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Defensoria Pública sob a ótica constitucional de instituição essencial à justiça

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Agenda 15/02/2015 às 09:48

Neste artigo será feita uma breve análise acerca da Defensoria Pública vista pela Constituição Federal como instituição essencial à justiça.

Resumo: Neste artigo será feita uma breve análise acerca da Defensoria Pública vista pela Constituição Federal como instituição essencial à justiça. Inicialmente, será tratado da evolução histórica da Defensoria Pública, traçando os marcos significativos desde sua implantação até os dias atuais, também serão abordados de forma sucinta, porém elementar, os princípios, prerrogativas, garantias e impedimentos conferidos aos Defensores Públicos. Em seguida, cuidar-se-á da sua estrutura organizacional e atuação, bem como, o papel do Defensor Público com vistas a proporcionar a garantia do acesso à justiça. Ressalte-se, que o presente artigo tem por objetivo demonstrar a importância dada pela Constituição Federal à instituição da Defensoria Pública, porém necessária se faz a valorização desta instituição, e por óbvio do respeito à CF/88, de modo que possa exercer seu papel com efetividade.

Palavras-chaves: Defensoria Pública; Constituição Federal de 1988; Acesso à Justiça; Função essencial à justiça.

Sumário: INTRODUÇÃO; 1-Evolução histórica; 2- Princípios institucionais, garantias, prerrogativas e impedimentos; 3- Estrutura organizacional e atuação da Defensoria Pública; 4- O papel do Defensor Público como meio a garantia do Acesso à Justiça; 5- CONCLUSÃO; REFERÊNCIAS.


INTRODUÇÃO

A Constituição Federal de 1988 representa grande avanço para a democracia do país, razão pela qual é denominada de Constituição cidadã, e como exemplo disto, incorporou à sua redação o papel da Defensoria Pública de garantir o acesso à justiça aos necessitados.

À inteligência do art. 134 da Constituição Federal, a Defensoria Pública é “instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV”.

Sendo assim, caberá a Defensoria Pública, representando o Estado, desempenhar tão importante tarefa de prestar assistência jurídica integral e gratuita aos hipossuficientes, é o que aduz o art. 5º, LXXIV, CRFB/88.

A origem da Defensoria Pública tem estrita ligação com a origem do acesso à justiça, pois à medida que surgiam direitos de garantia do acesso à justiça foram surgindo meios para torná-lo efetivamente prestados. Diante do seu papel garantidor do acesso à justiça é que a CF/88 a intitula como instituição essencial à justiça.


1. Evolução histórica

O surgimento da Defensoria Pública tem ligação tênue com a história da assistência jurídica gratuita proporcionada pelo Estado àqueles em condições desprivilegiadas. Assim, à medida que o Estado tem por dever a garantia do acesso à justiça, passar a existir, como consequência, o dever de oferecer meios que conduzam à efetiva prestação jurisdicional aos necessitados. (BORGE, 2010).

Em 1694 a.C., o Código de Hamurabi abordava a necessidade de tratamento especial aos que se achavam em posições desfavoráveis:

Parágrafo 48, XIV Se um awilum tem sobre si uma dívida e (se) Adad inundou seu campo ou a torrente (o) carregou, ou (ainda) por falta de água, não cresceu cevada no campo, nesse ato ele não dará cevada ao seu credor. Ele umedecerá a sua tábua e não pagará os juros desse ano (BOUZON, 2003 p. 86).

Retira-se desse enunciado do Código de Hamurabi, a aparente existência, já naquele tempo, de uma preocupação em isentar do pagamento de juros aqueles que passavam por momentos dificultosos.

A assistência jurídica da maneira mais próxima da que hoje conhecemos, pode ser observada em Atenas, onde por ano, eram nomeados dez advogados a fim de fazerem a defesa dos menos favorecidos perante os tribunais; e, em Roma, que havia normas salvaguardando os direitos do desprivilegiados. (OLIVEIRA, 2007).

Constantino (288-337) é tido, segundo Humberto Peña Moraes e José Fontenelle Teixeira, como o pioneiro a trazer a ideia de acesso à justiça para a ordem jurídica, sendo também agrupada depois à Legislação de Justiniano (483-565), cuja redação determinava o oferecimento de um advogado àqueles que não poderiam remunerar um defensor. (MORAES, 2007).

