O objetivo do presente artigo é discutir a possibilidade da aplicação das regras do reembolso em hipóteses diversas das previstas na Lei 6.404/76.
A Lei das Sociedades Anônimas prevê no art. 109 os direitos essenciais dos acionistas, e elenca entre eles, o direito de retirada. Entende-se por direito de retirada ou direito de recesso, a possibilidade do acionista se retirar da sociedade quando discordar de deliberação de assembleia geral. O exercício do direito de retirada ou de recesso, é cabível nas hipóteses expressas na lei, tais como artigos 137, 221, 223, 236, 252 e 256 da Lei nº 6.404/76. A rigorosa restrição legal evita a o exercício do direito de retirada em massa, capaz de ensejar a dissolução da sociedade ou prejudicar a preservação da empresa, posto que é a sociedade que tem que arcar com o ônus do pagamento do valor na apuração de haveres. O acionista dissidente tem o direito de receber o valor do reembolso, ou seja, valor a ser pago pela sociedade na apuração de haveres, conforme dispõe o art. 45 da lei.
O STJ já admite a dissolução parcial de cia fechada, pelo exercício do direito de retirada de acionista, comprovada a quebra da affectio societatis, admitindo o pagamento do reembolso com base no art. 45 da LSA:
“SOCIEDADE ANÔNIMA. CAPITAL FECHADO. DISSOLUÇÃO PARCIAL. POSSIBILIDADE.
Trata-se, na origem, de ação para dissolver parcialmente sociedade anônima com a apuração de haveres ou a exclusão dos acionistas ora recorridos. Na espécie, a sociedade anônima apresenta estrutura de sociedade familiar, na qual as ações permanecem em poder dos membros de uma mesma família, não sendo, portanto, negociadas no mercado de capitais. O instituto da dissolução parcial é, a princípio, voltado às sociedades contratuais e personalíssimas, contudo deve-se observar que atualmente, a complexa realidade das relações negociais potencializa a extensão daquele instituto às sociedades “circunstancialmente” anônimas. A jurisprudência deste Superior Tribunal é que, para a exclusão judicial do sócio, não basta a alegação de quebra da affectio societatis, mas a demonstração de justa causa, ou seja, dos motivos que ocasionaram essa quebra. No caso, a sentença, ao apreciar o conjunto fático-probatório, consignou uma série de fatos a configurar a justa causa: o recorrente reeleito pela assembleia geral para o cargo de diretor não pode exercê-lo nem sequer conferir livros e documentos sociais em razão de óbice imposto pelos recorridos, a não distribuição de dividendos aos recorrentes e os recorridos exercerem a diretoria de forma ilegítima, são os únicos a perceber rendimentos mensais. Daí, ante a caracterização do justo motivo, deve-se concluir pela exclusão dos recorridos da sociedade anônima com estrutura de sociedade familiar. Precedentes citados: EREsp 111.294-PR, DJ 10/9/2007, e REsp 1.129.222-PR, DJe 1º/8/2011. REsp 917.531-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 17/11/2011.”
Outra hipótese diz respeito ao falecimento de acionista. É certo que o herdeiro pode ingressar na sociedade na condição de acionista, ou postular o pagamento de seus haveres. A Lei nº 6.404/76 é omissa quanto ao critério que deve ser utilizado no cálculo do pagamento. Também já há decisão do STJ nesse sentido :
“Agravo de instrumento. Art. 993, parágrafo único, II, do Código de Processo Civil. Inventário. Perícia.
1. Nos termos do art. 993, parágrafo único, II, do Código de
Processo Civil, preenchido o pressuposto, ou seja, ser o autor da herança sócio de sociedade que não anônima, correta a decisão que determinou a apuração de haveres.
2. Recursos especiais conhecidos e providos”.
Em resumo: a interpretação literal da Lei nº 6.404/76 nas hipóteses que autorizam o direito de retirada, violaria de forma clara direitos dos acionistas, bem como o princípio da liberdade de associação.