Recentemente participei de um treinamento sobre gestão de pleitos em Projetos e Obras, o que me instigou a expressar meu ponto de vista.
De início, procurei na lista de participantes do curso a característica dos interessados neste tema como forma de “amostragem” daquele público alvo.
Éramos em 28, sendo 25 vendedores de serviços (construtoras e empresas de engenharia) e 3 compradores de serviços (sendo um ente público e somente eu e mais uma colega de entes privados), ou seja, a maioria absoluta formada por quem vende o serviço e que, em regra, formula pleitos.
Tive a grata sorte de trabalhar, nos últimos 15 anos e de maneira ininterrupta, em projetos dos mais variados portes, mas gostaria de destacar a atuação em mega projetos (assim considerando aqueles com orçamento superior a um bilhão de reais).
Ainda que revestidos de toda a formalidade peculiar aos grandes investimentos, tenho percebido ao longo dos anos que os Projetos no Brasil têm sido aprovados, cada vez mais, com menos grau de certeza e assertividade nas quantidades e variáveis que impactam em prazo e custo.
A falta de planejamento tem transformado a agilidade em “pressa” e o “fast-track” em “correria”. Leva-se o projeto até a suas datas mais tarde para uma tomada de decisão e, desse modo, pressiona-se as equipes de engenharia a gerar dados para balizamento de orçamentos cada vez mais incertos.
Não delongando em apenas um dos nossos dramas, passo a tratar do reflexo desta “pressa” na questão objetiva dos pleitos.
Um pleito pode se definir em linhas gerais como sendo “reivindicação de direitos expressos em contrato para o ressarcimento de perdas, tendo como base as obrigações entre as partes para assegurar o equilíbrio econômico-financeiro da obra”.
Desse modo, não há como se obrigar os fornecedores à execução de alterações de projetos “a posteriori” e seus respectivos aumentos de quantitativos sem contar com eventuais reclamações de reequilíbrio e, ainda, considerar-se injusto tal pleito, sem uma análise criteriosa das razões que levaram a tal fato. Parece até ingênuo, senão de contestável boa-fé, o entendimento de que nossos fornecedores têm que absorver as incertezas e lacunas de Projetos sem a maturidade requerida, ignorando os custos decorridos.
O pleito em si configurado, deve ser tratado de maneira específica, tempestiva e dura, tendo em vista que a protelação de sua solução impacta os principais objetivos do projeto, em destaque, o orçamento e o cronograma.
A eficiência da gestão de pleito não deve ser medida pela “busca do pleito zero”, mas pela tempestividade das suas tratativas e pela organização da equipe de projetos na sua gestão. Também parece-me um pouco ingênuo acreditarmos que em projetos, especialmente os de grande porte, não haverá qualquer tipo de reclamação desta ordem. Mas, pasmem, já vi metas de “Pleito Zero”!!!
Não querendo ser pretencioso ao ponto de considerar esta manifestação de entendimento como sendo um artigo ou algo que o valha, seguem algumas reflexões que considero importante nos questionarmos:
- Nossa comunicação é eficiente? Recentes pesquisas na área nos mostram que comunicação é uma das maiores preocupações em projetos. Será que todos de nosso time têm informação boa, atualizada e na medida das suas atribuições?
- Trabalhamos com equipes realmente multidisciplinares? Os vendedores de serviços têm, cada vez mais, apoio jurídico e o que percebo é que, em alguns casos, quem compra serviços ainda vê seus advogados como “mal necessário”. Não há como segregar a importância do conhecimento técnico específico das equipes, sejam Engenheiros, com toda sua expertise, ou do corpo Jurídico, com toda uma estratégia preventiva (proativa) ou defensiva (reativa), seja pelo lado do contratante ou do contratado.
- Temos uma gestão de documentação realmente eficaz? E aí não me refiro aos CDOCs, cada vez mais automatizados, mas, sim, a uma gestão sistemática dos documentos que explicitam escopo, prazo e custo, bem como fundamentam as obrigações entre as partes (contratos, especificações, propostas consolidadas, atas de reunião, e-mails etc.)
- Nossas equipes conhecem de gestão de contratos? Não é necessário uma equipe de experts, mas conhecimentos básicos podem fazer muita diferença se aplicados em tempo;
- Conhecemos na íntegra o escopo de nossos projetos? Não são raros os casos de lacunas de escopo ou desconhecimento dos limites de responsabilidade de cada stakeholder.
- E, por fim, estamos sendo “fair” nas relações de fornecimento? Não podemos achar que, quando as tais lacunas existem, nossos pedidos fora de contexto aos nossos prestadores serão atendidos sem custos adicionais. Projetos devem ter contingências!
Bem, poderia ficar horas tecendo comentários e observações, mas concluo tentando fazer menção ao que entendo ser a causa.
Enquanto continuarmos sacrificando a engenharia brasileira com avaliações e estudos realizados com base crua e focada fortemente no retorno do investimento em detrimento de bons projetos conceituais, básicos e executivos, vamos continuar tendo salas de treinamento repletas de interessados em “aprender” sobre defesa de pleitos, e projetos com elevados riscos de não serem concluídos dentro dos limites de custo e prazo, comprometendo, deste modo, os resultados esperados por seus invetidores.
Necessária se faz a consolidação de um modelo de gestão de contratos em projetos e obras, aproximando efetivamente as equipes de Engenharia e Jurídica, formando um grupo coeso e com ampla cobertura multidisciplinar nas variáveis que envolvem os projetos de investimento.