Com a vinda do Cristianismo, cuja bandeira era o estímulo à caridade, ocasionou como obrigação dos advogados a dispensa dos honorários nas causas em que atuavam, bem como, aos juízes, coube o dever de julgarem, sem que fossem impostas custas processuais. Entretanto, na época da Idade Média, período marcado pelo feudalismo, não houve espaço para tais ideais que acabaram ficando de escanteio. (OLIVEIRA, 2007).

Somente depois da Revolução Francesa, em 1789, tendo se propagado os ideais de igualdade, liberdade e fraternidade, foi que surgiu para o Estado a necessidade de amparar a população carente, mediante prestação judiciária gratuita por órgãos oficiais. Apesar, da intenção de criar tais instituições, neste momento ainda não houve a implementação de assistência aos necessitados de forma aceitável, o que havia era apenas uma inquietação quanto à forma de garantir a igualdade processual. (BORGE, 2010).

Na década de 70, tivemos o que podemos chamar, do primeiro impulsionador do tema acesso à justiça, que foi o denominado Movimento de Acesso à Justiça, que apesar de ser o primeiro a evidenciar essa questão expressamente, não pode ser tratado com a primeira demonstração de preocupação com esta problemática, haja vista que lá nas sociedades antigas já se tinha essa inquietação, pois atentavam para a necessidade de garantir igualdade de tratamento no tocante ao acesso à justiça aos desfavorecidos pela sociedade. (BORGE, 2010).

O Movimento de Acesso à Justiça mostrava grande preocupação com a maneira formal em que o Direito estava sendo apresentado, vez que entendiam a formalidade como um dificultador para o entendimento do direito, sendo este um dos geradores dos processos litigiosos. Em busca da superação disso, é que começou a surgir o emprego de meios alternativos para resolver as subversões, fugindo, de tal modo da realização de desnecessários atos processuais, bem como, cooperando para desatravancar o sistema judiciário e, igualmente, auxiliar a solucionar os problemas sociais levados ao Judiciário.

Por conseguinte, houve estímulo à utilização de instrumentos como a conciliação, a arbitragem e a mediação, todos esses objetos de conhecimento do ordenamento jurídico da época, porém sem prática e maiores valorizações, somente, a partir desse momento, foram adotados efetivamente como meios alternativos de grande proeminência para a ciência do direito e como facilitadores da justiça. (MELO, 2007).

Posto Isto, percebe-se que o intuito maior do Movimento do Acesso à Justiça era concretizar o que seria o real fito do Direito, a saber, extinguir as disparidades sociais e econômicas presentes na sociedade. Todavia, somente com a existência de um órgão disponível à população para que todos pudessem ter acesso ao exercício de seus direitos e garantias dispostos em um Estado de Direito, isso seria viável; nesse cenário, tem-se a criação do órgão que teria como objetivo primordial essa garantia do acesso à justiça: a Defensoria Pública.

O §10, Título 84 do Livro III, das Ordenações Filipinas é considerado por brilhantes juristas como Humberto Peña de Moraes[1] e José Carlos Barbosa Moreira[2] et al. como o registro mais remoto da existência da Defensoria no Brasil, tal dispositivo dispunha o que segue, com a redação original:

Ordenações Filipinas, Livro III, Título LXXXIV, § 10. Em sendo o aggravante tão pobre que jure não ter bens móveis, nem de rais, nem por onde pague o aggravo, e dizendo na audiência uma vez o Pater Noster pela alma Del Rey Don Diniz, ser-lhe-á havido, como se pagasse os novecentos réis, contanto que tire de tudo certidão dentro do tempo, em que havia de pagar o aggravo.

As Ordenações Filipinas foram reguladas pela Lei n. 8 de outubro de 1823 e vigorou até o final do ano de 1916. Isto impulsionou a criação de diversos normativos legais acerca da temática de garantia do acesso à justiça aos mais necessitados. Passados alguns anos, surgiram outros dispositivos sobre forma de leis e regulamentos, colocando, de maneira mais sólida, a assistência judiciária no Brasil. Pioneiramente, tais leis abordavam a assistência judiciária em processos penais, em seguida, novas leis foram sendo criadas conferindo-lhe um caráter bem mais abrangente, incluindo, assim, o processo civil. (MELO, 2007).

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Destarte, em 1870 com o Instituto dos Advogados Brasileiros, o então presidente da mesma, Nabuco de Araújo, deu incisiva investida na causa de garantia de justiça aos pobres, incentivando, através da criação de um conselho, a prática dentre os advogados em oferecer consultas jurídicas gratuitas aos desprovidos financeiramente. (MELO, 2007).

