Sumário: 1. Notas introdutórias 2. Definições doutrinárias 3. Elementos de Direito comparado: paralelos ao Direito Espanhol 3.1 Aspectos da jurisprudência espanhola 3.2 A responsabilidade por produto defeituoso 4. Implicações práticas da aplicação do Código de Defesa do Consumidor à atividade médica 4.1 O dano moral. Fundamentos jurídicos e sua quantificação 4.2 A controvérsia sobre a inversão do ônus da prova 4.3 A publicidade, seus efeitos e conseqüências 4.4 Outros aspectos relevantes 5. As alterações legislativas introduzidas pelo novo Código Civil 6. A construção do entendimento jurisprudencial brasileiro 7. Conclusões 8. Referências bibliográficas
1. Notas introdutórias
O convívio em sociedade – e por conseqüência, o Direito – vive em constante evolução. Cultura, tecnologia e fatores econômicos são vigas de sustentação destas mudanças que, seja de forma abrupta ou paulatina, influenciam o comportamento de uma época.
Longe de ser uma manifestação extemporânea do legislador, o Direito do Consumidor tem raízes históricas em períodos muito anteriores. Este, que hoje chamamos de novo direito, surgiu como contraponto às desigualdades entre produtor e consumidor, que eclodiram com a Revolução Industrial, no Século XIX, e foram se intensificando ao longo das décadas seguintes, de forma a tornar o consumidor desamparado em suas relações jurídicas. Se antes, toda e qualquer produção era manual - artesanal mesmo, e por conseqüência, limitada - e o comércio era exercido em pequenas entidades produtivas (geralmente familiares), que se encarregavam desde a produção até a distribuição, hoje a produção é massificada, em série, de forma impessoal e automatizada, e não raro há completa separação entre os processos de produção, distribuição e comercialização de produtos.
O consumidor, antes peça chave no processo produtivo, passou a ser mero destinatário final, objeto de estudos de marketing e tendências, sem qualquer participação direta, e com limitada autonomia de vontade, vítima de contratos de adesão, monopólios e cláusulas abusivas de todo tipo.
No Brasil, as duas últimas décadas do Século XX representaram um considerável avanço quanto à regulação das relações de consumo e proteção do consumidor, como amadurecimento natural dos meios de proteção da sociedade de massas.
A Constituição Federal promulgada em 1988, elevou à condição de garantia constitucional a defesa do consumidor. Foi expresso seu artigo 5º, inciso XXXII, ao afirmar: "O Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor". Esta foi a primeira manifestação importante do legislador no sentido de reconhecer a vulnerabilidade do cidadão comum nas relações de consumo.
Também na Carta Magna, foi a defesa do consumidor alçada à condição de princípio da atividade econômica, consubstanciada em seu artigo 170, V [1].
Dois anos depois, e em atenção aos princípios constitucionais que assim determinavam, promulgou o Estado o assim chamado Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990). Esta lei tornou-se um marco no sistema jurídico nacional, não só por suas qualidades, mas pela forma como foi absorvida pelo cidadão comum, que nela encontrou instrumento capaz de fazer prevalecer alguns de seus direitos de cidadania mais elementares.
Na lição de Sérgio Cavalieri Filho, em notável ensaio sobre a matéria [2]:
"O que fez a Constituição para possibilitar a criação desse novo direito? Está lá no seu art. 5º, XXXII. A Constituição - e este é um ponto fundamental - separou as relações de consumo do universo das relações jurídicas e as destinou ao Código do Consumidor. Esse, destarte, é o campo de incidência do Código do Consumidor - as relações de consumo qualquer que seja o ramo do direito onde elas venham a ocorrer - público ou privado, contratual ou extracontratual, material ou processual.
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Pois esse é o campo de incidência do Código do Consumidor. Um campo abrangente, difuso, que permeia todas as áreas do direito, razão pela qual venho sustentando que o CDC criou uma sobreestrutura jurídica multidisciplinar, normas de sobredireito, aplicáveis a todos os ramos do direito onde ocorrerem relações de consumo.
