Resumo
O presente artigo aborda os aspectos relevantes dos direitos coletivos lato sensu (direitos difusos, coletivos stricto sensu e individuais homogêneos), discorrendo sua evolução histórica e conceitos, a legislação brasileira aplicável ao tema e os instrumentos administrativos e judiciais utilizados para sua tutela, dando ênfase à legitimação conferida pela Constituição Federal de 1988, em seu art. 129, III, ao Ministério Público como um dos titulares da defesa desses direitos, destacando a importância do inquérito civil e do compromisso de ajustamento de conduta como instrumentos extrajudiciais utilizados para tal, seguida de sua atuação em juízo por meio da ação civil pública, e como custos legis nas demais ações coletivas, utilizando-se como embasamento a pesquisa bibliográfica em doutrinas, legislações e entendimentos dos tribunais superiores sobre o assunto.
Palavras-Chave: Direitos Transindividuais. Ministério Público. Tutela Processual Coletiva.
Abstract
This article discusses the relevant aspects of the broad sense collective rights (diffuse rights, collective strict sense and homogeneous individual) discussed its historical evolution and concepts, Brazilian law applicable to the subject and the administrative and legal instruments for their protection, emphasizing legitimacy conferred by the Constitution of 1988 in its art. 129, III, the public prosecution as one of the holders of the defense of these rights, highlighting the importance of the civil investigation and the undertaking of conduct adjustment as extra-judicial instruments used for that, then his judgment in action through civil action, and as legis costs in other collective actions, using as basis the literature in doctrines, laws and understandings of the higher courts on the subject.
Keywords: Rights trans. Prosecutors. Collective protection Procedure.
Sumário
Introdução. 1. Direitos e Interesses Difusos e Coletivos. 2. Legislação Brasileira Acerca dos Direitos Coletivos. 3. Atuação do Ministério Público na Defesa dos Direitos Coletivos. 3.1 Legitimação. 3.2 Atuação Extrajudicial. 3.3 Atuação Judicial. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
O ser humano tem como pressuposto de existência a titularidade de Direitos Fundamentais sem os quais seria impossível viver com o mínimo de dignidade. Esses direitos foram sendo conquistados aos poucos, e são classificados pela doutrina majoritária em três gerações ou dimensões[1] que representam a evolução do Estado na garantia dos direitos fundamentais, seja de forma não intervencionista (direitos de primeira geração, ou de liberdade), prestacional (direitos de segunda geração, ou de igualdade), ou impondo uma obrigação de fazer ou não fazer ao Estado e a sociedade (direitos de terceira geração, ou de fraternidade e/ou solidariedade).
Os direitos difusos e coletivos integram a terceira geração dos direitos e garantias fundamentais, são direitos marcados pela pluralidade de titulares, indetermináveis ou não, e exigem participação ativa do Estado e da sociedade para que sejam garantidos, além disso, têm como fundamentos a solidariedade e a fraternidade.
Apesar da recente ascensão desses direitos sua origem principal decorre do ideal de fraternidade da Revolução Francesa de 1789, e mais tarde, como reação a Segunda Guerra Mundial. No Brasil, foram positivados pela primeira vez em 1934 com o advento dos Códigos Florestal e de Águas[2], e em nível constitucional, no artigo 113, inciso 38[3] da Constituição do mesmo ano, mas as devidas proteções a esses direitos só foram dadas a partir da década de 1980 com a proteção ambiental por meio da Política Nacional do Meio Ambiente - PNMA (Lei nº 6.938/1981), da Lei de Ação Civil Pública - LACP (Lei nº 7.347/1985), no entanto foi com a Constituição Federal de 1988 (CF/88) que houve sua consagração e ampliação, da qual decorreu o Código de Defesa do Consumidor – CDC (Lei nº 8.078/1990) e outras importantes leis nesse sentido.
Ante a positivação dos direitos difusos e coletivos se faz necessária à disponibilização de meios que garantam a sua efetividade, e assim, a norma constitucional e algumas legislações infraconstitucionais reforçam a legitimação do Ministério Público e outras instituições para pleitearem tais direitos em nome da coletividade, e criam instrumentos capazes de garantir a defesa desses direitos. Como um dos principais atuantes na defesa dos interesses transindividuais, foram conferidos ao Ministério Público instrumentos extrajudiciais (inquérito civil e compromisso de ajustamento de conduta), e judiciais (ação civil pública) para alcançar resultados satisfatórios na proteção da sociedade, meio ambiente, do patrimônio público e outros, o que será abordado neste artigo.
