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Limite de dedução do prejuízo fiscal no Imposto de Renda e da base negativa na Contribuição Social sobre o Lucro

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Agenda 01/01/2003 às 00:00

7 - A instituição de empréstimo compulsório disfarçado, sem obediência aos requisitos legais e constitucionais

Ainda na esteira das inconstitucionalidades, vale mencionar que, ainda que a limitação da dedução dos prejuízos fiscais e das base negativas sejam meramente temporal, já que no futuro, os valores dessas bases de cálculos negativas não utilizados, em função da restrição/limitação, podem vir a sê-lo, elas acabariam por implicar em um desembolso antecipado de imposto sobre a renda e de contribuição social sobre o lucro líquido, absolutamente indevidos, que só posteriormente serão recuperados.

E com isso, assemelham-se a verdadeiros empréstimos compulsórios disfarçados, instituídos sem que fossem observadas nenhuma das condições constitucionalmente estabelecidas para tanto, quais sejam: necessidade de lei complementar, atendimento a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidades públicas, guerras externas ou sua iminência, ou, ainda, no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional.

Nesse sentido, merece destaque decisão proferida pelo Exmo. Desembargador Andrade Martins, do E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, notadamente em virtude do reconhecimento do limite de 30% em questão como empréstimo compulsório:

"I - TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE A RENDA. COMPENSAÇÃO DE LUCROS, NO BALANÇO FISCAL, COM PREJUÍZOS APURADOS EM PERÍODOS-BASE ANTERIORES. ABOLIÇÃO DA LIMITAÇÃO TEMPORAL DO ART. 12 DA LEI 8.541/92 (LEI 8.981/95, ART. 117, INC. I). CRIAÇÃO DE LIMITE DE 30% AO EXERCÍCIO DO DIREITO DE COMPENSAR (LEI 8.981/95, ART. 42). EMPRÉSTIMO COMPULSÓRI0 DECORRENTE DE ILEGAL MORATÓRIA "PRO FISCO", INSTITUÍDA PELO LEGISLADOR ORDINÁRIO SEM AUTORIZAÇÃO DO CTN.

II - TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO. COMPENSAÇÃO DE LUCROS, NO BALANÇO FISCAL, COM BASES NEGATIVAS APURADAS EM PERÍODOS-BASE ANTERIORES. ABOLIÇÃO DA LIMITAÇÃO TEMPORAL DO ART. 44, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI N.º 8.383/91 (LEI N.º 8.981/95, ART. 117, INC. II). CRIAÇÃO DE LIMITE DE 30% AO EXERCÍCIO DO DIREITO DE COMPENSAR (LEI N.º 8.981/95, ART. 58). EMPRÉSTIMO COMPULSÓRIO DECORRENTE DE ILEGAL MORATÓRIA "PRO FISCO", INSTITUÍDA PELO LEGISLADOR ORDINÁRIO SEM AUTORIZAÇÃO DO CTN.

1 - Tal como foi estabelecida nos arts. 42 e 58 da Lei n.º 8.981/95 e ao depois reiterada nos arts. 15 e 16 da Lei n.º 9.065/95, a limitação percentual de 30% imposta à compensação de prejuízos fiscais e bases negativas - respectivamente em relação ao imposto sobre a renda e à contribuição social sobre o lucro - não restringe o direito dos contribuintes de compensar integralmente uns e outras com os lucros que venham a ser apurados, mas apenas escalona temporalmente o exercício desse direito.

2 - A legislação do imposto sobre a renda e da contribuição social sobre o lucro aboliu o esquema de limitação temporal que tradicionalmente impunha à compensação de lucros, no balanço fiscal, com prejuízos (IRPJ) e bases negativas (CSL) verificados em períodos-base anteriores. Os incs. I e II do art. 117 da MP n.º 812/94 - convertida na Lei n.º 8.981/95 - revogaram expressamente o art. 12 da Lei n.º 8.541/92 e o art. 44, parágrafo único, da Lei n.º 8.383/91, respectivamente - daí resultando que todo o estoque de prejuízos que se tenha formado a partir do balanço fiscal (de IRPJ e CSL) levantado em 31 de dezembro de 1994 é, por força de direito adquirido, permanentemente dotado de compensabilidade, insuscetível, pois, de extinção por decadência.

3 - A criação de novo esquema limitador, agora em função da expressão econômica absoluta do lucro real apurado, equivale à imposição de empréstimo compulsório, pois tal restrição não guarda relação alguma com os elementos da hipótese normativa e da base de cálculo dos tributos referidos - imposto sobre a renda e contribuição social sobre o lucro. O limite de 30% incide sobre a disponibilidade de um direito, e não sobre o direito mesmo, pois não faz senão restringir o fluxo normal do exercício deste, ao longo do tempo. Por isso, sua incidência implica apropriação temporária de parcela do patrimônio da empresa, levada a cabo sem observância dos requisitos previstos no art. 148 da Constituição.

