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Precisa punir?

A verdade por trás do crime e da pena

Agenda 12/05/2015 às 15:02

Pequeno artigo acerca da finalidade da pena, dentro de uma visão criminológica tradicional e da teoria agnóstica entre outras.

A Prisão é um dos institutos mais antigos da sociedade, durante vários séculos o sistema carcerário foi usado como local onde o indivíduo aguardava sua punição, as penas nessa época eram corporais, de tortura, vexatória, quando não a própria morte entre outras. Portanto, o cárcere, em seus primeiros passos, era utilizado como meio e a pena corporal como final da punição.

Até mesmo na Bíblia podemos encontrar passagens onde verificamos o que ocorria com quem infringia a regras, tomemos, por exemplo, passagem no livro de Gênesis, cap. 40:1-4: "Depois destas coisas, o copeiro do rei do Egito e o seu padeiro ofenderam o seu senhor, o rei do Egito. Pelo que se indignou Faraó contra o seus dois oficiais, contra o copeiro-mor e contra o padeiro-mor; e mandou detê-los na casa do capitão da guarda, no cárcere onde José estava preso; e o capitão da guarda pô-los a cargo de José, que os servia. Assim, estiveram por algum tempo em detenção".

Com a humanização do direito penal houve substituição das penas corporais para as penas privativas de liberdade, o cárcere deixou de ser o local onde se aguardava a punição e passou a ser a própria punição do condenado. As leis atuais confirmam o caráter ressocializador da pena, pois trazem em seu comando normativo, imperativo para que o encarcerado tenha auxílio da instituição no que diz respeito à educação, trabalho e local apropriado para cumprimento de pena, até mesmo cursos técnicos para aumentar a porcentagem de sucesso em sua finalidade.

O ocorre que os estabelecimentos prisionais foram criados para apresentar estruturas intransponíveis, monitoramento, segurança e condições para ressocializar o delinqüente, porém verifica-se que esses locais apresentam alto índice de violência, rebeliões, perca de valores éticos. Por esses e outros motivos o sistema não consegue cumprir sua função, o problema está desde a forma de aplicação dá pena até o seu efetivo cumprimento, faz-se necessário, então investir em políticas pública pré, durante e pós- encarceramento.

Para melhor análise da pena devemos, primeiramente, entender o que é o crime, seu conceito e suas causas. A definição da palavra crime é o ponto mais importante do estudo do ramo Direito Penal, o código penal de 1940, que se encontra em vigor, não traz o conceito de crime consigo, a sua definição está na Lei de introdução do código penal (Decreto 3.914/41), no artigo 1º que dispõem que considera crime “a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção”. Já o código criminal de 1830 definia crime como toda ação ou omissão voluntária às leis penais, era considerado criminoso aquele que cometia, constrangia ou mandava alguém cometer crime, sendo necessário ao autor do delito má-fé, ou seja, conhecimento do mal.

O código penal de 1890, em seu artigo 7º, considera crime como sendo qualquer violação imputável e culposa da lei penal, possuindo como agente do crime quem executa diretamente presta auxílio, provoca e determina outro a executá-lo, ou ainda, manda alguém cometer. Também são considerados agentes do crime os cúmplices que fornecem instrução para cometê-lo, ou auxilia, ajuda o criminoso a se evadir, recebe, compra ou oculta objeto de crime e dão asilo ou deixam assassinos e ladrões fazerem reuniões em sua casa.

Na legislação atual não há conceituação completa de crime, este foi produzido pela doutrina. Dentre os vários conceitos quatro são considerados mais importantes para o estudo, quais sejam, o conceito formal, material, analítico e definitorial.

Define-se crime, segundo o conceito formal, sob uma análise estritamente legal, de acordo com a lei, por ser fruto do positivismo que retira a aplicação de valores buscando uma maior segurança jurídica. Doutrinadores clássicos, como Carmignani, definem crime como fato humano contrário à lei, Giusppe Maggiore conceitua como qualquer ação legalmente punível. Portanto, para a corrente formal, a definição de crime depende exclusivamente do imperativo legal, ou seja, da própria lei.

