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Novos critérios de fixação do quantum compensatório do dano moral

Consiste em saber como e com base em quais critérios o juiz fixará o valor compensatório a ser pago a título de indenização por danos morais. Estuda alguns desses critérios objetivos norteadores do magistrado quando da quantificação da indenização.

SUMÁRIO. 1. Introdução: caracterizando o dano moral e sua compensação. 2. Critérios de fixação do quantum compensatório do dano moral. 2.1. O quantum compensatório. 2.2 Capacidade econômica dos agentes. 2.3. Extensão do dano. 2.4. Capacidade de recuperação. 2.5. Sofrimento da vítima. 2.6. Punitive damages. 3. Estudo de casos e julgados. 3.1. A tentativa de tarifação do quantum. 3.2. A tabela do STJ. 3.3. Análise de julgados. 4. Considerações finais. 5. Referências.  

1 Introdução: caracterizando o dano moral e sua compensação.

Com o advento do atual Código Civil (BRASIL, 2014a), em 10 de janeiro de 2002, foi reconhecido em seus artigos 12 e 186 o dano moral como ato ilícito, passível de reparação por parte do ofensor em favor da vítima, porém, para fins de compreensão de como é mensurado o referido valor a ser pago a título de danos morais, nos faz necessário questionar: Quais os critérios utilizados pelos magistrados para a fixação do quantum compensatório do dano moral?

A partir desse problema apresentado, surge uma questão socioeconômica a ser debatida, qual seja: a justa medida da compensação, suficiente para torná-la eficaz e cumprir os objetivos pelo qual existe, e evitar que o valor seja tal que reste configurado o enriquecimento ilícito do ofendido. Por outro lado, uma vez concedido o dano moral em quantidade não ideal para o caso concreto, poderá haver o comprometimento da justa indenização, da punição e persuasão do agente causador do dano e das outras pessoas, além da função do Judiciário.

Em virtude da dificuldade de mensuração do valor a ser arbitrado a título de danos morais, a pesquisa objetiva determinar quais são os critérios objetivos que possam ser utilizados pelo juiz para que ele fixe um quantum indenizatório com uma justa medida para a vítima e o agente causador da lesão. Vale ressaltar que a presente pesquisa não tem o intuito de esgotar todos os critérios norteadores dos magistrados na quantificação da indenização, e sim expor e estudar aqueles que são mais utilizados, em virtude de serem objetivos, de modo a diminuir a margem de subjetividade e arbitrariedade do magistrado.

Busca-se expor o método do arbitramento judicial, com base no princípio da razoabilidade/proporcionalidade, além da utilização de alguns critérios fixadores do quantum compensatório do dano moral, como o método existente mais adequado para a compensação a uma ofensa aos direitos da personalidade.

O dano moral foi recepcionado pela Constituição República de 1988 (BRASIL, 2014b), em seu artigo 5º, inciso X, o qual assevera que a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas são invioláveis, sendo assegurado o direito a indenização por danos morais na hipótese de lesão a um desses institutos. No mesmo sentido, o artigo 186 do Código Civil (BRASIL, 2014a) introduziu o dano moral como uma forma de ato ilícito, logo, passível de reparação. Portanto, não há mais dúvidas quanto à possibilidade de reparação de um dano exclusivamente extrapatrimonial, tendo em vista sua previsão expressa no ordenamento jurídico brasileiro, mas, por outro lado, o debate agora gira em torno do valor a ser arbitrado a título compensatório.

O dano moral, sob uma ótica geral, tem o objetivo de resguardar os direitos da personalidade inerentes à condição de ser humano, o que não excluí a possibilidade de indenização por danos morais decorrente de um dano material, que por sua vez, também ocorrendo, observar-se-á uma cominação de dano patrimonial e extrapatrimonial. Logo, nada impede que o dano material seja cumulado com o dano moral, tendo em vista que poderá existir, em um mesmo ato, uma lesão material e um dano extrapatrimonial, o que poderá dar ensejo a uma ação visando compensar o prejuízo sofrido (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2012).

Para ocorrência do chamado dano moral, é necessário que a lesão atinja a intimidade, os valores, a honra, a vida privada, entre outros bens jurídicos inerentes a personalidade da pessoa, que merecem proteção legal para a preservação da dignidade humana (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2012).  Vale ressaltar, que os meros aborrecimentos da vida cotidiana não são aptos a ensejar uma indenização por dano moral, sob pena de inviabilizar o convívio humano, como asseverou Cavalieri Filho (2010). 

Nesse sentido, o de evitar indenizações banais e corriqueiras que por diversas vezes abarrotam o Poder Judiciário, é que se deve observar se o ato praticado pelo ofensor gera efetivamente uma lesão a um direito da personalidade. Para tanto, é necessário um estudo específico voltado a conceituar os direitos da personalidade, vez que seria impossível saber se houve uma ofensa a este, sem saber o que de fato é.

Cumpre destacar que os direitos da personalidade estão previstos no atual Código Civil (BRASIL, 2014), em seu capítulo II, do título I, do livro I, do artigo 11 ao artigo 21. Apesar do Código Civil prever expressamente a matéria, os direitos da personalidade têm como principal sede a Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2014b), a qual estabeleceu a dignidade da pessoa humana como valor fundamental, devendo ser protegidos individualmente e socialmente. De certa forma, os direitos da personalidade estabelecem uma proteção a valores fundamentais, os quais são essenciais para uma vida com dignidade (AMARAL, 2008). A convivência, os bons costumes, entre outros atributos decorrentes de um processo histórico revelarão o que são valores fundamentais, como por exemplo, ter uma boa fama, ser livre, entre outros. 

Importante salientar, que a personalidade do ser humano distingue-se do instituto dos “direitos da personalidade”. Nos ensinamentos do doutrinador Caio Mario da Silva Pereira "[...] não constitui esta ‘um direito’, de sorte que seria erro dizer-se que o homem tem direito à personalidade. Dela porém, irradiam-se direitos sendo certa a afirmativa de que a personalidade é o ponto de apoio de todos os direitos e obrigações" (2002, p. 154). Logo, a personalidade do ser humano é o conjunto de valores fundamentais, caracteres essenciais, pelos quais servirão de base para o surgimento de muitos outros direitos, que por sua vez, exercerão uma proteção a todos esses valores naturais do indivíduo.

