Sumário: 1.Introdução; 2. Pluralismo jurídico, 2.1.Antecedentes históricos, 2.2.Concepções atuais; 3.União Européia, 3.1.Formação histórica, 3.2.Instituições comunitárias; 4. Pluralismo jurídico na União Européia, 4.1.Direito nacional, 4.2.Direito comunitário, 4.2.1.Conceito, 4.2.2.Classificação, 4.2.3.Caracteristícas; 5. Conclusão; Bibliografia.
1.INTRODUÇÃO
O presente artigo pretende discutir o pluralismo jurídico decorrente do processo de integração na Europa, considerando a existência concomitante de dois ordenamentos jurídicos no contexto da União Européia: o nacional, constituído pelo Direito interno dos países que a integram, e o supranacional, constituído pelo Direito Comunitário.
Inicialmente, examina-se o pluralismo jurídico, seus antecedentes históricos e as concepções atuais que o identificam. Adiante, aborda-se a União Européia, sua formação histórica e as instituições que a compõem.
Em seguida, analisa-se o pluralismo jurídico na União Européia, a partir do estudo do Direito Nacional e do Direito Comunitário, enquanto sistemas com diferentes princípios, regras, procedimentos e áreas de competência, mas que interagem entre si.
Finalmente, à guisa de conclusão, procura-se apresentar, esquematicamente, uma síntese das idéias expostas ao longo do artigo, que venham contribuir para o enriquecimento do tema.
2.PLURALISMO JURÍDICO
2.1.ANTECEDENTES HISTÓRICOS
O Direito tem sido normalmente identificado como a ordem jurídica do Estado, isto é, aquela composta por normas elaboradas, editadas e asseguradas por órgãos estatais. No entanto, a ampliação do estudo da Sociologia Jurídica tem implicado o reconhecimento de que o Estado não detém mais o monopólio da criação e aplicação das normas jurídicas. Assim, admite-se a existência simultânea de ordens jurídicas distintas, que, por sua própria dinâmica, tornam-se insuscetíveis à apreensão por um único Direito (estatal).
Como observa Ana Lúcia Sabadell:
"Esta questão vem sendo tratada sob a denominação de pluralismo jurídico, provocando acirradas discussões no meio acadêmico. Na verdade não existe uma única resposta. Devemos examinar a situação concreta de cada período histórico para saber se existe um ordenamento jurídico unitário ou uma pluralidade de sistemas jurídicos."[1]
O pluralismo jurídico existiu na Europa durante o período medieval e o período moderno. "Em paralelo ao direito criado pelos aparelhos centrais dos Impérios e dos Reinos (direito real), vigoravam o sistema jurídico da Igreja e uma multiplicidade de direitos locais consuetudinários (fundamentados nos costumes e em antigas tradições jurídicas) e de direitos de várias corporações (Universidades, membros de determinadas profissões, "irmandades"). O direito romano era reconhecido como fonte do direito; as opiniões dos grandes "doutores" (jurisconsultos) eram consideradas como legalmente válidas. Além disso, os diferentes grupos étnicos (tais como os mouros, judeus e ciganos) também mantinham o seu próprio direito, independentemente do lugar em que moravam".[2]
Citado por Antônio Carlos Wolkmer,[3] Norbert Rouland destaca quatro manifestações jurídicas na Idade Média: um Direito "senhorial", baseado no militarismo; um Direito "canônico", informado por princípios cristãos; um Direito "burguês", fundado na atividade econômica; e, finalmente, um Direito "real", com a pretensão de incorporar os demais em nome da centralização do poder político, resultante da expansão do sistema capitalista.
Essa multiplicidade de formas e de conteúdos jurídicos foi denunciada por filósofos racionalistas e iluministas, que chegavam a considerar o Direito medieval caótico e monstruoso. A desproporcionalidade e o autoritarismo na aplicação das penas, sem o direito dos acusados à ampla defesa e ao contraditório, propiciavam uma sociedade submissa, em que os excluídos do círculo de poder dominante (isto é: a nobreza, a realeza e o clero) não tinham qualquer representação.
