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Primeiras linhas em Direito Eletrônico

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Agenda 01/01/2003 às 00:00

VII- Princípios norteadores

Princípios são aquelas linhas diretrizes ou linhas mestras que inspiram o sentido das normas e configuram a regulamentação das relações virtuais, conforme critérios distintos dos que podem ser encontrados em outros ramos do direito.

Segundo Américo Plá Rodrigues30 princípios "são linhas diretrizes que informam algumas normas e inspiram direta ou indiretamente uma série de soluções pelo que, podem servir para promover e embasar a aprovação de novas normas, orientar a interpretação das existentes e resolver os casos não previstos".

Patrícia Regina Pinheiro Sampaio e Carlos Affonso Pereira de Souza31 vêem a necessidade de adaptação da legislação vigente mas que na falta de legislação específica "nossos juízes deverão utilizar-se dos princípios gerais de direito e dos costumes internacionais que paulatinamente se vão fixando para reger as controvérsias oriundas dos contratos internacionais, a fim de melhor atender às exigências do bem comum e do clamor social por justiça"

Transpondo a noção de princípios gerais do direito, válidos em todo o direito, para os princípios do Direito Eletrônico aplicáveis somente na área deste direito, podemos dizer que são as idéias fundamentais e informadoras da organização jurídica virtual. São eles os seguintes:

a) Princípio da existência concreta – transparece a primordial diretriz de que as relações estabelecidas pelos envolvidos na esfera fática devem se sobrepujar sobre a formalidade dos atos praticados na esfera virtual, ou seja deve haver um predomínio dos fatos quando forem divergentes dos documentos e/ou atos eletrônicos. O que deve ser levado em consideração nas relações virtuais é aquilo que verdadeiramente ocorre e não aquilo que é estipulado em, por exemplo contratos virtuais. Ensina referido princípio que em caso de discordância entre o que ocorre na prática e o que surge de documentos e acordos estabelecidos eletronicamente deverá ser dada maior importância ao que sucede nos terreno dos fatos. O desajuste entre os fatos e a forma pode evidenciar a simulação de uma situação jurídica distinta da realidade viciada por um erro na transmissão de dados e informações.

A importância desse princípio é reforçada pela facilidade com que podem ser adulterados os documentos eletrônicos além do que a legislação específica não atribui validade aos documentos eletrônicos como faz a legislação francesa. Portanto a supremacia dos fatos nos tempo atuais mostra-se a corrente dominante na doutrina até que sejam criadas legislações e mecanismos governamentais que validem ou autentiquem tais documentos atribuindo-os validade e segurança jurídica e que portanto minimizem a utilização desse princípio restringindo-o apenas quando realmente necessário para dirimir dúvidas provenientes desse tipo de documentos.

b) Princípio da racionalidade

A escassa legislação existente nos dá a exata importância desse princípio, pois sua maleabilidade dá margem a diversas interpretações que devem ser norteadas pela razão de conformidade com o pensamento de Montesquieu e Rousseau, ou seja consiste na afirmação essencial de que o ser humano procede e deve proceder nas suas relações virtuais conforme a razão.

A vasta liberdade deixada por nossos legisladores fornece um imensurável campo de decisões que podem revestir-se de arbitrariedades e que devem necessariamente passar pelo crivo do princípio da racionalidade permitirá a construção de uma espécie de standart a ser seguido em determinadas situações levadas ao judiciário trazendo respeito e confiança por parte daquele que necessita resolver sua questão através dos órgãos estatais.

Observamos então que referido princípio corresponde a um limite ou freio formal e ao mesmo tempo flexível, aplicável nas relações onde as premissas legais não tem o poder de descrever minuciosamente as regras de conduta concernentes justamente pela infindável possibilidades e maneiras de desenvolvimento das atividades efetuadas pela novas tecnologias da informação

Por não existir uma espécie de consenso na interpretação assim como existe presumivelmente na ciências exatas a aplicação desse princípio torna-se útil para a melhor aplicação do Direito Eletrônico. No longínquo ano 1908, o jurista Clóvis Benviláqua32, já lecionava a e expusera a vital importância do manuseio da razão para efeito de interpretação conforme podemos constatar nas seguintes palavras: "Em conclusão, na interpretação da lei deve atender-se antes de tudo ao que é razoável, depois às conseqüências sistemáticas e, finalmente ao desenvolvimento histórico da civilização"