1. DIREITOS E INTERESSES DIFUSOS E COLETIVOS
Também conhecidos como direitos metaindividuais, supraindividuais, ou transindividuais, possuem como titulares a coletividade indeterminável, ou determinado grupo ou categoria. Sua natureza jurídica é mista, sendo direito público e/ou privado, explica Gajardoni[4] que “direitos e interesses supraindividuais não são necessariamente afetos à administração pública, mas, como um todo, têm inegável conotação público-social”.
A definição legal, e individualizada, do que vem a ser direito difuso e direito coletivo, bem como de direitos individuais homogêneos, que por sua natureza podem ser objetos de defesa coletiva, encontra-se positivada no art. 81, I, II e III do CDC, com a seguinte redação:
“Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base.
III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.” (destaque nosso)
No que concerne à definição jurídica dada pelos Tribunais Superiores pode-se destacar o conceito de Celso de Melo[5] prolatado durante voto em julgamento de Mandado Segurança no Supremo Tribunal Federal (STF).
"os direitos de terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados enquanto valores fundamentais indisponíveis, pela nota de uma essencial inexauribilidade”.
No contexto histórico, os direitos difusos e coletivos, tidos pela doutrina como direitos de terceira geração surgem no século XX, decorrente de uma reação natural à Segunda Guerra Mundial, em complemento aos direitos de primeira e segunda geração e emanam da vida em sociedade e como forma de proteção do seu patrimônio público, natural, artístico, cultural, artificial etc. inspirados em propósitos coletivos de fraternidade e vida comum, com espoco no pilar de fraternidade ou solidariedade da Revolução Francesa de 1789.
Nesse sentido, explica Carlos Ayres Brito[6], que:
“Efetivamente, se consideramos a evolução histórica do Constitucionalismo, podemos facilmente ajuizar que ele foi liberal, inicialmente, e depois social. Chegando nos dias presentes à etapa fraternal esta fase em que as constituições incorporam às franquias liberais e sociais de cada povo soberano a dimensão da Fraternidade; isto é, a dimensão das ações estatais afirmativas, que são atividades assecuratórias da abertura de oportunidades para os segmentos sociais historicamente desfavorecidos, como, por exemplo, os negros, os deficientes físicos e as mulheres (para além, portanto, da mera proibição de preconceitos). De par com isso, o constitucionalismo fraternal alcança a dimensão da luta pela afirmação do valor do Desenvolvimento, do Meio Ambiente ecologicamente equilibrado, da Democracia e até de certos aspectos do urbanismo como direitos fundamentais. Tudo na perspectiva de se fazer a interação de uma verdadeira comunidade; isto é, uma comunhão de pela consciência de que, estando todos em um mesmo barco, não têm como escapar da mesma sorte ou destino histórico”.
No Brasil, esses direitos surgem com o Código de Águas, o Código de Minas, e a Constituição Federal, todos de 1934, e a partir da década de 1980 tem sua ascensão com a Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, a Lei de Ação Civil Pública e são consagrados em 1988 em nível constitucional, com a presença em vários dispositivos da CF/88.
2. LEGISLAÇÃO BRASILEIRA ACERCA DOS DIREITOS COLETIVOS
O Brasil, conhecido pelo grande número de Leis, é também importante propulsor da defesa dos interesses transindividuais, seja como sede de grandes conferências mundiais sobre o tema, ou pela vasta legislação que protege esses direitos, conforme abordadas a seguir.
Consagrado em capítulo próprio no artigo 225 da Constituição Federal de 1988 com a seguinte redação:
“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”
O Meio Ambiente, no ordenamento jurídico brasileiro, tem o Regimento do Pau-Brasil de 1605 como a primeira norma sobre o tema, mas só em 1934 com a sanção do Código Florestal e do Código de Águas têm-se os primeiros alicerces do que viria constituir, décadas depois, a atual legislação ambiental brasileira. A devida preocupação com o meio ambiente tem seu ápice a partir da Lei nº 6.938/1981 (PNMA), das Conferências Mundiais sobre o Meio Ambiente (Rio-92 e Rio+20), além da Lei de Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/1985), da Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998), do Estatuto das Cidades (Lei nº 10.257/2001) e do Novo Código Florestal (Lei nº 12.651/2012), entre outras, bem como os decretos e resoluções do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA).