4 - De modo análogo ao utilizado na dilação imposta aos contribuintes pelo art. 311, inc. I, da Lei 8.200/91, também traduz imposição inválida de empréstimo compulsório a referida limitação de 30% prevista nos arts, 42 e 58 da Lei no 8.981/95 e reiterada nos arts. 15 e 16 da Lei n.º 9.065/95 (Argüição de Inconstitucionalidade em REO MS n.º 150.656, Reg. n.º 94.03.047561-7; j. 28.9.95, Rev. TRF 3ª Região, vol. 24, p. 196 e segs.).

5 - A limitação de 30% no caso imposta à compensação de prejuízos, antes mesmo de se revestir como insólito empréstimo compulsório, erige-se como ilegal suspensão da exigibilidade de um crédito do contribuinte, à medida que coonesta cogente procrastinação do exercício do respectivo direito por seu legítimo titular. Desse modo, a rigor, introduz ilegal esquema de moratória no direito tributário - modalidade de moratória em favor do fisco, não autorizada pelo Código Tributário Nacional exatamente o reverso da medalha do instituto que, exclusivamente em favor do contribuinte, vem disciplinado no art. 151, inc. I, da referida codificação.

6 - Matéria preliminar rejeitada. Apelação da União e remessa oficial improvidas. Apelação da impetrante provida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar, negar provimento à apelação da União e à remessa oficial e, por maioria, dar provimento à apelação da impetrante, nos termos do relatório e voto do Senhor Desembargador Federal Andrade Martins, na conformidade da ata de julgamento que fica fazendo parte integrante do presente julgado, com quem votou o Desembargador Federal Newton De Lucca, sendo que a Desembargadora Federal Lucia Figueiredo lhe dava parcial provimento.

São Paulo, 26 de agosto de 1998 (data do julgamento).. " (Apelação em Mandado de Segurança n.º 180965 - TRF 3ª R – Relator Des. Federal Andrade Martins - Apelantes: Goldfarb Incorporações e Construções Ltda e outros, União (Fazenda Nacional) Apelados: os mesmos Remetente: Juízo Federal da 13ª Vara São Paulo - Sec. Jud. SP)"

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Isto posto, também por esses motivos supra aduzidos, não podem prosperar à limitação à dedução dos prejuízos fiscais na base de cálculo do imposto de renda e das bases negativas na base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido, pois ofendem o artigo 148, I e II, da Constituição Federal de 1988 [49], entre outros, por instituir empréstimo compulsório disfarçado, não obedecendo os requisitos constitucionalmente impostos.


8 - A Dedução das Bases de Cálculo Negativas versus a Compensação Tributária

A dedução dos prejuízos fiscais e das bases negativas, não se confunde com a compensação de tributos pagos indevidamente ou a maior, prevista no art. 170 [50], do Código Tributário Nacional, e regulada pelo art. 66 [51] da Lei nº 8.383/91, com redação dada pelo art. 58 [52] da Lei nº 9.069/95.

De fato, conforme anteriormente exposto, a dedução das bases de cálculo negativas tem por finalidade a absorção dos prejuízos fiscais e das bases negativas, para a correta apuração das bases de cálculo do imposto de renda e da contribuição social sobre o lucro, mediante a exclusão (subtração) de seus valores do(s) resultado(s) positivo(s) obtidos.

Assim, a dedução dos prejuízos fiscais e das bases negativas, ocorre sempre em momento anterior à apuração ou recolhimento dos tributos, objetivando apenas excluir da tributação resultados que, em verdade, nada acrescem ao patrimônio das contribuintes, mas apenas e tão somente, recompõem perdas anteriores.

Difere, assim, da compensação de tributos, que ao contrário, se opera em momento sempre posterior à apuração dos tributos e implica, necessariamente, no recolhimento indevido ou a maior de tributos em etapa anterior a da compensação.

E tal situação não ocorre de forma alguma com a dedução das bases de cálculo negativas, que indicam, justamente, a ausência de tributos a pagar no período anterior a que se referem.

Desse modo, podemos constatar que para a compensação de tributos, é essencial que exista um crédito tributário entre o contribuinte e o Poder Público, decorrente de um recolhimento efetuado anteriormente de forma indevida ou à maior e que, dessa forma, pode ser restituído ao contribuinte na forma de compensação com os futuros recolhimentos.

Nota-se, portanto, que para que se possa efetuar a compensação tributária, o crédito tributário deve, obrigatoriamente, já estar constituído, o qual, face à compensação, será posteriormente reduzido.

A dedução das bases de cálculo negativas, entretanto, não afetam o crédito tributário após a sua constituição, mas anteriormente, pois contribuem para a correta apuração das bases de cálculo dos mencionados tributos.

Dessa forma, temos que a dedução dos prejuízos fiscais e das bases negativas não se confunde com a compensação tributária, pois, conforme se demonstrou acima, apesar de ambas serem direitos do contribuinte, possuem condições, elementos e finalidades totalmente diversos e que não podem ser confundidos.