Com o fim da Idade Média e com o advento da Idade Moderna, a questão do pluralismo jurídico abre espaço para uma nova proposta, fundada no liberalismo e no individualismo. "A consolidação de uma nova forma de sociedade, capitalista, impõe uma nova concepção do político e do jurídico e uma crescente autonomia das ciências, livres do domínio religioso." [4]
No final do século XIX, o pluralismo jurídico toma por base a obra de Otto von Gierke, que examinou o Direito das "corporações", na Alemanha. Na mesma linha de uma leitura sociológica dos sistemas jurídicos, citem-se Eugen Ehrlich, que analisou as manifestações do Direito "vivo" nas comunidades camponesas da região de Bukowina (Europa central), em detrimento do Código Civil do Império Austro-Húngaro, e Karl Llewllyn, que analisou o ordenamento jurídico desenvolvido pelos índios Cheyenne, nos EUA.
Nas primeiras décadas do século XX, surgem as abordagens pluralistas de Santi Romano, sustentando que todo corpo social (partido político, religião, empresa) é uma instituição, que desenvolve seu próprio ordenamento jurídico, e de Widar Cesarini Sforza, defendendo a existência das relações jurídicas reguladas por normas costumeiras ou por acordos e decisões entre particulares, independente do Direito estatal. [5]
Nas últimas décadas, a questão do pluralismo jurídico tem sido objeto de diversos estudos, tanto do ponto de vista teórico quanto do ponto de vista empírico, dando origem a três concepções atuais, retratadas por Ana Lúcia Sabadell[6], como se verá adiante.
2.2. CONCEPÇÕES ATUAIS
Pode-se destacar três concepções atuais do pluralismo jurídico. A primeira concepção situa-se nas análises teóricas sobre a "interlegalidade". Os adeptos desta concepção "identificam a existência de vários sistemas de normas jurídicas que interagem entre si, criando redes de relações jurídicas continuamente mutantes."[7] Esta é a posição nuclear do pós-positivismo jurídico, que considera o monopólio estatal da elaboração e aplicação do Direito como uma construção historicamente superada.
A segunda concepção refere-se às mudanças ocorridas no cenário internacional, que propiciaram o surgimento de organizações internacionais (ONU, OMC) e supranacionais, de caráter regional (União Européia, NAFTA, Mercosul), que passaram a reclamar, de modo crescente, espaço de normatividade, por vezes, em detrimento dos ordenamentos jurídicos internos. A coexistência de normas jurídicas nacionais, internacionais e supranacionais criou uma nova forma de pluralismo jurídico que os estudiosos e pesquisadores passaram a analisar nos últimos anos. [8]
A terceira concepção encontra-se nas pesquisas empíricas sobre o Direito "informal", alheio ao Direito "oficial", e no seio de diversas instituições sociais como igrejas, sindicatos, associações civis e empresas. [9]
Dentre as concepções atuais do pluralismo jurídico, interessa-nos diretamente a segunda, em face do tema objeto do presente trabalho.
3.UNIÃO EUROPÉIA
3.1.FORMAÇÃO HISTÓRICA
O cenário internacional tem sofrido profundas transformações, nas últimas décadas, com o surgimento de blocos regionais, e a conseqüente interdependência entre os países que os integram.
Na Europa, o processo de integração ganha impulso com a assinatura, em Paris, em 11 de abril de 1951, do Tratado de Paris, que instituiu a Comissão Européia do Carvão e do Aço (CECA) e, em Roma, em 25 de março de 1957, dos Tratados que instituíram a Comunidade Econômica Européia (CEE, hoje CE) e a Comunidade Européia de Energia Atômica (CECA ou EURATOM).
O primeiro tinha por propósito a criação de um mercado comum de carvão e do aço. O segundo tinha por objetivo a criação de uma economia comum através da aproximação sucessiva das políticas econômicas dos países-membros. O terceiro propunha-se a promover, na Europa, a utilização da energia para fins pacíficos.
