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Indulto presidencial como estratégia para imposição de limites máximos à duração das medidas de segurança

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  Considerações finais

  A grande problemática do presente estudo gira em torno da ausência de limites máximos na medida de segurança e da aplicação do indulto presidencial como forma de sanar tal questão. Tanto a existência de limites mínimos (1 a 3 anos) na medida de segurança, a partir dos quais é possível a realização de perícia médica para averiguação da existência de periculosidade, quanto a ausência de limites máximos de duração na medida ferem diversos princípios constitucionais, tais como: princípio da individualização da pena, princípio da dignidade da pessoa humana, princípio da igualdade, princípio da legalidade, princípio da proporcionalidade e princípio da intervenção mínima.

Para a aplicação justa das medidas de segurança no Estado Democrático de Direito, e o respeito pleno aos direitos humanos dos indivíduos a ela submetidos, deve haver harmonia entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. No entanto, acerca da duração máxima das medidas de segurança, os três poderes possuem posicionamentos divergentes. O legislador foi omisso quanto à existência de prazos máximos na medida de segurança. O Poder Judiciário, através do STF, entende que o prazo máximo das medidas de segurança deve ser de 30 anos, período previsto para as penas, conforme art. 75, do CP. Já o STJ entende que deve haver uma proporcionalidade maior e a duração deve ser a correspondente à pena máxima cominada ao ilícito-típico praticado pelo doente mental. O Poder Executivo também se posicionou sobre o tema através do indulto presidencial, emitido pelo Presidente da República no período natalino. A partir de 2008 o indulto passou a se estender aos internados que estão submetidos à medida de segurança por período superior à pena abstrata cominada ao delito respectivo.

A concessão do indulto na medida de segurança, apesar de ser constitucional e estar sendo aplicado anualmente desde 2008 a diversos doentes mentais, teve a repercussão geral reconhecida pelo STF, a partir de um pedido formulado pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul que, a nosso ver, não possui qualquer embasamento legal. O MP/RS afirma que o fato de ser portador de uma patologia torna o submetido à medida de segurança um indivíduo perigoso para a sociedade. Porém, tal argumento não possui embasamento legal e fere princípios como intervenção mínima, legalidade e igualdade. Não há dados comprovados de que o inimputável tem mais probabilidade de repetir o injusto penal, quando comparado ao imputável. Além do mais, é extremamente injusto que o imputável fique muito menos tempo privado de sua liberdade do que o inimputável, que não agiu com discernimento e autocontrole. Ressalte-se ainda que tanto antes, quanto durante e depois da internação, é dever do Estado dar todo o respaldo para o doente mental. Afinal, se ele cometeu um fato descrito como crime, por conta de sua doença, é porque não recebeu anteriormente tratamento adequado da saúde pública. O Estado deve estar, ainda, preparado para receber o indivíduo indultado que continuar precisando de tratamento, devendo a internação, caso necessária, ocorrer de uma maneira civil e não mais penal.

Podemos verificar, ainda, através do presente trabalho, que apesar do anteprojeto ainda se basear na noção de periculosidade, pretende estabelecer prazos máximos na medida de segurança, seguindo a linha de posicionamento já defendida pelo STJ e pela doutrina majoritária, sendo provável que tal entendimento tenha sido a motivação para a aplicação do indulto na medida de segurança. Através do indulto na medida de segurança, os internados que estão submetidos à internação por período superior à pena máxima cominada ao ilícito-típico praticado passam a receber o indulto e, consequentemente, a extinção da punibilidade.

Através do presente trabalho podemos concluir que, com relação às medidas de segurança, o indulto resolve divergências entre os poderes, tentando tornar pacificada a questão a respeito dos seus limites máximos de duração. É evidente a necessidade de que o legislador penal estabeleça a duração máxima das medidas de segurança, pois essa ausência de limites fere diversos preceitos constitucionais e gera insegurança jurídica. Por outro lado, o STF também deve reconhecer a constitucionalidade da concessão do indulto na medida de segurança, o que significará a resolução de uma questão de âmbito legislativo pelo Poder Executivo e pelo Poder Judiciário.