Os direitos da personalidade são aqueles inerentes à condição de ser humano, ou seja, toda pessoa tem, independendo de condição social, política, econômica. Trata-se de proteção a valores fundamentais, tais como o nome, a imagem, a integridade física, entre outros, que não poderão ser violados, sob pena de causar um dano extrapatrimonial perfeitamente passível de reparação. Portanto, pode-se afirmar que todo ser humano goza da proteção aos direitos da personalidade, visto que para tanto, basta o seu nascimento com vida. De fato, os direitos da personalidade emanam do nascimento com vida, porém, o ordenamento jurídico brasileiro prevê a proteção aos interesses do nascituro desde a sua concepção. Por outro lado, a cessação da personalidade, bem como dos direitos inerentes a esta, se dá com a morte do indivíduo, podendo esta ser real ou ficta. (AMARAL, 2008)

Via de regra, os direitos inerentes à personalidade são irrenunciáveis e intransmissíveis, não podendo o ofendido, previamente a ofensa, afastar a possibilidade de indenização mediante cláusula contratual (AMARAL, 2008). Porém, ocorrendo essa hipótese, deve-se levar em consideração o artigo 945 do Código Civil (BRASIL, 2014a), o qual estabelece que a fixação da indenização deverá levar em conta a culpa da vítima em confronto com a conduta do autor, o que de fato acarretará em redução do valor a ser pago a título de indenização pelo autor da ofensa.

Francisco Amaral (2008), ao escrever sobre o tema, diz que os direitos da personalidade se divide em três ramos, quais sejam, de caráter físico, intelectual e moral. A proteção à integridade física pessoal, ao próprio corpo, a qual deverá ser preservada, assegurado à indenização por danos morais na hipótese de descumprimento deste preceito, sem prejuízo de outras punições, inclusive penais, seria o caráter físico. Vale ressaltar que a preservação a própria vida encontra-se aqui tutelada. Quanto ao aspecto intelectual, merecem proteção os direitos autorais, a liberdade de pensamento e criação. Já no âmbito moral, há uma proteção quanto à boa imagem, ao nome, a reputação, bem como outros preceitos fundamentais relacionados à moral individual. Mais do que a simples proteção, as pessoas poderão exigir de terceiros o respeito a todos esses direitos, sob pena de incidir em ato ilícito passível de reparação, ou até mesmo crimes previstos no código penal dependendo de como se dará a ofensa.

Importante destacar que os ramos dos direitos da personalidade destacados pelo autor (AMARAL, 2008) não são taxativos, pelo contrário, trata-se de rol exemplificativo, podendo surgir outros direitos se necessário à proteção da pessoa. Vale ressaltar que, a honra, o nome, a imagem, são exemplos de direitos da personalidade, mas que não são exclusivos de pessoas naturais, podendo esses direitos serem atribuídos também a pessoas jurídicas. O artigo 52 do Código Civil (BRASIL, 2014a) aduz que “Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade.”

No mesmo sentido, a Súmula n° 227 do STJ (BRASIL, 2014c) admite a aplicação do dano moral em favor da empresa que tiver um dos direitos da personalidade transgredido. Ante o exposto, não restam dúvidas sobre a possibilidade de aplicação do dano moral, com o intuito de compensar uma lesão, seja ela patrimonial ou extrapatrimonial. Basta para tanto, que a lesão atinja os direitos da personalidade do indivíduo ou da empresa ofendida. 

Por fim, os direitos da personalidade destinam-se à proteção aos valores decorrentes do princípio da dignidade humana previsto no artigo 5º, inciso X da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2014b), sendo tais direitos atribuídos às pessoas naturais, aos nascituros, bem como as pessoas jurídicas, resguardado o direito de ação contra aquele que transgredir uma dessas normas e causar um dano extrapatrimonial, decorrente de ofensa a um direito da personalidade. Não merece compensação o fato considerado mero dissabor da vida cotidiana (CAVALIERI FILHO, 2010).

O princípio da dignidade humana está devidamente positivado na Constituição da República, em seu artigo 1º, inciso III (BRASIL, 2014b). Os direitos da personalidade terão efeito erga omnes, ou seja, oponíveis contra todos. Logo, toda pessoa deverá respeitar os direitos individuais inerentes à personalidade, sob pena de incidir em um dano e violar a cláusula geral de incolumidade da pessoa, que por sua vez, trata-se da preservação a integridade do indivíduo. A preservação dos direitos da personalidade, nada mais é do que o respeito ao direito a integridade plena da pessoa. A referida preservação é denominada de Dignidade da Pessoa Humana. O dever de incolumidade é a obrigação de não violar os direitos da personalidade de uma pessoa, ou seja, a partir do momento em que alguém causa um dano a personalidade de outrem, estará violando o dever de incolumidade do ofendido, acarretando uma lesão à dignidade da pessoa humana (AMARAL, 2008).

Seguindo a linha de raciocínio de que a dignidade da pessoa humana é uma característica de todo ser humano, aduz Ingo Wolfgang Sarlet:

Aliás, apenas quando (e se) o ser humano viesse ou pudesse renunciar à sua condição é que se poderia cogitar da absoluta desnecessidade de qualquer preocupação com a temática ora versada. Todavia, justamente pelo fato de que a dignidade vem sendo considerada (pelo menos para muitos e mesmo que não exclusivamente) qualidade intrínseca e indissociável de todo e qualquer ser humano e certos de que a destruição de um implicaria  a destruição do outro, é que o respeito e a proteção da dignidade da pessoa (de cada uma e de todas as pessoas) constituem-se  (ou, ao menos, assim o deveriam) em meta permanente da humanidade, do Estado e do Direito. (2009, p. 29)

Logo, a dignidade da pessoa humana é atribuída a todo ser humano, estando diretamente ligados, não havendo a possibilidade de separação. Mas por se tratar o princípio da dignidade humana de um tema muito subjetivo, não havendo um conceito na legislação, ficou a cargo dos juristas lhe conferirem uma definição. Ainda segundo Ingo Wolfgang Sarlet:

Construindo sua concepção a partir da natureza racional do ser humano, Kant sinala que a autonomia da vontade, entendida como a faculdade de determinar a si mesmo e agir em conformidade com a representação de certas leis, é um atributo apenas encontrado nos seres racionais, constituindo-se no fundamento da dignidade da natureza humana. (2009, p. 35)

Partindo dessa premissa, Kant, ora mencionado por Ingo Wolfgang Sarlet (2009), estabelece que a dignidade não está sujeita a uma conferência estatal, pelo contrário, trata-se de um atributo dos seres racionais. Levando-se em consideração o conceito acima citado, a dignidade seria um atributo inerente aos seres racionais, ou seja, todas as pessoas o possuem, cabendo ao Estado garantir a proteção aos mesmos, conferindo ao indivíduo o direito de exigir o respeito perante terceiros. Porém, apesar de diversas tentativas de definição da dignidade humana pelos estudiosos, não há no ordenamento jurídico brasileiro um conceito para tal princípio, assim como não é uníssono na doutrina.

