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O direito ao esquecimento: a influência da informação na vida social

No presente artigo se faz uma análise do sistema tecnológico, com vistas a, por meio do método indutivo-dedutivo, concluir que o direito ao esquecimento é insofismável a qualquer pessoa.

1 Introdução

                   Desde muito tempo a sociedade batalha pela garantia de seus direitos, conquistados ao longo da evolução histórica de um povo, e, aos poucos, constitucionalizados. Isso se dá, principalmente, porque o que há de mais importante é a pessoa humana, tanto que, em nosso direito, a dignidade da pessoa humana detém especial atenção, tendo sida consagrada como fundamento do nosso Estado, nos termos do inciso III do art. 1º da Constituição Federal.

                   Dentre tantos direitos conquistados verifica-se, hodiernamente, questão muito discutida dizendo respeito à tecnologia e sua evolução. A tecnologia apresenta-se exponencialmente através dos diversos meios a publicidade, sendo a informação, dela decorrente, apresentada, muitas vezes, de forma exagerada e, até mesmo, prejudicial.

É inegável que a facilidade na comunicação beneficia a humanidade de uma maneira geral, fornecendo uma melhoria, ainda que artificial, além de erradicar vários males como a ausência de informação, liberdade de expressão, transparência nos governos, entretenimento, educação, entre outros.

Ocorre que o excesso de informação, ou como alguns preferem nomear, o superinformacionismo, nem sempre se mostra positivo. Nesta toada, Cintra, Grinover e Dinamarco, sobre o princípio da publicidade nos atos processuais, dizem que: [...] toda precaução há de ser tomada contra a exasperação do princípio da publicidade. Os modernos canais de comunicação de massa podem representar um perigo tão grande como o próprio segredo (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2006, p. 75).

            Em verdade, nossas reflexões se voltam a um fenômeno contemporâneo que se denomina sociedade da informação. Nesta senda, o conceito de superinformacionismo está conectado a esse contexto em que a sociedade se encontra, ou seja, uma busca na internet revela mais informações do que se imagina.

            Em virtude dessas considerações, percebe-se que se apresentam não são apenas dados coletados com facilidade, mas também informações que expõem as pessoas. Não obstante, o avanço tecnológico se faz acompanhar de dois fatores preocupantes. O primeiro guarda relação com a velocidade na propagação da informação, e, o segundo, com a capacidade de armazenamento, cuja característica é fazer com que a informação a se divulgar seja permanentemente preservada.

            Como se depreende, algumas indagações surgirão como: Se não existe direito absoluto, qual limite para o superinformacionismo? Como ficam a intimidade e a privacidade das pessoas que se sentem violadas pelos meios de comunicação em massa e não conseguem remover o conteúdo? Até que ponto se pode invadir, destruir e divulgar a personalidade? A pessoa que cometeu crime e cumpriu sua pena integralmente, fica desobrigada aos olhos da sociedade? O excesso de publicidade bem como as pressões impostas sobre os figurantes do “drama judicial” interfere nas decisões do Poder Judiciário? Existe diferença entre opinião pública e opinião publicada?

            As respostas para tais perguntas não são simples, visto que o pivô da discussão gira em torno da dignidade da pessoa humana e da efetiva tutela dos direitos fundamentais. Em linhas gerais, este texto procura demonstrar que o direito ao esquecimento se deve medir de maneira que não justifique a censura e nem atente ao princípio da liberdade de manifestação do pensamento.

  1. O direito à liberdade de expressão, de informar e ser informado

            Os direitos à liberdade de expressão e informação, entre outros direitos, são fundamentais, na categoria direitos individuais, conforme a Constituição Federal de 1988:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, liberdade, igualdade, segurança e a propriedade, nos termos seguintes: [...] IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; V- é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; [...] IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; [...] XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer; XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional; LX – a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou interesse social o exigirem (BRASIL, 2014, p. 22-27).

            Sobre a proteção ao pensamento e a vedação à censura, a Carta Magna prevê:

Art. 220 A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. [...] § 2º - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística (BRASIL, 2014, p. 76).

