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Tutela inibitória no Direito Ambiental

Agenda 22/05/2015 às 10:20

O estudo da tutela inibitória constitui momento oportuno para se propor uma classificação das tutelas que corresponda às diferenças entre as várias necessidades do Estado de Bem-Estar Ambiental.

1 INTRODUÇÃO

É justamente a partir da Revolução Francesa, como vimos nas lições de Rousseau sobre o ser cidadão, que os valores, até então estabelecidos, foram colocados abaixo, juntamente com as classes que os defendiam: o clero e a nobreza.

Daí era preciso um novo universo de valores que estabelecesse um novo regime, pois a Revolução havia sido devastadora. Ideologicamente falando, foi uma verdadeira ruptura epistemológica e política na forma de agir com vistas à administração do interesse público. Esse interesse público, agora, era definido pelos interesses populares, representados pela burguesia e a revolução civil.

As mudanças foram tão profundas que todo o Estado passou a ser laico. O homem, pela primeira vez, pôde se sentir como verdadeiro construtor de seu desiderato. Agora ele escrevia a história com suas próprias mãos, não se aceitavam os velhos dogmas de leis estabelecidas de forma inquestionável.

Não era um novo fato comum. Modificou-se para sempre a forma de agir politicamente, com uma nova legitimidade. A participação popular decidiria de que forma seria a civilização do futuro, em direção de uma cidadania verdadeira.

Devido às transformações que entraram na vida dos cidadãos em definitivo, mudou-se a forma de agir e pensar de cada indivíduo, que agora era um ser com autonomia e desejos que poderiam determinar a forma pela qual deve caminhar o coletivo no sentido de ampliar os horizontes de sua conduta e conhecimento.

Aprofundando a questão dentro das dimensões de direitos, o que seria consagrado como a “geração” de direitos, hoje acompanhando o pensamento de Willis Santiago Guerra Filho (2005, p. 46), “ao invés de “gerações” é melhor se falar em “dimensões de direitos fundamentais”, e nesse contexto, não se justifica apenas pelo preciosismo de que as gerações anteriores não desaparecem com o surgimento das mais novas”. O autor explica que

O importante é que os direitos “gestados” em uma geração, quando aparecem em uma ordem jurídica que já trás direitos da geração sucessiva, assumem outra dimensão, pois os direitos de geração mais recente tornam-se um pressuposto para entendê-los de forma mais adequada e, consequentemente também, para melhor realizá-los. Assim, por exemplo, o direito individual de propriedade, num contexto em que se reconhece a segunda dimensão dos direitos fundamentais, só pode ser exercido observando-se sua função social, e com o aparecimento da terceira dimensão, observando-se igualmente sua função ambiental. (GUERRA FILHO, 2005, p. 47).

Desta forma, fica claro que o termo “dimensão” de direitos parece-nos mais apropriado, tendo em vista que hoje temos indivíduos de variadas gerações que vivem em dimensões diferentes. Enquanto alguns vivem dentro de uma qualidade de vida onde são garantidos todos (ou quase) os seus direitos, outros não conseguem nem o direito a uma sobrevivência digna.

Assim, chegando ao presente, falaremos na terceira dimensão de direitos, apesar de que alguns autores, como Paulo Bonavides aceitar uma quarta dimensão de direitos.

A realidade social é por demais rica para ser abarcada completamente pelo Estado ou pelo direito estatal. A cada dia surgem novos horizontes para o ser humano, e com isso novos interesses e novos conflitos, que exigem definição e organização pelo Estado, nos limites que lhe são impostos pela noção de Estado de Direito e pela própria previsibilidade humana.

A tensão existente entre a nova realidade, formada diariamente, e as fronteiras da atuação do direito estatal constitui, hoje, possivelmente, o grande elemento da crise enfrentada pela dimensão jurídica.