A Constituição da República, em seu artigo 5º, caput (BRASIL, 2014b), prega a igualdade, a liberdade e a segurança entre os brasileiros, bem como os estrangeiros residentes no país. São garantias fundamentais para que um indivíduo tenha uma vida digna, logo, tais garantias exercem uma função basilar no princípio da dignidade humana.

Logo, para preservação da dignidade humana, é função do Estado assegurar aos indivíduos as garantias fundamentais, acima descritas, não se limitando a elas, para manutenção da ordem pública. Vale ressaltar, que é obrigação de todos preservar os direitos inerentes a personalidade de cada um, para o convívio em sociedade de forma digna.

O dano moral é a ofensa aos direitos inerentes à personalidade decorrentes de ato praticado pelo ofensor podendo o dano abranger a esfera patrimonial ou extrapatrimonial do ofendido. Importante frisar que a dor, o sofrimento, a angústia, entre outros sentimentos ruins não se relacionam com a definição do dano moral, mas sim das consequências geradas pela lesão causada pelo ofensor (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2012). Poderá haver a incidência de dano moral sem que haja dor e sofrimento por parte do ofendido. É o caso do individuo que se encontra em coma em um hospital, podendo este ter sido lesado no âmbito dos seus direitos da personalidade, porém, sem haver qualquer sentimento decorrente da lesão. Nesse sentindo, leciona Carlos Roberto Gonçalves:

O dano moral não é a dor, a angústia, o desgosto, a aflição espiritual, a humilhação, o complexo que sofre a vítima do evento danoso, pois esses estados de espírito constituem o conteúdo, ou melhor, a consequência do dano. A dor que experimentam os pais pela morte violenta do filho, o padecimento ou complexo de quem suporta um dano estético, a humilhação de quem foi publicamente injuriado são estados de espírito contingentes e variáveis em cada caso, pois cada pessoa sente a seu modo. O direito não repara qualquer padecimento, dor ou aflição [...]. (2008, p.609)  

Importante destacar ainda, que o artigo 5º, inciso X da Constituição da República de 1988 (BRASIL, 2014b), elenca algumas hipóteses de incidência do dano moral, tratando-se de rol exemplificativo. Implica dizer que caso haja lesão a um direito da personalidade que não esteja elencado no referido dispositivo legal, poderá haver uma reparação por danos morais, uma vez que o rol constante da Constituição não é taxativo. Em outras palavras, a indenização por danos morais não se limita as hipóteses previstas no referido artigo.

Para que se configure um dano moral é necessário ainda que a lesão seja grave, fugindo dos padrões de normalidade da vida cotidiana. O aborrecimento diário decorrente das relações humanas inerentes à vida em sociedade não são capazes de ensejar uma reparação por dano moral. Nesse prisma, aduz Sérgio Cavalieri Filho:

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[...] só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia a dia, no trabalho, no trânsito, entre amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos. ( 2010, p.87)

Portanto, ainda segundo o autor supracitado (CAVALIERI FILHO, 2010), o mero dissabor da vida cotidiana não é capaz de ensejar a aplicação da reparação por danos morais a fim de gerar uma satisfação pecuniária.

O termo mais adequado para a reparação de um dano moral seria a palavra “compensação”, tendo em vista que uma vez ocorrido um dano extrapatrimonial, impossível seria o retorno ao estado em que se encontrava, merecendo o ofendido uma compensação ao dano sofrido. Não havendo a possibilidade de retorno ao estado anterior ao dano, a compensação, via de regra, se dá em pecúnia, como forma de amenizar o prejuízo que o ofensor lhe causou (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2012). Porém, essa compensação deverá seguir alguns critérios de fixação a fim de que se evite o enriquecimento ilícito do ofendido, bem como cumpra sua função social de educar e punir o agente que causou o dano. Nada obsta que a compensação se efetive de forma diversa da citada, desde que cumpra os preceitos pela qual existe. Nas palavras de Noronha:

Veremos oportunamente que indenização e ressarcimento são palavras praticamente sinônimas na língua portuguesa [v. 2, cap. 9], ambas parecendo mais adequadas para referir a reparação por danos patrimoniais. Compensação, por seu turno, fica melhor para danos extrapatrimoniais [v. 2. Cap. 10]: indenizar é apagar o dano, o que só se consegue fazer através da reposição do patrimônio na situação em que estava antes, enquanto compensar é dar algo que contrabalance o mal causado, mas sem poder apagar este (2013, p.461).

Na prática, para um melhor entendimento, grosso modo, seria como se o ofendido tivesse sua esfera extrapatrimonial lesada pelo ofensor e, tendo em vista a impossibilidade de retorno ao estado inicial, merecesse uma compensação na esfera patrimonial. Observa-se que uma vez praticado o ato de ofensa moral, não há pedido de perdão que fará com que o dano retorne ao status a quo. Por isso, necessária se faz a compensação a fim de amenizar o prejuízo decorrente do dano (NORONHA, 2013)  .

Maria Helena Diniz assevera em sua obra que o indivíduo poderá pleitear indenização, não valorando o seu sofrimento, mas como uma atenuação da sua dor:

[...] que o direito não repara a dor, a mágoa, o sofrimento ou a angústia, mas apenas aqueles danos que resultarem da privação de um bem sobre o qual o lesado teria interesse reconhecido juridicamente. O lesado pode pleitear uma indenização pecuniária em razão de dano moral, sem pedir um preço para sua dor, mas um lenitivo que atenue, em parte, as conseqüências do prejuízo sofrido, melhorando seu futuro, superando o deficit acarretado pelo dano (2003, p.85).

Trata-se da natureza compensatória da indenização o fato dela atenuar o sofrimento, as dificuldades, a angústia, decorrentes do ato danoso praticado pelo ofensor (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2012). Porém, ao mesmo tempo em que a indenização tem um caráter compensatório para a vítima, possui também uma natureza punitiva ao agente causador do dano, o qual servirá de desestímulo para que não venha a reincidir em evento danoso. Carlos Roberto Gonçalves, em sua obra Responsabilidade Civil, aduz que:

Ao mesmo tempo que serve de lenitivo, de consolo, de uma espécie de compensação para atenuação do sofrimento havido, atua como sanção ao lesante, como fator de desestímulo, a fim de que não volte a praticar atos lesivos à personalidade de outrem (2008, p. 628).

Deverá ser observado ainda, que o caráter compensatório é o primário, antecedente ao caráter punitivo da indenização. Via de regra, não se pode fixar uma indenização exclusivamente para punir o agente. Também não há a possibilidade de aumentar o valor da reparação somente para punição do ofensor, o que faz do caráter punitivo um instituto secundário (GONÇALVES, 2008).