            Apesar de a Constituição deixar muito ampla a proteção ao direito de se expressar, emitir e receber informação, é importante perceber que há limitações em seu gozo. Esse mesmo limite existente, também se aplica ao critério temporal de uma informação, conforme pontua Alexandre de Moraes:

O direito de receber informações verdadeiras é um direito de liberdade e caracteriza-se essencialmente por estar dirigido a todos os cidadãos, independentemente de raça, credo ou convicção político-filosófica, com a finalidade de fornecimento de subsídios para a formação de convicções relativas a assuntos públicos. A proteção constitucional às informações verdadeiras também engloba as eventualmente errôneas ou não comprovadas em juízo, desde que não tenha havido comprovada negligência ou má-fé por parte do informador. A Constituição Federal não protege as informações levianamente não verificadas ou astuciosas e propositadamente errôneas, transmitidas com total desrespeito à verdade, pois as liberdades públicas não podem prestar-se a tutela de condutas ilícitas. A proteção constitucional à informação é relativa, havendo necessidade de distinguir as informações de fato de interesse público, da vulneração de condutas íntimas e pessoais, protegidas pela inviolabilidade à vida privada, e que não podem ser devassadas de forma vexatória ou humilhante (MORAES, 2004, p. 252).

            Sobre o tema, José Afonso da Silva reforça:

Liberdade de informação jornalística – É nesta que se centra a liberdade de informação, que assume características modernas, superadoras da velha liberdade de imprensa. Nela se concentra a liberdade de informar, e é nela ou através dela que se realiza o direito coletivo à informação, isto é, a liberdade de ser informado. Por isso, é que a ordem jurídica que lhe confere um regime específico que lhe garanta a atuação e lhe coíba os abusos (SILVA, 2005, p. 246).

            A propósito da liberdade de imprensa, cabe recordar as palavras de Karl Marx, expostas por José Afonso Silva:

[...] a imprensa livre é o olhar onipotente do povo, a confiança personalizada do povo nele mesmo, o vínculo articulado que une o indivíduo ao Estado e ao mundo, a cultura incorporada que transforma lutas materiais em lutas intelectuais, e idealiza suas formas brutas. É a franca confissão do povo a si mesmo, e sabemos que o poder da confissão é o de redimir. A imprensa livre é o espelho intelectual, no qual o povo se vê, e a visão de si mesmo é a primeira confissão da sabedoria [...][1] (MARX apud SILVA, 2005, p. 246).

            Sobre o assunto em tela, o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais assim se pronunciou em recente julgado:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO INDENIZATÓRIA - DANOS MORAIS - CERCEAMENTO DE DEFESA - INOCORRÊNCIA - MANIFESTAÇÃO PESSOAL EM REDE SOCIAL - CRÍTICA À ATUAL ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL - LIBERDADE DE EXPRESSÃO DO PENSAMENTO - DIREITO DO CIDADÃO - AUSÊNCIA DE EXCESSO - ILÍCITO NÃO CONFIGURADO - RESPONSABILIDADE CIVIL - INEXISTÊNCIA - DEVER DE INDENIZAR AFASTADO. I- Se a produção da prova requerida afigura-se desnecessária à composição da lide, eis que as demais provas produzidas nos autos são suficientes à formação da convicção do juízo para o julgamento, sem violação ao contraditório e à ampla defesa, não há que se falar em cerceamento de defesa. II- No momento em que alguém passa a exercer um cargo público, em especial um cargo de relevo político e de destaque no âmbito municipal como o ocupado pelo autor (Prefeito), os atos praticados no exercício do mencionado cargo passam a interessar a toda uma coletividade, e, dessa forma, podem ser alvo de críticas e ataques. Tem-se que o homem público, como o Prefeito, deve suportar críticas e insinuações acima do que há de suportar aquele que não assume tais responsabilidades. III- O direito à liberdade de manifestação do pensamento está consagrado na Constituição da República (art.5º, IV), encontrando-se protegida, portanto, a livre manifestação da opinião, e proibida a censura, sem que haja abuso desse direito a ponto de violar a imagem e a honra das pessoas envolvidas. Tem-se que o direito de crítica, enquanto manifestação do direito de opinião, traduz-se na apreciação e avaliação de atuações ou comportamentos de outrem, com a correspondente emissão de juízos racionais apreciativos ou depreciativos. IV- Inexistiu excesso por parte do réu na manifestação do seu pensamento, capaz de violar a imagem ou a qualquer direito da personalidade do autor, pois se trata de crítica feita à Administração Municipal como um todo, sem referência específica à sua pessoa ou seu cargo. V- Não configurado o excesso em opinião divulgada no facebook relativa à administração pública municipal, não há que se falar em lesão à honra do então Prefeito.  (TJMG -  Apelação Cível 1.0567.13.006360-3/001, Relator(a): Des.(a) João Cancio , 18ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 15/07/2014, publicação da súmula em 17/07/2014) (BELO HORIZONTE, 2014, p. 01).