Recaséns Sinches33, ao considerar os vários métodos modernos-método teleológico, método histórico-evolutivo ou progressivo, "método da "vontade da lei", nos mostra que cada um deles encerra uma parte de verdade, mas que em sua síntese final, em cada caso concreto, será dada pelo "logos do razoável". Mal comparando, a operação interpretativa se assemelha à execução de uma partitura musical. Vários são os instrumentos – no caso os métodos de interpretação – mas eles devem formar um conjunto harmônico, sob a batuta do maestro, no caso, o logos do razoável, o qual, como veremos em breve, ‘informado pela idéia básica do bem comum"

Assim podemos notar que o princípio da racionalidade deve ser alçado e respeitado como sendo um dos princípios inerentes ao Direito Eletrônico devendo ser utilizado e aplicado para dirimir as questões onde sejam discutidas as relações virtuais.

c) Princípio da lealdade – Todo homem deve agir em boa-fé, deve ser verdadeiro: ex honestate unus homo alteri debet veritatis manifestationem, essa é a premissa básica a ser seguida por todos aqueles que almejam o relacionamento justo e harmonioso perante a sociedade.

A Lealdade e confiança recíprocas são fundamentais para qualquer negócio através do cumprimento honesto e escrupuloso da obrigações mutuamente estabelecidas.

Apesar dos interesse divergentes e contrapostos: "As partes são obrigadas a dirigir a manifestação da vontade dentro dos interesses que as levaram a se aproximarem, de forma clara e autêntica, sem uso de subterfúgios ou intenções outras que não as expressas no instrumento formalizado. A segurança das relações jurídicas depende, em grande parte, da lealdade e da confiança recíproca. Impende que haja entre os contratantes um mínimo necessário de credibilidade, sem o qual os negócios não encontrariam ambiente propício para se efetivarem. E esse pressuposto é gerado pela boa-fé ou sinceridade das vontades ao firmarem os direitos e obrigações. Sem ele, fica viciado o consentimento das partes. Embora a contraposição de interesses, as condutas dos estipulantes subordinam-se a regras comuns e básicas da honestidade, reconhecida s ó em face da boa-fé que impregna as mentes"34

O interprete, portanto, em todo e qualquer contrato tem de se preocupar mais com os espírito das convenções do que com sua letra. "L’ espirit prime la lettre; la volonté réelle domine le rite; le droit n’est plus dans les mots, mais dans les réalités. Ceux-là ne peuvent, en aucun cas, permettre de défòrmer celles-ci"35.

Assim a lealdade nos atos e contratos perpetrados pela via eletrônica devem estar sempre acompanhados do princípio referido que deve ser utilizado quando qualquer dos envolvidos tente se locupletar indevidamente de terceiros visando enriquecimento ilícito a custas da lesão dos direitos assegurados pela legislação vigente.

O princípio da lealdade torna-se mais efetivo e importante em matéria de Direito Eletrônico em virtude da acentuda e crônica falta de leis sobre o assunto que leva aqueles que necessitam estabelecer relações pela via eletrônica a resguardar seu direitos através dessa premissa principiológica.

d) Princípio intervenção estatal – a intervenção direta do Estado para garantir efetivamente as relações virtuais, é de fundamental importância. Para evolução dessa práticas o Estado deverá regulamentar uma série de atividades como por exemplo, a do notário eletrônico. Validar os documentos produzidos na internet através de órgãos certificadores. Legitimar assinaturas digitais.

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O Estado tem o dever de estabelecer uma verdadeira política diretrizes nas relações virtuais com o intuito de dar segurança e legalidade a estes atos contribuindo assim de forma decisiva para o fomento do comercio e da economia em geral.

Portanto para aqueles que desejem contratar por intermédio de um contrato virtual, o Estado deverá fornecer subsídios necessários para garantir jurídica e legalmente este vínculo dando validade jurídica aquele documento, a assinatura digital, etc..

Além disso, o Estado deverá intervir em uma incontável gama de situações que proporcionem desrespeito ao direito, como o cometimento de crimes, violação de regras de publicidade, direitos do consumidor e uma série de outras questões que só poderão ser combatidas se houver a intervenção efetiva do Estado.