No dano patrimonial, a reparação visa o retorno ao estado inicial, ou seja, antes da ocorrência do dano. Por outro lado, no dano moral, a reparação ocorre através da compensação, como forma de amenizar as consequências do dano. Porém, o valor compensatório não encontra na lei critérios objetivos para a sua fixação, o que gera dificuldade em sua valoração. (BERTONCELLO, 2006)

No Brasil, não foi recepcionado o sistema de tarifação do dano moral, o qual consiste na vinculação de determinado ato danoso a uma tabela pré-existente para valoração da compensação. Segundo Carlos Roberto Gonçalves (2008), o critério predominante para a reparação do dano moral é o arbitramento pelo magistrado, ou seja, o juiz, ao analisar as peculiaridades do caso concreto, fixará de acordo com a sua conveniência o valor a ser pago a título compensatório. Ainda segundo o autor supracitado, a crítica que se faz a esse sistema é que não há uma defesa eficaz contra o livre arbítrio do magistrado quanto ao valor da compensação, visto que sempre estará em consonância com a lei, ainda que o valor seja muito alto, ou ínfimo.

Portanto, conclui-se que o dano moral é uma lesão aos direitos da personalidade, não havendo dúvidas quanto à possibilidade de sua reparação segundo o ordenamento jurídico pátrio. Além disso, merece uma atenção especial no tocante a sua quantificação, visto que não há como atribuir um valor exato para um dano extrapatrimonial.

Porém, uma vez configurado o dano moral, a dificuldade agora consistirá na sua mensuração, como se procede, com base em quais critérios e a cargo de quem fica esse processo de quantificação do dano moral, para que assim possa haver a compensação merecida.

2. Critérios de fixação do quantum compensatório do dano moral

Para um melhor entendimento de como o Magistrado apura o valor de um dano extrapatrimonial e em seguida determina um quantum compensatório, necessário se faz um estudo mais aprofundado voltado para os critérios utilizados como parâmetro na aplicação do valor compensatório.

Tais critérios não estão previstos no atual ordenamento jurídico, sendo fruto de construções doutrinárias, princípios e costumes.

A extensão do dano, possibilidade de reparação do dano, condição financeira do ofendido e ofensor, as condutas do ofendido e do ofensor, são exemplos de critérios utilizados e que serão estudados individualmente neste capítulo.

Vale ressaltar, que a equidade, por sua vez prevista no artigo 127 do Código de Processo Civil, deve ser um dos princípios adotados pelo magistrado no momento da quantificação. Entende-se por equidade o julgamento justo, analisando as peculiaridades de cada caso concreto.

2.1 O quantum compensatório

Inicialmente, importante frisar que o dano extrapatrimonial é o que por ora interessa, visto que é este o de difícil mensuração e que exige a aplicação dos critérios supracitados para fixação do valor a ser compensado. Nas palavras de Vanessa Justo Oliveira “[...] é o dano moral puro, ou seja, aquele que causou lesões apenas e, exclusivamente, na esfera extrapatrimonial da vítima, que não teve repercussão material.” (2009, p. 313)

 Vale ressaltar, que o termo “valor compensatório” é o mais adequado para conceituar o valor que será pago pelo ofensor ao ofendido. Isso ocorre pelo seguinte motivo: quando da ocorrência de um dano imaterial, o ofendido tem uma lesão na esfera extrapatrimonial, especificamente nos seus direitos da personalidade e independente de qualquer tentativa de retorno ao status quo por parte do ofensor, não logrará êxito, justamente pelo fato dessa espécie de dano não haver valor pecuniário exato, tornando impossível o retorno perfeito ao estado em que se encontrava antes da ocorrência do dano, diferentemente do que ocorre quando se tem um dano patrimonial (NORONHA, 2013).

Segundo Gagliano e Pamblona Filho (2012) apesar do termo “indenização” ser comumente utilizado no meio jurídico, não é o adequado para definir a natureza do valor pago ao ofendido a título de danos morais, visto que guarda intimidade com “ressarcimento”, que por sua vez faz cessar os prejuízos e consequências do dano, o que não é possível em se tratando de danos morais.

Tal valor também não tem natureza reparatória, visto que o dinheiro não representa função de equivalência. O dinheiro, no caso de dano moral, representa função compensatória, e por isso o termo mais adequado é compensação. (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2012).

Portanto, para que haja uma atenuação dos prejuízos gerados pelo fato danoso, bem como funcione como um lenitivo ao sofrimento da vítima, é que o magistrado determina uma compensação a ser paga pelo ofensor em favor do ofendido. Nesse sentido, assevera o autor Antonio Lindbergh C. Montenegro:

Predomina, contudo, o entendimento de que a quantia outorgada ao ofendido não representa um ressarcimento, sentido rigoroso do termo, e sim uma compensação ou satisfação simbólica, visto que nela domina a idéia de pena privada, de manifesta incompatibilidade com a sistematização dos princípios  que formam o arcabouço da teoria da indenização do danos (1999, p. 123).

A determinação do valor compensatório a ser pago pelo ofendido fica a cargo do magistrado, que fixará, quando provocado, com base em alguns critérios não estabelecidos no ordenamento jurídico, analisando as peculiaridades de cada caso, com fundamento no princípio do livre convencimento do magistrado. (GONÇALVES, 2008).

Tal valor não está vinculado a qualquer tabela, apesar de algumas tentativas de tarifação, porém, deverá o magistrado se basear em alguns critérios existentes, além de aplicar também o princípio da razoabilidade, para que se possam cumprir os objetivos pela qual existe a compensação, quais sejam, o caráter social, punitivo e compensatório da indenização. Nesse sentido, aduz Sérgio Cavalieri Filho:

Não há, realmente, outro meio mais eficiente para se fixar o dano moral a não ser pelo arbitramento judicial. Cabe ao juiz, de acordo com o seu prudente arbítrio, atentando para a repercussão do dano e a possibilidade econômica do ofensor, estimar uma quantia a título de reparação pelo dano moral. (2010, p. 96.)

O quantum compensatório deverá cumprir sua função social na medida em que exerce seu caráter educativo ao agente causador do dano, demonstrando-o que o fato que praticou é digno de reprovação social, além de servir como uma espécie de punição privada, assunto que será tratado mais a frente.

Esses critérios norteadores da fixação do valor a ser pago pelo ofensor, bem como as funções da indenização, existem para que não haja injustiça ao ponto da compensação não ser suficiente para cumprir o caráter compensatório do dano, bem como para que evite o enriquecimento ilícito, que por sua vez consiste no fato do ofendido aumentar seu patrimônio sem que haja motivo ou, ainda, haja desproporção do valor pago em demasia com relação ao dano causado.

Pelos motivos expostos acima, se faz necessário o estudo aprofundado de alguns dos critérios que funcionam como norteadores do julgador no momento da valoração do dano imaterial.