  1. A influência da opinião pública no sistema judiciário

            A publicidade no processo é uma arma eficaz na defesa dos direitos individuais e coletivos, eis que atua como um elemento fiscalizador no exercício da jurisdição. Ao lado dessa publicidade ampla existe também a publicidade restrita às partes e aos seus patronos, pois garante os interesses dos indivíduos contra os males dos “juízos secretos”, além de evitar o excesso de informação.

Sobre a publicidade dos atos judiciais, a Constituição Federal dispõe, no inciso IX do art. 93 que:

[...] todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação (BRASIL, 2014, p. 54).

Acontece muitas vezes que o tribunal se torna o centro das atenções. A opinião pública, expressa através dos diversos meios de comunicação, ou ainda a opinião “publicada pela imprensa” submete os julgadores a pressões diretas e indiretas que acabam por refletir em suas decisões.

            Nesse sentido, observa-se uma tensão envolvendo a independência judicial e a opinião pública, a qual gera grande discussão. Há correntes defensoras de que os juízes não podem nem devem ser “surdos” à opinião pública, pelo contrário, devem levá-la a sério, e, em muitos casos, dela extrair a motivação de suas decisões. Esse entendimento se justificaria pela ideia de que as instituições dependem da credibilidade da sociedade, logo, não se deveria desconsiderar as visões hegemônicas para que não haja o enfraquecimento institucional, conforme visualizamos a seguir:

            O Judiciário tem de saber o que sente e o que pensa a população, mas não pode decidir apenas em favor da opinião pública, contra o que está na lei e na Constituição. “[...] Tem havido algumas coincidências entre o que pede a população e o que decide o Judiciário, mas elas nem sempre coincidem. Esse dado mostra que a opinião pública está mais instruída. O país está evoluindo” (CALSING, 2012, p. 01).

            Já a Delaíde Arantes, do Tribunal Superior do Trabalho, refuta a ideia de que o Judiciário tenha que se deixar permear pelo que dizem os jornais, nesse sentido: “[...] Considero que não se deve julgar pela mídia, mas claro que deve haver uma aproximação entre Justiça e sociedade, para haver um diálogo, sempre no sentido da cidadania” (ARANTES, 2012, p. 01).

            Fomentando o tema, afirmara o professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais, Fernando Filgueiras:

[...] Uma das características desejáveis para o Poder Judiciário, para o liberalismo, é que ele seja imune aos interesses políticos e privados, assim como o processo de decisão realizado pelos juízes seja surdo ao clamor da opinião pública. Um dos preceitos fundamentais do liberalismo político é que o Poder Judiciário seja despolitizado, de forma que suas decisões ocorram na letra fria da lei e que, desse modo, ocorra a justiça como resultado final do processo judicial. O que se defende, portanto, é que o processo decisório da magistratura seja procedimental, uma vez que se atenha aos procedimentos e regras estipulados em códigos de processo e de conduta dos juízes. Se a justiça é o objetivo final, para o liberalismo ela deve ser desprovida da política e de qualquer concepção moral dos valores. Se a justiça vincular-se a qualquer valor supremo, tal como os valores religiosos, por exemplo, o risco é que ela sirva para que uma maioria que defenda esses valores imponha suas preferências a uma minoria contrária a esses valores. O resultado é que a justiça acaba servindo de instrumento de opressão contra as minorias. Um Judiciário imune aos clamores da opinião pública, portanto, é mais do que desejável para que a justiça possa, de fato, ser concretizada (FILGUEIRAS, 2012, p. 01).