Por fim queremos ressaltar que o papel do Estado nesta revolução de conceitos é fundamental para o sucesso da relações virtuais e enfatizar que sua inércia em resolver e normatizar essas questões traz um prejuízo considerável a economia e aos cidadãos que continuam a contratar sem qualquer espécie de garantia e sujeito a todo o tipo de infortúnio. Daí a necessidade da intervenção estatal que exercerá uma dupla e primordial função através de atos e procedimentos normativos: o fomento das relações virtuais e a coibição de práticas contrárias ao direito.

e) Princípio da Subsidariedade

a.1) Introdução

Apesar de não concordarmos com a utilização da legislação vigente para dirimir conflitos provenientes de relações virtuais, a realidade da carência de normas e institutos que ainda devem demorar muitos anos para surgir em sua plenitude nos faz admitir que este princípio atualmente é fundamental para o desenvolvimento do Direito Eletrônico.

e.2) Pressupostos para a aplicação

Esclarecemos que dois pressupostos devem ser observados antes da aplicação desse princípio. O primeiro diz respeito a omissão, ou seja, as normas tradicionais só poderão ser aplicadas nas relações virtuais se as mesmas não tiverem previsão legal. O segundo pressuposto para aplicação é de que não seja incompatível com os demais princípios e normas vigentes sobre o assunto, bem como que sua efetivação não determine procrastinações e inadequações ao desenvolvimento natural dessas relações, permitindo a celeridade e a simplificação, que sempre são almejadas na solução dos conflitos.

e.3) Objetivo

Pretendemos demonstrar abaixo uma série de entendimentos de diversos doutrinadores na área do Direito Eletrônico que a nosso ver dão subsídio para esse princípio. Porém em momento algum atribuímos aos mesmos o reconhecimento desse princípio apenas nos utilizamos de seus pensamentos para apontar a necessidade de um norte único que dissemine uma fonte segura de aplicação desse direito seja qual for o caso ou ramo jurídico em que se apresente.

Com isso teremos um norte fixo e seguro para solucionar as mais variadas questões desde a aplicação de regras contratuais até mesmo a confecção de um contrato eletrônico de forma correta que se vier a ensejar qualquer dúvida sobre sua aplicação possa ser dirimida com base nesse princípio ou qualquer outro que elaborar-mos em outros tópicos

Assim segue abaixo a aplicação desse princípio nas mais variadas esferas do direito demonstrada através da análise de uma série de livros sobre o assunto onde, onde repito os autores não o identificam, porém em nossa compreensão ele é utilizado de forma expressa em suas colocações.

e.4) Na esfera contratual

Em nosso entendimento a Prof. Ana Paula Gambogi Carvalho36 apesar de reconhecer aplicação desse princípio vê a necessidade da criação de leis regulamentadoras "o desenvolvimento do comércio eletrônico esbarra, tanto no Brasil, quanto na Alemanha, em uma série de obstáculos legais. O problema principal no que se refere à conclusão de contratos eletrônicos está na falta de segurança da internet. Os preceitos legais aplicáveis do Direito brasileiro não se prestam a regulamentar adequadamente o uso de assinatura digital, como também deixam em aberto a questão da validade jurídica de documentos assinados divinalmente. A ausência de legislação nessa área contribui imensamente para minar a confiança do usuário de Internet brasileiro nesta nova tecnologia, o que impede o desenvolvimento do comércio eletrônico no País. A necessidade de leis claras e adequadas disciplinados o assunto é premente."

Referido entendimento vai de encontro ao nosso, pois a falta de mecanismos legais impede o regular desenvolvimento da relações virtuais ao mesmo tempo em que nos força a utilizar velhos institutos para dar uma segurança mínima aos contratos, por exemplo estabelecidos via internet. Portanto enquanto não possuímos tão almejada legislação deveremos nos utilizar dos velhos institutos através do princípio da subsidiariedade, mesmo que inadequados mas que porém não devem deixar de ser aplicados para o resguardo de bens jurídicos lesionados.

Outras posições podem ser encontradas em doutrina diametralmente opostas principalmente no que diz respeito a eficácia probatória como a do Prof. José Rogério Cruz e Tucci37 quando diz que "As técnicas de certificação disponíveis na atualidade permitem garantir razoável segurança do comércio eletrônico, até porque as entidades financeiras e importantes empresas não teriam investido tantos recursos na comunicação via internet se porventura houvesse risco acentuado aos seus potenciais clientes.

