto se dá, pois diferentemente do que ocorre na compra e venda ou na prestação de serviço que utilizam a internet apenas como meio (nestes casos as operações apesar de se realizarem pela internet acabam por se exteriorizar), nas operações realizadas digitalmente, estas começam, se desenvolvem e terminam nos meios eletrônicos.
Este assunto será abordado de uma forma mais detalhada quando se for estudar o tratamento a ser dado ao chamado "software virtual".
3.2.2- Os softwares "de prateleira" e "por encomenda"
Este assunto, em virtude de sua complexidade, atualidade e importância, tem sido tema de saudáveis debates no meio jurídico. Em razão disso, inúmeras correntes doutrinárias surgiram buscando verificar se existe a possibilidade de incidência tributária com relação a comercialização desses softwares, bem como, em havendo essa possibilidade, qual seria o imposto que caberia a eles.
Na tentativa de solucionar a questão a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, acolheu, à unanimidade, o voto proferido pelo Relator, o Ministro Sepúlveda Pertence [6], que decidiu no seguinte sentido:
(...)
III. Programa de computador ("software"): tratamento tributário: distinção necessária.
Não tendo por objeto uma mercadoria, mas uma bem incorpóreo, sobre as operações de "licenciamento ou cessão do direito de uso de programa de computador" - matéria exclusiva da lide -, efetivamente não podem os Estados instituir ICMS: dessa impossibilidade, entretanto, não resulta que, de logo, se esteja também a subtrair do campo constitucional de incidência do ICMS a circulação de cópias ou exemplares dos programas de computador produzidos em série e comercializados no varejo - como a do chamado "software de prateleira" (off the shelf) - os quais, materializando o corpus mechanicum da criação intelectual do programa, constituem mercadorias postas no comércio.
O que ficou estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal, foi que nas operações envolvendo a circulação de cópias ou exemplares dos programas de computador produzidos em série e comercializados no varejo, ou seja, quando envolverem o software "de prateleira", estas mercadorias devem ser consideradas como postas no comércio para aquisição de qualquer um indiscriminadamente, ficando sujeitas, por conseguinte, à incidência do ICMS, de competência Estadual.
Quando se tratar, no entanto, de operação mercantil envolvendo o software, tendo este como objetivo a realização de um serviço para um usuário em especial ("por encomenda"), estaremos diante da hipótese de incidência do ISS (Imposto sobre serviços de qualquer natureza), que, como visto anteriormente, é um tributo de competência municipal.
Existe uma parte dos juristas que corrobora com este entendimento do Supremo, se colocando contrários ao argumento utilizado por algumas empresas, e que foi inclusive acolhido por algumas Turmas do Superior Tribunal de Justiça, de que, personalizado ou não ("por encomenda" ou "de prateleira"), o software não constitui uma mercadoria e sim um bem intelectual intangível e incorpóreo distinto de seu suporte físico, não estando, por esta razão, sujeito à cobrança do ICMS, mas sim do ISS, imposto bem menos oneroso. Entendem os juristas partidários da posição do Supremo, como por exemplo, Fabiano Pereira dos Santos [7], Procurador Geral do Município do Rio de Janeiro, que o fundamental na identificação de um produto como mercadoria não é se ele advém ou não de um processo de elaboração intelectual, e sim se essa mercadoria foi adquirida com a finalidade de ser vendida, e em decorrência disso, ele afirma que:
Não resta dúvida, deste modo, de que o software destinado à comercialização, acessível a qualquer indivíduo, indiscriminadamente, deve ser considerado mercadoria que circula, sujeita à cobrança de ICMS. Assim, se o programa é feito e vendido para milhares de pessoas, como se fosse um jornal ou um livro, perde as condições de individualidade e exclusividade regidas numa cessão do direito de uso de software e, embora obra intelectual, entra na área de circulação de mercadorias.