A antiga Atenas serviu de inspiração para a Ordem dos Advogados Brasileiros, uma vez que, utilizava-se de 10 advogados nomeados para atuar em favor dos necessitados nas justiças cíveis e criminais, porém somente essa atitude não sanava o problema do acesso. (MELO, 2007).

A Constituição de 1891, apesar de não tratar expressamente do tema do acesso à justiça, fez menção à proteção do direito de defesa, em seu art. 72, § 16, onde assegurava aos acusados a ampla defesa com todos os recursos e meios essenciais a ela.

Foi em 05 de maio de 1897, que fora expedido um Decreto no Rio de Janeiro (Distrito Federal), criando oficialmente o serviço de assistência jurídica gratuita, surgindo aí o “embrião” da Defensoria Pública. Este órgão era disposto em uma Comissão Central e várias Comissões Seccionais. Porém, tal Decreto não é considerado como um grande avanço, haja vista que apenas tinha alcance na cidade do Rio de Janeiro.

Em 1934, a Constituição Federal utilizou a expressão Assistência Judiciária, cuidando como matéria constitucional e dando incumbência à União e aos Estados para prestarem essa assistência judiciária aos necessitados e a criação de órgão especialmente para esse intuito.[3]

Desta monta, percebe-se que essa norma de 1934, abarcava duas dimensões, a saber, a justiça gratuita e a assistência judiciária; a primeira, com a isenção de emolumentos, custas, taxas e selos; a segunda, pela imposição da criação de órgãos essenciais a garantia dessa assistência.

Em 1935, em respeito à premissa constitucional, o Estado de São Paulo foi o primeiro a criar um serviço de assistência judiciária gratuita, através do Decreto Estadual nº. 7.078, regulamentado pela Lei nº. 2.497/1935. Esse serviço era chamado de Departamento de Assistência Social, que organizava o serviço de assistência judiciária do Estado de São Paulo. Logo após isto, os outros Estados que também atenderam à disposição constitucional foram o Rio Grande do Sul e Minas Gerais. (BORGE, 2010).

Entretanto, apesar de São Paulo ter sido o Estado precursor do serviço de assistência judiciária, somente em 2006, instituiu a Defensoria Pública em conformidade com a Lei Complementar nº. 80/94, através da Lei Complementar nº. 988/2006. (BORGE, 2010).

Com a Constituição de 1937, viu-se assegurado apenas o direito à defesa, nada mencionando acerca da assistência judiciária, até mesmo, pelo momento político em que o país passava, a saber, o Estado Novo (1937-1945). [4]

O Código de Processo Civil de 1939 trouxe um Capítulo, mas precisamente, Capítulo II, intitulado em: Do Benefício da Justiça Gratuita, que no Título VII, nos artigos 68 a 79, abordava sobre as regras básicas da justiça gratuita, ou seja, das despesas processuais, do rol de serviços isentos de pagamentos em favor de quem se declarasse sem condições para suportar as despesas processuais. (SILVA, 2000).

Em que pese à Constituição de 1934 e ao Código de Processo Civil de 1939, o que existia por parte do Estado, era apenas a indicação de profissional liberal para que atuasse para o bem do povo, o que configurava um contraponto ao dever de criação de um órgão estatal para a garantia de um acesso à justiça a todos que necessitem e que fosse gratuito.

Em 1946, a Constituição Federal a exemplo da Constituição de 1934, volta a tratar do tema da assistência judiciária, estabelecendo em seu art. 141, §35, que deverá o Poder Público oferecer a assistência judiciária aos necessitados, na forma da lei.[5]

O aludido dispositivo assegurava a assistência judiciária aos necessitados, todavia, não mencionava como seria prestada tal assistência e de quem seria a competência, se da União, dos Estados ou dos Municípios. Destoa disto, que alguns Estados começaram a criar seus próprios órgãos de assistência e os que não o fizeram, credenciavam advogados especiais a fim de que fosse prestada a assistência judiciária.