2.2 Capacidade econômica dos agentes

Não teria eficácia no mundo prático à condenação do agente causador do evento danoso ao pagamento de uma compensação em favor do ofendido se não tiver condições de arcar com o débito agora existente. Nada mudará a não ser o fato dele passar a ser um devedor do ofendido. Não haverá compensação, tampouco caráter social, punitivo e pedagógico da indenização. Por isso, o magistrado deverá atentar-se a condição financeira do ofensor, para que a indenização não seja exorbitante ao ponto de impossibilitar o pagamento.

Por outro lado, na hipótese do valor compensatório ser ínfimo quando comparado ao patrimônio do ofensor, os motivos pelos quais existe também não serão cumpridos, acarretando na ineficácia, ainda que parcial, da condenação. Neste caso, poderá haver a compensação, mas pode ser que não exerça a função pedagógica e/ou punitiva da condenação, visto que o agente causador do dano não sentirá um pouco dos efeitos do dano.

O magistrado poderá buscar auxílio na Receita Federal para auferir, através da declaração anual de imposto de renda, a condição financeira dos agentes envolvidos. Em se tratando de pessoa jurídica, o contrato social da empresa poderá auxiliar o juiz.

A aplicação de um valor elevado a título de compensação por danos morais encontra justificativa na hipótese em que o autor do dano possui um vasto patrimônio. Isso ocorre devido à necessidade de se concretizar o caráter punitivo da indenização. Neste caso, a não aplicação de um alto valor a título compensatório, prejudicaria a efetivação desta função.

Em se tratando de valores altos, deve-se atentar ainda para a configuração do enriquecimento ilícito da vítima.

Segundo Sérgio Cavalieri Filho (2010) na fixação do dano moral, o magistrado deve ter em mente o princípio de que o dano não pode ser fonte de lucro, devendo a indenização ser suficiente para reparação do dano causado e nada mais, a fim de que se evite o enriquecimento sem causa, respeitando a lógica do razoável.

Além das condições econômicas do agente causador do dano, é necessário observar o mesmo prisma com relação ao ofendido, para que a indenização aplicada não configure fonte de lucro, concretizando o enriquecimento ilícito como ressalvado pelo autor supracitado.  Como por exemplo, a vítima que ascende de classe social em decorrência de indenização por nome incluído no Serviço de Proteção ao Crédito.

Por outro lado, não se deve reduzir o valor compensatório apenas sob o argumento de que a vítima é pobre, visto que tal tratamento seria inconstitucional, ferindo o princípio da igualdade expresso no artigo 5º, caput, da Constituição da República (BRASIL, 2014). A título de exemplo, a empresa que é condenada a pagar R$1.000,00 (mil reais) ao empregado que tem sua honra lesada pelo empregador. 

2.3 Extensão do dano

A aplicação da análise da extensão do dano quando da valoração da indenização está prevista no artigo 944, caput, do Código Civil (BRASIL, 2014a) “A indenização mede-se pela extensão do dano.” Fazendo uma interpretação do artigo supracitado, a extensão do dano como critério de arbitramento do dano moral consiste na análise da dimensão do prejuízo causado pelo evento danoso, para que se possa, juntamente com outros critérios, ter um valor arbitrado a título de danos morais, proporcional ao dano gerado.

Dessa forma, entende-se que maiores prejuízos, acarretarão em maiores indenizações, ou seja, o valor a ser pago a título de indenização por danos morais é proporcional à extensão do dano provocado pelo ofendido.

Porém, fazer uma análise da extensão do dano imaterial é um pouco mais complexo do que verificar a extensão em um dano patrimonial. Na ocorrência de um dano patrimonial, através de perícia, verifica-se o valor que fora reduzido do patrimônio do ofendido, e por meio da indenização, busca-se repará-lo, reconstituir aquilo que se perdeu. Tal situação se torna impossível quando o dano for extrapatrimonial, visto que não há a possibilidade de valorar uma ofensa aos direitos da personalidade e muitas vezes não é possível o retorno ao estado em que se encontrava antes da ocorrência do evento danoso. (BELTRÃO, 2014).

Os danos extrapatrimoniais são dotados de subjetividade, ou seja, um mesmo caso admite diversas interpretações, o que os tornam de difícil mensuração, acarretando por diversas vezes em casos semelhantes, decisões completamente distintas, o que acaba por gerar certa insegurança jurídica.

Ocorre que, o magistrado, levando em consideração este critério, deverá ponderar apenas o efetivo dano causado pelo ofensor e não as suas intenções, não sendo estas passíveis de indenizações. Não se busca neste plano, avaliar o dolo do agente e sim o efetivo prejuízo que causou à vítima, é o que diz Gonçalves (2008).Segundo o autor (GONÇALVES, 2008), avaliado o prejuízo, o que se busca é convertê-lo em pecúnia a fim de que se possa compensar o dano. A dimensão do dano causado justifica o valor da indenização como os fins justificam os meios.

A título de exemplo, o indivíduo que invade a privacidade de uma pessoa famosa, começa a gravar vídeos ou tirar fotos com intuito de publicar uma matéria constrangedora para a vítima, mas por circunstâncias alheias a sua vontade não consegue publicar, responderá tão somente pelo dano que causou, ou seja, a invasão da privacidade, intimidade, sem prejuízo de outros danos que viera efetivamente a se concretizar. Porém, apesar do ofendido pretender publicar a matéria, não conseguiu, e não poderá ser responsabilizado pelo ato não praticado.

Ainda no plano da extensão do dano, deverá ser analisado o comportamento da vítima, se ela contribuiu para consumação do dano. Caso tenha contribuído, segundo o artigo 944, parágrafo único, do Código Civil (BRASIL, 2014), haverá uma atenuação do valor aplicado a título compensatório, visto que houve a ocorrência do instituto chamado de culpa concorrente da vítima, onde ela também contribuiu para concretização do dano.

2.4 Capacidade de recuperação

Outro critério a ser analisado pelo magistrado no momento da valoração do quantum indenizatório é a capacidade de recuperação da vítima. Qualquer leigo seria capaz de observar que um dano irreparável, ou seja, que não permita a possibilidade de recuperação da vítima é merecedor de uma indenização maior do que um dano que poderia facilmente ser reparado.

Deve-se observar neste ponto, de acordo com as peculiaridades de cada caso, se aquele dano causado pelo ofensor tem a possibilidade de recuperação por parte da vítima, além de quanto tempo e de como será essa recuperação.

Não se pode confundir reparação do dano, com recuperação dos prejuízos por parte da vítima. O primeiro é o método utilizado como tentativa de retorno ao estado em que se encontrava o objeto do dano antes do evento danoso. O segundo está relacionado a forma como o ofendido vai acolher o dano.