Em futuro não muito distantes, as empresas e os consumidores irão certamente habituar-se, em proporção crescente, a utilizar e reconhecer como seguras as transações virtuais.

Conclui-se pois que a eficácia probante dos contratos eletrônicos deve ser autorizada sem quaisquer óbices e subordinada à prudente análise do julgador, que poderá por certo, quando se fizer necessário (art.383, parágrafo único do CPC) recorre aos demais meios de prova, em especial, à prova pericial para certificar-se da autenticidade do respectivo documento"

A afirmação que os contratos eletrônicos tem eficácia probatória sem quaisquer óbices é no mínimo perigosa pois enseja segurança que não condiz com a realidade eletrônica além do que o autor ressalva que quaisquer dúvidas podem ser sanadas com a realização de prova pericial o que deságua na completa inutilidade do meio que deverá sempre ser submetido a perícias. Além disso o reconhecimento da segurança não se dará pela habituação dos envolvidos e sim por normas de segurança e aparatos que permitam aos usuários estabelecer relações virtuais com o resguardo da lei e do Estado.

O Prof. Marco Aurélio Greco38 dirimiu com muita propriedade o procedimento que deve ser seguido pelo profissional no momento da interpretação e aplicação as questões envolvendo as novas tecnologias inseridas na sociedade dizendo que "diante desta novas realidades, cumpre evitar duas posturas igualmente inadequadas em se tratando desta novidade que são os sites da internet: uma é repelir a aplicação dos conceitos que foram construídos no âmbito do Direito como se a realidade fosse totalmente diferente e eles fossem absolutamente inadequados. Não há dúvida que a novidade é manifesta e que esta realidade virtual escapa do padrão que baseou a disciplina normativa dos últimos séculos. Por isso pode-se dizer que os conceitos clássicos estão em crise, pois não são suficientemente operativos para regular a realidade atual, mas isto não significa que os standards que os informam e os valores e finalidades que visam não sejam semelhantes aos que devem encontrar aplicação no âmbito da internet (boa-fé, lisura de comportamento, etc...)

Outras postura igualmente simplista é pretender considerar que os conceitos construídos a partir de um mundo material são automaticamente transplantáveis para o âmbito da internet. Exageramos em sentido oposto, pois, assim como é fato que existem conceitos, institutos, figuras e normas que podem ter aplicação no mundo virtual, também é fato que este apresenta características absolutamente novas que não são captadas pelas norma existentes.

A conclusão que daí decorre é que há todo um conjunto de situações novas que exige um esforço de todos os estudiosos do Direito, no sentido de buscar uma disciplina que seja compatível com as características técnicas e operacionais da informática e que conduza a uma nova conformação de institutos jurídicos existentes e ao nascimento de outros novos, seja quanto aos objetos das relações jurídicas, seja quanto ao seu valor ou conteúdo".

Andou bem o autor ao separar as posturas que não devem ser nem simplistas nem inadequadas porém acreditamos na necessidade de estruturação de novos institutos próprios de uma ramo autônomo da ciência como o princípio da subsidiariedade e não buscar compatibilidade em disciplinas já existentes que além de trazerem o ranço arcaico trazem problemas de interpretação e aplicação de toda a ordem que geram inseguranças e indefinições jurídicas que comprometem o desenvolvimento das relações jurídicas estabelecidas pela via eletrônica.

e.5) Na esfera documental

Ao mencionar documento eletrônico Ângelo Volpi Neto39 diz "que em virtude de no Brasil não há legislação sobre o tema até a presente data de 2001, é necessário que se faça aplicação do Direito Comparado, para adaptar-mos, dentro do possível, à legislação existente e aplicarmos a prática comercial, que como sempre, que como sempre vem muito antes de qualquer dispositivo legal"

Sugere o autor, o saneamento dos problemas apresentados pela falta de regulamentação legal dos documentos eletrônicos a aplicação, por intermédio do princípio da subsidiariedade e provisoriamente, do direito comparado e aplicação dos costumes para resolver determinadas questões pontuais.

Para o especialista Renato M. S. Opice Blum40 "em um futuro próximo, os negócios realizados on line serão a regra e não mais a exceção. Dessa maneira, ainda que seja possível atribuir a validade do documento eletrônico desde já, observados certos pressupostos, impõem-se a adoção de normas que regulamentem a questão da Assinatura Digital e sua validade quando aplicada ao documento eletrônico, não só no Brasil, mas em todo o mundo, visando uma segurança jurídica capaz de fornecer o comércio internacional".