Então, em 05 de fevereiro de 1950 foi editada a Lei nº. 1060, que regulamentava a concessão da assistência judiciária aos necessitados, apesar de utilizar o termo assistência judiciária, deve-se levar em consideração a intenção do legislador em dizer justiça gratuita, haja vista tratarem de institutos diversos.[6]

Para elucidar esses dois conceitos, vejamos o que Pontes de Miranda (1967, p. 460) aduz sobre o tema:

Assistência Judiciária e benefício da justiça gratuita não são a mesma coisa. O benefício da justiça gratuita é direito à dispensa provisória de despesas, exercível em relação jurídica processual, perante juiz que promete a prestação jurisdicional. É instituto de direito pré-processual. A Assistência Judiciária é organização estatal, ou paraestatal, que tem por fim, ao lado da dispensa provisória de despesas, a indicação de advogado. É instituto de direito administrativo.

A inovação no texto legal, veio por nele conter expressamente a competência dos Estados para a prestação dessa assistência judiciária, e, que sendo algum Estado omisso quanto à criação desse órgão, caberia à Ordem dos Advogados do Brasil, a indicação de advogado para atender tal finalidade. Os dispositivos que cuidavam da justiça gratuita foram remetidos para a Lei nº. 1.060/1950, que foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988, e, vigora até hoje.

Dessarte, tendo sido atribuída competência aos Estados para a criação deste órgão especial, temos o Rio de Janeiro como o primeiro a criar o cargo de Defensor Público vinculado à Procuradoria Geral de Justiça, por meio da Lei nº. 2.188/1954, portanto, este Estado dispõe da mais antiga Defensoria Pública do país. Em seguida, Minas Gerais foi o próximo Estado a criar uma Defensoria Pública, constituindo a segunda mais antiga. Após a Constituição Federal de 1988, os demais Estados passaram a criar suas Defensorias Públicas. (BORGE, 2012).

A Constituição Federal de 1967 e a Emenda Constitucional de 1969 estabeleceram que as regras para a prestação da assistência judiciária no Brasil seriam dadas através de lei ordinária. [7]

Novamente, o Rio de Janeiro inovou ao estabelecer a assistência judiciária como um órgão do Estado, e, após diversas evoluções no tocante à organização da assistência judiciária, em 1977, com a Lei Complementar n. 06, houve a institucionalização da Defensoria Pública nesse Estado e a criação do Defensor Público Geral do Estado, expresso no art. 7º da Lei Complementar n. 06/1977.

Desta monta, esse modelo de Defensoria Pública e assistência judiciária foram incorporados ao adotado pela Constituição Federal de 1988, que incluiu no Capítulo IV, a Defensoria Pública como função essencial à justiça, juntamente com o Ministério Público, a Advocacia Pública e a Advocacia.

Atualmente, o artigo 134 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 conceitua com maestria o que vem a ser a Defensoria Pública, fazendo-o de forma bem abrangente. Tal dispositivo legal, assim preceitua: “Art. 134. A Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do Art. 5º, LXXIV”.

Pode-se afirmar, então, que a Defensoria Pública é o órgão garantidor do direito do acesso à justiça, em especial, aos hipossuficientes.


2. Princípios institucionais, garantias, prerrogativas e impedimentos

A Lei Complementar nº. 80, publicada em 12 de janeiro de 1994, organiza a Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territórios e prescreve normas gerais para sua organização nos Estados, e dá outras providências.

No art. 3º da Lei Complementar nº. 80/94 estão dispostos alguns princípios institucionais da Defensoria Pública, a fim de que os Defensores possam efetivamente prestar assistência judiciária aos necessitados, como a garantia constitucional que é, ou seja, de maneira global e gratuita. À luz do referente dispositivo, ipsis litteris: “Art. 3º. São princípios institucionais da Defensoria Pública a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional.” (grifei).

Segundo o princípio da unidade, a Defensoria Pública deve ser compreendida como um todo orgânico, de maneira que todos os seus integrantes formam um único órgão, sob a mesma direção, mesmo fundamento e finalidades. (ZUMIOTI, 2012).

O princípio da unidade encontra embasamento no art. 3º, da LC nº. 80/94, e, ainda no art. 2º, que traz a ideia de integração, quando afirma que: “Art. 2º. A Defensoria Pública abrange: I – a Defensoria Pública da União; II – a Defensoria Pública do Distrito Federal e dos Territórios; III – as Defensorias Públicas dos Estados”.

Não obstante, a existência de fundamentos infraconstitucionais, o princípio da unidade tem amparo na própria Carta Maior que aduz em seu art. 134, caput, ser a Defensoria Pública uma instituição.