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Outra inevitável conclusão que se tira do exposto é a de que o Código do Consumidor não é apenas uma lei geral (como querem alguns), tampouco uma lei especial (como querem outros), mas uma lei específica, vale dizer, um Código de Consumo compreendendo todos os princípios cardiais do nosso direito do consumidor, todos os seus conceitos fundamentais e todas as normas e cláusulas gerais para a sua interpretação e aplicação. Daí resulta que o Código do Consumidor deve ser interpretado e aplicado a partir dele mesmo e não com base em princípios do direito tradicional. Não se pode dar ao CDC uma interpretação retrospectiva, que consiste, na bela lição de Barbosa Moreira, em interpretar o direito novo à luz do direito velho, de modo a tornar o novo tão parecido com o velho que nada ou quase nada venha a mudar."
Em declaração de voto, relativo ao julgamento do agravo de instrumento 179.184-1 (julgado em 17/09/92 pelo Tribunal de Justiça de São Paulo), o Eminente Desembargador Silveira Netto complementa, de forma bastante pertinente:
"... o Código de Defesa ao Consumidor situou-se de forma a quebrar as regras do atual sistema jurídico (autonomia da vontade na contratualística), o equilíbrio que deve permanecer no tempo da execução do contratado, assegurada a primeira na liberdade de manifestação pelas figuras de erro, dolo, simulação, abuso de direito, etc., e o segundo revelado em possíveis eventos imprevisíveis ou inevitáveis, teoria da imprevisão, cláusula <rebus sic stantibus>. Não é verdade, pois o novo direito está consagrado dentro dos princípios gerais do direito, como não poderia deixar de ser, adaptado ao atual comportamento social revelado nas teorias que envolvem o consumo, definindo-se através de situações concretas e que exigem disciplina especial que a antiga legislação não poderia, pelo tempo em que lançada, prever ou disciplinar, longe da revolução industrial, do crescimento das comunicações, da concentração populacional e da marcada condução da vontade das pessoas introduzidas num mercado de frenético consumo. Em suma, uma das principais marcas da contratualística, a autonomia da vontade, passa a ser vista de forma dinâmica e não mais estática, uma proteção ao consumidor, o qual supostamente é sempre mais frágil diante do produtor ou do prestador de serviços. Nem se diga que o Código de Defesa ao Consumidor consagra um direito novo, desligado do antigo; antes, o que existe é o direito antigo revelado em posições novas e mais atuantes, sem abandono das regras que vedam o abuso de direito, que asseguram a prevalência da vontade real diante da manifestação dos interessados, nem sempre ajustada à realidade, que conduzem a interpretação dos contratos limitados aos princípios da boa-fé, estrutura do negócio jurídico, aos usos e costumes, o tratamento de benefício ao consumidor no caso de dúvida."
As regras introduzidas pelo Código de Defesa do Consumidor, pela sua natureza, são normas de ordem pública e de interesse social, e por isso abrangem a sociedade como um todo, coletividade de pessoas indeterminadas, nas suas relações, e afetam todos os membros desta sociedade; estão destinadas à defesa da pessoa que adquire ou utiliza produto ou serviço, consubstanciado numa relação de consumo.
2. Definições doutrinárias
O questionamento primeiro que se levanta é se o exercício da medicina - tal qual hoje o conhecemos, ou seja, a relação médico-paciente - pode ser caracterizado como verdadeira relação de consumo, e assim, estar sujeito à aplicação das regras contidas no Código de Defesa do Consumidor.
Para tanto, necessário conhecer quais as definições legais para consumidor, fornecedor, e serviço, no novo ordenamento consubstanciado no Código de Defesa do Consumidor. Normalmente tarefa afeita à doutrina, a definição de determinados conceitos pode se tornar um problema quando realizada pelo legislador, que pode delimitar em demasiado sua abrangência. Entretanto, quando da elaboração do código de consumo, houve a deliberada intenção de definir no corpo da lei os conceitos nela contidos, de forma a torná-lo o mais completo possível, bastante em si mesmo.
O artigo 2º do mencionado diploma legal define o consumidor como "toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final" [3].
O fornecedor, por sua vez, é definido no artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor como sendo "toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços".
Bem se percebe a abrangência, ainda que genérica, da definição apresentada, que busca englobar qualquer pessoa, física ou jurídica, que possa ser capaz de exercer atividade econômica, ainda que seja esta atípica ou eventual. No caso específico, concentramos nossas atenções na prestação de serviços.
O mesmo artigo, em seu parágrafo 2º, define serviços como "qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista". A definição é meramente exemplificativa, uma vez que qualquer atividade remunerada, fornecida no mercado de consumo, é tida legalmente como serviço [4].