A nosso ver o autor se contradiz quando diz que é possível atribuir validade ao documentos eletrônico desde já e ao mesmo tempo diz ser necessário a adoção de normas que regulamentem a assinatura digital e a sua validade. Ora não podemos atribuir este validade de forma contundente, pois a segurança de um documento eletrônico ainda é muito frágil e sujeita a todo o tipo de adulteração, que só será sanada atingindo um grau razoável de risco quanto tivermos legislações específicas sobre a firma digital e autenticação de documentos por organismos oficiais de preferência.

e.6) Nas esfera criminal

O Prof. Arthur José Concerino41 assevera uma dificuldade maior na aplicação do direito penal existente e a necessidade primordial da criação de leis atentando que "a precariedade da legislação, aliada à falta de conhecimentos específicos sobre a rede mundial e acerca dos métodos e forma utilizados pelo invasores, de um lado, e a incessante expansão da internet e também o permanente avanço da criatividade dos hackers, de outro, dificultam sobre maneira a questão da segurança digital. Isto porque, não só através de antivírus, firewalls, criptografia, etc., se combate a ação desses experts. A falta de regulamentação no que pertine a este tema também constitui elemento de intranqüilidade. Embora esteja sendo aplicada, por exemplo a legislação comum (código Penal) a alguns crimes praticados através da rede, o fato é que em determinadas situações, o grau de ofensa ao bem da vida lesado é de tal monta, que a sociedade clama por penalidades mais severas, veiculadas através de normas específicas. Ademais, em matéria penal, faz-se mister a descrição de uma conduta específica (tipo penal), pois este ramo do direito repele o uso da analogia, quando aplicada em prejuízo do réu"

Nesse caso autor a nosso ver vai além salientando a impossibilidade da atuação da legislação, em alguns casos uma vez que na tipificação dos crimes não é aceita a figura da analogia e por conseguinte livra os criminosos de sanções penais em determinados casos em que a lei não prevê questões envolvendo atos condenáveis na esfera criminal.

Já os Profs. Alexandre Jean Daoun e Renato M. S. Opice Blum42 defendem que "em que pesem as considerações de que a lei material penal deva ser interpretada restritivamente, proibida a extensão analógica, o revés de tal interpretação, para o Direito da Informática, ausente qualquer traço análogo, o dinheiro rapinado de uma conta corrente via internet é furto como outro qualquer, diferenciando-se apenas quanto a maneira e quanto ao agente que pratica o delito (cracker). Nesta abordagem, o que difere não é o tipo penal, nem mesmo os conceitos incidentes sobre este; a inovação está no modus operandi. O resultado alcançado com a conduta independe da abrangência jurídica atribuída a `res`"

E continua "Em face das lacunas oriundas da modernidades, a reprimenda aos novos crimes virtuais que afloram em nosso meio deverá acatar o princípio da reserva legal, conquanto verificada no artigo 1º. do Código Penal brasileiro e consagrado pelo artigo 5, XXXIX da Constituição Federal de 1988: "Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal".

Enquanto isso o Direito Penal, tutelador dos bens mais relevantes, quais sejam, vida, liberdade, pode ser regido pelas normas penais como anteriormente comentado.

A sociedade não pode estar submetida à falta de interpretação destas ou ficar a mercê do Direito costumeiro e da analogia para definir a sua aplicação. Através dos mecanismos legais existentes e dos que estão por vir, deve brotar a resistência às condutas criminosas, anulando, assim, o desdém com que parte da sociedade prefere tratar as inovações eletrônicas presentes cada vez mais em nosso meio".

O artigo constante em nossa Carta Magna e no Código Penal mencionado pelos autores visualiza bem o espírito do legislador e preconiza uma segurança legal na punição dos crimes, portanto a legislação vigente é inapta para a solução dos crimes virtuais que devem observar legislação específica, no entanto de maneira subsidiária deve ser aplicada a legislação penal vigente não através da correta aplicação do Direito Penal, mas sim por uma medida de segurança pública e política social relegando a um segundo plano as interpretações corretas do direto penal, porém vale salientar que tais procedimentos são extremamente temeráveis e devem ser imediatamente remediados de uma forma coerente que se vislumbra com a criação de leis específicas sobre o assunto.