Apesar, de representar um princípio institucional da Defensoria Pública, somente é observado de maneira abstrata, haja vista o Brasil ser um Estado federado, que preza pela autonomia de suas instituições, não sendo diferente com a Defensoria Pública, onde cada membro dos Ministérios Públicos Estaduais e Defensorias Públicas Estaduais têm sua própria unidade e autonomia, apenas podendo ter mudança de seus membros dentro de cada um deles. (GALLIEZ, 2010).

No tocante ao princípio da indivisibilidade, Paulo Galliez (2010, p.156), nos ensina que:

“A Defensoria Pública pertence aos Defensores Públicos e aos assistidos, e a sua razão de ser consiste no fato de que as suas normas fundamentais e o funcionamento de seus órgãos não podem sofrer qualquer solução de continuidade. Uma vez deflagrada a atuação do Defensor Público, deve a assistência jurídica ser prestada até atingir o seu objetivo, mesmo nos casos de impedimento, férias, afastamento ou licenças, pois nesses casos, a lei prevê a possibilidade de substituição ou designação de outro Defensor Público, garantindo assim o princípio da eficiência do serviço público introduzido no art. 37 da Carta Magna pela Emenda Constitucional n° 19/98.” (grifo nosso).

Depreende-se disso, que o princípio da indivisibilidade constitui um desdobramento do princípio da unidade, onde a Defensoria Pública deve ser compreendida como um todo, não se sujeitando a rupturas ou fracionamentos. Exemplificando tal princípio, trazemos à baila, a intimação pessoal do Defensor e a contagem do prazo em dobro de todos os prazos.

Esse princípio permite que seus membros se substituam uns aos outros, a fim de que a prestação da assistência jurídica aconteça sem solução de continuidade, de forma a não deixar os necessitados sem a devida assistência. (MENEZES, 2007).

A Constituição Federal apresenta no §1º do artigo 134, uma vedação ao Defensor Público para o exercício da advocacia, com o intuito de ver preservado o princípio da indivisibilidade, corrobora desse entendimento o art. 130 da Lei nº. 80/94. As redações de tais dispositivos aduzem:

Art. 134. § 1º Lei complementar organizará a Defensoria Pública da União e do Distrito Federal e dos Territórios e prescreverá normas gerais para sua organização nos Estados, em cargos de carreira, providos, na classe inicial, mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a seus integrantes a garantia da inamovibilidade e vedado o exercício da advocacia fora das atribuições institucionais.

Art. 130. Além das proibições decorrentes do exercício de cargo público, aos membros da Defensoria Pública dos Estados é vedado:

I - exercer a advocacia fora das atribuições institucionais;

Para esclarecer a diferença entre Defensoria e Advocacia, o STJ se pronunciou acerca dessa temática, e sem deixar margens para dúvidas, reiterou a existência de diferença entre esses dois órgãos auxiliares da Justiça, na medida em que a advocacia não é uma atividade do Estado, pelo contrário é uma atividade privada, onde o seu exercício é livre, nos termos do Estatuto da Advocacia. Por sua vez, a Defensoria Pública, é uma instituição essencial à função jurisdicional do Estado, devendo prestar orientação jurídica e cuidar da defesa, em todos os graus, dos necessitados, conforme reza o artigo 5º, LXXXIV, CRFB/88. Ainda assim, o Defensor Público exerce função pública, enquanto que o advogado exerce “múnus publicum”.[8]

Desse julgado, extrai-se que, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a Advocacia não constitui uma atividade do Estado, e como já dito alhures, a Defensoria não se confunde com a Advocacia.

Por último, observaremos o princípio da independência funcional, que versa sobre a autonomia que é dada à Defensoria perante os demais órgãos estatais, de modo que seus membros sejam subordinados apenas à hierarquia administrativa, sem que estejam obrigados à hierarquia funcional. (GALLIEZ, 2010).

Importa ressaltar, a distinção que deve ser feita quanto à autonomia funcional e a independência funcional.

A autonomia funcional é a independência de um órgão em relação aos demais entes públicos ou privados, dessa forma, em matérias que dizem respeito exclusivamente à Defensoria Pública não poderá haver interferência de outros entes. Já a independência funcional, por sua vez, possui como titular o Defensor Público e não a instituição. (DI PIETRO, 2005).

Na mesma linha de raciocínio, Hugo Nigro Mazzilli (2007, p.196), afirma que:

[...] a autonomia funcional diz respeito ao Ministério Público como instituição, e a independência funcional é uma garantia conferida a cada um de seus órgãos, ou cada um de seus membros, enquanto agentes públicos.