E assim, na terceira dimensão de direitos, temos como valor a solidariedade, inicialmente; e, hoje, a fraternidade. O Estado é o de Bem-Estar Ambiental, os direitos são difusos. A luta é contra a exploração do homem pelo homem, e deste para com a natureza. O modelo é o desenvolvimento sustentável e teremos como consequência a “cidadania ambiental”, como define Rogério Portanova (2000).

Esse Estado de Bem-Estar Ambiental que vem se espalhando só pode se assentar quando os direitos da primeira e da segunda dimensão forem mais bem cumpridos, ou seja, conquistados por todos.

Ocorre que para salvar a espécie humana, teremos que salvar o seu habitat. Em outras palavras, a vida é um direito fundamental, e, portanto, para preservar e garantir esta vida há que se conservar o local onde essa vida se desenvolve. Finalmente, se a vida só é possível em seu habitat, então este é fundamental à vida. Assim, o meio ambiente, ou seja, o direito ao meio ambiente deve ser qualificado como um direito fundamental.

Daí o meio ambiente foi a primeira categoria de interesses metaindividuais a merecer atenção especial da sociedade e, por consequência, do legislador pátrio, ante o progresso experimentado pelos seres humanos, para ser implementado na esfera jurídica, que despendia de atitudes as mais diversas. Temos, então, a gênese do direito ambiental.

2 DESENVOLVIMENTO

O direito é visto hoje como um instrumento que, marcado principalmente pelos valores da igualdade e da solidariedade, visa a permitir o desenvolvimento da personalidade humana e a realização das relações sociais através da tutela – não mais formal, mas concreta – da dignidade e do desenvolvimento do homem na comunidade em que vive.

A partir de uma metódica constitucionalizada, dirigida pela teoria dos direitos e garantias constitucionais fundamentais, é que será possível estabelecer a delimitação conceitual adequada para partes e terceiros no direito processual civil.

No caso, a teoria dos direitos fundamentais, como guia condutora da nova postura metodológica a ser implantada, é justamente aquela decorrente dos direitos e garantias constitucionais fundamentais positivados expressa ou implicitamente na Constituição de 1988.

Esses direitos e garantias constitucionais fundamentais compõem o núcleo de uma Constituição democrática e pluralista e possuem tanto dimensão subjetiva, que se liga às pessoas individuais ou coletivas titulares dos direitos, quanto objetiva, já que formam o parâmetro básico, com eficácia irradiante e vinculatória, para a interpretação e compreensão da própria ordem jurídica.

Como principais diretrizes interpretativas relativas aos direitos e garantias constitucionais fundamentais, podemos apontar: imprescritibilidade; aplicabilidade imediata; imunidade em relação ao poder reformador do constituinte derivado; imunidade em relação ao legislador infraconstitucional; direitos pétreos; interpretação aberta e extensiva etc.

O estudo e a compreensão do Direito Processual pelo prisma constitucional são fundamentais, conforme já bem ressaltado por Nelson Nery Junior (2009, p. 25), segundo o qual o intérprete deve buscar a aplicação do direito ao caso concreto, sempre tendo como pressuposto o exame da Constituição de 1988.

A Constituição de 1988 cuidou tanto da ampliação da legitimação ativa para postular a tutela de direitos coletivos e difusos (BARROSO, 1998, p. 141), quanto criou ações cujo objeto específico ensejava a promoção de tais direitos.

Por isso mesmo, instaura-se entre o destino dos interessados tão firme união, que a satisfação de um só implica de modo necessário à satisfação de todos; e reciprocamente a lesão de um só constitui ipso facto, lesão da inteira coletividade. Um exemplo típico é o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (CF/88, art. 225).

Ocorrem casos que não são de indisponibilidade nem de “especial valia do interesse em si considerado”, mas ainda assim existe relevância social na tutela coletiva, em razão da peculiaridade do conflito de interesses.  Na hipótese de dispersão muito grande de prejudicados e de insignificância da lesão no plano individual, “haverá certamente relevância social na tutela coletiva”, como argumenta Luis Roberto Barroso (1998, p. 220).