Assim necessitamos de novas regras como preleciona o Prof. Guilherme Guimarães Feliciano43 "Urge, pois, que venha a lume legislação específica para tipificar todas as condutas próprias de criminalidade (mormente os delitos informáticos puros, como noutros países se fez). A atipicidade de diversa condutas socialmente reprováveis e relacionadas ao objeto informático, algumas das quais em franca ascensão (e.g. o ingresso não autorizado em rede ou sistema computacional), imprime ares de premência à edição de lei apropriada".

e.7) Na esfera trabalhista

Curiosas soluções são expostas por alguns doutrinadores que a nosso ver não trazem uma definição apropriada. Uma delas é a apresentada pelo Prof. Roberto Senise Lisboa44 quando conclui que "o empregador não pode efetuar o monitoramento de e-mail`s encaminhados e recebidos por seus empregados, sob pena de violação do direito à intimidade e a privacidade, salvo em se tratando de mensagens abertas ao público em geral.

Havendo desconfiança sobre a produtividade ou a fidelidade do empregado, torna-se preferível optar pela sua substituição por outro empregado de confiança, deslocando-o para outra atividade se for o caso"

Tal afirmativa demonstra o quanto é perigosa a utilização de conceitos tradicionais, pois além dos desdobramentos que a situação impõe, as soluções em virtude da falta mandamento legislativo levam a soluções no mínimo inadequadas como a troca por outro empregado de maior confiança como sugere o referido autor.

Ora a relação trabalhista só pode vingar se houver a confiança mínima exigida para qualquer relação de emprego. Além do mais, o problema não é tão fácil assim, pois os meios de produção são de propriedade do empregador e portanto, não devem ser utilizados para fins pessoais do empregado. Daí perguntamos, mesmo sendo utilizado o e-mail pelo empregado para fins criminosos o empregador não poderá filtrar esse e-mail que é enviado por máquinas de sua propriedade, dentre outras questões que deverão ser abordadas em tópicos específicos.

e.8) Direito autoral

No direito autoral a necessidade da segurança é ainda mais patente. Segundo o Prof. Manoel J. Pereira dos Santos45 "parece inevitável concluir que, mesmo mantido o caráter personalista do Direito Autoral, apesar da manifesta diluição dos conceitos de autoria, originalidade e finalidade da obra intelectual, deveremos sem dúvida contemplar o nascimento de um regime protetivo das obras intelectuais de configuração radicalmente diferente daquele que surgiu em decorrência da invenção da imprensa".

É importante salientar, comungamos desse entendimento, que a interpretação a ser utilizada deve levar em consideração as situações radicalmente diferentes que no caso são apontadas pelo autor. A imprensa escrita e a publicação eletrônica traz uma série de peculiaridades que muitas vezes não permitem uma aplicação unitária para as duas situações, por isso o legislador ou o interprete na hora de sua atuação deve tomar muito cuidado pois o mesmo preceito pode não ser adequado as duas situações, o que traz uma maior complexidade na aplicação do princípio da subsidiariedade e faz salientar a maior urgência nessa matéria da feitura de leis pertinentes.

e.9) Solução mais apropriada

Para nós a solução mais adequada para os problemas concernentes as questões que envolvem o Direito e a Informática é sem dúvida, a promulgação de leis em primeiro lugar e é claro como estas não abarcam a totalidade das relações estabelecidas na sociedade, devemos nos socorrer a princípios universais do Direito Eletrônico como o princípio da subsidiariedade desde que observados os pressupostos a ele inerentes.

Para o Prof. Marco Aurélio Greco46 o "grande desafio para a jurisprudência e legislação que vierem a ser construídas versando as atividades realizadas com o uso de computadores, não envolve questões meramente técnicas de eficiência dos equipamentos, mas está predominantemente, na composição justa e equilibrada destes valores.

Estas nova realidade coloca problemas jurídicos complexos que estão exigindo a elaboração de uma legislação compatível com suas características".