Assim considerados (e devidamente transplantados os conceitos para o caso em questão), temos que o paciente – ou usuário de serviços médicos – é o consumidor, para o qual se presta um serviço (o ato médico de forma geral; uma consulta, uma intervenção ou qualquer outro tipo de procedimento), e o fornecedor é aquele profissional que desenvolve sua atividade, de forma remunerada, nos moldes do já mencionado artigo 3º.
Por certo, existem posições contrárias, resistentes à idéia de que há intrínseca relação de consumo na prestação de serviços médicos, sob a argumentação de que o trabalho autônomo de profissionais liberais não deveria ser tutelado pelo Código de Defesa do Consumidor. Especificamente com relação aos médicos, se sustenta que os mesmos já estão adstritos ao controle de seus Conselhos Regionais e Conselho Federal de Medicina, com código de conduta e de ética próprios.
Poucas são as vozes dissonantes, mas elas existem. Tome-se por exemplo a exposição de Antonio Ferreira Couto Filho e Alex Pereira Souza [5], nas quarenta e três páginas que compõem a parte dita doutrinária de sua obra. Há, em sua argumentação, a tentativa de demonstrar a inadequação da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor à relação médico/paciente.
Em nosso entender, faltam argumentos concretos, mormente quando se percebe que o trabalho apresenta um viés claramente defensivo da atividade médica – e aqui se constata tal fato sem nenhum juízo de valor. As conclusões a que chegam os autores simplesmente não se encaixam com as premissas anteriormente levantadas [6].
Mesmo após ressaltar os inegáveis avanços da legislação consumerista, os citados autores concluem que:
"A relação médico/paciente não pode ser considerada mera relação de consumo. É preciso que se faça uma reflexão de transcedental importância de que o serviço de saúde é sui generis, posto que possui uma função social ímpar, incomparável com qualquer outra.
A vida e a saúde não são bens de consumo, não podendo ser comparadas a um produto qualquer. Também não podem ser vistas como serviços prestados oriundos da relação médico/paciente, até porque desta relação não são oferecidos bens de consumo."
O que se verifica é que há uma distorção de conceitos, utilizados com a finalidade de justificar a posição adotada. O foco da questão não é a vida ou a saúde, e sim a relação estabelecida entre as partes. Não há, efetivamente, como conciliar uma abordagem jurídica e uma abordagem filosófica quanto a este tema. E aqui, o interesse analítico é e deve ser, exclusivamente jurídico. O interessante, neste caso, é perceber que, apesar de tal dissonância, os argumentos passam antes por duas constatações, a saber:
"Trata-se, também, consoante pensamento majoritário, de relação de consumo, posto que o médico põe à disposição da sociedade o nobre serviço da medicina e, nessa qualidade, enquadra-se perfeitamente no dispositivo do Código de Defesa do Consumidor, sendo um fornecedor de serviços."
"O paciente, por seu turno, é consumidor, posto que contrata o médico para obter desde um diagnóstico até ser tratado ou mesmo submeter-se a uma cirurgia, adquirindo, em qualquer hipótese, o serviço posto à disposição pelo médico e, sem dúvida, na condição de destinatário final."
A propósito disto, a introdução supra, sobre o campo de abrangência das normas contidas no Código de Defesa do Consumidor, e sua inserção no sistema jurídico-constitucional brasileiro.
Nos parece claro que o paciente, ao contratar a execução de um serviço médico, desde uma simples consulta a um procedimento cirúrgico, seja ele considerado um consumidor dos serviços oferecidos por este profissional. Em contrapartida, este último, ao oferecer seus conhecimentos de forma remunerada a uma variada gama de consumidores, está se enquadrando na definição de fornecedor contida no Código de Defesa do Consumidor (e aí se retorna à expressão "qualquer atividade oferecida no mercado de consumo", já devidamente comentada).
Sílvio Rodrigues [7], civilista de escol, demonstra comungar do mesmo entendimento, ao expor:
"Acho oportuno levantar uma outra questão em matéria de responsabilidade médica que é a de saber se ela pode ser enquadrada ou não dentro do Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078, de 11-11-1990).