2.1 Interesses, Tutelas e Sentenças

Surgem assim as novas relações jurídicas, frequentemente de conteúdo não patrimonial, tornando-se evidente a inefetividade das sentenças da classificação trinária. “Os direitos não-patrimoniais”, como é curial, “não podem ser efetivamente tutelados através da sentença condenatória”.

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Essa sentença, por “correlacionar-se com a execução por sub-rogação”, somente mostra-se adequada para permitir a reparação do direito violado ou o cumprimento forçado da obrigação inadimplida. A sentença condenatória não se presta a impedir alguém de praticar um ilícito, exatamente porque “não se correlaciona com a execução indireta, ou seja, com meios que possam atuar sobre a vontade do devedor para convencê-lo a adimplir” (MARINONI, 2001, p. 38).

A sentença declaratória, por outro lado, se não é ligada a qualquer meio de execução, limitando-se a declarar a respeito de uma relação jurídica, também é “evidentemente impotente para impedir a prática do ilícito” (MARINONI, 2001, p. 38).

Diante da sentença declaratória, o réu não se vê compelido a não praticar o ilícito. Sabe o demandado que a única sanção que sofrerá, diante da prática do ilícito, é a ressarcitória, o que lhe permite transformar livremente o direito do autor em tutela ressarcitória, que na maioria das vezes será prestada pelo equivalente em pecúnia.

Na lição clarividente de Luiz Guilherme Marinoni (2001, p. 39), as sentenças da classificação trinária não tutelam de forma adequada os direitos que não podem ser violados, seja porque têm conteúdo não-patrimonial, seja porque, tendo natureza patrimonial, não podem ser adequadamente tutelados pela via ressarcitória.

Pior do que isso, a classificação trinária, por sua inefetividade, permite a qualquer um expropriar direitos não-patrimoniais, como o direito à higidez do meio ambiente, transformando o direito em pecúnia.

 Na verdade, e por incrível que possa parecer, um sistema que trabalha exclusivamente com as três sentenças clássicas está dizendo que todos têm direito a lesar direitos desde que se disponham a pagar por eles, conforme preleciona Marinoni (2001, p.39).

A lição de Marinoni (2001, P.39) é contundente, afirmando que a “questão da inefetividade da sentença condenatória para a tutela das novas situações jurídicas também foi sentida no direito italiano, levando a doutrina a falar em crise da sentença condenatória”.

2.2 Tutela Jurisdicional Adequada: Preventiva  

Propiciar a prevenção de danos, impedindo que os mesmos ocorram, ou antecipar a concessão do mérito, minimizando os efeitos da lesão já consumada, é essencial para trazer o resultado prático tão esperado do processo, mormente no campo dos direitos fundamentais.

O meio ambiente talvez mais do que outros direitos fundamentais, trabalha com a necessidade de atuação preventiva, pois a agressão consumada é de difícil ou impossível reparação, não sendo por outro motivo que a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro, em 1992, adotou, em sua Declaração de Princípios (1992, p. 5), o princípio da precaução que merece observação de todos, em especial do Poder Judiciário, Princípio 15: “para proteger o meio ambiente, medidas de precaução devem ser largamente aplicadas pelos Estados, segundo suas capacidades”.

 Em caso de risco de danos graves ou irreversíveis, a ausência de certeza cientifica absoluta não deve servir de pretexto para procrastinar a adoção de medidas visando a prevenir a degradação do meio ambiente. 

Importante registrar que a edição da EC 45/2004, que tratou da chamada “Reforma do Judiciário”, teve como objetivo a eficiência e celeridade das decisões judiciais.