O conceito material faz de início, uma análise puramente sociológica do crime, tendo-o como fato social. Para Raffaele Garofalo o crime era uma "violação dos sentimentos de bondade, caridade estruturais de piedade e probidade" (citado por García-Pablos, Criminologia, cit., p.124), "uma conduta gravemente lesiva de bem jurídico" (Queiroz, 2011 p. 150). Atualmente é definido como ato que viola algum bem jurídico tutelado pela lei, fazendo uma junção do que é valioso para a sociedade, com a proteção do bem jurídico. Entende-se, portanto, como ação ou omissão que vai contra os interesses da sociedade ou de grupos dentro desta, definidos pela pessoa do legislador.

No Brasil foi adotado o conceito analítico de crime, na forma tripartida, conforme a doutrina majoritária, visto que a minoritária adota o a definição bipartida.  Aqui se considera crime como fato típico, antijurídico e culpável. Portanto, seria uma conduta de ação ou omissão concreta que se amolda ao caso hipotético previsto na legislação, sendo proibido por esta, por caracterizar a ilicitude do ato reprovado socialmente. "O conceito analítico é, pois, um desdobramento do conceito formal de crime, isto é, crime como infração à lei penal."(Queiroz, 2011 p. 152).

Há também o conceito definitorial, que surge com a teoria do etiquetamento, também conhecida como labeling approach. Para esta corrente delito faz parte da reação social, que define o que é uma conduta de desvio, o crime é "uma construção social arbitrária resultante dos processos de criminalização primária (a lei etc.) e secundária, a cargo do sistema de justiça criminal (Polícia, Ministério Público etc.)."(Queiroz, 2011 p. 151). Desviante é aquele quem foi rotulado como criminoso por um determinado grupo social.

Depreende-se, das várias formas de conceituação do crime, que este depende do que a lei caracteriza como crime, uma visão claramente legal, como conseqüência deve-se observar quem define o que é e o que não é crime e seu contexto histórico, para assim entende-lo. O conceito definitorial, assim como os demais, demonstra implicitamente que o crime é definido por quem detém o poder dentro da sociedade, mais especificamente em determinados grupos dentro desta que controlam as relações de poder e impõem suas regras perante os demais grupos, definindo o que vai ser considerado como ato de desvio ou conduta normal, socialmente aceita.

Importante, também, se faz as causas do delito, sabendo das causas pode-se cortar o mal pela raiz. A criminologia é uma ciência que estuda o crime, criminoso, reação e controle social. Além disso, investiga o que ocorre na realidade, por ser uma ciência do mundo do "ser" e não do dever "ser", como o direito penal. Pode ser separada em dois momentos, a criminologia tradicional e a moderna, esta tem por objeto o processo de criminalização, rotulação com olhar voltado para as instituições, já aquela tem como objeto as causas do crime, com um olhar para o comportamento.

Dentro do estudo da criminologia tradicional existem diversas correntes e escolas que definem as causas do crime, por tal motivo é chamada de ciência etiológica. São elas, Escola Clássica, Positivista Italiana, Francesa e de Chicago, cada uma possui uma linha de pensamento diferente acerca do delito, indo desde causas biológicas às até causas sociais.

A Escola Clássica propõem que o delito é resultado do livre arbítrio, ou seja, da própria vontade da pessoa, não diferenciando o delinqüente do indivíduo normal, por entender que ambos possuem a mesma responsabilidade e liberdade moral de suas próprias condutas. A pena era usada como meio de defesa social, baseada no contrato social e na sua máxima utilidade, “o critério da medida da pena é o mínimo sacrifício necessário da liberdade individual” (Baratta, 2011 p. 34).

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Para Cessare Beccaria, autor da Escola Clássica, o indivíduo coloca apenas uma parte mínima de sua liberdade no contrato social e dessa parte mínima surge o direito do Estado punir o delinqüente, observando-se sempre que o que foi depositado é apenas a menor parte consagrada, pois o avanço desta passa a ser considerado injusto.

Romagnosi, também autor da Escola Clássica, parte do princípio da conservação da espécie humana e da máxima utilidade. A pena tem finalidade de contra-estimulo para o desejo de delinqüir, porém não o coloca como único meio de defesa social, por entender que também deve ser feita a prevenção do delito por meio da melhoria da vida social.

A Escola Clássica possuía como pilares o direito natural, considerado imutável e divino. Dentro desta temática jusnaturalista Carrara descreve o delito não como ente fático, mas sim como ente jurídico, “porque sua essência deve consistir, indeclinavelmente, na violação de um direito” (F. Carrara, 1889, p 37-28), direito este que advém de uma lei absoluta, conforme as vontades do criador.