O Procurador da Fazenda Nacional em Alagoas, o jurista Aldemario Araújo Castro [8], também concorda com o entendimento que foi proferido pelo STF, entretanto, ele considera incongruente a premissa utilizada pelo Ministro Sepúlveda Pertence, de que o conceito de mercadoria efetivamente não inclui os bens incorpóreos e tão somente os corpóreos. Para o citado Procurador, se apenas a mercadoria como bem corpóreo pudesse sofrer a incidência do ICMS, então em relação ao software "de prateleira", apenas a sua base física estaria sujeita á incidência, com o que ele discorda. Para o citado jurista, o software "de prateleira" como um todo, deve ser tributado pelo ICMS, pois "A evolução tecnológica impõe a adequação da idéia de mercadoria".
Diferentemente do posicionamento adotado pelo Supremo, tem-se uma outra corrente, que possui um entendimento semelhante, em parte, ao defendido por algumas empresas. Em parte, porque, apesar de entender também que, por ser um bem imaterial o software não pode ser considerado uma mercadoria, esta corrente admite que o suporte físico possa ser tributado pelo ICMS.
Defensor desta posição, o doutrinador Guilherme Cezaroti [9] conclui que:
A fórmula mais adequada seria, então, aquela adotada pela Portaria nº 181, do Ministério da fazenda, que estabeleceu, para fins de cálculo do imposto de importação, em seu artigo 2º, que na importação de software a base de cálculo do imposto de importação deve corresponder ao valor aduaneiro do suporte físico do programa, desde que no documento de importação estejam indicados separadamente o valor de custo do software e do suporte físico.
Isto, no entanto, para críticos deste entendimento, não seria possível em razão do que está disposto no § 1º do artigo 8º constante no Decreto Lei nº 406/68, onde o legislador limitou à incidência do ISS os serviços constantes na lista, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias.
Tem-se um posicionamento bastante interessante, no mesmo sentido da tese defendida por grande parte das empresas que comercializam programas de computador, em um parecer elaborado pelo escritório Lobo & Ibeas advogados [10].
De acordo com o referido parecer, os entendimentos que concluem pela incidência do ICMS sobre o "software de prateleira" partem do fundamento de que as operações de comercialização desse tipo de "software" no mercado varejista seguem o modelo geralmente adotado por outras obras intelectuais gravadas em série para comercialização em massa, no varejo, como é o caso, por exemplo, dos livros e dos discos fonográficos.
Ocorre que, segundo o parecer, quando se trata de comercialização de "software de prateleira", a pratica no mercado tem mostrado um modelo operacional substancialmente diferente, pois neste caso, o autor do programa cede ou licencia a utilização de seus direitos autorais ao distribuidor, e este, por sua vez, cede ao varejista, ou diretamente ao usuário final, o direito não exclusivo de utilizar o "software" (obra intelectual), mediante certas condições dispostas, via de regra, no exterior da embalagem.
A conclusão do parecer é pela incidência do ISS, tanto para o software "por encomenda" como para o software "de prateleira", por entender que este último, é sublicenciado ao usuário final, devendo ele utilizá-lo apenas nas condições autorizadas, e em decorrência disso, a base física não pode ser considerada o objeto principal da operação de circulação e nem uma mercadoria em si, mas um mero veículo do serviço prestado.
Conforme foi observado, vários são os posicionamentos com relação a comercialização dos softwares. Quanto ao chamado software "por encomenda", parece não restar dúvida de que, por serem elaborados especialmente pra um certo usuário, constituem realmente uma prestação de serviço, e por isso devem ser tributados pelo ISS.
Com relação ao software "de prateleira", mesmo respeitando os posicionamentos acima demonstrados, e que são brilhantemente defendidos por seus filiados, entende-se que ele realmente possui características que o assemelham a uma mercadoria.
