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A ação civil ex delicto

Agenda 17/05/2015 às 18:10

A reparação civil ex delicto permite que o dano ocasionado por um ilícito penal seja reparado não apenas no âmbito criminal, satisfazendo a sociedade e o Estado, mas também no âmbito civil diretamente à vítima ou aos seus sucessores.

INTRODUÇÃO

A sociedade evoluiu muito em alguns aspectos, porém em outros permaneceu com praticamente as mesmas condutas já que certos institutos pouco se modificaram.

Um dos aspectos que mais evoluiu é a intervenção do Estado no que diz respeito à resolução de conflitos interpessoais.

Antigamente, predominava a chamada "justiça pelas próprias mãos", que poderia ser comparado, atualmente como autotela, só que em proporções muito maiores. Era a lei do "olho por olho, dente por dente".

Mesmo no âmbito civil havia punições severas aos devedores, pois aquele que devesse e não pagasse, teria a sua vida nas mãos do credor, podendo ser morto ou escravizado.

Era uma época de vingança ilimitada privada. Agia-se diretamente sobre o ofensor, como punição pelos seus atos ilícitos.

Posteriormente, passou-se a uma fase de composição dos danos em dinheiro.

No período republicano, os delitos passaram a serem distinguidos entre públicos, aqueles que atingiam diretamente a comunidade, e privados, aqueles que atingiam diretamente o indivíduo, na esfera privada.

Nos delitos públicos, a pessoa sofria persecução do Estado e nos delitos privados a execução não se dava mais sobre a pessoa, mas sim sobre seus bens.

Atualmente, não só no sistema jurídico brasileiro, mas também em outros países, a punição de certos crimes é somente do Estado por serem mais graves ou que o legislador denuncia, como nos crimes de ação penal pública.

Trata-se da soberania do interesse público sobrepondo-se ao interesse privado, pois o Estado permite punir apenas o indivíduo responsável por ilícitos penais. Ele veda a punição ou vingança privada.

Tanto o Código Civil de 1916 quanto o atual, preconiza que todo aquele que por ação ou omissão voluntária, negligência, imprudência ou imperícia, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, fica obrigado a reparar dano.

Conforme Giuseppe Bettiol:

"O crime ocasiona, portanto, não apenas um dado penal, mas também um dano civil que deve ser reparado. Assim, gravita em torno do crime toda uma série de interesses e de disposições não penais que, por se referirem ao crime, poderiam agrupar-se sob a denominação de direito criminal civil."

Apesar dos ilícitos penais e civis serem condutas contrárias ao direito, eles se diferem em relação a pena imposta para tais delitos.

No direito privado, a condenação converte-se em perdas e danos, e no direito público há a execução de uma pena por parte do Estado.

Portanto, com exceção nos delitos previstos na Lei 9.099/95, as chamadas infrações de menor potencial ofensivo, sempre haverá a ação do Estado, e na condenação a imposição de uma pena, prevista no direito penal.

A exceção se dá pelo fato de a lei referida privilegiar o ofensor, concedendo beneficio civil dos danos e a transação penal que afastarão a ação penal, que antes do surgimento de tal lei, era indeclinável por parte do Estado.

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

FUNDAMENTOS

A prática de uma conduta delituosa pode gerar efeitos distintos no âmbito civil e penal.

O direito penal visa à proteção de bens jurídicos de maior relevância para a sociedade, como a vida, o patrimônio, a ordem publica etc. É, portanto, parte do direito público.

O direito civil visa à proteção de bens jurídicos importantes nas relações privadas, interpessoais, como contratos, obrigações etc. A doutrina o classifica como um ramo do direito privado.

Todavia, a prática do ilícito penal não está inclusa na prática dos ilícitos civis, merecendo, portanto, uma reparação de cunho patrimonial, quer que seja de danos materiais ou morais.

Deste modo, a evolução do direito trouxe uma legislação que acompanhou a evolução da sociedade, extinguindo o instituto da autotutela e regulamentando as relações jurídicas, inclusive no que diz respeito a atos ilícitos, quer sejam civis ou penais, bem como seus efeitos e formas de reparação.

A ação civil ex delicto encontra fundamento legal tanto na legislação penal quanto na legislação civil.

O Código de Processo Penal, em seus artigos 63 a 67, trata das regras da ação ex delicto, ditando sua legitimidade ativa e passiva, a competência e principalmente a independência entre os juízos civil e criminal.

