Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

Quanto Vale o Serviço do Advogado?

Agenda 11/02/2015 às 16:29

O MPF em matéria exibida no Fantástico do último dia 25, pretende limitar os honorários advocatícios para casos onde há pedido de aposentadoria no judiciário, tal atitude demonstra ofensa à liberdade do advogado em definir o valor do seu trabalho.

Em recente matéria televisiva exibida no último dia 25 pela Rede Globo, o programa Fantástico mostrou alguns casos onde aposentados estavam sendo "enganados" por "advogados espertalhões" na prestação dos seus serviços advocatícios. Infelizmente não há como negar a existência de profissionais desta estirpe que enganam seus clientes, e apropriam-se de seus de valores muito além da verba honorária ajustada no momento da contratação dos seus serviços jurídicos.


No entanto, observou-se outras questões que se mostraram ofensivas à categoria desse profissional do direito. A matéria relata a intervenção do Ministério Público Federal quanto aos honorários advocatícios cobrados em tais casos, buscando-se assim limitar a remuneração do Advogado.


Percebe-se que esse tipo de manifestação, vindas de um ente público, demonstra certo desrespeito à atividade da advocacia, tal afirmativa nos leva ao seguinte questionamento: Como um ente público pode estipular a remuneração de atividade privada?

 
A advocacia, não por mero capricho do legislador constituinte, mas por uma necessidade real, é a única profissão privada que consta na Lei Maior, conforme depreende-se do seu artigo 133“o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.", o que demonstra a sua relevância num Estado Democrático de Direito.


E não só isso, a advocacia possui um  estatuto constituído por Lei Federal (Lei nº 8.906/1994) onde estão previstas as prerrogativas profissionais e deveres éticos provenientes da função, prevendo inclusive sanções aos infratores destas normas de conduta, por meio dos seus TED’s - Tribunal de Ética e Disciplina.


Não obstante seu Estatuto, a advocacia, possui ainda uma tabela de honorários acessível a todos, cuja sua finalidade é informar e orientar, tantos advogados como clientes, sobre os valores de referência dos trabalhos do advogado nas suas diferentes áreas e tipos de processo. Contudo, essa tabela não tem o condão de limitar qualquer valor de honorários, eis que possui caráter meramente informativo, dado o regime capitalista adotado pelo Brasil, onde é inconcebível prever o Estado intervindo na livre iniciativa.

A nossa indignação reside nesse ponto, pois, a matéria jornalística, tal como veiculada causa não apenas transtornos, mas uma verdadeira confusão ao público em geral, sobre as formas que o serviço da advocacia é contratado.


Não há dúvidas que a advocacia é uma profissão privada (embora o seja em algumas situações públicas, como no caso da AGU), e como tal, assim como tantas outras atividades privadas, não pode ter a sua remuneração regulamentada por lei. Não há de se confundi-la, com a função de um juiz ou promotor, que são, pela sua própria natureza, cargos públicos, e por conseguinte, com sua remuneração regulada por Lei.


Como profissão privada, o advogado possui liberdade ampla e total, para quantificar o seu trabalho, seja pelo prestígio do seu nome, pelo corpo jurídico ao qual faz parte, pela experiência, pela expertise, tempo e valores investidos na sua formação, meio social, e tantos outros fatores externos ou de foro íntimo, cabendo ao mercado, ou mais precisamente ao cliente, aceitar ou não a remuneração proposta. Não há nada de ilegal ou imoral nisso.

Faz-se necessário observar o que esta por trás do trabalho do advogado, sendo inconcebível a alegação de que o serviço é simples para definir sua remuneração. Mas não só isso, a complexidade das Leis e dos procedimentos do nosso judiciário, tornam qualquer trabalho do advogado custoso. Tome-se por exemplo, um caso de inventário pelo rito do arrolamento, haja vista a existência de único herdeiro com imóvel e veículo a compor o espólio, em que pese parecer simples,  dentre os trabalhos empregados na atuação do patrono, encontraremos a observação da idoneidade dos bens; procedimentos administrativos para o recolhimento do ITCMD junto à Secretaria da Fazenda; conferência do contador judicial quanto a partilha informada e imposto recolhido (isso em algumas varas da família de São Paulo); fornecimento de cópias para o formal de partilha e seu registro no cartórios de registro imobiliário competente, em fim, é bastante trabalho que pode alongar-se por muito, mas muito tempo. Tive casos similares que duraram mais de três anos.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos


Levando em conta estas considerações, quanto custaria a representação do advogado nesse inventário? Se a somatória dos bens resultar em R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) e, seguindo a tabela da OAB/SP, ou seja, cobrar 6% (seis por cento) do valor total desses bens, a remuneração do trabalho do advogado seria de R$ 3.600,00 (três mil e seiscentos reais) para três ou mais anos de trabalho. Dividindo esse total pelos estimados 36 meses (duração média do processo, sem que o advogado possa fazer qualquer coisa para mudança desse cenário), esse profissional terá uma remuneração de R$ 100,00 (cem reais) mensais. Nem se pense de o processo durar mais tempo do que previsto, pois se assim o for, caberá o profissional questionar-se: vale a pena investir tempo e esforços nesse trabalho?


Veja que somente o advogado é capaz de quantificar quanto vale sua prestação de serviços, cabendo ao cliente decidir se aceita ou não a proposta ofertada, por esta razão, além de abusiva é totalmente descabida a intervenção do Ministério Público Federal em desejar limitar a remuneração do profissional de direito, sendo, a bem da verdade, uma afronta liberdade do advogado no exercício de sua função, e ao princípio da livre iniciativa, prevista nos fundamentos republicanos do art. 1º da CF, como também, no rol dos direitos e garantias fundamentais, art. 5º, XIII.

 
Casos como os da reportagem devem ser observados com muito cuidado, para não generalizar a idéia de limitação da remuneração do advogado em qualquer  situação, pois, sendo assim, considerando uma verba honorária muito além das condições de pagamento, tem o cliente o direito de aceitar a proposta e procurar outro profissional que atenda as suas possibilidades econômicas, sem contar que, terá ainda à sua disposição, caso se enquadre nos pressupostos legais, a assistência advocatícia gratuita, exercida pelas defensorias públicas à disposição em sua cidade, estando assim bem representado na defesa de seus direitos.

Fontes:

Reportagem: http://g1.globo.com/fantastico/noticia/2015/01/advogados-sao-acusados-de-dar-golpe-em-aposentados-rurais.html;

Constituição Federal:  http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm ;

Tabela OAB/SP: http://www.oabsp.org.br/servicos/tabelas/tabela-de-honorarios/juizo-de-familias-e-sucessoes ; e

Estatuto da Advocacia e a OAB: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8906.htm

Sobre o autor
Rogério Alves

Advogado Graduado no Centro Universitário Nove de Julho. Especialista em Direito Público pela Escola Paulista de Direito. Advogado parceiro da Buratto Sociedade de Advogados e Shilinkert Sociedade de Advogados. Palestrante do Departamento de Cultura e Eventos da OAB Seção São Paulo. Assessor do 2º Tribunal de Ética e Disciplina da OAB Seção São Paulo. Membro do Instituto de Desenvolvimento Educacional e Assistência Social - IDEAS. Articulista dos Sites Jus Brasil, Jus Navigandi, Conewsnity e Blog do Werneck. Administrador do Blog "Discussões por rogerioalvesadvblog"

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!