Dentro desse espírito, a ação coletiva se insere e deve ser prestigiada, porquanto sua utilização ensejará rapidez e eficiência de resposta aos conflitos, evitando a proliferação de inúmeras demandas individuais, ou, o que é pior, ausência de ações em razão do povo não ter acesso ao Judiciário por ignorância, impossibilidade ou desestímulo.

O princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, previsto no art. 5º, XXXV, da CF/88, merece plena aplicação, sobretudo na busca e realização dos direitos fundamentais, e não mera positivação retórica e formal.  Conforme dispõe o artigo, nenhuma lesão ou ameaça a direito pode ser subtraída da apreciação do Judiciário.

Refere-se ao exercício do direito de ação, isto é, o direito que tem toda e qualquer pessoa de acionar o Poder Judiciário para pedir o afastamento de uma ameaça (evitar a lesão a determinado bem da vida, tutelado pela ordem jurídica), a aplicação do direito ao caso concreto (processo do conhecimento), ou a realização dele na prática (processo de execução).

Do ponto de vista processual, cabe consignar que a locução “tutela coletiva” refere-se à defesa dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos. Certa confusão é causada quando se utiliza a expressão “direitos coletivos” como gênero das espécies difuso, coletivo e individual homogêneo.

O direito ao meio ambiente sadio bate de frente, por vezes, com o direito à habitação; basta ver a utilização urbana das zonas protegidas de nossos mananciais hídricos. O interesse urbanístico geral que exige uma obra viária colide com o interesse de moradores de bairros que sofrerão impactos ambientais com o maior fluxo de veículos nas vias públicas destes bairros.

É necessário que haja uma tomada de consciência de que o processo deve servir plenamente àqueles que, dentro do círculo social, podem envolver-se em conflitos – sejam empresários ou trabalhadores, ricos ou pobres, todos da comunidade -, o que faz com que o direito processual assuma uma postura mais humana, ou mais preocupada com os problemas sociais, econômicos e psicológicos que gravitam ao redor de suas conceituações e construções técnicas. Faz-se indispensável que o sistema esteja preparado para produzir instrumentos capazes de propiciar a tutela mais ampla possível aos direitos reconhecidos.

A rapidez com que ocorre a transformação da sociedade e o surgimento de novas relações jurídicas exige que a técnica passe a ser manipulada de modo a permitir a adaptação do processo às novas realidades e à tutela das várias situações de direito substancial.

Mesmo com as mudanças que vêm ocorrendo com maior rapidez nos últimos tempos, os avanços em termos de tutela coletiva tratam-se da tutela preventiva, a única capaz de impedir que os direitos não patrimoniais sejam transformados em pecúnia, através de uma inconcebível expropriação de direitos fundamentais à vida humana.

A importância da tutela preventiva pode ser percebida, em todas as sociedades modernas, a partir da necessidade de se conferir tutela jurisdicional adequada às novas situações jurídicas, frequentemente de conteúdo não patrimonial ou prevalentemente não patrimonial, em que se concretizam os direitos fundamentais do cidadão. É preciso remodelar alguns conceitos fundamentais da teoria do processo.

O surgimento de novos conceitos é uma necessidade que advém da alteração dos valores e, portanto, da sensibilidade do doutrinador, assim, a remodelação dos conceitos, em outras palavras, também é fruto da mudança dos valores que inspiram as criações teóricas.

Se a tutela declaratória não é hábil para permitir a prevenção, e se a tutela condenatória tem um nítido escopo repressivo, não há possibilidade de se encontrar, dentro da classificação trinária das sentenças, uma via adequada para a tutela dos direitos não patrimoniais, o que revela uma total incapacidade do processo civil clássico para lidar com as relações mais importantes da sociedade contemporânea. Tutela jurisdicional é um procedimento estruturado para tutelar adequadamente o direito material.

A tutela de prevenção do ilícito requer um procedimento estruturado com tutela antecipada, pois o direito a que se visa proteger através da tutela preventiva tem, em regra, grande probabilidade de ser lesado no curso do processo.