Aqui, na capacidade de recuperação, o dano já fora efetivado, o que está em análise é a possibilidade da vítima se recuperar dos prejuízos decorrentes da ofensa aos direitos da personalidade do indivíduo. Pode ser que haja recuperação do trauma gerado pelo evento danoso por completo, ou não, que deixe sequelas para toda vida.

2.5 Sofrimento da vítima

O sofrimento da vítima como critério de arbitramento do dano moral, segundo Vanessa Justo Oliveira (2009), é um critério um tanto quanto subjetivo, onde deve o magistrado fazer uma análise da lesão sofrida pela vítima para saber seu grau de intensidade, se foi grave, moderado ou leve. Além disso, deverá ainda fazer uma interpretação visando descobrir se a lesão foi de grande magnitude ou não houve maiores repercussões.

Dessa forma, podendo analisar o evento danoso sob o ponto de vista do sofrimento da vítima, uma lesão de maior repercussão nos direitos inerentes a personalidade do indivíduo faria jus a uma indenização maior, da mesma forma ocorreria em danos de menores proporções onde a indenização deveria ser reduzida. Logo, tal procedimento auxiliaria na aferição do valor a ser pago a título de compensação.

Em termos práticos, para melhor compreensão, perder um filho em virtude de um ato ilícito praticado por outrem, gera um sofrimento maior na vítima do que uma simples inclusão indevida do nome no serviço de proteção ao crédito, merecendo, portanto, uma maior indenização.

2.6 Punitive damages

Os chamados Punitive Damages, do inglês Danos Punitivos, são aquelas indenizações cuja finalidade é punir o agente ofensor (BELTRÃO, 2014). No Brasil, não há previsão legal para tal modalidade de indenização. Ocorre que, o artigo 944 do Código Civil (BRASIL, 2014a) aduz que a indenização deverá ser medida pela extensão do dano.

Fazendo uma interpretação do supracitado dispositivo legal, a indenização deverá servir tão somente para ressarcir ou compensar o dano causado, não podendo o valor compensatório ser majorado para fins de punição do agente causador do dano. Portanto, o artigo 944 do Código Civil (BRASIL, 2014a) é uma forma de vedação do Punitive Damages no ordenamento jurídico brasileiro.

Entretanto, no caso da aplicação do dano moral, admite-se, em alguns casos, a aplicação do Punitive Damages como uma espécie de pena privada. Nas palavras de Sérgio Cavalieri Filho:

Na verdade, em muitos casos o que se busca com a indenização pelo dano moral é a punição do ofensor. Pessoas famosas, atingidas moralmente por noticiários de televisão ou jornais, constantemente declaram na petição inicial da ação indenizatória que o valor da eventual condenação será destinado a alguma instituição de caridade. O mesmo ocorre quando a vítima do dano moral é criança de tenra idade, doente mental ou pessoa em estado de inconsciência. Nesses casos – repita-se – a indenização pelo dano moral atua mais como forma de punição de um comportamento censurável que como compensação. (2010, p. 99).

Nos casos citados pelo autor (CAVALIERI FILHO, 2010) quase não há função compensatória oferecida pela indenização, visto que a vítima do dano moral já é possuidora de um vasto patrimônio ou não tem interesse em receber o dinheiro resultante da indenização por danos morais, o que por sua vez não afasta o direito de pleitear a medida. Portanto, nestes casos, não há que se falar em compensação ao sofrimento da vítima, e sim na aplicação da indenização com o intuito de punir o ofensor que praticou um ato digno de reprovação que resultou em ofensa aos direitos da personalidade da vítima.

Vale ressaltar que o fato supracitado trata-se de uma exceção, sendo que a principal finalidade da indenização por danos morais é o caráter compensatório. Segundo Carlos Roberto Gonçalves:

O caráter punitivo é puramente reflexo, ou indireto: o causador do dano sofrerá um desfalque patrimonial que poderá desestimular a reiteração da conduta lesiva. Mas a finalidade precípua da indenização não é punir o responsável, mas recompor o patrimônio do lesado, no caso do dano material, e servir de compensação, na hipótese de dano moral. O caráter sancionatório permanece ínsito na condenação ao ressarcimento ou à reparação do dano, pois acarreta a redução do patrimônio do lesante.  (2008, p. 635).

Ainda segundo o autor (GONÇALVES, 2008), uma vez aplicada à indenização com intuito de compensar a vítima, não poderá o valor empregado a título de indenização ser majorado apenas com o objetivo de punir o ofensor. Caso isto ocorra, poderá o ofendido incidir em enriquecimento ilícito o que também é vedado pelo atual ordenamento jurídico pátrio, além de configurar um novo dano, agora em desfavor do condenado.

Conclui-se, portanto, que a punição do agente, em forma de pena privada, como chama Sérgio Cavalieri Filho (2010), é uma função secundária da indenização. Trata-se de um reflexo, assim chamado por Carlos Roberto Gonçalves (2008), da compensação do dano, que por sua vez seria o objetivo principal da indenização. A punição como objetivo secundário da indenização, tem o intuito de educar e evitar a reincidência em dano do ofensor. 

Importante ressaltar, que os critérios citados acima não devem ser analisados isoladamente quando da mensuração do valor compensatório, sob pena do magistrado cometer uma injustiça quando do julgamento da lide. Pelo contrário, devem ser analisados em conjunto para que dessa forma seja possível cumprir os objetivos pelo qual existe a indenização.

3. Estudo de casos e julgados 

Neste capítulo o que se objetiva é a análise prática do tema exposto ao longo da pesquisa, ou seja, como são aplicados os critérios fixadores do dano moral no caso concreto. Não obstante, o presente capítulo também tem o intuito de apreciar jurisprudências bem como fazer uma análise da tentativa de tarifação do dano moral por meio de uma tabela criada pelo Superior Tribunal de Justiça.

3.1 Tentativa de tarifação do quantum

Como observado no capítulo anterior, seguindo os ensinamentos de Sérgio Cavalieri Filho (2010) o método mais indicado para fixação do quantum compensatório do dano moral é o arbitramento judicial.

Porém, ainda que seja o mais adequado, não está livre de críticas, como por exemplo, a de que não há uma defesa eficiente contra decisões baseadas no arbitramento por parte do magistrado, visto que tal decisão está inserida num contexto carregado de subjetividade, ou seja, o magistrado não está vinculado a critérios objetivos para proferir uma decisão, é o que diz Carlos Roberto Gonçalves (2008).

Ainda segundo o autor (GONÇALVES, 2008), isso acarreta outro problema, qual seja, a insegurança jurídica, visto que em casos semelhantes, poderão existir decisões completamente diferentes, tendo em vista que essas decisões estão pautadas na sensibilidade e interpretação do magistrado para cada caso concreto.