Segue abaixo a transcrição dos artigos:

"Art. 63 - Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no juízo civil, para efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros.

Art. 64 Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, a ação para ressarcimento do dano poderá ser proposta no juízo civil, contra o autor do crime e, se for o caso, contra o responsável civil.

Parágrafo único. Intentada a ação penal, o juíz da ação civil poderá suspender o curso desta, até o julgamento definitivo daquela.

Art. 65 Faz coisa julgada no civil a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em estado de necessidade, em legitima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.

Art. 66 Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato.

Art. 67 Não impedirão igualmente a propositura da ação civil:

I- O despacho de arquivamento do inquérito ou das peças de informação;

II- a decisão que julgar extinta a punibilidade;

III- a sentença absolutória que decidir que o fato imputado não constitui crime.

O artigo 91, inciso I, do Código Penal, cuja redação foi determinada pela Lei 7.209/84, nos seguintes termos: "são efeitos da condenação: I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime", traz o principal efeito civil da sentença penal, que é o de tornar certa a obrigação de indenizar pelo dano causado pelo crime."

O Código Civil traz a previsão legal para a reparação civil pelos ilícitos penais, no artigo 186, com o seguinte teor: "... aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligencia ou imprudência, violar o direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito", trata da obrigação de indenizar por atos ilícitos em geral, incluindo os ilícitos penais.

Contudo, o mesmo fundamento legal dispõe de artigos que preveem especificamente a obrigação de reparação civil por determinados delitos cometidos, como é o caso dos artigos 948, 949 e 953, que preveem a reparação para os crimes de homicídio, lesão corporal e crimes contra a honra,dentre outros, nos seguintes termos:

"Art. 948. No caso de homicídio, a indenização consiste, sem excluir outras reparações:

I - No pagamento das despesas com o tratamento da vitima, seu funeral e o luto da família;

II - Na prestação de alimentos as pessoas a quem o morto os devia, levando-se em conta a duração provável da vida da vitima.

Art. 949. No caso de lesão ou ofensa a saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até o fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que ofendido prove haver sofrido.

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Art. 953. A indenização por injúria, difamação ou calúnia consistirá na reparação do dano que delas resulte o ofendido.

Parágrafo único. Se o ofendido não puder provar prejuízo material, caberá ao juiz fixar, equitativamente, o valor da indenização, na conformidade das circunstancias do caso. "

ATOS JURIDICOS LICITOS E ILICITOS

Os atos lícitos são aqueles que geram direitos. Nas palavras de Araken de Assis:

"O ilícito importa invasão da esfera jurídica alheia sem consentimento do titular ou autorização do ordenamento, ou seja, a agressão a esfera dos direitos que de modo geral competem a alguém."

A apuração da culpa, segundo o artigo 186 do Código Civil, deve abranger o dolo e a culpa, nas modalidades de negligência, imprudência e imperícia, quer sejam danos individuais, difusos ou coletivos.

Os ilícitos penais e civis diferem em relação as suas consequências, porém, na maioria das vezes, ambos geram efeitos de reparação civil.

Os ilícitos civis geram a obrigação de reparar o dano material ou moral na esfera patrimonial.

Entretanto, os ilícitos penais, de acordo com o princípio da intranscendência geram pena imposta somente ao agente do delito.

Já nos ilícitos civis, a vitima pode ingressar com a reparação contra o agente, seu representante legal ou seus herdeiros, gerando obrigação civil em relação à responsabilidade de indenizar.

Ambas as responsabilidades, civil e penal, são independentes. A sentença condenatória penal é uma decisão de mérito a respeito do fato que gerou a obrigação de indenizar, que restou provado em sede de juízo criminal, necessitando, apenas, para que a vitima obtenha sua reparação na esfera civil, da liquidação e execução da sentença penal condenatória, que constitui um titulo executivo judicial.

Todavia, o fato de não haver condenação da esfera penal ou mesmo de não ter sido instaurado um processo criminal, não impede que a vítima, seu representante ou seus herdeiros ingressem com um processo de conhecimento na esfera civil.

A diferença é que toda a instrução processual será feita no âmbito civil, fase que é dispensada quando dá a sentença penal condenatória, já que o processo de conhecimento está superado pelo advento da condenação.