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            Corroborando a ideia, sustenta Marco Aurélio Bellizze:

Há quem pense que as decisões do STF, para serem legítimas, têm que ser conforme a opinião pública. Mas o que é a opinião pública? O que chega até o Judiciário é a opinião pública ou a opinião publicada? [...] O mais importante é o interesse público. A opinião pública tem sede de vingança social (BELLIZZE, 2012, p. 01).

            Para essa última corrente o Judiciário, como agente imparcial e detentor de garantias, deve estar apto a arcar com os ônus decorrentes de decisões impopulares, logo, a opinião pública não pode ser um fator relevante na formação da convicção judicial.

            A fim de tentar elucidar o presente impasse, é imperativo analisar de forma crítica o conceito de “opinião pública”, que, a princípio, seria aquela opinião definida pelo posicionamento da maior parte, ou da parte mais influente, dos indivíduos de uma comunidade, sobre um determinado assunto controvertido.

            Em certas situações, a opinião hegemônica dos cidadãos surge espontaneamente e, em sequência, se torna fonte de emissão e recepção na mídia tradicional. Por outro lado, há momentos em que ocorre o oposto, isto é, as visões dos agentes controladores da mídia influenciam e determinam a opinião dos telespectadores. 

            Já quando a posição popular é objeto de pesquisas, há o risco de produzir resultados artificiais, seja porque quando se indaga sobre temas polêmicos as pessoas tendem a emitir julgamentos relativos a assuntos os quais não refletiram ou que desconhecem, seja porque o próprio processo de inquirição, eventualmente, sugere as respostas.

            Haja vista todos esses problemas, definir o grau de aprovação popular de uma decisão judicial não é um trabalho simples, pois muitas vezes não haverá meios suficientes para distinguir com segurança a motivação das supostas opiniões sobre o assunto.

            Convém notar ainda que o Poder Judiciário defende numerosos casos de interesse de grupos à margem da sociedade. Nessa esteira, entender que os magistrados devem observar a opinião social se mostra, muitas vezes, como negação da legitimidade dos direitos constitucionalmente consagrados e da função de julgar.

            Dessa forma, de nada valeria ouvir a opinião pública e não levá-la em conta, porém, ouvir e decidir sob a influência majoritária rebaixa a independência do Judiciário, que se perfaz por sua autonomia, envolvendo, inclusive, sua imparcialidade política e sua capacidade de resguardar os direitos de quem não tem o controle majoritário.

            Foi com o intuito de preservar os interesses dos indivíduos, o legislador infraconstitucional previu que a regra geral do princípio da publicidade:

Art. 155 - Os atos processuais são públicos. Correm, todavia, em segredo de justiça os processos: I - em que o exigir o interesse público; II - que dizem respeito a casamento, filiação, separação dos cônjuges, conversão desta em divórcio, alimentos e guarda de menores (BRASIL, 2014, p. 385).

     Os exemplos de limitação do princípio não param por aí. No Código de Processo Penal, o artigo 483 dispõe sobre o sigilo que deve haver na votação do Conselho de Sentença do júri, no que se refere aos quesitos.

      Já o art. 792, em seu §1º, também do Código de Processo Penal, regulamenta que:

Art. 792. As audiências, sessões e os atos processuais serão, em regra, públicos e se realizarão nas sedes dos juízos e tribunais, com assistência dos escrivães, do secretário, do oficial de justiça que servir de porteiro, em dia e hora certos, ou previamente designados. § 1º Se da publicidade da audiência, da sessão ou do ato processual, puder resultar escândalo, inconveniente grave ou perigo de perturbação da ordem, o juiz, ou o tribunal, câmara, ou turma, poderá, de ofício ou a requerimento da parte ou do Ministério Público, determinar que o ato seja realizado a portas fechadas, limitando o número de pessoas que possam estar presentes [...] (BRASIL, 2014, p. 658).