A função da pena é a defesa social, mas sua finalidade, diferentemente das já apresentadas, é a eliminação do perigo social. As outras funções da pena como reeducação do delinqüente, por exemplo, seria apenas uma finalidade acessória à eliminação social.

Com o avanço do tempo, as ideologias da Escola clássica perderam força, o homem passou a ser resultado de uma série de determinações e não mais do livre arbítrio, portanto, o delito deixou de ter uma lógica de causação espontânea, surgindo, então, a Escola Positivista.

Nesta Escola o crime passou a ter "todo o complexo de causas na totalidade social que determina a vida do indivíduo"(Baratta, 2011 p. 38). Lombroso considerava o delito como entre natural, não mais como ente jurídico como em outrora, que possuía como causa características biológicas hereditárias, começa a aparecer a figura de rígido determinismo.

Tempos depois Enrico Ferri, que considerava o livre arbítrio como ficção, ampliou o que foi demonstrado por Lombroso, adicionando ao determinismo biológico fatores antropológicos, físicos e sociais. O crime passou a depender, também, do contexto onde o homem encontrava-se introduzido, seu comportamento era pura expressão de seu contexto social.

O sistema penal se fundava, além da classificação do delito, nas tipologias dos autores, que poderiam ser delinqüentes natos, possuía aspectos cognitivos, mais biológicos, loucos, que possuem pensamentos anormais por disfunções mentais e não físicas, habituais, que faz da prática do crime um modo de vida, ocasional, que comete crimes eventualmente, está associado às oportunidades que existem no "mercado", ou passional, aquele que comete por impulso, não controla suas ações. A criminalidade aqui se encontra na anomalia do autor do delito.

Garófalo dizia que o ato de que cometer um crime causava a violação de determinados sentimentos de bondade e caridade fundamentais da piedade e probidade, estes delitos "são aqueles contra os quais toda a sociedade civilizada se defende, porque exprimem um notável egoísmo, e atentam contra valores e interesses percebidos como universais na consciência de todos os cidadãos normais"(Baratta, 2011 p. 117).

A idéia de delito natural foi proposta por R. Garófalo, bem como, a de periculosidade, que possuía cunho de prevenção contra o cometimento de delito e reincidência. O criminoso, fonte de perigo, deveria ser inocuizado pela prisão perpétua ou até mesmo a pena de morte.

Ao final, a Escola Positiva, por intermédio de Grispigni, chegou ao sistema pela responsabilidade social do autor, imputa-se o delito pelo modo de se comportar do sujeito, por isso a sociedade deve intervir conforme as ações do delinqüente. Necessário, então, a reafirmação da pena como meio de defesa social, porém, esta não possui somente o viés de correcionalista de reprimir o delinqüente e o retirar do convívio social, mas, também, possui caráter reeducativo tendo a diferenciação tipológica dada por Ferri como meio de contribuir para maior alcance desse caráter substitutivo.

A Ideologia da defesa social foi um pensamento comum à Escola Clássica e Escola Positivista, nasceu juntamente com a revolução burguesa, assumindo papel ideológico no setor penal. Possuía seis princípios fundamentais à sua existência. No Princípio da legitimidade, o direito de punir do Estado é resultado de um contrato social, o Estado "esta legitimado para reprimir a criminalidade, da qual são responsáveis determinados indivíduos, por meio de instâncias oficiais de controle" (Baratta, 2011 p. 42).

O Princípio do bem e do mal afirma que o bem ou mal não está no livre arbítrio, mas sim no determinismo biológico. "O delinqüente é um elemento negativo e disfuncional do sistema social. O desvio criminal é, pois, o mal; a sociedade constituída, o bem."(Baratta, 2011 p. 42).

Princípio de culpabilidade traz a idéia de culpa e responsabilidade subjetiva do agente. "O delito é expressão de uma atitude interior reprovável, porque contrária aos valores e as normas"(Baratta, 2011 p. 42). Já o Princípio da finalidade dispõe que a pena possui duas finalidades, segundo a prevenção especial positiva a ressocialização do delinqüente, e de acordo com a negativa a inocuização como contramotivação ao comportamento criminoso.

Com o Princípio de igualdade tem-se que o Direito Penal é igual para todos, pois o tipo penal é infinitivo e impessoal. E por último, não menos importante, o Princípio do interesse social e do delito natural, onde o Direito Penal protege o interesse e o direito de todos. "O núcleo central dos delitos definidos nos códigos penais nas nações civilizadas representa ofensa de interesses fundamentais, de condições essenciais à existência de toda sociedade"(Baratta, 2011 p. 42).