Nesse sentido, uma vez não havendo defesa eficiente contra sentença proferida em primeira instância com base em arbitramento judicial, dificilmente o recurso interposto a fim de reformar tal sentença será conhecido e provido.

Por esses e outros motivos, é que o Superior Tribunal de Justiça publicou em Setembro de 2009 uma tabela, meramente ilustrativa, sobre o dano moral.

A tarifação consiste em uma minuciosa análise do caso concreto, de acordo com as suas peculiaridades e levá-lo em confronto com uma tabela preexistente ao evento danoso e observar em qual hipótese aquele fato se enquadra. Feito isso, encontra-se uma média de valor a ser pago a título de indenização por danos morais.

De certa forma, a tarifação traria benefícios como a celeridade processual, uma vez que não haveria a necessidade de análise de todos esses critérios que auxiliam na fixação do quantum compensatório. Bastaria conflitar o evento danoso à tabela preexistente e se concluiria uma média de valor a ser pago a título de compensação. Com isso, diminuiria a subjetividade e arbitrariedade das decisões, o processo seria mais célere, e diminuiria a quantidade de processos encalhados no judiciário.

Deve-se atentar a distinção existente entre arbitramento e arbitrariedade. Arbitramento, neste caso, significa uma fixação prudente, baseada em critérios objetivos, do quantum compensatório do dano moral. Por outro lado, arbitrariedade guarda certa relação com subjetividade, tem sentido pejorativo.

Contudo, a tarifação não foi muito bem recebida pelos juristas, como por exemplo, Carlos Roberto Gonçalves (2008), que por sua vez, fez algumas críticas a este método, uma delas é a possibilidade de saber a média de valor que será pago antes mesmo de se ajuizar uma ação pleiteando indenização por danos morais. O indivíduo, ao ser ofendido, poderá analisar se vale a pena adentrar com a ação ou não levando em consideração o ilícito.

Além disso, a utilização deste método de indenização do dano moral também não levaria em consideração os princípios da razoabilidade e proporcionalidade que Sérgio Cavalieri Filho (2010) defende ser o ideal, logo, a indenização poderia não cumprir os preceitos pela qual existe. Em alguns casos, poderia não haver a justa medida da indenização, não punindo o agente ofensor e/ou não compensando a vítima pelo dano sofrido, em virtude da generalização das decisões.

Com o intuito de tarifar o dano moral, no ano de 2002, o Senador Antônio Carlos Valadares, elaborou o Projeto de Lei nº 7.124/2002 (BRASIL, 2014d). O referido projeto considera o dano moral como a ofensa ao patrimônio moral de pessoas físicas ou jurídica, responsabilizando pelo dano, todos os colaboradores da ofensa, na proporção de suas ações ou omissões.

O projeto de Lei (BRASIL, 2014d) prevê a quantia de até R$20.000,00 (vinte mil reais) para indenizações de natureza leve. De R$20.000,00 (vinte mil reais) a R$90.000,00 (noventa mil reais) para indenizações de natureza média. E por fim as ofensas de natureza grave poderiam variar entre R$90.000,00 (noventa mil reais) e R$180.000,00 (cento e oitenta mil reais).

Porém, o projeto supracitado (BRASIL, 2014d) não fora aprovado e encontra-se no momento arquivado.

3.2  A tabela do STJ

Tendo em vista a tão mencionada falta de critérios objetivos para a fixação do quantum compensatório, a fim de criar um método mais eficaz para a aplicação do valor indenizatório, o Superior Tribunal de Justiça criou uma tabela no ano de 2009 com valores médios que foram aplicados em cada situação nela prevista.

Vale ressaltar que a presente tabela não tem força vinculante, nem se trata de uma tentativa de tarifação do dano moral por parte do Superior Tribunal de Justiça. Pelo contrário, essa tabela apenas foi uma notícia publicada pelo STJ com o intuito de nortear os julgadores, porém não foi de muita utilidade.

        Fonte: STJ..., 2014

Como se observa da presente tabela existe um valor médio atribuído à indenização de acordo com a instância, estando vinculado o referido valor a um fato. Na ocorrência de um desses fatos previstos na tabela, atribui-se a título de indenização por danos morais o valor previamente estabelecido para o respectivo evento danoso.

A criação da supramencionada tabela apenas expõe na prática a tão aludida dificuldade de se atribuir ao dano moral um valor compensatório.

3.3 Análise de julgados

Esse tópico tem o intuito de expor uma análise de julgados relacionadas ao uso dos critérios fixadores do quantum compensatório do dano moral. Passa-se então ao exame do primeiro julgado, que por sua vez, fora proferido pela Décima Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:



RESPONSABILIDADE CIVIL. COBRANÇA INDEVIDA. DANO MORAL. QUANTUM. CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO. Na mensuração do dano, não havendo no sistema brasileiro critérios fixos e objetivos para tanto, mister que o juiz considere aspectos subjetivos dos envolvidos. Assim, características como a condição social, a cultural, a condição financeira, bem como o abalo psíquico suportado, hão de ser ponderadas para a adequada e justa quantificação da cifra reparatório-pedagógica. Quantum mantido. Honorários advocatícios mantidos. Multa por descumprimento. Cabimento. PROVERAM EM PARTE O RECURSO. (2014)

De acordo com a ementa supracitada, observa-se na prática a falta de critérios objetivos para a fixação do quantum compensatório, fazendo-se necessária a apreciação de critérios subjetivos das partes. A decisão ainda faz menção à função reparatória da indenização e também ao caráter pedagógico em relação ao ofensor, sendo este também efeito da indenização, que por sua vez visa coibir a reincidência.

O segundo julgado a ser analisado foi proferido pela Décima Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

AÇÃO ANULATÓRIA. PROTESTO INDEVIDO DE TÍTULO. DANOS MORAIS. QUANTUM. CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO. REDUÇÃO. POSSIBILIDADE. Apresentam-se como princípios norteadores para a quantificação do dano moral, o princípio da razoabilidade e, ainda, o princípio que veda o enriquecimento ilícito, deles não podendo se divorciar o Julgador. (2014)

No julgado supracitado, observa-se a presença dos princípios da razoabilidade/proporcionalidade, assim como o princípio da vedação ao enriquecimento ilícito. Vale ressaltar, que a correta aplicação do princípio da razoabilidade é utilizá-lo como base para adoção dos critérios subjetivos norteadores da fixação do quantum compensatório. É o que diz o Desembargador Paulo Roberto Pereira da Silva em seu voto no Acórdão de que trata a ementa supra transcrita:

E é na busca desta razoabilidade que se impõe a aferição, pelo Juiz, do grau de reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade da culpa, do sofrimento da vítima, ou seja, a gravidade da lesão, a sua condição social, a capacidade econômica do causador do dano e do ofendido. São parâmetros seguros, através dos quais o Julgador deve sempre se pautar. (MINAS GERAIS, 2014)

O desembargador acima citado considera tais parâmetros norteadores do magistrado como essenciais para o arbitramento do dano moral, além de seguros, pelos quais o magistrado deverá sempre se basear.