Seguiram-se a esses o Tratado de Fusão dos Executivos, de 1965, que unificou as estruturas da CECA, da CE e do EURATOM; o Tratado de Bruxelas, de 1972; e o Ato Único Europeu, de 1987, que ampliou os poderes das Comunidades Européias e aperfeiçoou os procedimentos de tomada de decisão.
Em 7 de fevereiro de 1992, foi assinado, em Maastricht, o Tratado da União Européia (TUE), firmado pelo Reino da Bélgica, pelo Reino da Dinamarca, pela República Federal da Alemanha, pela República Helênica, pelo Reino da Espanha, pela República Francesa, pela Irlanda, pela República Italiana, pelo Grã-Ducado de Luxemburgo, pelo Reino dos Países Baixos, pela República Portuguesa e pelo Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, que entrou em vigor em 1º de novembro de 1993. Em janeiro de 1995, a República da Áustria, a República da Finlândia e o Reino da Suécia aderiram ao Tratado da União Européia.
O Tratado de Maastricht, de 1992, foi alterado pelo Tratado de Amsterdã, de 1997, e pelo Tratado de Nice, de 2001.
O Tratado da União Européia representa uma nova fase no processo de integração naquele continente, imposta pela necessidade da criação de bases sólidas para a edificação da Europa futura. Além de promover a unificação dos países europeus, eliminando as barreiras que dividiam a Europa e melhorando as condições da vida e de emprego, o Tratado da União Européia reafirma o objetivo de assegurar a segurança e a liberdade de seus cidadãos.
A União Européia inova e supera em muitos aspectos as organizações internacionais tradicionais, em particular na sua estrutura, funcionamento, poderes e competências. Fala e age como se fosse um Estado continental e elabora e promulga normas jurídicas que vigoram nos países que o integram e firma acordos com outros grupos de países. Vem inspirando a formação de blocos regionais semelhantes, como o NAFTA e o Mercosul.
Os objetivos da União Européia, inicialmente apenas econômico e monetário, ampliaram-se consideravelmente, com a inserção de novos domínios, como a cultura, a informação, a defesa de consumidores, a segurança, a energia, o meio ambiente, as relações internacionais e o desenvolvimento científico e tecnológico, até alcançar a amplitude e a complexidade que apresenta hoje. Daí as profundas implicações no campo da Sociologia Jurídica e do Direito, com o surgimento de um pluralismo jurídico, caracterizado pela existência concomitante de dois ordenamentos: o primeiro, representado pelo Direito Nacional, composto por normas internas elaboradas no âmbito de cada país-membro; e o segundo, representado pelo Direito Comunitário, composto por normas supranacionais decorrentes dos Tratados comunitários e elaboradas pelas instituições comunitárias diretivas (Conselho da União Européia, Comissão Européia e Parlamento Europeu) e pela jurisprudência emanada do Tribunal de Justiça das Comunidades Européias.
3.2.INSTITUIÇÕES COMUNITÁRIAS
A estrutura da União Européia compreende órgãos fundamentais, designados pelos Tratados comunitários como instituições. O seu exame permite distinguir quatro instituições diretivas: o Conselho da União Européia, a Comissão Européia, o Parlamento Europeu e o Tribunal de Justiça das Comunidades Européias.
O Conselho da União Européia é a instituição responsável pela coordenação das políticas econômicas gerais dos países-membros, dispondo de poder de decisão próprio. É composto por um representante, de nível ministerial, de cada Estado-membro, com prerrogativas específicas para assumir, por seu país, compromissos vinculantes. É a única instituição comunitária em que os Estados-membros são representados.
A Comissão Européia é a instituição incumbida de velar pela aplicação dos Tratados comunitários, formulando recomendações e pareceres sobre as matérias neles tratadas. Dispõe de poder de decisão próprio e está habilitado a tomar as iniciativas necessárias para garantir a coordenação e a execução das ações da União Européia e dos Estados-membros. É composta por vinte membros, escolhidos em função de sua competência geral, entre técnicos e políticos, com mandato de cinco anos e com todas as garantias de independência.
Segundo Alejandro López Lacube, a Comissão Européia é "a instituição comunitária por excelência e a mais original" [10].