Já na linha de pensamento da Escola Francesa, partia-se da concepção de que o meio produzia o criminoso e que suas características biológicas não eram mais determinantes, trabalhavam muito com linhas estatísticas. O olhar social desta escola pode ser visto através do pensamento de Lacassagne, que afirmava: "cada sociedade têm os criminosos que merecem". Lacassagne não afasta as anomalias biológicas apresentadas por Lombroso, mas afirma que aparição de tais condições físicas são conseqüência de fatores sociais, como, miséria e pobreza entre outras.

Gabriel Tarde, jurista francês, analisava o criminoso como um profissional, para tanto, era necessário um tempo de aprendizagem, assim como nas demais profissões existentes. Para Tarde a imitação tinha papel importantíssimo no processo de aprendizagem criminosa, determinados modos de se comportar iniciam-se como moda, passando a se tornar prática cotidiana e imitada por outras pessoas. Antecipou, ainda, a teoria da associação diferencial, que afirma que o comportamento criminoso pode ser aprendido pela interação com grupos íntimos através de técnicas e orientações, complexas ou simples.

O estudo da grande metrópole feito pela Escola de Chicago chegou à conclusão de que a desorganização social, ausência do poder Público, áreas de pobreza é que leva ao surgimento de maior índice de criminalidade. O local degradado enfraquece as instituições sociais, tais como, as escolas e famílias, tornando propício o surgimento de atos de desvio.

A Teoria ecológica, criada por Park e Burgess, tinha como idéia principal a cidade, não como local para grupamento de pessoas, mas como um organismo próprio. O modo de se comportar das pessoas é diretamente influenciado por vetores sociais ambientais, quanto maior a desorganização social maior a criminalidade local. Os locais de desorganização são caracterizados pela degradação física da cidade, segregações de diversos tipos e pobreza entre outros.

Da soma de teorias das Escolas apresentadas, percebe-se que o crime é resultado de uma soma de fatores, é um fato biológico, psicológico e social. Porém essa associação não é suficiente para explicar o comportamento criminoso, como se verifica, aqui o crime pode ser relacionado aos estratos inferiores presentes na sociedade, esse fato não responde o porquê do crime ser cometido fora dos estratos inferiores.

O comportamento criminoso, além dos motivos já citados, pode ser aprendido através da interação das pessoas, o crime também se apresentar quando o individuo é privado de ter acesso aos meios para ter o seu sucesso almejado. O status de crime vária conforme as vontades de quem define este, por várias vezes na sociedade uma conduta que era realizada pelas pessoas que detinham o poder passou a ser realizada por quem não o tinha, com isso passou a ser reprovada e como conseqüência considerada como crime.

Portanto, para maior controle social, e mais eficaz controle na área penal, é importante o estudo das causas, mas tão quanto as estas, deve-se atentar as instituições e o processo de rotulação.Para entender os fins devemos entender os meios, em outras palavras para entender a finalidade das penas devemos entender o "mundo criminoso". Para termos um eficaz dever ser é necessário o saber de como ocorrem o processo do ser.

Por mais importante que sejam as causas percebe-se realmente que na área penal são as instituições que fazem o controle social, inclusive nas prisões. Passando a discussão acerca do crime, para melhor entendimento da pena, chegamos à finalidade e seus meios de execução.O sistema carcerário é um dos males da sociedade que infelizmente não podemos abrir mão, pelo menos por um longo período de tempo conviveremos com esse sistema fadado ao fracasso, por falta de uma janela de oportunidade para prática de efetiva mudança no seio da aplicação das penas e de suas finalidades (execução penal).

 A finalidade da pena, conforme visto na criminologia tradicional, por mais que prevista no ordenamento, não é capaz de atingir seu objetivo, pois sua realidade é política e não jurídica. Uma rápida análise sobre a política abolicionista, responsável por negar a atividade estatal sancionadora, que apresenta propostas concretas para o fim do sistema carcerário à alternativas de punição se faz importante para o estudo.