O Código de Defesa do Consumidor regula todas as relações contratuais entre a pessoa que adquire um produto e um serviço como destinatário final (art. 2º) e um fornecedor, que é todo aquele que fornece um produto ou um serviço mediante remuneração. Ora entre o cirurgião e o paciente se estabelece um contrato tácito em que o cirurgião se propõe a realizar cirurgia na pessoa do paciente, mediante remuneração, e se obriga a usar toda a sua habilidade para alcançar o resultado almejado. Trata-se de um contrato de prestação do serviço, pois esse contrato, na linguagem daquele código é toda atividade fornecida no mercado mediante remuneração (art. 3º, § 2º). Aliás, o Código do Consumidor contempla a espécie de serviço fornecido pelos profissionais, tais como médicos, dentistas, etc. ao declarar no § 4º do art. 14 que "a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação da culpa".
O Código de Defesa do Consumidor é lei de ordem pública e de interesse social, e assim se aplica a todos os casos que abrange desde sua entrada em vigor. Isso vem proclamado no seu art. 1º. Portanto parece-me que a relação entre paciente e cirurgião fica abrangida pelo Código de Defesa do Consumidor.
Uma das principais conseqüências desta conclusão é a de que em tais relações os prazos de prescrição para reclamar a reparação do dano derivado da prestação do serviço é de cinco anos (art. 27)."
Daí, compreendida a relação médico-paciente como relação de consumo, inexistem argumentos para evitar que esta seja regida pelos parâmetros reguladores do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que sistema autônomo e prevalente, por designação constitucional.
Também neste sentido, e reforçando o já exposto, o professor Genival França [8] arremata:
"Dizer que este Código do Consumidor é uma intervenção indevida do poder público nas relações de consumo, notadamente no que se refere às ações de saúde, é um equívoco, porque o dever do Estado na garantia dos direitos sociais implica necessariamente na rotura com a política social restritiva, em busca da universalização da cidadania. Se o Estado fica apenas exercendo a simples função bancária de compra de serviços, dificilmente teremos o controle da estrutura de proteção dos bens públicos. O entendimento atual é que a saúde é uma função pública, de caráter social, que se exerce para garantir o direito universal e eqüitativo de acesso aos serviços em seus diversos níveis. E mais: é preciso rever o conceito de cidadania. Ele não pode ser entendido apenas no seu aspecto jurídico-civil, senão, ainda, nas garantias sociais, corolário de uma efetiva prática democrática. E o setor saúde ganha uma certa magnitude em face de sua abrangência social, a partir do pacto entre o Governo e a Sociedade, com vistas às melhores condições de vida da população."
3. Elementos de Direito comparado: paralelos ao Direito Espanhol
O assunto é tratado de maneira semelhante pela doutrina e jurisprudência espanhola, onde a discussão sobre o assunto foi iniciada alguns anos antes. A lei 26/1984 (Ley General para la Defensa de los Consumidores y Usuarios, de 19 de julho de 1984) instaurou um sistema de responsabilidade objetiva para a compensação dos danos sofridos pelo consumidor – este definido pelo artigo 1.2 como destinatário final de produtos e serviços – na utilização de serviços, dentre outras coisas.
Diz o art. 25 da mesma lei:
"El consumidor y el usuário tienen derecho a ser indeminizados por los daños y perjuicios demostrados que el consumo de bienes o la utilización de productos o servicios les irroguen, salvo que aquellos daños y perjuicios estén causados por su culpa exclusiva o por la de las personas de las que deba responder civilmente."
O texto ressalta a primazia da objetividade ao estabelecer uma clara exceção, que consiste na suposta ruptura do nexo causal. Os artigos seguintes – 26 [9] e 27 [10] – matizam a responsabilidade e enumeram situações, mas o caput do artigo 28 prevê a responsabilidade objetiva em certos casos:
"1. No obstante lo dispuesto en los artículos anteriores, se responderá de los daños originados en el correcto uso y consumo de bienes y servicios, cuando por su propia naturaleza o estar así reglamentariamente establecido, incluyan necesariamente la garantía de niveles determinados de pureza, eficacia o seguridad, en condiciones objetivas de determinación y supongan controles técnicos, profesionales o sistemáticos de calidad, hasta llegar en debidas condiciones al consumidor o usuario."
O segundo apartado do mesmo artigo (equivalente aos nossos parágrafos), expõe de forma irretorquível a responsabilidade objetiva aplicada concretamente:
"2. En todo caso, se consideran sometidos a este régimen de responsabilidad los productos alimenticios, los de higiene y limpieza, cosméticos, especialidades y productos farmacéuticos, servicios sanitarios, de gas y electricidad, electrodomésticos y ascensores, medios de transporte, vehículos a motor y juguetes y productos dirigidos a los niños."