Verifica-se, portanto, que a utilização do vocábulo "compensação", ao invés de dedução dos prejuízos fiscais e das bases negativas, é mais uma imprecisão da linguagem técnica (livre, natural) utilizada pelos legisladores - considerados na acepção ampla do vocábulo "legislador" - que, apesar de conter alguns termos científicos, acaba gerando uma série de impropriedades, erros, atecnias, ambigüidades e etc., como no presente caso.

Face ao exposto, entendo que "dedução" é o vocábulo mais adequado para nominar o direito em questão.


9 - A Decadência do direito à dedução

Entende-se por decadência, a perda do direito material em função do seu não exercício dentro de um prazo previamente estabelecido. Dessa forma, havendo previsão temporal para que um direito seja exercido e, o seu titular por qualquer motivo não o exerceu, este, fatalmente, perderá esse direito, face a sua inércia.

No que se refere a decadência do direito à dedução das bases de cálculo negativas, temos que não existe, atualmente, norma que estabeleça prazo específico de decadência desse direito, como ocorreu anteriormente em 1947 (prazo de 03 anos) e em 1977 e 1992 (prazo de 04 anos).

Dessa forma, apurados os prejuízos fiscais e as bases negativas, o contribuinte poderá efetuar a sua dedução com os posteriores resultados positivos, independentemente de qualquer prazo e, dessa forma, não há que se falar em decadência na presente questão.

Nesse sentido, cabe ressaltar que é bastante comum a atribuição de direitos em nosso ordenamento, sem que tenha prazo determinado para sua extinção, prevendo-se tão somente um termo final para o exercício do direito à ação judicial que o assegura, como é o caso de todos aqueles que, não sujeitos à decadência, encontram-se apenas sujeitos à prescrição.

Assim,o mestre SILVIO RODRIGUES [53] afirma que:"na prescrição o que perece é a ação que guarnece o direito; enquanto na decadência é o próprio direito que fenece", o que confirma a possibilidade de subsistência indefinida de determinados direitos, sem se falar ainda naqueles imprescritíveis, como os referentes à vida, honra, nome, nacionalidade, os facultativos ou potestativos, aqueles referentes às ações sobre estado de família etc.

Assim é que informa WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO [54]:

"Uma vez adquiridos, perduram os direitos enquanto não sobrevém causa capaz de eliminar algum ou todos os seus elementos constitutivos, sujeito, objeto e tutela legal. O direito não se extingue pelo não-uso, salvo na hipótese prevista pelo art. 710, nº III, do Código Civil."

Cabe também acrescentar que, se a intenção do legislador fosse que o direito à dedução em questão tivesse prazo final para seu exercício, este o teria feito na própria lei (ou se preferisse em outra posterior), como no caso dos prejuízos fiscais onde se limitou o exercício deste direito aos 4 (quatro) anos-base subsequentes à apuração do citado prejuízo, conforme acima mencionado.

Observe-se que somente nesses casos, a limitação temporal imposta para utilização dos prejuízos fiscais na esfera do imposto de renda não era somente a forma de exercício do direito, mas confundia-se com sua própria essência, já que, se não exercido dentro daquele prazo estipulado, o contribuinte não mais poderia fazê-lo.

Tal situação não difere da decadência, onde o prazo para exercício de um determinado direito afeta diretamente sua subsistência, atingindo-o frontalmente.

Por outro lado, ainda que houvesse um prazo de decadência para o exercício do direito à dedução das bases de cálculos negativas, este seria inconstitucional pelos mesmos argumentos aplicáveis à limitação de 30%, anteriormente expostos.

De fato, a fixação de prazo decadencial, da mesma forma que a limitação imposta, contraria os conceitos de renda e de lucro utilizados pela Constituição Federal, o princípio da capacidade contributiva, o da isonomia, o da vedação ao confisco etc, na medida em que, conforme se demonstrou anteriormente, acaba também provocando uma tributação sobre resultados que nada acrescem, mas tão somente recompõem perdas anteriores.

Ora, imaginemos um prazo de 04 (quatro) anos para que se efetue a dedução das bases de cálculo negativas e, dentro desse prazo, um contribuinte exerceu regularmente o seu direito, deduzindo-as com os resultados positivos obtidos, mas ao término desses 04 (quatro) anos, restam ainda bases de cálculo negativas à deduzir, que face a decadência, não poderão ser mais deduzidas.

Dessa forma, se atendida a limitação de 30% imposta, esse contribuinte deverá, a partir de então, tributar seus resultados sem considerar os prejuízos acumulados, contrariando, face ao exposto, todos os princípios e normas supra mencionadas.

Portanto, seja porque não há previsão temporal para a extinção do direito à dedução dos prejuízos fiscais e das bases negativas com os resultados positivos futuros, seja porque se houvesse tal prazo, este seria inconstitucional, não há que se falar em decadência ao direito em questão.

Sobre o autor
Walter Saes

advogado, consultor e analista tributário em São Paulo (SP), pós-graduando em Direito Tributário

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SAES, Walter. Limite de dedução do prejuízo fiscal no Imposto de Renda e da base negativa na Contribuição Social sobre o Lucro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 61, 1 jan. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3572. Acesso em: 24 nov. 2024.

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