A interpretação constitucional adequada para o julgamento do RE 628658 é o reconhecimento da legitimidade da aplicação do indulto presidencial aos submetidos à medida de segurança. É o que se espera do STF, sendo certo que, para isso, o tribunal terá de implicitamente rever seu posicionamento a respeito da limitação da duração das medidas de segurança em 30 anos, finalmente admitindo que a limitação deve guardar relação com a pena máxima abstratamente cominada. No fundo, aguarda-se ansiosamente a edição de lei que estabeleça expressamente essa garantia, e as posições do Poder Judiciário e do Poder Executivo denotam tendência nesse sentido.


Referências

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Notas

[3] Em outra oportunidade realizamos um estudo detalhado da aplicação desses princípios às medidas de segurança. Cf. CIA, 2011.

[4] Registre-se o PLS 513/13, que pretende alterar a Lei de Execução Penal, no sentido de abolição dos HCTP´s. O projeto pretende revogar os artigos relativos aos HCTP´s (art. 99, 100 e 101, LEP) e os artigos 172, 173 e 174, referentes à execução das medidas de segurança. Ao artigo 171 pretende conferir a seguinte redação: “Transitada em julgado a sentença que aplica medida de segurança será determinada expedição de guia de execução à autoridade de saúde competente, promovendo-se a inserção dos dados no Cadastro Nacional de Saúde”.

[5] Tal como ocorreu com as instituições destinadas à aplicação de medidas socioeducativas de internação para crianças e adolescentes: a nomenclatura atual é Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (CASA), antes denominada Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor (FEBEM).

[6] O art. 5º, XLIII, da, CF considera crimes insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos. O debate a respeito da aplicação deste dispositivo ao indulto, bem como sobre a constitucionalidade da proibição do indulto aos crimes hediondos e equiparados foge aos limites deste trabalho.

[7] Art. 26, CP - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

[8] A ementa contém erro de digitação, pois o Decreto 6706 é de 2008, e não de 1998. O acórdão respectivo repete o erro diversas vezes.

[9] O intenso debate doutrinário a respeito das finalidades da pena não é objeto do presente estudo. Ainda assim, deve-se ressaltar que a doutrina majoritária não reconhece finalidades retributivas à pena, que teria tão-somente finalidades preventivas. Por todos, é o pensamento de Roxin (1993). Por outro lado, a realidade da execução penal insinua que a verdadeira finalidade perseguida com a pena é a retribuição, ou antes, a vingança pura e simples, apesar de todo o discurso constitucional em sentido contrário. Nesse sentido, cf Duek Marques (2008) e Figueiredo (2014).

[10] Art. 2º, da CF - São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

[11] Art. 196, da CF - A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

[12] As regras para o indulto são elaboradas pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), com a participação da sociedade, do Ministério Público e dos órgãos dos Poderes Judiciário, Executivo e Legislativo. A proposta é submetida ao Ministro da Justiça e, em caso de aprovação, a mesma é encaminhada para a sanção da Presidência da República (BRASIL, 2014).

Sobre as autoras
Michele Cia

Graduada em Direito pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, especialista em Didática do Ensino Superior pela Faculdade de Americana e mestre em Direito pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Doutoranda em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Advogada e membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. É pesquisadora do Núcleo de Estudos da Tutela Penal dos Direitos Humanos (NETPDH) e parecerista da Revista de Estudos Jurídicos da UNESP, ambos vinculados ao Programa de Pós-Graduação em Direito da UNESP. É membro do Grupo de Pesquisa Criminologia e Vitimologia, ligado ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito da PUC-SP. Professora e coordenadora do curso de Direito da Libertas – Faculdades Integradas.

Stefânia Tubaldini Chagas

Graduada em Direito pela Libertas – Faculdades Integradas.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CIA, Michele; CHAGAS, Stefânia Tubaldini. Indulto presidencial como estratégia para imposição de limites máximos à duração das medidas de segurança. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4425, 13 ago. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/41691. Acesso em: 7 nov. 2024.

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