Por conseqüência, pode esta norma de responsabilidade objetiva ser aplicada aos danos causados por serviços sanitários ao consumidor, quando este os tenha sofrido, em nexo causal, pela atuação médica (do médico ou do centro hospitalar), em virtude de qualquer relação, seja contratual ou extracontratual.
3.1 Aspectos da jurisprudência espanhola
Em que pese ser a mencionada lei datada de 1984, a jurisprudência espanhola tardou bastante em aplicá-la. As primeiras sentenças que a aplicam, emitidas pelo Tribunal Supremo, em 01 de julho de 1997 (S 1 Jul. 1997) e 21 de julho de 1997 (S 21 Jul. 1997), ambas tratando de casos relativos a amputação de uma perna. Esta última reproduz, neste extremo, o contido na primeira, a qual merece transcrição parcial:
"De los motivos aducidos se examinan, en primer lugar, el segundo y el tercero para evitar en lo posible repeticiones o argumentaciones inconducentes, dada su correlación. Se apoyan ambos en el art. 1692.4 de la LEC [11] y denuncian infracción por inaplicación de los arts. 1 y 28 de la Ley General para la Defensa de los Consumidores y Usuarios. Ninguna duda cabe, a la luz de la dicción literal del art. 1 de la expresada ley, que el recurrente en cuanto «persona física» que utiliza unos «servicios», reúne la condición de «usuario» «cualquiera quesea la naturaleza pública o privada, individual o colectiva de quienes los producen, facilitan, suministran o expiden». Conforme al sistema de «garantías y responsabilidad» que establece el capítulo VIII de tal cuerpo normativo el usuario tiene derecho a ser indemnizado de los daños y perjuicios demostrados que la utilización de los servicios les irroguen salvo que aquellos daños y perjuicios estén causados por su culpa exclusiva. Expresamente el apartado 2 del art. 28 que particulariza, com acentuado rigor, la responsabilidad civil incluye entre los «sometidos su régimen» los «servicios sanitarios», conceptos que a no dudar comprenden los prestados en el INSALUD. Esta responsabilidad de carácter objetivo cubre los daños originados en el correcto uso de los servicios, cuando «por su propia naturaleza», o estar así reglamentariamente establecido, incluyen necesariamente la garantía de niveles determinados de pureza, eficacia o seguridad, en condiciones objetivas de determinación y supongan controles técnicos, profesionales o sistemáticos de calidad, «hasta llegar en debidas condiciones al usuario». Estos niveles se presuponen para el «servicio sanitario», entre otros. Producido y constatado el daño que consistió en la amputación de la pierna, resultado no querido ni buscado, como consecuencia directa de la intervención, sino ocurrido en contra de lo inicialmente previsto, que era la mejoría en las funciones de la articulación, por la concurrencia, al menos, de un factor exógeno, como fue la infección por pseudonomas aeruginosa, que degeneró el proceso curativo, se dan las circunstancias que determinan aquella responsabilidad del centro hospitalario. En efecto, los niveles presumidos por ley de pureza, eficacia o seguridad que suponen, además, posibilidades de controles técnicos de calidad, impiden, de suyo, (o deben impedir) por regla general las infecciones subsiguientes a una intervención quirúrgica adquirida, en el medio hospitalario o su reactivación en el referido medio. Cuando estos controles de manera no precisada fallan; o bien, por razones atípicas dejan de funcionar, en relación con determinados sujetos, el legislador impone que los riesgos sean asumidos por el próprio servicio sanitario en forma externa de responsabilidad objetiva, cara al usuario, que por ser responsabilidad objetiva aparece limitada en su cuantía máxima, a diferencia de la responsabilidad por culpa, que sólo viene limitada en su cuantía económica por criterios de proporcionalidad y prudencia en relación con el caso no concurre - excluiría la responsabilidad objetiva al interferir en esse conjunto de riesgos asumidos por imperio legal otros elementos adicionales de riesgo que, en sus consecuencias, económicas, no son aceptables, y en sus consecuencias ético jurídicas son rechazables. También, en un perfil acabado de la responsabilidad objetiva, (no obstante, que esta excepción carezca de respaldo legal expreso), el caso fortuito o la fuerza mayor entendidos como sucesos imprevisibles e inevitables fuera del control de aquellos niveles de exigencias que la determinan, servirán, en principio, para excluir la responsabilidad objetiva al faltar los presupuestos que la justifican. Pero estas excepciones deben oponerse y probarse por los perjudicados. En definitiva, los motivos prosperan."