A necessidade de tutela preventiva exige a estruturação de um procedimento autônomo, dotado de tutela antecipatória e que desemboque em uma sentença que possa impor um fazer ou um não fazer sob pena de multa, preconiza Marinoni (2003, p. 22)

Ao nos depararmos com uma tutela jurisdicional preventiva atípica, os cidadãos devem ter a sua disposição instrumentos processuais adequados para a tutela dos seus direitos, faz se necessário que seja construída uma tutela jurisdicional idônea à prevenção do ilícito. Tal tutela, nos dizeres de Luiz Guilherme Marinoni (2003, p. 25), pode ser denominada de inibitória.

2.3 Tutela Jurisdicional Adequada:  Inibitória

A tutela inibitória no direito brasileiro deve ter por meta construir os seus próprios elementos.  A tutela inibitória, configurando-se como tutela preventiva, visa a prevenir o ilícito, culminando por apresentar-se, assim, como uma tutela anterior à sua prática, e não como uma tutela voltada para o passado, como a tradicional tutela ressarcitória.

Tem por fim impedir a prática, a continuação ou a repetição do ilícito, e não uma tutela dirigida à reparação do dano. Portanto, o problema da tutela inibitória é a prevenção da prática, da continuação ou da repetição do ilícito.

A tutela inibitória é específica, como explica Marinoni (2003, p. 28), pois objetiva conservar a integridade do direito em si, assumindo importância não apenas porque alguns direitos não podem ser reparados e outros não podem ser adequadamente tutelados através da técnica ressarcitória, mas também porque é o melhor prevenir do que ressarcir, o que equivale a dizer que no confronto entre a tutela preventiva e a tutela ressarcitória deve-se dar preferência à primeira.  A tutela inibitória é caracterizada por ser voltada para o futuro, independentemente de estar sendo dirigida a impedir a prática, a continuação ou a repetição do ilícito.

Devemos observar que a inibitória não perde sua natureza preventiva, pois não tem por fim reintegrar ou reparar o direito violado, mesmo nos casos de apenas fazer cessar o ilícito ou impedir sua repetição.

O sistema de tutela dos direitos deve deixar de ser pensado em torno da ação una e abstrata e passar a ser compreendido em termos de tutela. A expressão tutela nada tem a ver com o fato de o resultado perseguido pelo autor ser obtido através de uma tutela que não é de cognição exauriente, mas de cognição sumária.

A tutela inibitória é requerida via ação inibitória, que constitui ação de cognição exauriente. Nada impede, contudo, que a tutela inibitória seja concedida antecipadamente, no curso da ação inibitória, como tutela antecipatória na lição de Marinoni (2003, p. 29)

De acordo com a doutrina majoritária, a tutela inibitória funciona basicamente através de uma decisão ou sentença que impõe um não fazer ou um fazer, conforme a conduta ilícita temida seja de natureza comissiva ou omissiva.  A tutela inibitória é uma tutela atípica, mandamental.

O fundamento maior da inibitória ou a base de uma tutela preventiva geral encontra-se na própria Constituição Federal, precisamente no art. 5º, XXXV, que estabelece que a “lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

Hoje existe a necessidade de uma tutela antecedente ao dano, de conteúdo nitidamente preventivo, o que levou os estudiosos a tentarem explicar o fundamento e a finalidade desse tipo de tutela.

Em uma doutrina elaborada há bastante tempo, afirmou-se que muito embora não verificado o evento ou mesmo praticada a ação, entendeu-se que a prática da ação, dos atos preparatórios ou simples anúncio da ação como conteúdo de um propósito não poderiam deixar de ter significado.

Outra parte da doutrina, porém, tentou distanciar conceitualmente os ilícitos, antes e depois do dano. Para se evidenciar que o dano não é elemento constitutivo do ilícito. O dano é a prova da violação.