Diante desse cenário, pode-se dizer que a autonomia funcional pressupõe a desnecessidade de autorização de qualquer outro órgão do Estado que seja estranho à Defensoria Pública, para a realização de algum ato, não se afastando, em hipótese nenhuma, a legalidade de tal ato.

E, que, portanto a independência funcional denota que os membros da instituição “não devem obediência intelectual a quem quer que seja, nem mesmo ao superior hierárquico. Agem em nome da Instituição, de acordo com a lei e sua consciência [...]” (GONÇALVES, 2000).

Desta feita, os princípios institucionais da Defensoria Pública permitem que seus membros utilizem de outros meios, que não somente a atuação prática jurídica, haja vista o seu dever, conjuntamente, de advertir, nortear e conscientizar extrajudicialmente o seu público alvo.

As garantias conferidas aos Defensores Públicos estão dispostas no art. 43 da Lei Complementar nº. 84/1990, da seguinte forma: “São garantias dos membros da Defensoria Pública da União: I - a independência funcional no desempenho de suas atribuições; II - a inamovibilidade; III - a irredutibilidade de vencimentos; IV - a estabilidade”. (grifei).

A independência funcional no desempenho de suas atribuições corresponde a um princípio institucional da Defensoria Pública, já tratado anteriormente em tópico próprio. Apenas com o intuito de rememorar, detém a independência funcional de uma íntima ligação com a autonomia conferida à Defensoria Pública, à medida que não cabe interferência dos demais órgãos estatais no desempenho de suas funções, bem como, que possui independência na formação de seu convencimento técnico-jurídico, exercendo de maneira livre e independente, sem subordinação a ninguém.

No tocante à garantia da inamovibilidade, o art. 34, da Lei Complementar nº. 80/94 aduz: “Art. 34. Os membros da Defensoria Pública da União são inamovíveis, salvo se apenados com remoção compulsória, na forma desta Lei Complementar”. (grifei).

A segunda parte do referente dispositivo normativo, inclusive, também aposta no art. 50, §1º, III da Lei Complementar nº. 80/94, como forma de sanção, é considerada inconstitucional, haja vista na própria Constituição Federal de 1988 não haver qualquer tipo de restrição à garantia da inamovibilidade, sendo, portanto, absoluta, diferente da restrição referente ao interesse público, que é dada aos magistrados e membros do Ministério Público.[9]

A inamovibilidade, à luz do § 1º do art. 134, representa a vedação à transferência do Defensor Público do órgão onde está lotado para outro, independentemente da vontade deste. Colaciona-se abaixo o § 1º do art. 134 da CRFB/88:

Art. 134. A Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV.)

§ 1º Lei complementar organizará a Defensoria Pública da União e do Distrito Federal e dos Territórios e prescreverá normas gerais para sua organização nos Estados, em cargos de carreira, providos, na classe inicial, mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a seus integrantes a garantia da inamovibilidade e vedado o exercício da advocacia fora das atribuições institucionais. (grifei).

Aqui, a irredutibilidade dos vencimentos é a mesma garantia conferida a todos os servidores públicos, conforme a redação do art. 37, XV da Constituição Federal, in verbis:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

[...]

XV - o subsídio e os vencimentos dos ocupantes de cargos e empregos públicos são irredutíveis, ressalvado o disposto nos incisos XI e XIV deste artigo e nos arts. 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I; (grifei).

E, por último, temos a garantia da estabilidade, que diz respeito ao período em que o Defensor Público adquire estabilidade, que ocorre após preenchidos os requisitos de ordem objetiva e subjetiva, a saber, o prazo de três anos de efetivo exercício e avaliação do estágio probatório de 24 (vinte e quatro meses), respectivamente. (GONÇALVES, 2000).

As prerrogativas cominadas aos Defensores Públicos correspondem às dispostas no artigo 44 da Lei Complementar nº. 80/1994, que serão a seguir, destrinchadas.

Entendamos primeiro que aos Defensores Públicos são apresentadas algumas prerrogativas com o escopo de melhor exercerem a função pública, a que lhes é incumbida. Nesse mesmo sentido “rema”, o ilustre doutrinador Hely Lopes Meirelles (2012, p. 356-357), quando afirma:

As prerrogativas que se concedem aos agentes políticos não são privilégios pessoais; são garantias necessárias ao pleno exercício de suas altas e complexas funções governamentais e decisórias. Sem essas prerrogativas os agentes políticos ficariam tolhidos na sua liberdade de opção e de decisão, ante o temor de responsabilização pelos padrões comuns da culpa civil a que ficam sujeitos os funcionários profissionalizados.