O que se propõe por esta matriz teórica é a substituição do atual sistema por um sistema não punitivo para resolução dos conflitos. Michel Foucault através de sua obra Vigiar e Punir deu base ao movimento abolicionista, pois possibilitou o entendimento de que o sistema punitivo moderno se baseou a partir das teorias científicas da criminologia tradicional (etiológica), esta teve papel fundamental no direito penal moderno, pois justifica "as práticas punitivas sob a perspectiva do falso humanismo representado pelo discurso ressocializador. A criminologia etiológica incorporou-se, subliminar e invisivelmente, como discurso orientador das fases legislativa, judicial e executiva, fixando a idéia da pena clínica e correcional." (Carvalho, 2007 p. 5)

Noutra interpretação da obra percebe-se que o poder pode ser observado através das relações, quando este não pode ser observado o investigador não obtém a posse do objeto. Com isso, não há ninguém que detém o poder, "ninguém é, propriamente falando, seu titular; e, no entanto, ele sempre se exerce em determinada direção, com uns de um lado e outros do outro; não se sabe ao certo quem o detém; mas se sabe quem não o possui."(Carvalho, 2007 p. 5).

Outros autores, como Thomas Mathiesen, tinham como idéia central a abolição do cárcere, até mesmo de suas formas alternativas, porque teriam a mesma funcionalidade do cárcere. O que deveria ocorrer era uma reforma nas instituições responsáveis pela punição, com melhora em suas condições, mudança do regime de visitas e saídas temporárias entre outros.

Afirma, ainda, que determinados argumentos apontam contra a construção de mais locais para encarceramento. São eles:

 (1ª) a criminologia e a sociologia demonstram que o objetivo de do detento (prevenção social) é irreal, sendo constatável efeito contrário de destruição da personalidade e incitação da reincidência; (2ª) o efeito da prisão no que diz respeito à prevenção geral é absolutamente incerto, sendo possível apenas estabelecer alguma relação de impacto de políticas econômicas e sociais na dissuasão do delito; (3ª) grande parte da população carcerária é formada por pessoas que praticaram delitos contra a propriedade, ou seja, contra bens jurídicos disponíveis; (4ª) a construção de novos presídios é irreversível; (5ª) o sistema carcerário, na qualidade de instituição total, tem caráter expansionista, ou seja, suscita novas construções; (6ª) as prisões funcionam como formas institucionais e desumanas; (7ª) o sistema carcerário produz violência e degradação nos valores culturais; e (8ª) o custo econômico do sistema carcerário é inaceitável. (Mathiesen, 1989 p. 11).

Alega que para diminuirmos a necessidade do sistema penal seria necessária a descriminalização das drogas e uma política mais voltada às vítimas do crime e menos voltada ao infrator. Conclui que se a maioria dos crimes são contra o patrimônio, a verdadeira guerra contra o crime seria o combate a pobreza, portanto, verifica-se o crime para usar da melhor política social para combatê-lo.

 Para Nils Christie o sistema penal produz sofrimento e dor para seus usuários, quando deveria ser o oposto disto. O autor propõe opções de castigo, não como as penas alternativas, mas como participação da comunidade, com um sistema de indenização pelo dano causado, essa compensação seria uma opção de castigo que não leva dor e sofrimento.

Ainda dentro do abolicionismo, para Louk Hulsman, há diversas opções para resolução dos conflitos, como a conciliação, educação, terapia e etc. Opções estas que não são somo o sistema carcerário, que em sua visão foi criado propriamente para fazer o mal.

Há, ainda, dentro desta corrente uma forte crítica aos substitutivos penais, pois eles são apenas relegitimadores do sistema carcerário, reforçam sua necessidade por gerarem uma expectativa de comportamento e possibilidade de reencarceramento. A teoria abolicionista tem importância fundamental para demonstrar a ineficiência do sistema penal para construção de uma nova política criminal.

O atual sistema jurídico-penal afastou a discussão sobre o abolicionismo penal, como conseqüência deu-se enfoque maior à pena como meio de castigo. Prova disso é a própria lei de execução penal de 1984, que tem como finalidade a prevenção especial positiva, ou seja, a ressocialização do delinqüente, porém com a Constituição de 1988 a lei foi alterada, principalmente no que tange aos princípios aplicados à sanção penal.

Diferentemente de algumas Constituições de países europeus, que trazem a finalidade da pena em seu teor, a Constituição brasileira não traz o por quê da pena, sua fundamentação.  Ela direciona seus esforços para dizer como punir, isso traz ausência dos limites à interpretação de aplicação da execução penal, fazendo surgir uma política de redução de danos.