O que se depreende da doutrina é que a tutela inibitória não deve ser compreendida como uma tutela contra a probabilidade do dano, mas sim como uma tutela contra o perigo da prática, da continuação ou da repetição do ilícito. O dano não é uma consequência necessária do ato ilícito. O dano é requisito indispensável para o surgimento da obrigação de ressarcir, mas não para a constituição do ilícito.

O maior doutrinador dessa área, Marinoni (2003, p. 37), acentua que o dano não pode estar entre os pressupostos da inibitória. A tutela inibitória tem por fim prevenir o ilícito. A tutela preventiva objetiva impedir a prática. Na “linha da melhor doutrina italiana, é que para a obtenção da tutela inibitória não é necessária a demonstração de um dano futuro”.

A ideia de que a tutela inibitória encontra obstáculo na liberdade do homem guarda raízes em princípios próprios do direito liberal, os quais não podem servir para inspirar uma doutrina sob diversos valores e em uma época diferente. A tutela preventiva, como já foi dito, é fundamental para a efetividade de direitos muito importantes dentro do contexto do Estado atual.

Assim, temos que o problema está na dificuldade de se provar que um ilícito poderá ser praticado. A ação inibitória permite – em razão das virtudes do novo art. 461 – a obtenção de tutela inibitória antecipada em seu seio, não necessita, por motivos bastante óbvios, de uma ação principal (MARINONI, 2003, p. 49).

Existe um direito à tutela jurisdicional adequada, porque o Estado, ao proibir a autotutela privada, assumiu o gravíssimo compromisso de tutelar de forma efetiva as diversas situações de direito material. Basta apenas uma ação processual para que o direito à prevenção seja atendido.

Não temos a menor dúvida em afirmar que o princípio geral de prevenção é imanente a qualquer ordenamento jurídico que se empenhe em garantir – e não apenas em proclamar - os direitos. Portanto, “não admitir a tutela preventiva, quando em jogo direitos não patrimoniais, é admitir a expropriação desses direitos”, transformando-se o “direito ao bem em direito ao ressarcimento ou, em outras palavras, em simples pecúnia” (MARINONI, 2003, p. 63).

Tal possibilidade, como é óbvio, está muito distante das Constituições que consagram os denominados “novos direitos” e estão preocupadas em garantir ao homem, “direitos imprescindíveis à própria dignidade e a sua inserção em uma sociedade mais justa” (MARINONI, 2003, p. 63).

A Constituição de 1988, que funda um Estado Social, é marcada por direitos sociais, como o direito à saúde, o direito à educação etc. direitos que, podendo ser tutelados de forma difusa e ou coletiva, podem exibir a tutela inibitória. Supõe-se, como é evidente, que tais direitos devam ser efetivamente tutelados, até mesmo porque a falta de efetividade da tutela jurisdicional implica a existência de um ordenamento jurídico incompleto. Sem um direito processual capaz de garantir uma tutela jurisdicional efetiva e adequada não há um ordenamento que possa ser qualificado como jurídico.

A tutela inibitória coletiva pura tem sido utilizada com certa frequência, sendo significativo o seu uso nas ações que, visando à proteção do meio ambiente, impedem que uma fábrica que ameaça agredir ao meio ambiente inicie suas atividades.

Para a demonstração da importância da tutela inibitória coletiva, torna-se adequada a análise da tutela do meio ambiente uma vez que este é um dos lugares em que a inefetividade da tutela ressarcitória evidencia-se de modo mais claro.

Se for verdade que cresce em importância, nos últimos tempos, “a reparação específica do dano ecológico, e que é necessária a responsabilização”, ainda que pelo equivalente, daquele que agride o meio ambiente, o certo é que “não se pode admitir, no campo do direito ambiental, a troca da tutela específica e preventiva do bem tutelado pela tutela ressarcitória”, sob pena de admitir-se implicitamente uma lógica perversa, que justificaria o cínico “poluo, mas pago” (MARINONI, 2003, p. 79).