A Defesa do Consumidor tem como base a Constituição Federal de 1988 (arts. 5º, XXXII e 170, V), e por instrução do art. 48 do ADCT (Ato das Disposições Constitucionais Transitórias), foi regulamentada pela Lei nº 8.078/1990 (CDC) que trouxe além do direito material aplicado as relações de consumo, a conceituação legal de direitos difusos e coletivos (art. 81), e a matéria processual em título próprio “Da Defesa do Consumidor em Juízo” (arts. 81 a 104), onde disciplinou a ação civil coletiva.
O patrimônio público e a moralidade administrativa foram protegidos pelo legislador, entre outras, na Lei nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa) que possui como instrumento processual a ação civil de improbidade administrativa, para os casos de atos de improbidade administrativa que importem em enriquecimento ilícito, causem prejuízo ao erário, ou atentem contra os princípios da Administração Pública.
Além disso, diversas leis contêm normas de proteção a interesses transindividuais, como aqueles “ligados à pessoa portadora de deficiência, aos investidores no mercado de valores mobiliários, à criança e o adolescente, à defesa da ordem econômica e da livre concorrência”[7], também conhecidos por direitos individuais homogêneos.
Em matéria processual, a Lei de Ação Popular (Lei nº 4.717/1965) e a Lei de Ação Civil Pública têm sido os principais instrumentos para a efetividade dos direitos que tem como titulares a coletividade. Há ainda, a ação civil coletiva[8] para a defesa dos direitos individuais homogêneos disciplinada no CDC, que quando proposta pelo Ministério Público, possui a mesma natureza da Ação Civil Pública.
3. ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA DEFESA DOS DIREITOS COLETIVOS
3.1 Legitimação
A legitimação de titulares para representação da coletividade, especialmente a do Ministério Público visa a maior efetividade à atividade judicial no trato de demandas individuais repetitivas, além disso, decorre da necessidade de ampliação do acesso à justiça, da redução dos custos da demanda e da celeridade processual, bem como da tendência natural de inércia social quando se trata de direitos que todos são titulares, pois ao permitir que todos ajam, ninguém acaba agindo, seja por insignificância do dano quando individualmente considerado, tendo-se apenas uma dimensão maior do dano quando considerado globalmente, seja por achar que o outro irá defender o direito em nome de todos, fenômeno que Gajardoni[9] denominou de “efeito carona da atuação alheia” ou “free riding”.
Na defesa de muitos desses direitos há uma legitimação concorrente do Ministério Público com cidadãos, Defensorias Públicas, Sindicatos, Associações, entre outros. No que concerne ao Ministério Público, a CF/88 ao consagrá-lo em seu art. 127 “instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbiu-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”, legitimou-o, em seu art. 129, para entre outras funções, promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.
Para Mazzilli[10], “inexiste taxatividade na defesa judicial de interesses transindividuais. Por isso, além das hipóteses expressamente previstas em diversas leis, qualquer outro interesse difuso, coletivo ou individual homogêneo pode em tese ser defendido em juízo, tanto pelo Ministério Público como pelos demais legitimados do art. 5º da LACP e art. 82 do CDC”.
Em recente e importante decisão[11], o STF ao reconhecer a legitimidade do Ministério Público para a defesa dos direitos e interesses de beneficiários do seguro DPVAT, nos casos de indenização paga pela seguradora em valor inferior ao determinado em lei, pacificou os entendimentos de que “na defesa dos direitos difusos e coletivos, a ação civil pública seria o protótipo de sua tutela, e o Ministério Público possui legitimidade ativa, invariavelmente em regime de substituição processual, devendo ser entendida em sentido amplo e irrestrito”, já quanto à defesa dos direitos individuais homogêneos, reputou-se que “sua coletivização teria sentido meramente instrumental, e sua tutela teria como instrumento básico a ação civil coletiva do CDC, bem como, o Ministério Público como o primeiro dos legitimados ativos, teria sua atuação em regime de substituição processual justificada pelo relevante interesse social configurada nos casos em que a lesão a esses direitos comprometeria também interesses sociais subjacentes, com assento no art. 127 da CF/88”, e definiu interesse social como “interesses cuja tutela, no âmbito de determinado ordenamento jurídico, seria julgada como oportuna para o progresso material e moral da sociedade a cujo ordenamento jurídico corresponderia”.