No mesmo sentido o Prof. Sérgio Ricardo Marques Gonçalves47 "o modo de se pacificar este potencial manancial de lides com os quais lidamos hoje é aprovar, com extrema urgência em nosso país, a adoção de um sistema de assinatura digital, garantindo as partes e em especial ao logista, mais respaldo na identificação de seu parceiro de negócios. Serão também necessárias normas que determinem toda uma infra-estrutura de armazenamento de dados e documentos, além de formas de proteção ao seu conteúdo (que hoje também não temos), cabendo às partes neste ínterim, salvaguardar seu interesse usando a prevenção como sua maior arma"

Nosso entendimento vai de encontro com o dos autores, pois a solução definitiva passa pela promulgação de leis que viabilizem a utilização dos meios eletrônicos, sendo omissas aí sim devemos aplicar as normas vigentes desde que compatíveis, mesmo que sejam de difícil e complexa transposição para a relação eletrônica.

e.10) Observação final

Por fim nos utilizamos dos ensinamentos do Prof. Arnoldo Wald48 quando leciona que as "novas formulações hão de ser criadas, outros equilíbrios devem ser encontrados, no plano dos contratos, da família, da sociedade e do próprio Estado, para que o direito não seja uma espécie de camisa-de-força que impeça a boa utilização das novas técnicas, e que prevaleça um clima de cooperação dominado pela ética"

Por isso para darmos o devido incentivo as relações efetivadas por meios eletrônicos deveremos criar, formular e principalmente inovar rompendo (não totalmente) com os velhos institutos do direito que em nenhum momento previram a revolução tecnológica por nós presenciada. Esta revolução deve ser encarada como incentivo ao estudo de novos rumos da ciência para a solução dos conflitos ocorridos no âmbito virtual, incentivando e dando maior segurança jurídica aqueles que pretendam se utilizar das facilidades oferecidas pela informática.

f) Princípio da efetividade- diz respeito a efetividade dos provimentos judiciais. O juiz que prolatar uma sentença deve tem competência para tanto além de dispor de viabilidade (executoriedade) do comando proferido. Isto não quer dizer que o estrangeiro não esteja submetido a legislação nacional Este princípio é fundamental para dirimir as relações virtuais em virtude da mobilidade da transações, bem como as questões de fixação de competência e atribuição para execução do julgado. Muito ainda deve ser discutido em termos de jurisdição o que demandará um esforço mútuo de vários países no sentido de atestar competência a juizes quando se depararem com questões que envolvam competências de dois ou mais países.

g) Princípio da submissão- significa que, em limitado número relações virtuais, uma pessoa pode voluntariamente submeter-se à jurisdição de tribunal a que não estava sujeita, desde que comece a ser julgada por alguns dos países signatários. Assim o Estado que viabilizar a persecução de determinado delito, por exemplo deverá contar com a colaboração dos países que de algum modo concorreram em seu território para o cometimento da infração. Ou seja deve ser dada uma certa liberdade para a atuação do juiz de origem uma vez que os litígios surgidos no mundo virtual muitas das vezes são repartidos (modos operandi) em vários países ao mesmo tempo.

Por fim devemos esclarecer que o elenco dos princípios acima mencionados são apenas um estudo inicial sobre o assunto e de maneira alguma podem ser considerados de forma absoluta, sem modificações ou aprimoramentos. Os mesmos seguem uma linha de vanguarda e com certeza sofrerão críticas das mais diversas que auxiliarão nas construção sólida e perene desta nova e importante área do direito.

Sobre o autor
Mario Antonio Lobato de Paiva

Sou advogado há mais de 20 anos e trabalho com uma equipe de 10 advogados aptos a prestar serviços jurídicos em todas as áreas do Direito em Belém, Brasília e Portugal. Advogado militante em Belém, foi Conselheiro e Presidente da Comissão em Direito da Informática da OAB/PA, Ex-Professor da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Pará, especialista em Direito da Informática; Assessor da OMDI- Organização Mundial de Direito e Informática; Membro do IBDI- Instituto Brasileiro de Direito da Informática; Instituto Brasileiro de Direito Eletrônico -IBDE ; Colaborador de várias revistas e jornais da área jurídica nacionais e estrangeiros tendo mais de 400 (quatrocentos) artigos publicados; autor e co-autor de livros jurídicos; palestrante a nível nacional e internacional. Site: www.mariopaiva.adv.br email: mariopaiva@mariopaiva.adv.br

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PAIVA, Mario Antonio Lobato. Primeiras linhas em Direito Eletrônico. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. -182, 1 jan. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3575. Acesso em: 23 dez. 2024.

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