Como é evidente, a admissão da tutela ressarcitória no campo do direito ambiental não significa a aceitação da poluição, mas objetiva evitar que o dano ecológico fique sem a devida reparação. Para que não ocorra a degradação do meio ambiente é imprescindível a atuação preventiva e, assim, também a tutela inibitória coletiva.

Há, no direito brasileiro, responsabilidade objetiva sob a modalidade do risco integral em caso de dano ao meio ambiente. Para efeito de responsabilidade no plano ambiental, o que interessa é o dano, pouco importando se o poluidor imagina que foi legitimado a produzi-lo pela autoridade administrativa.

Entretanto, se no plano do direito ambiental deseja-se a prevenção, e não a reparação, não é de “grande valia teorizar-se a respeito da responsabilidade do poluidor, sendo muito mais relevante pensar-se na tutela inibitória do ato lesivo ao meio ambiente” (MARINONI, 2003, p. 85).

A grande vantagem é que a tutela inibitória pode tutelar direitos absolutos e relativos. Na tentativa de ampliar o conceito de condenação, cria-se uma condenação-não-título-executivo. A superação de classificação clássica e a evolução da ciência processual resultam na retomada de um novo conceito de tutela dos direitos.

É didática a seguinte nota de Barbosa Moreira (1980, p. 3):

Toma-se consciência cada vez mais clara da função instrumental do processo e da necessidade de fazê-lo desempenhar de maneira efetiva o papel que lhe toca. Pois a melancólica verdade é que o extraordinário progresso científico de tantas décadas não pode impedir que se fosse dramaticamente avolumado, a ponto de atingir níveis alarmantes, a insatisfação, por assim dizer, universal, com o rendimento do mecanismo da justiça civil.

O processo passa a ser concebido como instrumento que deve dar respostas adequadas às diferentes situações de direito substancial carentes de tutela. A doutrina começa a tratar das “tutelas jurisdicionais diferenciadas”, demonstrando que o procedimento ordinário não é capaz de atender de maneira adequada aos vários casos conflitivos concretos.

O processualista, agora raciocinando a partir das necessidades do direito substancial, alerta para a inefetividade de determinadas formas de tutela que não seriam capazes de realizar concretamente os direitos e, até mesmo, a partir do argumento de que há um direito constitucional à adequada tutela jurisdicional, aponta para a falta de legitimidade dessas tutelas.

A doutrina fala atualmente em tutela jurisdicional dos direitos, estando plenamente consciente de que a tutela jurisdicional apenas será adequada se puder realizar efetivamente o direito material. Na verdade, o tema da tutela jurisdicional é decorrência natural da doutrina da efetividade do processo e de sua preocupação com a efetiva tutela dos direitos.

A ação não se confunde com o direito material - e está consciente de que tem fortes compromissos com o direito material, ao qual deve servir de forma efetiva para não ser transformado em algo distante da realidade da vida das pessoas.

Na linha de raciocínio de Marinoni (2003, p. 401), a ação cominatória ou a ação cautelar inominada não tutela de maneira adequada os direitos que estão a exigir tutela preventiva tutela inibitória é garantida constitucionalmente (art. 5.º, xxxv, CF) fundamento nos art. 461 do CPC e 84 do CDC, suficientes para permitir a prestação da tutela inibitória nas formas individual coletiva.

Consagra uma tutela inibitória atípica que é capaz de atender direitos que necessitam de tutela na forma coletiva e o direito à higidez do meio ambiente.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A tutela inibitória, por não poder se desligar da tutela antecipatória e do uso da multa como medida de coerção apresenta-se como tutela alternativa às tutelas tradicionais, em face das novas necessidades de tutela, ou seja, em vista da não-patrimonialidade da grande maioria dos denominados “novos direitos” e das novas características da economia contemporânea.