A legitimação do Ministério Público para a defesa de qualquer interesse coletivo, latu sensu, já foi reconhecida pelo STF em seus julgados, como exemplo, a decisão[12] do Supremo sobre a questão do aumento indevido das mensalidades escolares.
Há, ainda, casos em que o Ministério Público ajuíza Ação Civil Pública contra a coletividade determinada, visando o cumprimento de determinada obrigação, a exemplo, para impedir continuidade de greve nos serviços públicos essenciais, são as chamadas ações coletivas passivas.
3.2 Atuação Extrajudicial
A atuação extrajudicial do Ministério Público dá-se, principalmente, com o compromisso de ajustamento de conduta e o inquérito civil.
O compromisso de ajustamento de conduta previsto, pela primeira vez, na Lei nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente) em seu art. 211, foi inserido no § 6º do art. 5º da Lei nº 7.347/1985 (LACP) pela Lei nº 8.078/1990 (CDC), atribuindo-lhe a eficácia de título executivo extrajudicial, e no âmbito do Ministério Público teve sua regulamentação pela Resolução nº 23/2007 do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) em seu art. 14, já no âmbito do Ministério Público do Estado de Sergipe (MPSE), a Resolução nº 02/2008 do Colégio de Procuradores de Justiça (CPJ) regulamenta o assunto nos arts. 25 a 31.
O Portal de Direitos Coletivos[13] trás a seguinte definição, “é um acordo que o Ministério Público celebra com o violador de determinado direito coletivo, com a finalidade de impedir a continuidade da situação de ilegalidade, reparar o dano ao direito coletivo e evitar a ação judicial”. Ele permite ainda, à compensação e/ou à indenização pelos danos que não possam ser recuperados. Distingue-se da transação típica, pois versa sobre interesses indisponíveis, não permitindo o legitimado dispor do direito no todo ou em parte, devendo o compromisso versar as condições de cumprimento das obrigações.
Mazzilli[14] entende ainda que “o compromisso extrajudicial não exige homologação judicial, mas, em advindo esta, deixará de ser título executivo extrajudicial para ser título judicial”.
Já o inquérito civil, previsto no art. 8º, § 1º da LACP, foi consagrado pela CF/88 em seu art. 129, III, e regulamentado pela Resolução nº 23/2007 do CNMP, e no âmbito do MPSE pela Resolução nº 02/2008 do CPJ, já no âmbito federal, pela Resolução nº 87 do Conselho Superior do Ministério Público Federal. Também conforme definição apresentada pelo Portal de Direitos Coletivos, “é um procedimento investigatório instaurado pelo Ministério Público para descobrir se um direito coletivo foi violado. Para tanto, o membro do Ministério Público pode solicitar perícia, fazer inspeções, ouvir testemunhas e requisitar documentos para firmar seu convencimento”.
Seu objetivo é apuração de elementos de convicção para eventual propositura de ação civil pública ou celebração de compromisso de ajustamento de conduta. Possui como características a informalidade, a dispensabilidade, a publicidade e a inquisitoriedade, e estrutura-se em três fases, quais sejam: a instauração, a instrução e a conclusão.
Possui natureza unilateral e facultativa, e poderá ser instaurado de ofício, por requerimento, por representação de qualquer interessado, ou por designação do Procurador-Geral de Justiça, do Conselho Superior do Ministério Público, das Câmaras de Coordenação e Revisão e dos demais órgãos superiores da Instituição, nos casos cabíveis.
Pode ser precedido de procedimento preparatório, e deverá ser concluído no prazo de um ano, prorrogável pelo mesmo prazo e quantas vezes forem necessárias, por decisão fundamentada de seu presidente, à vista da imprescindibilidade da realização ou conclusão de diligências, dando-se ciência ao órgão de revisão, que, a título de exemplo, no âmbito do MPSE é o Conselho Superior do Ministério Público (CSMP).
Concluído o inquérito civil, o membro do Ministério Público proporá a ação civil pública, ou promoverá seu arquivamento, fundamentadamente, esgotadas todas às possibilidades de diligências. Há ainda, a necessidade de, em caso de arquivamento, remetê-lo ao órgão de revisão para que homologue ou rejeite-o. Ressalva-se que o arquivamento feito pelo Ministério Público não impede a propositura da ação civil pelos demais legitimados.