A doutrina anterior é reiterada pela sentença, da mesma corte, datada de 09 de dezembro de 1998 (S 9 Dic. 1998), caso de mulher que, em período pós-operatório, contrai tétano e vem a falecer. Diz, em parte de sua fundamentação:
"Lo cual coincide con la doctrina que esta Sala mantuvo en la S 1 Jul. 1997 sobre un caso, análogo al presente, en que se produjo una infección postoperatoria, cuya doctrina se reiteró en la S 21 Jul. 1997 al entender que son aplicables los arts. 1, 26 y 28 de la L 26/1984, de 19 Jul., general para la defensa de los consumidores y usuarios, en cuanto la demandante es consumidora (art. 1), há utilizado unos servicios (art. 26), entre los que se incluyen los sanitarios (art. 28.2) y la producción de un daño genera responsabilidad objetiva que desarolla el capítulo VIII (arts. 25 y ss). Esta responsabilidad de carácter objetivo cubre los daños originados en el correcto uso de los servicios, cuando «por su propia naturaleza», o estar así reglamentariamente establecido, incluyen necesariamente la garantía de niveles determinados de pureza, eficacia o seguridad, en condiciones objetivas de determinación y supongan controles técnicos, profesionales o sistemáticos de calidad, «hasta llegar en debidas condiciones al usuario». Estos niveles se presuponen para el «servicio sanitario», entre otros. Producido y constatado el daño... se dan las circunstancias que determinan aquella responsabilidad del centro hospitalario. En efecto, los niveles presumidos por ley de pureza, eficacia o seguridad que suponen, además, posibilidades de controles técnicos de calidad, impiden, de suyo, (o deben impedir) por regla general las infecciones subsiguientes a una intervención quirúrgica adquirida, en el medio hospitalario o su reactivación el el referido medio. Cuando estos controles de manera no precisada fallan; o bien, por razones atípicas dejan de funcionar, en relación con determinados sujetos, el legislador impone que los riesgos sean asumidos por el próprio servicio sanitario en forma externa de responsabilidad objetiva."
A partir do ano de 1999, sentenças neste sentido passam a ser mais freqüentes - consolidando assim a doutrina jurisprudencial. Como exemplo, pode ser citada a de 29 de junho de 1999 (S 29 Jun. 1999), caso de extirpação de vesícula biliar e morte da paciente, na qual se aplica a doutrina do dano desproporcional e responsabilidade do centro médico, reiterando a aplicação das normas da Lei de Consumidores e Usuários.
Também decisão de 24 de setembro daquele mesmo ano (S. 24 Sep. 1999), caso de implantação do contraceptivo conhecido como DIU, que veio a se mostrar defeituoso, aplica a mencionada lei, e aduz:
"Aduce la recurrente conjuntamente con la infracción del art. 1902 del CC, la de los arts. 26, 27 y 28 de la Ley de 19 jul. 1984, General para la Defensa de Consumidores y Usuarios, al entender que la aplicación de estos preceptos es indebida, ya que el producto anticonceptivo había sido homologado y se presentaba correcto. A tales efectos el Tribunal de Instancia tuvo en cuenta las previsiones legislativas que en materia de responsabilidad contiene la Ley especial citada y no declaró que el anticonceptivo resultase correcto y dotado de las garantías que lo hacían útil para el destino de su empleo.
La aplicación de la normativa de defesa de los consumidores en cuestiones de servicios sanitarios resulta procedente y así lo ha entendido esta Sala de Casación Civil y con especial referencia al artículo 28, párrafo segundo, presumiéndose «iuris et de iure» que los referidos servicios incluyen las garantías a las que se refiere el párrafo primero del artículo (SS 1 Jul. 1997 y 9 Jun. 1998).
No se suscita duda alguna respecto a que entre los servicios sanitarios cabe incluir la implantación de anticonceptivos, y la responsabilidad que procede deriva de que el producto no reúna las debidas y exigidas garantías de niveles determinantes de su eficacia y seguridad. La aplicación del referido art. 28 no excluye el art. 1902 ó 1903 del CC, e incluso el 1101, tratándose de culpa contractual, pues se supedita a la concurrencia ineludible del factor culposo o negligente (S 22 Jul. 1994), que en este caso se da, al haber quedado sentada la responsabilidad propia de la Diputación Provincial que recurre. El motivo se desestima."