O próximo julgado a ser estudado foi proferido pela 31ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo:

PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. TELEFONIA FIXA. TELECOM. LINHAS TELEFÔNICAS NÃO SOLICITADAS. INDEVIDA INCLUSÃO CADASTRO DE MAUS PAGADORES. DANO MORAL TIPIFICADO. ARBITRAMENTO JUDICIAL. CRITÉRIOS. RECURSO DA AUTORA PROVIDO. RECURSO DA RÉ IMPROVIDO. O valor a título de indenização dos danos morais não pode ser extremamente modesto, mas também não representar excesso na direção oposta, tornando-se fator de enriquecimento injustificado do indenizado Tem caráter dúplice serve de consolo ao sofrimento experimentado pelo ofendido e tem cunho educativo ao causador do dano, com a finalidade de que aja de modo a evitar novas vítimas e ocorrências semelhantes. (2014)

Observa-se do presente julgado, que o valor da indenização não poderá ser exorbitante suficiente para restar configurado o enriquecimento ilícito do ofendido, e por outro lado, não poderá ser modesta demais ao ponto de não compensar o dano causado ou deixar de cumprir outras funções da indenização. Entende-se por modesta, a indenização insuficiente para atender os preceitos pelos quais existe.

O julgado ainda faz menção ao caráter dúplice da indenização, qual seja, servir de consolo para o ofendido; e exercer sua função pedagógica a fim de educar o agente ofensor, demonstrando a reprovabilidade da sua conduta e servindo como uma espécie de pena privada para este. Dessa forma, como o julgado diz, procura-se evitar novas condutas danosas em face de outras vítimas.

O próximo julgado a ser analisado fora proferido pela 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Espírito Santo:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS - BLOQUEIO DAS LINHAS TELEFÔNICAS - PESSOA JURÍDICA - NÃO INCIDÊNCIA DO CDC - PREJUÍZOS PRESUMIDOS - DANOS MATERIAIS NÃO COMPROVADOS - DANOS MORAIS - VIOLAÇÃO À HONRA OBJETIVA - ABALO À REPUTAÇÃO DA EMPRESA - INDENIZAÇÃO DEVIDA - QUANTUM INDENIZATÓRIO ARBITRADO EM R$ 7.000,00 (SETE MIL REAIS) - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE. [...]. 10 - No tocante ao quantum indenizatório, o Superior Tribunal de Justiça vem recomendando a razoabilidade como condutora da decisão do juiz. O Colendo Tribunal vem, em muitos casos, negando-se a alterar o valor da indenização, por entender que ¿fixado o valor da indenização dentro de padrões de razoabilidade, faz-se desnecessária a intervenção deste Superior Tribunal, devendo prevalecer os critérios adotados nas instâncias de origem¿ (STJ - AGA 470538⁄SC - DJ. 24.11.2003). 11 - Verba indenizatória arbitrada em R$ 7.000,00 (sete mil reais), acrescida de correção monetária a partir da data do arbitramento e juros de mora a partir da citação. 12 - Recurso conhecido e provido em parte.   VISTOS, relatados e discutidos, estes autos em que estão as partes acima indicadas. ACORDA a Egrégia Segunda Câmara Cível, na conformidade da ata e notas taquigráficas que integram este julgado, à unanimidade de votos, conhecer do presente recurso e provê-lo em parte, nos termos do voto proferido pelo E. Relator.   Vitória, 06 de maio de 2014.     DES. PRESIDENTE DES. RELATOR. (2014, grifo nosso)

O presente julgado mantém os critérios adotados pelo juiz de direito, visto que o valor indenizatório encontra-se dentro dos padrões de razoabilidade.

Como se observa dos julgados supramencionados, não resta dúvidas que o método mais adequado para aferição do valor compensatório é o arbitramento judicial.

Os critérios utilizados para efetivação desse arbitramento são basicamente os mesmos, alterando alguns para cada caso em concreto. A indenização fixada a título de danos morais deve sempre estar pautada nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade como afirmaram Sérgio Cavalieri Filho (2010) e Carlos Roberto Gonçalves (2008).

A sensibilidade de cada juiz, em cada julgamento, na aplicação dos critérios fixadores do quantum compensatório, faz com que haja algumas disparidades em decisões proferidas em casos semelhantes, porém, ainda não há um método mas eficaz para solução desse problema.

4. Considerações finais

A pesquisa tem como conteúdo a definição e caracterização do dano moral, passando pelo estudo dos direitos da personalidade e da dignidade da pessoa humana, além de demonstrar como se procede à quantificação da indenização por danos morais.

Expõe ainda, individualmente, o estudo de alguns critérios utilizados como base no processo de quantificação do dano moral. São eles: a capacidade econômica dos agentes envolvidos, a extensão do dano, a capacidade de recuperação da vítima, o sofrimento da vítima e por fim a utilização da indenização como forma de punir o agente ofensor.

O método mais adequado para aplicação da indenização por danos morais é o arbitramento judicial, pelo qual o magistrado, utilizando-se dos princípios da proporcionalidade/razoabilidade, somado aos critérios norteadores à aplicação da indenização, fixará o valor compensatório, como defende Sérgio Cavalieri Filho (2010).

Os motivos pelos quais a tarifação do dano moral não atende bem os preceitos pelos quais existe a indenização, deixando um pouco a desejar em relação à satisfação do tutelado, o que de certa forma macularia, caso fosse utilizado, a imagem do Judiciário.

De fato, seguindo a linha de raciocínio de Sérgio Cavalieri Filho (2010), este método me parece o mais adequado, visto que analisa as peculiaridades de cada caso em concreto, além de considerar também às funções pelo qual a indenização existe, quais sejam: social, punitiva e compensatória.

Por fim, esta pesquisa abre novas perspectivas de trabalhos a serem realizados no sentido de explorar outros critérios, não expostos nesta pesquisa, que também podem ser utilizados na quantificação da indenização por danos morais.

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Sobre os autores
Gilberto Fachetti Silvestre

Professor da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES); Professor da Universidade Vila Velha (UVV); Doutorando em Direito Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP); Mestre em Direito Processual Civil pela UFES; Advogado sócio do escritório Caetano, Fachetti & Schneider Advogados. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/7148335865348409

Alcides Caetano Silva

Advogado em Vitória - ES; Especialista em Direito Médico - EMESCAM

Flavio Britto Azevedo Schneider

Advogado em Vitória - ES; Especialista em Direito Médico - EMESCAM.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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