Uma forma de tutela que não apenas condenasse, mas que pudesse incidir sobre a vontade do réu, de modo a garantir a efetiva tutela dos direitos. A tutela que se liga às medidas coercitivas, que aparece como resposta às novas exigências de tutela, passa a demandar nova classificação das tutelas, ou no mínimo, uma reconceituação de condenação.

Desta forma, a sentença mandamental é compreendida como aquela que ordena e, ao mesmo tempo, usa a força da coerção. A preocupação está em encontrar um lugar adequado à tutela inibitória.

Reconstruir uma classificação que “divide as tutelas em declaratórias, constitutiva, condenatória, mandamental e executiva”. É essa “nova classificação” que permite ser eliminado o equivoco consistente na confusão da tutela preventiva com a condenação para o futuro (MARINONI, 2003, p. 431).

Marinoni (2003) formula um esboço de uma classificação das tutelas que pudesse expressar os resultados do processo no plano do direito material a partir da ideia de que as tutelas devem realizar as várias ações de direito material. O raciocínio em torno da tutela inibitória se deve exatamente porque deriva da exigência de se dar tutela efetiva ao direito material. 

O estudo da tutela inibitória constitui momento oportuno para se refundar a temática da “tutela jurisdicional dos direitos”, ou precisamente para se propor uma classificação das tutelas que corresponda às diferenças entre as várias necessidades do direito material.

A compreensão da tutela jurisdicional a partir de sua efetiva interligação com o direito material permite que as “tutelas de cognição sumária sejam classificadas com base em critérios que rompem com a visão formalista, fundada em uma concepção ‘panprocessualista’”, que levou a doutrina a definir a tutela cautelar tomando em consideração a sua “provisoriedade” (MARINONI, 2003).

Como as tutelas sumárias também devem ser classificadas de acordo com o papel que efetivamente desempenham no plano do direito material, não tivemos dúvida ao sustentar – divergindo do restante da doutrina – a existência de uma tutela inibitória antecipada, que não se confunde com a tutela cautelar.

 É possível a existência, no direito brasileiro, da atipicidade de uma tutela fundamental para a efetividade dos direitos. Uma forma de ver o direito processual preocupada com a construção de um processo aderente ao direito material e à realidade social.

REFERÊNCIAS

BARROSO, Luis Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. 2. ed. São Paulo:

Saraiva, 1998.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Casa Civil, 1988.

DECLARAÇÃO DE PRINCÍPIOS. Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Rio de Janeiro, 1992, 7 p.

GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo Constitucional e Direitos Fundamentais. 4. ed. São Paulo: RCS, 2005.

MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela Inibitória: individual e coletiva. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.

______. Tutela específica. 2. ed. Revista. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.

MOREIRA. José Carlos Barbosa. Tutela antecipatória e tutela preventiva. Temas de direito processual. Segunda Série. São Paulo: Saraiva, 1980.

NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. 9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.

PORTANOVA, Rogério. Qual o papel do estado no século XXI?: rumo ao estado do bem estar ambiental. In: LEITE, José Rubens Morato (Org.). Inovações em direito ambiental. Florianópolis: Fundação José Arthur Boiteux, 2000.

Sobre o autor
Adauto José de Oliveira

Mestre em Direito Constitucional pela Unitoledo – Araçatuba-SP (2010). Advogado<br>(Unicastelo de Fernandópolis – 2005). Pedagogo (UNG – Univ. de Guarulhos – 1995).<br>Biólogo (Unib – Universidade Ibirapuera – 1989). Pós-graduação em Ensino de Biologia<br>(Unijales – 1999). Advogado em Jales-SP. Professor Universitário das Faculdades Aldete<br>Maria Alves (Fama) em Iturama-MG e Unicastelo - Fernandópolis-SP. Assessor Pref. Mun. Dirce Reis de 2013 e 2014.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Autor do Livro: Ação popular ambiental. Belo Horizonte: Arraes Editores, 2011.

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