ILÍCITOS PENAIS NA ESFERA CIVIL

Esses ilícitos ficam restritos a apreciação da esfera civil, nada tendo a ver com a atuação do juízo criminal.

Porém, os ilícitos considerados mais gravosos e merecedores de punições mais severas encontram-se elencados na legislação penal e nesta esfera serão julgados.

Entretanto, o fato de um ilícito ser previsto como penal não lhe retira o caráter de ilícito civil, muito menos os seus reflexos nessa esfera.

Grande parte dos ilícitos penais geram consequências civis, cujo principal efeito é a obrigação de reparar o dano. A distinção é, portanto, meramente formal.

Os tipos penais são fechados, pois não admitem interpretação além do que está descrito como fato delituoso. Para haver maior segurança jurídica, o fato concreto deve se encaixar exatamente ao descrito na norma, caso contrário, a conduta será considerada atípica.

Dito isto, podemos perceber que os ilícitos civis são de apuração muito menos rigorosa que os ilícitos penais, pois no ilícito civil a norma se amolda ao fato para abrangê-lo.

Até nos princípios processuais é possível constar diferenças. O processo penal busca a verdade real e o processo civil contenta-se com a verdade formal.

Podemos perceber que o julgamento de um ilícito na esfera penal é muito mais rígido no que diz respeito ao enquadramento da norma, do que um julgamento de um ilícito civil, pela própria natureza das diferentes esferas.

AÇÃO CIVIL EX DELICTO NO DIREITO COMPARADO

DIFERENTES SISTEMAS

Há quatro sistemas decorrentes de crimes: o sistema da confusão, da solidariedade, da livre escolha ou da interdependência e o da separação ou da independência.

No sistema da confusão, o processo visa à imposição de pena para reparação de cunho civil e penal.

No sistema da solidariedade, há duas ações distintas, porém ambas são resolvidas ao mesmo tempo, em conjunto num mesmo processo.

No sistema da livre escolha, ou da interdependência, há a possibilidade de se cumularem ambos os processos, civil e penal.

Por último, o sistema da separação, ou da independência, no qual há separação obrigatória das ações.

No Brasil, adotou-se o sistema da livre escolha, por permitir a adesão facultativa, posteriormente passando ao sistema da confusão, por ultimo, adotou o sistema da separação.

Em nosso sistema jurídico, a competência que se estabelece em relação à matéria é absoluto, ou seja, é necessário que se proponha uma ação civil perante o juízo cível e uma ação penal perante o juízo penal.

No Brasil, a ação civil que vise à reparação de danos decorrentes de ilícitos penais pode ser proposta antes, durante ou depois da ação penal, ou mesmo que qualquer ação penal seja proposta, dada a independência entre ambas.

Nosso ordenamento jurídico não permite a cumulação das duas ações.

SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA

A sentença penal condenatória possui alguns efeitos que se dividem em duas categorias: os efeitos primários e os efeitos secundários.

Os efeitos primários são aqueles ligados diretamente a pena, ou seja, a restrição da liberdade do indivíduo.

Os efeitos secundários são consequências não penais da sentença condenatória criminal.

Esses efeitos estão descritos nos artigos 91 e 92 do Código Penal, nos seguintes termos:

"Art. 91 - São efeitos da condenação:

I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime;

II - A perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé:

a) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito;

b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso.

Art. 92 - São também efeitos da condenação:

I - a perda de cargo, função pública ou mandato eletivo:

a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública;

b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a 4 (quatro) anos nos demais casos.

II - a incapacidade para o exercício do pátrio poder, tutela ou curatela, nos crimes dolosos, sujeitos a pena de reclusão, cometidos contra filho, tutelado ou curatelado;

III - a inabilitação para dirigir veículo, quando utilizado como meio para prática de crime doloso.

Parágrafo único - Os efeitos de que trata este artigo não são automáticos devendo ser motivadamente declarados na sentença."

A sentença penal possui uma parte condenatória, que é a imposição da sanção penal, e outra declaratória, o que torna certa a obrigação de indenizar.

Sendo o condenado absolvido em sede de revisão criminal, ficam prejudicados os efeitos da sentença condenatória, posto que desconstitui o titulo. Ficam, portanto, a instauração da execução, bem como o seu procedimento, prejudicados.