A prerrogativa da intimação pessoal de todos os atos e da contagem em dobro de todos os prazos, visa impedir que a imensa demanda a que estão submetidos os Defensores Públicos, venha a comprometer suas atividades pelo curto prazo do tempo, desta maneira, estar-se-ia conferindo tratamento desigual aos desiguais, na exata medida de suas desigualdades, sem ferir, portanto, o princípio da isonomia. A inobservância de tal prerrogativa ocasiona a nulidade dos atos processuais posteriores. (MENEZES, 2007).

A prerrogativa da comunicação da prisão e de investigação criminal ao Defensor Público Geral refere-se ao direito de, em caso de prisão ou investigação criminal, haver comunicação ao Defensor Público Geral. Assim, além do disposto no art. 5º, LXII, CF, que nos diz que: a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada”, importará também, no caso dos Defensores Públicos, a comunicação ao Defensor Público Geral. (MENEZES, 2007).

Outra prerrogativa conferida aos Defensores Públicos é a prisão especial, chamo atenção aqui, para o fato de em caso de prisão cautelar ou mesmo após a condenação transitada em julgado em pena privativa de liberdade, os Defensores têm direito de serem recolhidos em prisões separadas.

Tem ainda, como prerrogativa, o uso de vestimentas talares e as insígnias privativas da Defensoria Pública, leiam-se, as togas e os símbolos, respectivamente; essas constituem formas de distinção da função.[10]

A vista pessoal dos autos é outra prerrogativa conferida ao Defensor Pública, consistindo, ao livre acesso aos autos do processo, sem óbice algum para que seja conferida a vista aos autos para além das secretarias.[11]

A prerrogativa da comunicação pessoal e reservada com os assistidos visa resguardar o direito do contraditório e da ampla defesa, na medida em que preserva o sigilo e confiança do profissional e assistido.[12]

A manifestação por meio de cotas é outra prerrogativa, que consiste na possibilidade de o Defensor Público fazer anotações nos próprios autos do processo, sem necessidade de petição para tal.

O poder de requisição dispõe que o Defensor Público poderá fazer solicitações à autoridade pública e seus agentes, sempre que necessário ao exercício de suas funções, caso não sejam atendidas, poderá o inadimplente responder por sanções penais e administrativas.

De modo a facilitar o exercício das atividades do Defensor, é assegurada a prerrogativa da desnecessidade de procuração, no caso, quando representando os beneficiários da assistência judiciária gratuita com poderes gerais para o foro. (MENEZES, 2007).

Outra prerrogativa, de suma importância, consiste na possibilidade de deixar de patrocinar a causa, nesse caso, em observância à autonomia funcional do Defensor Público, toda vez que este entender que uma causa é manifestamente incabível ou inconveniente poderá eximir-se de continuar a patrociná-la, todavia, desde que seja dada ciência ao assistido e seja feito por meio de decisão motivada. (MENEZES, 2007).

A prerrogativa do mesmo tratamento reservado aos magistrados e às demais funções essenciais à justiça, compreende tanto o aspecto formal como do uso da analogia, no caso de lacuna, de alguma prerrogativa conferida às outras carreiras que não a do Defensor Público.

A última prerrogativa apontada pelo dispositivo legal trata-se da oitiva do Defensor como testemunha, que consiste na mesma assegurada aos demais servidores públicos em geral.[13]

Quanto às proibições, estão elas elencadas de forma bem clara, no artigo 46 da Lei Complementar nº. 80/94 e são elas:

Em que pese aos impedimentos, não poderá o Defensor Público exercer suas funções nos processos ou procedimentos, que compreendem todos os casos dispostos no art. 47 e no artigo 48 da Lei Complementar nº. 80/94, que de forma resumida, correspondem a requisitos subjetivos, ou seja, quando for parte ou possa emitir algum juízo de valor, por exemplo, por ser parte, cônjuge, companheiro ou parentes consanguíneos ou afins em linha reta ou colateral, até o terceiro grau.

Sobre a autora
Karla Richelly Carvalho Santos

Advogada, graduada em Direito pela Universidade CEUMA.

Informações sobre o texto

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