As sentenças de 3 de dezembro de 1999 (S 3 Dic. 1999) e de 30 de dezembro de 1999 (S 30 Dic. 1999), que contemplam casos de contágio de AIDS em conseqüência de transfusão de sangue, aplicam, da mesma forma, a Ley de Consumidores y Usuarios.
Diz a primeira:
"... en base constitucional de los arts. 43 y 51 de la CE [12], al tenerse en cuenta que en la época en la que fue tratada la paciente de referencia ya regía la Ley de 19 Jul. 1984 (General para la Defensa de Consumidores y Usuarios), cuyos arts. 25, 26 y 28.1 y 2, proclaman el derecho que tienen los consumidores y usuarios de los servicios sanitarios y de productos farmacéuticos a ser indemnizados por parte de los que le suministren dichos productos o servicios."
E complementa a segunda:
"... que como tal servicio sigue el régimen legal establecido en el art 28 de la Ley 26/1984, 19 Jul., en su apartado 1, siendo el apartado 2 el que circunscribe a determinados suministros y servicios, entre los que incluyen los servicios sanitarios: que el «correcto uso» que el precepto citado exige para hacer efectiva la responsabilidad objetiva que dispone es aquí equivalente a que la actora no pertenece a ninguno de los grupos convencionales de riesgo lo mismo que su esposo; que la atribución de responsabilidad objetiva nada tiene que ver con la conducta prudente de la parte a quien se le imputa la responsabilidad, y la S 10 Nov. 1999, también en supuesto análogo, dice: «Pero además, el el presente caso en perfectamente aplicable a la estimación del motivo (quien recurría en casación era la demandante, aclaramos) que se estudia, lo dispuesto en los art. 25, 26 y 28.1 y 2 de la Ley 26/1984, 19 Jul., General para la Defensa de Consumidores y Usuarios (BOE, de 24 Jul. 1984), que proclaman el derecho que tienen el consumidor y usuario de productos farmacéuticos y servicios sanitarios a ser indemnizados por parte de los que suministran o facilitan dichos productos o servicios, cuando sean defectuosos...»"
3.2 A responsabilidade por produto defeituoso
Os artigos 25 a 28 da mencionada lei espanhola 26/1984 foram parcialmente derrogados, no sentido de que não caberia sua aplicação à responsabilidade civil por danos causados por produtos defeituosos, que passaram a ser regulados pelo disposto na Ley 22/1994, de 6 de julho do mesmo ano.
Quanto ao tema relativo à responsabilidade médica, as sentenças do Tribunal Supremo ainda aplicaram aquela primeira Lei em muitos processos, pois quando da ocorrência dos fatos, não havia entrado em vigor esta última, para os casos em que se produziram danos por produtos defeituosos.
Pioneira sentença de 05 de outubro de 1999 (S 5 Oct. 1999) declarou a responsabilidade de laboratório em virtude de usuário infectado por hepatite C, devido ao emprego de um produto farmacêutico que continha o respectivo vírus. Assim dispôs, após fazer referências aos artigos 25, 26 e 28 da Ley de Consumidores y Usuarios:
"Tales artículos establecen un sistema de responsabilidad objetiva frente a la víctima-consumidor que en nuestro ordenamiento positivo há representado una indudable progresión en la protección de la parte más débil en la contratación (responsabilidad contractual) o en el consumo de productos defectuosos (responsabilidad extracontractual); especialmente el art. 28 impone el principio de responsabilidad por los daños originados en el correcto uso y consumo de bienes y servicios, con ciertas condiciones en el apartado 1; en el apartado 2, sin embargo, se añade que en todo caso, se impone el régimen de responsabilidad objetiva a los productos farmacéuticos; éstos, como en otros productos que enumera la misma norma, constituyen un precedente de la responsabilidad objetiva que explícitamente proclama la Directiva del Consejo, 85/374/CEE, de 25 de julio que há sido posteriormente desarollada por la Ley 22/1994, de 6 de julio, de responsabilidad civil por los daños causados por productos defectuosos; ambas normas inaplicables al presente caso. Pero sí es aplicable el artículo 28.2 de la citada ley; queda sometido al régimen de responsabilidad puramente objetiva el daño sufrido por el consumidor por la utilización del producto farmacéutico."