Diferente é no caso de extinção de punibilidade pelo crime ou contravenção penal, pois quando esta se opera após o transito em julgado da sentença, não apaga os efeitos secundários desta, dentre eles, os seus efeitos civis para fins de reparação de danos.

Quanto à sentença de absolvição imprópria, ou seja, aquela que aplica medida de segurança ao acusado por infração penal, não pode ser executada em sede civil, por não constituir título executivo, visto que a lei fala em sentença condenatória.

Assim, há necessidade do ofendido, seu representante legal ou ainda seus herdeiros, ingressarem com a ação reparatória no juízo cível, em sede do processo de conhecimento.

SENTENÇA PENAL ABSOLUTÓRIA

A sentença absolutória, fundada em insuficiência de provas, prevista no artigo 386, inciso VI, do Código de Processo Penal, diz que:

 " O  juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: (...) VI - não existir prova suficiente para a condenação", em nada influencia a ação de reparação de danos na esfera civel, posto que tal sentença apenas se associa com o principio da inocência, ou seja, ninguém será considerado culpado até prova em contrario.

Sem provas, não se pode considerar o réu culpado. E a prova no processo penal, deve ser objetiva sob pena de originar uma sentença absolutória, não pela prova de inocência do réu ou por inexistência do fato, mas por não se comprovar a culpa deste.

Portanto, pelo fato da sentença considerar o réu inocente ou que o fato criminoso não existiu, não pode tal sentença influenciar a ação reparatória civil, pois o processo penal busca a verdade real, havendo a necessidade de se comprovar integralmente a culpa, e o processo civil se contenta com a verdade formal.

Ou seja, o que não serve para incriminar um indivíduo na esfera penal, pode servir para apurar a sua responsabilidade na esfera civil.

Por tal motivo, pode o réu absolvido criminalmente por insuficiência de provas recorrer para a modificação do fundamento da sentença absolutória, visto haver legítimo interesse na reforma, pois a sentença absolutória fará coisa julgada no juízo civil.

ASPECTOS PROCESSUAIS

LEGITIMIDADE ATIVA

A ação civil ex delicto, segundo o artigo 63 do Código de Processo Penal, pode ser proposta pelo ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros.

Entende-se por ofendido, aquele foi atingido diretamente pelo fato criminoso, ou seja, a vítima do dano.

Portanto, a vítima pode ser qualquer pessoa, homem, mulher, maior, menor, capaz ou incapaz.

Com efeito, o artigo 63 do Código de Processo Penal inclui os herdeiros da vítima como legitimados para a propositura da ação civil ex delicto.

Isto ocorre, quando a vítima vem a falecer, quer seja em decorrência do fato criminoso ou de qualquer outra causa.

Como a ação civil ex delicto visa à reparação de um dano causado em decorrência de crime cometido, há o exercício do direito de sucessão.

E como tem cunho patrimonial, os herdeiros tem interesse na sua continuidade, andamento.

LEGITIMIDADE PASSIVA

A ação civil ex delicto deve ser proposta, a princípio, contra o réu condenado a sentença penal condenatória, bem como contra o autor do fato, no caso de ainda não haver condenação penal.

Por autor entende-se quem praticou a infração penal, e também os coautores e partícipes.

Desta forma, todos os responsáveis pelo fato criminoso poderão ser incluídos na ação civil reparatória do dano penal.

Temos, portanto, duas possibilidades a respeito da propositura da ação civil. Pode ser formado um litisconsórcio passivo facultativo simples, no caso de ainda não haver sentença condenatória.

Será facultativo o litisconsórcio, por haver uma mesma situação de fato unindo os réus envolvidos na ação civil. Porém, será simples, posto que a sentença poderá ser diferente para cada um deles.

No caso de ação civil ex delicto decorrente de sentença penal condenatória, o litisconsórcio será necessário, pois a execução do título executivo judicial, no caso a sentença, será contra todos, não cabendo opção ao autor.

Além de o autor do fato criminoso, temos também como legitimados passivos o responsável civil pelo agente, os seus herdeiros, ou ainda o garante, no caso de denunciação a lide na intervenção de terceiros.

O princípio da intranscedência, dispõe que apenas o autor do fato pode ser processado, julgado e condenado pela prática de um ilícito penal, não prevalece no direito civil, sendo portanto, possível que a ação civil reparatória seja proposta contra qualquer uma das pessoas.