No entanto, considera-se que o conceito de mercadorias contido no artigo 191 do Código Comercial, é insuficiente para abranger os softwares, e em face da proibição do artigo 110 do Código Tributário Nacional, de que a lei tributária (legislador) não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos conceitos e formas de direito privado, que são utilizados para delimitar as competências impositivas, e ainda, do princípio da tipicidade fechada, que impõe ao legislador tributário proceder a rigorosa e exaustiva definição das características ou dos elementos do tipo legal necessários para enquadrar o fato concreto, e que vigora no âmbito tributário (diferente do que ocorre no direito privado, onde prevalece a liberdade de forma (art.82 do Código Civil), na esfera tributária (pública), prevalecem os conceitos fundados da estrita legalidade e na segurança jurídica), entende-se que a legislação atual, não possui os mecanismos necessários para enquadrar a circulação do chamado software "de prateleira" na hipótese de incidência do ICMS, sendo necessária a criação, por parte do Congresso Nacional, de uma nova norma que venha regulamentar a questão.
3.2.3 – Software "virtual"
Denomina-se no presente estudo de software "virtual", aquele que, apesar de ter características que ora o assemelham ao software "por encomenda", ora o assemelham ao software "de prateleira", tem como principal particularidade a ausência de suporte físico, por ser totalmente digitalizado.
Um pouco mais complexa é a questão envolvendo a sua comercialização, pois além das dificuldades já observadas com relação aos outros dois tipos, tem-se ainda a ausência da exteriorização do negócio jurídico, uma vez que, a operação se desenvolve totalmente pelos meios digitais, o que torna extremamente difícil estabelecer qual seria o estabelecimento comercial (para efeitos do ICMS) ou ainda o local da prestação do serviço (para efeitos do ISS), bem como, fiscalizar essa operação que se realiza sem que haja qualquer sinal externo da sua ocorrência.
Com isto se quer dizer que, além da necessidade de identificar a natureza jurídica deste programa (mercadoria ou serviço), deve-se buscar saber se o web site pode ou não ser considerado um estabelecimento comercial (para aqueles que consideram o software uma mercadoria, portanto, sujeita a cobrança do ICMS) ou ainda como o local da prestação do serviço (para aqueles que consideram o software como uma prestação de serviço, sujeita portanto, a cobrança do ISS).
A respeito da sua natureza jurídica, pode-se aplicar o mesmo que foi dito com relação aos softwares "por encomenda" e "de prateleira", ou seja, mesmo que comercializado de forma exclusivamente virtual, o programa feito "por encomenda" deve ser considerado como uma prestação de serviço. Já o programa que é produzido em série e em larga escala (chamado "de prateleira"), adquirido via download (consiste na transferência de arquivos de um computador remoto para um computador local), pode vir a ser caracterizado como uma mercadoria. No entanto, em ambos os casos, necessita-se de uma nova legislação para que todos os aspectos que envolvem a hipótese de incidência sejam caracterizados da forma mais clara possível, em virtude do respeito ao ordenamento jurídico constitucional e tributário.
Quanto a questão de considerar o site como um estabelecimento comercial, ou ainda, como o local da prestação do serviço (que fazem parte da descrição da hipótese de incidência do ICMS e do ISS, respectivamente), entende-se não haver tais possibilidades.
Isto porque, apesar de possuir algumas características, que em determinadas operações podem identificá-lo como um estabelecimento comercial e em outras identificá-lo como o local de uma prestação de serviços, para que isso de fato ocorresse, seria necessária uma urgente atualização legislativa com vistas a regulamentar os aspectos relativos ao registro fiscal, procedimentos de fiscalização e destinados a soluções de possíveis conflitos de competência.
Os web sites são virtuais, ou seja, não ocorre a exteriorização das operações que nele se realizam, e isto dificulta qualquer tentativa de caracterizá-lo seja como estabelecimento comercial, seja como local onde se prestam serviços.
Por estas razões, entende-se que o chamado software "virtual" esta fora do campo de incidência tributária, sendo necessária a edição de uma nova legislação para que isto ocorra.
3.3 – Os provedores de acesso à internet
Em face da discriminação de competências constitucionais adotada no Brasil, a crescente atividade dos provedores na internet têm levantado várias discussões, tanto jurisprudências quanto doutrinárias, acerca do enquadramento tributário dessas atividades.
Surge com isso, a dúvida quanto ao imposto que incidirá sobre tais atividades. Se as mesmas estariam sujeitas ao ICMS ou ao ISS. E ainda, admitindo-se a incidência deste último, se o serviço prestado pelos provedores estaria definido na lista veiculada pela Lei Complementar nº 56/87.