O Parlamento Europeu tem como atribuição mais importante a participação no processo conducente à elaboração das normas comunitárias através dos procedimentos fixados nos Tratados da União Européia, a saber: procedimento de cooperação, procedimento de co-decisão, procedimento de consulta e procedimento do parecer favorável. Co-legisla, portanto, com o Conselho da União Européia, sob proposta da Comissão Européia. Tem ainda a faculdade de rejeitar o orçamento, no seu conjunto, o que fortalece o seu controle sobre as atividades comunitárias.
É composto por seiscentos e vinte e seis representantes populares (os eurodeputados), eleitos por sufrágio universal direto, para um mandato de cinco anos.
Finalmente, o Tribunal de Justiça das Comunidades Européias é a instituição que garante o respeito e a observância da ordem jurídica comunitária através da interpretação e aplicação dos Tratados da União Européia. Tem uma posição de destaque, em relação às demais instituições comunitárias, por exercer uma função fundamental no processo de integração européia.
Como observa Maria Teresa Cárcamo Lobo:
"O Tribunal de Justiça tem um papel de extraordinária importância na construção do ordenamento jurídico comunitário, no exercício de suas funções de tribunal constitucional, tribunal judicial, tribunal administrativo e instituição de consulta (...) Alguns de seus acórdãos marcaram o perfil político-jurídico da Comunidade e a densidade constitucional efetiva da integração européia." [11]
É composto de quinze juízes e assistido por oito advogados-gerais, aos quais cabe apresentar publicamente, com independência e imparcialidade, as conclusões fundamentadas sobre as demandas submetidas ao órgão jurisdicional comunitário.
As instituições comunitárias diretivas mantêm entre si um diálogo interinstitucional, que envolve uma gestão interativa e compartilhada, no âmbito da União Européia.
4.PLURALISMO JURÍDICO NA UNIÃO EUROPÉIA
4.1.DIREITO NACIONAL
O Direito Nacional compreende um conjunto de princípios e regras elaborado soberanamente por cada Estado-membro da União Européia, com eficácia restrita ao território respectivo. Encontra-se na Constituição e nas leis infraconstitucionais integrantes do ordenamento jurídico interno de cada país-membro.
A relação entre o Direito Nacional e o Direito Comunitário é extremamente complexa, em face da transferência de parcela dos poderes soberanos dos Estados-membros às instituições comunitárias dotadas de supracionalidade, como se verá adiante.
Como acentua Márcio Monteiro Reis:
"Esta foi uma solução encontrada pelos Estados europeus em seu processo de integração, realizado através da formação de uma Comunidade de Estados. Nela, como em qualquer comunidade, há uma área comum ao lado das áreas privativas de cada membro. Assim, os Estados renunciam à sua competência em determinadas matérias concretas sobre as quais os órgãos comunitários passam a legislar, administrar e julgar. Suas decisões têm efeito direto. Portanto, ao legislar, o órgão comunitário está produzindo "lei" para todos os Estados, criando direitos e obrigações para eles e seus cidadãos imediatamente, sem necessidade de nenhum ato estatal. O mesmo se dirá com os atos administrativos ou judiciais. Todos produzem efeitos como se fossem provenientes de instâncias nacionais." [12]
4.2.DIREITO COMUNITÁRIO
4.2.1.CONCEITO
Miguel Ángel Ekmekdjian, a propósito do conceito de Direito Comunitário, afirma:
" (.. ) El derecho comunitário no es un derecho extranjero ni siquiera un derecho exterior, es un derecho próprio de los Estados miembros, tanto como su derecho nacional, com la característica especial de coronar la jerarquía normativa en todos ellos. (...) El ordenamiento jurídico comunitário se configura como un plexo de normas cuyos sujetos activos y pasivos son los Estados miembros y sus cidadanos. Dotado de órganos proprios, tiene poderes soberanos en ciertas materias específicas y – en la misma medida – los Estados miembros han perdido la soberanía en tales ámbitos reservados a al comunidad. En ellos, los países miembros conservan, sin embargo, competencias residuales, pero deben ejercelas conforme a la política legislativa comunitaria (...)" [13]
No mesmo diapasão, Carlos Francisco Molina del Pozo, conceitua o Direito Comunitário como:
"(...) el conjunto de normas y princípios que determinan la organización, funcionamiento y competencias de las Comunidades Europeas, (que) se conforma como un orden jurídico sui generis, dotado de autonomía com relación a los ordenamientos nacionales, distinto del orden jurídico internacional y del orden jurídico interno de los Estados miembros y caracterizado por unos rasgos peculiares."[14]
Observe-se que ambos os conceitos de Direito Comunitário fazem menção a características próprias e a sua distinção em relação ao Direito Nacional.