            Pelos motivos apresentados, existe o sigilo nas investigações dos grupos de organização criminosa (Lei 12.850, de 02 de agosto de 2013) e nos inquéritos policiais (art. 20 do Código de Processo Penal). No Entanto, o Estatuto da Advocacia, (lei n. 8.906, de 04 de julho 1994) estabelece entre os direitos do advogado o de “[...] examinar em qualquer repartição policial, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de inquérito, findos ou em andamento, ainda que conclusos á autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos [...] (art. 7º, inciso XIV)” (BRASIL, 2014, p. 1023). Bem como:

[...] ingressar livremente nas salas e dependências de audiências, secretarias, cartórios, ofícios da justiça, serviços notoriais e de registro, e, no caso de delegacias e prisões, mesmo fora da hora de expediente e independentemente da presença de seus titulares. (artigo 7º, inciso VI, alínea b) (BRASIL, 2014, p. 1.023).

  1. O direito ao esquecimento e a pena perpétua

            O direito ao esquecimento já existe há algum tempo, porém, é mais simples identificá-lo no direito penal. Aquele que julgado, condenado, cumpriu a pena, tem o direito de que os registros sobre aquele fato não sejam utilizados de forma permanente contra ele, em virtude do princípio do nom bis in idem[2]. Além disso, o ex-condenado tem direito de requerer a reabilitação após 02 (dois) anos do dia em que a pena for extinta ou quando terminar sua execução (art. 94, Código Penal), voltando a ter bons antecedentes criminais.

            Nota-se, igualmente, que o direito ao esquecimento não surge apenas nos casos de condenação, mas também em situações nas quais o sujeito, mesmo antes do devido processo legal, acaba por ter sua condenação em razão da opinião pública, bem como naqueles casos que não serão, sequer, alvo de apreciação judicial. A propósito, desenvolvendo a dinâmica aqui pretendida, a Constituição Federal, na alínea b, do inciso XLVII, do art. 5º estabalece:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XLVII – não haverá penas: [...] b) de caráter perpétuo (BRASIL, 2014, p. 26).

            Tenha-se presente que a garantia constitucional não se restringe apenas a prisão, isto é, o encarceramento propriamente dito, mas se refere à própria pena.

            Nesse prisma, não há que se confundir pena com sanção, pois a melhor doutrina é unânime no sentido de relacionar pena ao direito criminal, mas se mostra claro, no texto em epígrafe, a pena mencionada tem o teor de sanção, ou seja, não se restringe apenas à esfera criminal, mas a todo arcabouço de ônus que pode sofrer o cidadão para pacificação social.

            Infere-se, nesse contexto, que o sujeito sofre punição pela sociedade, até mesmo inocente ou sem ser processado, e, correlatamente, os efeitos da pena, ou como dito alhures, a sanção, o que degrada seu ser. É bom lembrar, o tratamento degradante, constatado neste caso, é vedado pela Constituição nos termos do inciso III do art. 5º.

            Ademais, o princípio do non bis in idem, que veda mais de uma condenação do sujeito pela mesma infração, trata-se de uma questão afeta à dignidade da pessoa. Com efeito, a garantia fundamental do esquecimento possui raiz constitucional e legal, haja vista constituir uma vertente da dignidade da pessoa humana, do direito à vida privada, à intimidade, honra e imagem, consagrados na Carta da República de 1988 (artigos 1º, inciso III e art. 5º, inciso X, respectivamente) e no Código Civil Brasileiro (art. 21), devendo ser enfrentada em sua abstração máxima e aplicação factual, a partir de todos os ramos do Direito, dentre os quais, o constitucional ocupa papel norteador superior.

            Nesse horizonte, o direito em análise (ao esquecimento), deverá ser aplicado no âmbito trabalhista quando da contratação de um candidato que já foi demitido por justa causa, e na seara cível, em que a pessoa não pode ter seu nome negativado por mais de cinco anos nos cadastros de proteção ao crédito, ainda que não haja o pagamento da dívida, entre outros.