Convém primeiramente, tentar identificar qual o significado que foi dado pelo legislador constituinte ao "serviço de comunicação" contido na Lei Maior do Brasil, em seu artigo 155, inciso II, onde dispõe que:
Art. 155. Compete aos estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
I - (...)
II – operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;
O ilustre jurista Marco Aurélio Greco [11] interpretando o texto constitucional, dele extraiu que: "O conceito de "comunicação" utilizado pela CF-88 não é um conceito legal (que se extraia de uma determinada lei), mas sim um conceito de fato (que resulta da natureza do que é feito ou obtido)".
Observa-se com isso que o entendimento do conceito de comunicação utilizado pelo legislador constitucional, não deve sofrer uma interpretação restritiva, como tem tentado alguns doutrinadores, no sentido de pretenderem incluir na esfera de incidência do ICMS apenas o serviço de telecomunicação, que na verdade é uma espécie do gênero mais amplo que é a comunicação.
Como dito anteriormente, o tema tem provocado grandes divergências doutrinarias e inclusive jurisprudenciais. Com relação a isso, entende-se não haver maiores discussões quanto a configurarem, as atividades realizadas pelos provedores de internet, verdadeira prestação de serviço, vez que, não correspondem a operações que tenham por objeto bens móveis, nem mercadorias.
O que se observa, é que a questão primordial que se impõe é saber se o serviço prestado pelos provedores de acesso à internet constitui de fato uma prestação de serviço de comunicação, o que traria como conseqüência a sua tributação pelo ICMS.
Celso Oliveira [12] em consulta sobre a cobrança do ICMS e do ISS que lhe foi feita por empresas provedoras de acesso a internet no Estado do Paraná, identificou a existência de três posicionamentos jurídicos sobre a possibilidade ou não de se tributar o provedor de internet.
O primeiro é de defesa da cobrança do ICMS por considerar que os provedores se enquadram realmente como serviço de comunicação. Esta é a tese defendida pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), pelo doutrinador Marco Aurélio Greco, dentre outros.
O segundo tese defendida pela Prefeitura de São Paulo e de Curitiba, diz que os provedores seriam tributados pelo ISS, fazendo-se uma analogia dos serviços prestados por eles ao serviço de processamento de dados.
O terceiro, que reflete o entendimento de grande parte da doutrina, defende a não tributação dos provedores, seja pelo ICMS ou pelo ISS, por entender que se está diante de uma realidade nova, não conhecida pelo legislador e ainda que se trata de um serviço de valor adicionado e que não se enquadra em nenhum dos itens da lista do ISS. Este é o entendimento do próprio autor do parecer, dos juristas Fugimi Yamashita, Allaymer Bonesso, João Vicente Lavieri entre outros.
Mesmo respeitando-se os dois últimos posicionamentos, entende-se que o provedor de internet é realmente quem estabelece a comunicação, e quem detêm os mecanismos necessários para conectar o usuário a rede mundial de computadores.
Em regra a comunicação na internet é feita através do acesso por parte do usuário (que deverá dispor de um modem e uma linha telefônica), a um provedor. Este acesso ocorre com uma ligação telefônica, através de um programa com senha. A partir daí, o provedor, através de canais dedicados contratados por ele a uma específica empresa telefônica de ligações de longa distância, promove o roteamento (recepção e retransmissão de dados à rede através dos links e backbones) da ligação telefônica do cliente, e efetiva a sua comunicação com os demais usuários que já estejam na rede mundial.
É claro que este posicionamento não é unânime, pois como demonstrado anteriormente, grande parte da doutrina diverge desta opinião, utilizando para sustentar suas afirmações, respeitosos argumentos.
Para os defensores das correntes contrárias, a atividade realizada pelo provedor de internet seria apenas um serviço de valor adicionado ao de telecomunicações, vez que, a Lei Geral de Telecomunicações (LGT) – Lei nº 9.472/97 da a definição, em seu artigo 61, do que vem a ser este serviço, em cujo âmbito estaria inserido o provimento de acesso.