4.2.2.CLASSIFICAÇÃO
O Direito Comunitário apresenta duas categorias fundamentais de normas: o direito originário e o direito derivado.
O Direito Comunitário originário é formado pelos tratados que instituíram as Comunidades Européias, com seus anexos, protocolos, declarações e convênios relativos à sua execução, bem como pelos Tratados subseqüentes que os modificaram.
O Direito Comunitário derivado é formado pelas normas advindas das instituições comunitárias competentes para produzi-las, a saber: Conselho da União Européia, Comissão Européia, Parlamento Europeu e Tribunal de Justiça das Comunidades Européias.
Distintamente do Direito Comunitário originário, o Direito Comunitário derivado não se forma pela vontade direta dos Estados-membros manifestada ao aderir aos Tratados Comunitários, mas através de procedimentos legislativos autônomos com a participação das instituições comunitárias diretivas.
Os atos jurídicos que integram o Direito Comunitário derivado são: os regulamentos, as diretivas, as recomendações, as decisões, os atos convencionais, os princípios gerais de Direito e a jurisprudência. [15]
4.2.3.CARACTERÍSTICAS
As características essenciais do Direito Comunitário são: a autonomia, a primazia, a aplicabilidade direta, o efeito direito e a aplicabilidade de sanção ao Estado-membro por descumprimento da norma comunitária.
A autonomia do Direito Comunitário constitui o fundamento da ordem jurídica comunitária. Consiste na capacidade de criar um direito igual para toda a União Européia, uniforme e integralmente válido em todos os Estados-membros.
A primazia do Direito Comunitário significa que suas normas possuem supremacia sobre as normas dos ordenamentos jurídicos dos Estados-membros, inclusive sobre as de natureza constitucional.
Com efeito, ao aderirem à União Européia, os Estados consentem em transferir em favor das instituições comunitárias parcelas de suas competências, compartilhando, assim, os seus poderes soberanos. Os princípios e regras do Direito Comunitário afirmam-se, pois, em relação a todo o Direito Nacional, qualquer que seja o seu nível hierárquico.
A aplicabilidade direta do Direito Comunitário significa que as suas normas se integram ao ordenamento jurídico de cada Estado-membro, independente de a norma interna determinar essa inserção.
A jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Européias firmou-se como verdadeiro instrumento de criação judicial do direito. Trata-se, como se disse, do art. 177° do Tratado de Roma, com suas alterações, que confere ao Tribunal comunitário a atribuição de proferir decisões judiciais normativas, relativamente às questões prejudiciais sobre a uniformidade da aplicação e a apreciação da validade dos princípios e regras dos Tratados comunitários e dos atos e decisões adotados pelas instituições da União Européia.
O efeito direto do Direito Comunitário significa que as suas normas, ao entrarem em vigor, geram direitos e impõem deveres aos particulares, que podem invocá-los perante os órgãos jurisdicionais nacionais.
Por fim, os Estados-membros podem sofrer sanções, impostas pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Européias, pelo descumprimento de uma norma de Direito Comunitário ou até mesmo pelo não-acatamento de uma decisão judicial.
Como se viu, a relação do Direito Nacional com o Direito Comunitário – cuja coexistência concomitante identifica o pluralismo jurídico na União Européia – encontra-se, basicamente, na autonomia deste em relação àquele, na primazia deste sobre o Direito Nacional e na aplicabilidade direta do Direito Comunitário nos ordenamentos jurídicos dos Estados-membros. Essa relação não decorre dos Tratados comunitários, mas da rica jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Européias.