Os efeitos civis da sentença penal condenatória, no que tange a obrigação de indenizar, são de cunho patrimonial, refletindo diretamente no patrimônio do réu, e não sobre a sua pessoa, como no caso da condenação criminal.

Assim, a ação civil pode ser proposta contra o réu ou, na falta ou no caso de patrimônio insuficiente deste, contra o seu responsável civil.

Portanto, a ação civil ex delicto, seja ela fundada em título executivo judicial decorrente de sentença penal condenatória, ou uma ação civil no processo de conhecimento, será proposta conforme as regras dispostas no direito processual civil.

PRESCRIÇÃO

O fato de um delito penal encontrar-se prescrito, não podendo ser este objeto de apreciação e condenação pelo juízo criminal, não impede o fato da vitima poder entrar, sem sede de juízo civil, ação reparatória dos danos ocasionados pelo delito penal.

Portanto, ainda que o réu não tenha sido processado sequer pela justiça criminal, poderá ainda ser processado, julgado e condenado na esfera civil.

Há hipótese de a pessoa sair ilesa em relação à punição criminal, em que não foi sequer processada e apreciada pelo juízo criminal, mas ter de arcar com os danos civis decorrentes de um fato delituoso.

Outra possibilidade é aquela onde ocorre a extinção da punibilidade penal pela prescrição, prevista no artigo 107, inciso IV, do Código Penal:

"Extingue-se a punibilidade: (...) IV - pela prescrição, decadência ou perempção."

Há duas espécies de punição penal: a prescrição da pretensão punitiva e a prescrição da pretensão executória.

Na prescrição da pretensão punitiva ocorre a perda da pretensão de punir, criminalmente, o autor pelo delito cometido, ainda que tenha ele sido julgado e condenado.

A prescrição da pretensão executória se dá quando há sentença condenatória transitada em julgado, porém decorreu-se em determinado tempo sem que o Estado conseguisse executar tal sentença, exercendo o direito de punir, afastando todos os efeitos penais da sentença, se esta houver sido prolatada.

Ambas as prescrições não afetam a ação civil ex delicto.

Porém, há prescrição para propositura da própria ação civil reparatória, seja para execução da sentença condenatória, seja para propositura da ação em sede de processo de conhecimento.

A prescrição civil reparatória em sede de processo de conhecimento, rege-se pelo disposto no artigo 206, §3º, inciso V, que diz prescrever em 3 (três) anos a pretensão da reparação civil.

O artigo 200 do Código Civil dispõe que o prazo para a prescrição para a ação de reparação civil dos danos causados por infração penal fica suspenso durante a pendência da ação penal, nos seguintes termos:

"Artigo 200 - quando a ação se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva".

Isto significa que, sendo o réu inocentado por sentença absolutória transitada em julgado, excepcionalmente nas hipóteses em que a sentença absolutória faz coisa julgada no juízo cível, pode a vítima propor ação de reparação de danos causados pelo cometimento da infração penal, seja qual for o tempo decorrido até a sentença, pois a prescrição apenas começará a correr a partir desta.

SUSPENSÃO DA AÇÃO CIVIL EM DECORRENCIA DA AÇÃO PENAL

O juiz da ação civil poderá suspender o curso desta se houver necessidade, diante da pendência da ação penal.

Porém, a suspensão determinada pelo juiz civil não pode exceder 1 (um) ano, nos termos do artigo 265 §5º.

Verificando tal prazo, o juiz ordenará o prosseguimento do feito, ainda que não haja sentença proferida, conforme segue:

"Art. 265. Suspende-se o processo:

(...)

IV - quando a sentença de mérito:

a) depender do julgamento de outra causa, ou da declaração de existencia ou inexistencia da relação juridica, que constitua o objeto principal de outro processo pendente;

b) não puder ser proferida senão depois de verificado determinado fato, ou de produzida certa prova, requisitada a outro juízo;

c) tiver por pressuposto o julgamento de questão de Estado, requerido como declaração incidente;

(...)

§5º Nos casos enumerados nas letras a, b e c do nº IV, o período de suspensão nunca poderá exceder 1 (um) ano. Findo este prazo, o juiz mandará prosseguir o processo."

A suspensão visa evitar decisões contraditórias e conflitantes, principalmente no tocante aos efeitos civis da sentença penal, particularmente em relação àqueles que fazem coisa julgada no juízo cível.

INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

O Código de Processo Penal, em seu artigo 68, prevê que "quando o titular do direito a reparação do dano for pobre, a execução da sentença condenatória ou ação civil será promovida, a seu requerimento, pelo Ministério Público."

Há duas possibilidades de o Ministério Público intervir na ação civil reparatória, na qualidade de substituto processual: na execução da sentença condenatória e na propositura da ação civil em sede de processo de conhecimento.

Caso a parte proponha ação civil ex delicto para obter sentença condenatória em sede de juízo civil, o Ministério Público não precisará dá certeza que o crime ocorreu, bastando a ocorrência do crime em tese, pois a vitima pode propor a ação civil independente da ação penal.

Sendo o representante do Ministério Público substituto processual do titular do direito, pode este propor a ação nos mesmos moldes que o titular o faria.

O intuito da lei é garantir que a reparação civil pelo delito seja efetivada, ainda que o titular do direito a reparação não tenha condições de dar andamento na ação civil.

Se o titular do direito não é pobre e constituiu advogada, não há que se falar em manifestação do Ministério Público como fiscal da lei, posto não haver interesse de pessoa pobre.

Porém, se o titular do direito é representado por advogado dativo, a manifestação do Ministério Público será obrigatória.

Outra possibilidade diz respeito à manifestação do Ministério Público em casos que, de um lado, temos uma vítima pobre representada por um membro do Ministério Público,e de outro temos um incapaz, o qual, segundo a lei, o Ministério Público tem o dever de atuar em qualquer processo em que haja interesses nessa situação.

Neste caso, cabe a outro representante do Ministério Público cuidar dos interesses do incapaz, já que haverá uma incompatibilidade caso seja o mesmo representante da instituição a acompanhar processo em ambos os polos.

Por último, temos a hipótese em que o Ministério Público propõe ação civil ex delicto como substituto processual contra a Fazenda Pública.

Também há necessidade de outro representante da instituição atuar como custus legis do patrimônio público, pelos mesmos motivos mencionados nas hipóteses anteriormente citadas.

Assim, conclui-se que a intervenção do Ministério Público nas ações civis ex delicto se dá de duas formas: em alguns casos obrigatória ou como substituto processual, quando o titular que requereu o direito a reparação for pobre.

CONCLUSÃO

Há dois tipos de ação civil reparatória de danos por ilícito penal: ação civil ex delicto em sede de processo de conhecimento e a ação civil ex delicto em sede de processo de execução.

Com base nos dados expostos, conclui-se que a ação civil ex delicto pode ser intentada em decorrência de dano ocasionado por ilícito penal, independentemente da ação penal ser ou não intentada, bem como de seu resultado.

Porém, a ação reparatória decorrente de ilícito penal, pode ser suspensa por juízo cível, para evitar decisões divergentes. O prazo máximo de suspensão é de 1 (um) ano.

É parte legítima para intentar a ação civil ex delicto a vítima ou seu representante legal, bem como seus herdeiros.

No polo passivo da ação podem figurar tanto o autor do fato criminoso, ou seu representante legal, quanto seus herdeiros.

E a participação do Ministério Público na ação ex delicto se dá de duas formas: como custus legis e substituto processual.

Por fim, concluímos ser a ação civil ex delicto um instrumento de grande importância, pois propicia a reparação do dano ocasionado por um ilícito penal não apenas no âmbito criminal, mas também no âmbito civil diretamente a vitima ou a seus herdeiros, minimizando os prejuízos decorrentes de tal ilícito.

BIBLIOGRAFIA

ASSIS, Araken de. Eficácia Civil da Sentença Penal. 2 ed. São Paulo: RT, 2000.

BREGA FILHO, Vladimir. A Reparação do Dano no Direito Penal Brasileiro - Perspectivas. São Paulo, 2004.

MOREIRA, Rômulo Andrade. Ação Civil Ex delicto, Jus Navigandi, Teresina, a. 8, n. 281, 14 abril 2004.

MELO, Flávio Henrique de. Ação Civil "Ex delicto". Goiás, Universidade Católica de Goiás, 21 de outubro de 2004.

SOUZA, Victor Roberto Correa de. Ministério Público - Questões Polêmicas. Procuradoria da República, 10 fevereiro 2004. 

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