A jurista Luciana Angeiras [13] rebate este argumento expondo que:
Ocorre que o provedor de internet não presta apenas um serviço de valor adicionado, não é um mero plus à comunicação. Antes de tudo, é parte integrante do processo comunicacional; está relacionado com o canal físico, sendo o responsável por levar um dado do seu cliente à internet, bem como por manter a comunicação entre o emissor (Internet) e o receptor (usuário) através de seus computadores.
Compartilhando desta opinião, o já citado jurista Marco Aurélio Greco [14] ensina que a LGT utiliza conceitos, considerados por ela, pertinentes para regular determinado setor dessa atividade econômica, porém, ela não é uma lei tributária e não pretende delinear o campo de incidência de determinado tributo. Continua o citado autor dizendo que "Aliás, "comunicação" não é um conceito de direito privado que tenha sido encampado pela Constituição e que, por força do artigo 110 do CTN, devesse ter seu conteúdo buscado no âmbito da legislação específica do setor".
Argumentação semelhante, feita pelos que se colocam contrários a incidência do ICMS, é a de que como a LGT define o que vem a ser o serviço de telecomunicação, o ICMS somente poderia incidir sobre que fosse considerada telecomunicação.
Como visto anteriormente, não se pode admitir que a hipótese de incidência descrita pelo legislador constitucional, que buscou alcançar o gênero (comunicação), seja limitada por uma lei infraconstitucional que alcançou somente a espécie (telecomunicação).
Outro ponto questionado pelos opositores da tributação pelo ICMS, refere-se a necessidade de terem, os provedores de acesso, autorização, concessão ou permissão para explorar os serviços de comunicação em face do que dispõe o inciso XI, do artigo 21 da CF/88.
Ocorre que esta exigência é feita somente com relação aos serviços de telecomunicações, senão vejamos:
Art. 21. Compete à União:
(...)
XI – explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços de telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a organização dos serviços, a criação de um órgão regulador e outros aspectos institucionais; (grifos no original)
Ora, como se observou que a incidência do ICMS não se limita aos serviços de telecomunicações, mas sim aos serviços de comunicação, e ainda, que os provedores não realizam atividades referentes à telecomunicação e sim a comunicação, não se pode querer aplicar a exigência contida no citado artigo aos provedores de acesso.
A Norma 004/95, baixada pela Portaria MINICOM 148, de 31.05.1995 conceitua os provedores como sendo uma entidade que presta o serviço de conexão à internet, entendendo que esse "serviço de conexão" é prestado por meio de equipamentos que são necessários aos processos de armazenamento e encaminhamento de informações, e dos softwares e hardwares necessários para o provedor implementar os protocolos da internet e administrar o serviço.
O acesso à internet impõe ao usuário duas relações jurídicas distintas. A primeira, com uma concessionária de telecomunicações, onde pagará à ela um valor em contrapartida ao serviço de conexão (comunicação de dados via rede telefônica) entre ele e o provedor. A segunda com o provedor, com quem celebra um contrato de prestação de serviços através do qual ele poderá, mediante o uso de uma senha alfanumérica e pagamento do preço do serviço (usualmente proporcional ao número de horas de acesso) ter acesso à internet.
Nota-se que em ambas as relações estão sendo prestados serviços de comunicação. Assim como a empresa telefônica comunica o usuário com provedor, este comunica o usuário com a internet, não restando qualquer dúvida de que se trata, assim como o primeiro, de serviço de comunicação, e, por conseguinte, se enquadra na hipótese de incidência estabelecida pelo já citado inciso II, do artigo 155 da Constituição Federal.
Este foi inclusive o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, externado pelo voto do ilustre Ministro Relator José Delgado [15], onde decidiu entre outras coisas, que o provedor de internet é um agente interveniente prestador de comunicação e que os serviços prestados por ele são abrangidos pelas hipóteses de incidência do ICMS descritas no artigo 2º da LC nº 87, de 13.9.96, onde estabelece que:
Art. 2. O imposto incide sobre:
(...)
III - prestações onerosas de Serviços de Comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza".