I – Breve conceito do instituto da Denúncia Espontânea
Luís Eduardo Schoueri, ao analisar o instituto da Denúncia Espontânea, diz que o pressuposto do dispositivo é a espontaneidade da atuação do sujeito passivo, assim, a partir do momento em que se iniciar a fiscalização, não caberá mais falar em denúncia espontânea[1].
O instituto supramencionado tem como finalidade retirar o contribuinte da impontualidade, devendo, assim, ser afastada a aplicação de multa ao contribuinte. Todavia, embora o contribuinte não pague multa, não será vedada a cobrança dos “juros” e nem a deixará de ocorrer a “correção monetária” na denúncia espontânea.[2]
Assim, brevemente, conclui-se como Denúncia Espontânea a comunicação feita pelo infrator da legislação tributária à autoridade competente, do fato que gerou a infração, acompanhada do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou quando o valor depender de apuração, do depósito da quantia arbitrada pelas autoridades administrativas.
I – Breve conceito acerca da Compensação
Trata-se a compensação de um encontro de contas entre o sujeito que é credor e devedor, ao mesmo tempo, podendo a compensação ser de forma parcial ou integral, e tendo como principal finalidade a extinção de uma obrigação recíproca entre as mesmas pessoas que se estimam pagas.
Ressalta-se que a compensação não pode ser feita de vontade única do contribuinte, uma vez que necessita de lei autorizativa.
Nas palavras de Hugo de Brito Machado, “o Código Tributário Nacional refere-se à compensação como causa de extinção do crédito tributário” [3].
III – Análise Crítica do posicionamento da Receita Federal do Brasil
Ainda que o instituto da Denúncia Espontânea tenha previsão legal no artigo 138[4] do Código Tributário Nacional ("CTN"), de forma que atribui expressamente à Denúncia Espontânea efeito excludente da responsabilidade pelas infrações denunciadas, infelizmente, os contribuintes estão tendo dificuldades para conseguir os benefícios da Denúncia Espontânea. A Secretaria da Receita Federal do Brasil ("SRF") entende que só o pagamento é meio hábil a excluir a responsabilidade do sujeito passivo da obrigação tributária principal.
Antigamente, o entendimento acerca da compensação por meio de Denúncia Espontânea era dado pela Coordenação Geral de Tributação (“COSIT”) da SRF, que editou em 18/01/2012 a Nota Técnica nº 01, consignando de forma expressa que a compensação acarretaria os mesmos efeitos do pagamento em casos de Denúncia Espontânea.
No entanto, recentemente, em suas decisões, o Fisco federal também tem interpretado o artigo 138 do CTN de forma literal, alegando que não configura Denúncia Espontânea o débito quitado por meio de compensação, sendo condição indispensável o pagamento ou o depósito do débito.
O entendimento do Fisco desestimulou essa prática tão interessante, tanto para o contribuinte como para o próprio Fisco, da denúncia espontânea, uma vez que tem gerado entraves ao contribuinte ao se valer do instituto.
O Fisco federal, ao interpretar o instituto da Denúncia Espontânea de forma literal (conforme orienta o artigo 111, I[5], do próprio CTN), acaba cometendo erro técnico.
O artigo 138 do CTN, a nosso ver, deve ser interpretado por analogia, (metodologia de interpretação e integração da legislação tributária expressamente autorizada pelo artigo 108, I[6], também do CTN), pois a compensação possui a mesma natureza do pagamento e da conversão do depósito em renda, qual seja a extinção do crédito tributário (artigo 156, II[7], também do CTN).
A norma tem como finalidade estimular o contribuinte a regularizar seus débitos, antes que ocorram conflitos fiscais, de forma que o contribuinte evite a aplicação de multa pelas autoridades fiscais.
Uma interpretação teleológica do dispositivo revela que o verdadeiro alcance do dispositivo legal acaba visando um benefício ao próprio Fisco que não necessita de um contencioso administrativo ou um litigioso necessário.
Ao antecipar-se em relação à fiscalização o contribuinte regulariza seus débitos de forma que poupa a máquina pública, aumentando arrecadação. O Fisco, assim, recebe as importâncias sem a necessidade do Fisco de mobilização de servidores para fiscalizar esses contribuintes.
Portanto, a SRF não deve interpretar a compensação de forma literal, pois, a compensação se equipara ao pagamento, pelo fato de ambas serem modalidade de extinção do crédito tributário e porque a efetiva quitação do débito dependerá de ulterior verificação por parte do Fisco (ou homologação tácita).
Quanto à possibilidade de compensação para configurar a Denúncia Espontânea, já decidiu o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais ("CARF") em acórdãos recentes:
"DENÚNCIA ESPONTÂNEA. COMPENSAÇÃO. MULTA DE MORA. A denúncia espontânea também se configura com a quitação do tributo formalizada por meio de compensação, pleiteada anterior ou contemporaneamente à declaração do débito, devendo ser afastada a imposição da multa de mora." (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais / 1ª Turma Especial / 1ª Seção / Acórdão 1801-002.053 / Sessão de 30 de julho de 2014)
"DCOMP. PAGAMENTO. EQUIVALÊNCIA. A compensação pressupõe um pagamento anterior, ocorrido a maior ou indevidamente. A DCOMP é apenas a afetação desse pagamento, surtindo o mesmo efeito e merecendo equivalência." (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais / 3ª Turma Especial / 1ª Seção / Acórdão 1803-002.091 / Sessão de 11 de março de 2014).
Indubitavelmente, pelo exposto acima, é possível verificar que a atual postura das autoridades administrativas fiscais tem gerado um problema desnecessário para ambas as partes relacionadas ao processo administrativo.
Muito embora esteja claro no artigo 156 do CTN que a compensação é uma das modalidades de extinção do crédito tributário, a SRF tem entendido que essa modalidade extintiva de obrigação não produz os efeitos decorrentes da Denúncia Espontânea, o que de fato atrapalha a finalidade de restabelecimento do equilíbrio jurídico na relação entre o Fisco e o contribuinte.
[1] SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário. 1. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, pp. [693/694].
[2] SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 3 ed. São Paulo: Saraiva,2011, pp. [749/751].
[3] MA CHADO, Hugo de Brito. 32 ed. São Paulo: Malheiros, 2011, pp [213/218].
[4] "Art. 138. A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de apuração." [...]
[5] Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre:
I - suspensão ou exclusão do crédito tributário; [...]
[6] Art. 108. Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará sucessivamente, na ordem indicada:
I - a analogia; [...]
[7] Art. 156. Extinguem o crédito tributário: [...]
II - a compensação; [...]