Pode ser verificado durante a leitura do artigo 5º da Carta Magna que ela se preocupa apenas em trazer meios para minimizar a dor e o sofrimento causado ao usuário do sistema carcerário. Porém, mesmo que estivesse expresso o porquê do castigo, a Constituição não estaria imune as críticas, pois mesmo aqueles que a expressaram não conseguiram separar do seu objetivo o caráter retributivo e preventivo da pena, com isso se percebe que o que importa realmente é o meio como a pena é aplicada e não o seu fim (finalidade).

A Doutrina da Teoria Agnóstica, antecipando o segundo momento da criminologia, que possuía como objeto o processo de criminalização e rotulação e olhar voltado para as instituições, iniciada após a década de 60, define a conceituação de crime não como jurídica, mas sim como política. "O defeito das teorias correntes em tal matéria consiste justamente no erro de considerar a pena como uma conseqüência do direito, logicamente fundada (...). Que a pena considerada em si mesma, nada tem que ver com a idéia de direito (...)"("Fundamentos do Direito de Punir", 1996 pp. 649-650).

A pena, por mais que tenha como caráter a ressocialização, não consegue afastar o caráter retributivo e preventivo, pois os meios utilizados são totalmente ineficazes. Os substitutivos penais, que trazem facilmente uma falsa realidade de que e pena não é utilizada como castigo, são apenas meios de se reafirmar o mal institucionalizado. A pena, nos dias de hoje, é tida como ente político e não jurídico, o Estado abandona o sistema carcerário propositalmente para infringir dor e sofrimento, a ilusão de que se pretende reeducar e reconduzir o delinqüente à sociedade é real e está longe de acabar.

Uma mudança de sistema torna-se dificílima, pois o problema de aplicar outros meios como os já propostos, inclusive os da teoria abolicionista, é que não existe estrutura metodológica. Portanto, é necessário fazer com que o Estado simplesmente mude o caráter retributivo da pena que é dado nos dias de hoje. Fica fácil observar que o Estado não se importa de propósito com o sistema carcerário, a partir do momento que se destaca o que diz a lei de execução penal e que ocorre na realidade.

A finalidade da pena segundo nossa lei de execução penal é o efetivo cumprimento das decisões judiciais e o oferecimento de formas para readaptação da pessoa condenada, socialmente e moralmente. O que a lei dispõe já é o suficiente para maior eficiência do sistema carcerário, já que uma mudança de sistema é muito difícil basta cumprir o que a lei obriga e ao invés de construir novos presídios, investir no que realmente acaba com a necessidade de cometer delitos, uma melhora nos acessos aos meios legais para conseguir os objetivos traçados socialmente. Em outras palavras, maior investimento em direitos como educação, saúde, trabalho e conscientização de que a comunidade tem papel importantíssimo na redução dos delitos. Para que aplicar penas se podemos evitá-las.

REFERÊNCIAS

Alexandre, Alessandro Rafael Bertollo de. O conceito de crime. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 62, 1 fev.2003. abr.2015.

CARRARA, Francesco. Programa do curso de direito criminal: parte geral. Trad. José Luiz V. Franceschini e J. R. Prestes Barra. São Paulo: Saraiva 1956, v. 1.

GARCÍA PABLOS, Antonio.Derecho penal: introducción. Madrid: Universidad Complutense de Madrid, 1955.

Queiroz, Paulo. 2011.Direito Penal Parte Geral. Rio de Janeiro : Lumen Juris, 2011.

Zacarias, André Eduardo de Carvalho. 2003.Lei de Execução Penal Anotada. Leme : EDIJUR, 2003

Barreto, Tobias. 1996. "Fundamentos do Direito de Punir" (727), in revista dos Tribunais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1996.

Baratta, Alessandro. 2011.Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal. Rio de Janeiro : Revan, 2011.

Carvalho, Salo. 2007. Crítica à Execução Penal. Rio de Janeiro : Lumen Juris, 2007.

Mathiesen, Thomas. 1989.La Politica del Abolicionismo, in Abolicionismo. Buenos aires : Ediar, 1989.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: história da violência nas prisões. Trad. Raquel Ramalhete. 12. ed. Petrópolis: Vozes, 1995.

FERRI, E. Princípios do direito criminal. Trad. Paolo Capitanio. Campinas: Bookseller, 1996.

BECCARIA, C.Dos delitos e das penas. Trad. Paulo Oliveira. Rio de Janeiro: Tecnoprint, 1980.

Sobre o autor
Winston Prado

Estudante de graduação Direito - UNICEUB.

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