A já mencionada sentença de 24 de setembro de 1999 (S 24 Sep. 1999) – relativa ao DIU defeituoso, que condenou solidariamente a empresa fabricante e a Diputación Provincial de Valencia, que aplicou o contraceptivo por intermédio de seu centro de planificação familiar, assim asseverou:
"La responsabilidad en que incurrió la compañía codemandada y condenada DIU, S.A. – que no se defendió en el proceso -, no excluye la concurrente de la Diputación Provincial de Valencia, conforme a lo que se deja estudiado, y determina el rechazo del motivo quinto que contiene infracción del art. 1903 en relación al 26, 27 y 28 de la Ley de 19 Jul. 1984, ya que se viene a reiterar la argumentación del motivo precedente desde la órbita de aplicación del art. 1903, cuando há quedado decretado que se trata de responsabilidad por actuar culposo próprio. No responde la recurrente por la actuación de la mercantil que fabricó y distribuyó el producto, al no mediar entre las mismas relación de dependencia u outra de las previstas en el art. 1903 y sólo de naturaleza comercial. Sucede que la responsabilidad del comerciante no se inicia y agota en el mismo, sino que resulta extensiva a los terceros que, con respecto al producto defectuoso, han tenido intervención decisiva en la producción del daño, por lo que éste se debe a una actividad conjunta del fabricante y del tercero, conforme la previsión del art. 8 de la Directiva Comunitaria de 25 Jul. 1985, cuya adaptación a nuestro Derecho la produjo la Ley de 6 Jul. 1994, sin derogar los arts. 25 a 29 de la Ley General para Defensa de los Consumidores y Usuarios. Que también prevé la posibilidad de la responsabilidad de terceros (artículo 8), si bien la Disposición Adicional única, en cuanto se refiere al suministrador, está contemplando una actuación dolosa imputable a los mismos."
A análise comparativa dos diversos sistemas jurídicos existentes, mais do que incremento histórico-cultural, auxilia na formação de uma visão expandida dos problemas, e principalmente, das soluções legislativas encontradas por outras sociedades.
A escolha da Espanha como paradigma tem sua razão de ser fundada na experiência daquele país em conviver com diversos ordenamentos simultâneos. É preciso lembrar que antes – e além de – pertencer à União Européia (e portanto, estar sujeita às Diretivas e demais regulamentos desta gigantesca obra de convivência supranacional), a Espanha possui diversas regiões autônomas, com legislação própria dentro de seu território nacional.
Tratando especificamente sobre o Direito do Consumidor, praticamente todas estas regiões autônomas possuem codificação própria, que convive com a lei nacional maior, e conseqüentemente, com as orientações normativas (as chamadas Diretivas) da União Européia.
Como exemplo, podem ser citadas as leis 10/1981, de 18 de novembro (Estatuto Del Consumidor para el País Vasco); 3/1993, de 05 de março (Estatuto Del Consumidor de Cataluña); 12/1984, de 28 de dezembro (Estatuto Gallego Del Consumidor y Usuario); 5/1985, de 08 de julho (Ley de los Consumidores y Usuários em Andalucía); 6/1998, de 15 de março (Estatuto Del Consumidor y Usuário de Cantabria); 4/1996, de 14 de junho (Estatuto de los Consumidores y Usuários de la Región de Murcia); 2/1987, de 09 de abril (Estatuto de Consumidores y Usuários de la Comunidad Valenciana); 8/1997, de 30 de outubro (Estatuto del Consumidor y Usuário de la Comunidad Autónoma de Aragón); 3/1995, de 09 de março (Estatuto Del Consumidor de Castilla-La Mancha); 1/1998, de 10 de março (Estatuto de los Consumidores y Usuários de la Comunidad Autónoma de las Islas Baleares); e 11/1998, de 09 de julho (Ley de Protección de los Consumidores de la Comunidad de Madrid).
Tamanha complexidade (e por que não, profusão) de textos legais credencia a Espanha como objeto de estudo mais aprofundado, sendo certo que sua experiência legislativa, e mais, a forma como esta legislação foi sendo introduzida no cotidiano, através da construção paulatina do entendimento jurisprudencial, é matéria que serve de substrato para comparação e aprendizado de qualquer sistema que se pretenda sério.
O objetivo é, portanto, trazer uma visão comparativa de experiências legislativas e práticas, trazendo à luz exemplos concretos da aplicação do Direito positivo lá vigente, de forma a permitir um melhor aproveitamento do que ambos os sistemas jurídicos podem oferecer de melhor.