3.3 Atuação Judicial
Na atuação judicial do Ministério Público, destaca-se principalmente, seu papel exercido na ação civil pública, no entanto, sua atuação também pauta-se como custos legis na ação popular, no mandado de segurança coletivo, no mandado de injunção coletivo e nas demais ações de interesse coletivo. No tocante a ação popular, o Parquet pode atuar ainda, como substituto processual dando prosseguimento da ação em caso de desistência do autor (art. 9º da Lei nº 4.717/1965).
A ação civil pública surge do artigo 14, § 1º, da Lei nº 6.938/1981 (Política Nacional do Meio Ambiente) em que legitima o Ministério Público para a responsabilização penal e civil pelos danos causados ao meio ambiente, e fora regulamentada pela Lei nº 7.347/1985, que ampliou tal legitimidade e os direitos difusos e coletivos protegidos, e mais tarde fora elevada a status constitucional (art. 129, III, CF/88). Com o advento do CDC que por meio de seu art. 110 acrescentou o inciso IV no art. 1º da Lei nº 7.347/1985 foi ampliado o uso da ação civil pública para defesa de qualquer interesse difuso ou coletivo. Atualmente, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei Complementar (PLC) 5.139/2009 que visa criar a Nova Lei de Ação Civil Pública.
Essa ação tem por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, e legitimou, de forma concorrente, além do Ministério Público, a Defensoria Pública, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, as autarquias, empresas públicas, fundações e sociedades de economia mista, além das associações, estas, desde que cumpridos alguns requisitos. No entanto, dispôs em seu art. 5º, § 1º que “o Ministério Público, se não intervier no processo como parte, atuará obrigatoriamente como fiscal da lei”, e ainda, no § 3º do mesmo artigo, que “em caso de desistência infundada ou abandono da ação por associação legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa”.
CONCLUSÃO
Diante do exposto, vê-se a crescente preocupação com a proteção dos direitos coletivos decorrente da maior participação social e do importante papel exercido pelo Ministério Público consagrando-se em suas funções de defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais ou difusos e coletivos, e individuais indisponíveis atribuídas pela Constituição Federal em seus artigos 127 e 129, a partir da utilização de vários instrumentos propiciados pelo nosso ordenamento jurídico, e da ampliação dessa atuação por meio de importantes julgados dos tribunais superiores. A junção de todos esses fatores torna mais efetiva a prestação jurídica da tutela coletiva e contribui para alcançar um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, qual seja, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária.
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NOTAS
[1] Há divergência doutrinária com relação à utilização dos termos “geração” ou “dimensão” quando referidos a Direitos Fundamentais, neste artigo utilizar-se-á o termo “geração”.
[2] Decreto nº 23.793, de 23 de janeiro de 1934, e Decreto nº 24.643, de 10 de julho de 1934, respectivamente.
[3] “Art. 113, 38) Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a declaração de nulidade ou anulação dos atos lesivos do patrimônio da União, dos Estados ou dos Municípios”.
[4] GAJARDONI, 2012, p. 26.
[5] STF – Pleno – MS n° 22.164/SP – Rel. Min. Celso de Mello, Diário da Justiça, Seção I, 17 nov. 1995, p. 39.206.
[6] BRITTO 2003, p. 216.
[7] Hugo Nigro 2000, p. 104 e 105.
[8] Há divergência doutrinária quanto ao uso da terminologia “ação civil coletiva” e “ação civil pública”, que pode ser mais bem esclarecida em “http://www.processoscoletivos.net/doutrina/18-volume-1-numero-1-trimestre-01-10-2009-a-31-12-2009/83-acao-civil-publica-e-acao-coletiva-problema-terminologico”. Consideramos neste artigo, “ação civil coletiva” como sinônima e/ou gênero da qual “ação civil pública” é espécie.
[9] GAJARDONI, 2012, p. 23.
[10] Mazzilli, 2000, p. 106.
[11] STF – Pleno – RE n° 631111/GO – Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 06 e 07/08/2014 – Informativo nº 753 do STF.
[12] STF - Pleno - RE n. 163.231-3, e Súmula 643 do STF.
[13] O Portal de Direitos Coletivos “http://www.cnmp.mp.br/direitoscoletivos” foi criado pelo Conselho Nacional do Ministério Público e pelo Conselho Nacional de Justiça e reúne os bancos de dados dos inquéritos civis públicos e termos de ajustamentos de conduta dos Ministérios Públicos dos estados.
[14] Mazzilli, 2000, p. 259.