            Deve-se invocar também, tal direito, quando há excesso de informação, pelos meios de comunicação em massa, como no caso de um extravio de um dispositivo eletrônico onde havia fotos e vídeos em situações comprometedoras que acabam por ser publicadas na internet.

            A questão não se exaure nesses modelos. Em muitas ocasiões a imprensa, na busca de audiência, faz críticas infundadas, anuncia acontecimentos e nem sempre ouve todos os envolvidos, derivando-se disso, logo, um pré-julgamento, o que induz aqueles que têm acesso à informação a formarem uma opinião equivocada, muitas vezes, sobre determinada matéria.

            É óbvio que todos envolvidos nas situações ora descritas anseiam por verem tais informações eliminadas da internet e/ou de qualquer ambiente virtual. No Brasil, será necessário uma ação por parte da pessoa interessada que queira se ver livre de uma informação inverídica, difamadora, caluniosa ou injuriosa a seu respeito, uma inexistir nenhum dispositivo ao alcance do cidadão que possibilite a remoção de qualquer conteúdo sem a intervenção da Justiça.

            A título de conhecimento, em maio deste ano, foi aprovada na Europa, a chamada Lei do Direito de ser Esquecido. A norma em questão tem como foco a regulamentação do armazenamento na internet de dados pessoais que não são de interesse público. Visa estabelecer meios para apagá-los de redes sociais com a simples notificação do usuário, isto é, sem a intervenção do poder Judiciário.

            Aqui no Brasil, existe o Projeto de Lei de nº 7881[3], apresentado à Câmara dos Deputados no dia 06 de agosto de 2014, do qual é relator o Deputado Federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Esse projeto se encontra também na Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática. Em suma, o art. 1º, prevê que: “Art. 1º. É obrigatória a remoção de links dos mecanismos de busca da internet que façam referência a dados irrelevantes ou defasados, por iniciativa de qualquer cidadão ou a pedido da pessoa envolvida” (BRASIL, 2014, p. 01).

            Assim sendo, os cidadãos que não gozam de condição de personalidade pública, ou que não sejam objeto de um fato de relevância pública devem poder optar entre, ter ou não, seus dados pessoais disponíveis na internet.

            É fácil perceber que se há um direito público em baila, ou seja, um interesse público da sociedade, não poderia o indivíduo reivindicar o direito ao esquecimento, mesmo que já tenha passado muito tempo de sua ocorrência. No entanto, ainda que nessas condições, estar-se diante de uma linha tênue, pois o caso concreto merecerá análise minuciosa para que seja possível determinar se realmente se trata de um interesse público (coletivo) apto a predominar sobre o privado (individual).

            É comum ainda, com a digitalização de acervos de publicações, virem à tona episódios que, no decorrer do tempo, há muito se esqueceu.  A pessoa que cometeu um crime e que já cumpriu integralmente a pena pode conseguir ascensão social e gozar de boa reputação. Entretanto, com a digitalização do acervo, o fato pode voltar a circular por meio da internet, trazendo problemas à pessoa envolvida, que se vê novamente no tormento de um ilícito há muito quite perante a justiça, mas que a sociedade encara de outro modo.

            A internet proporciona uma facilidade que não se encontra quando se pesquisa nos meios físicos, ou seja, poder-se-ia argumentar que a informação sempre esteve disponível, bastava que qualquer pessoa procurasse obtê-la.

            A questão central, no entanto, não gira em torno da quantidade de informações que a internet pode armazenar sobre determinada pessoa, mas sim, que se tornem eternas. Dessa forma, não se trata de suprimir direitos consagrados como o da comunicação ou da informação, mas que todo cidadão também tenha direito ao esquecimento.

            A discussão não se resume se a informação não deve constar do mundo virtual, mas pode existir no mundo físico, ou seja, não pode existir em sites, mas pode existir impressa em um jornal ou revista. A pretensão do cidadão de não ver publicações e informações a seu respeito na internet é totalmente legítima, principalmente quando o que está disponível no mundo virtual não ocorreu por sua vontade, mais ainda, quando não é possível identificar o interesse público.

            Os provedores de serviço podem manter dados dos usuários quando lhes é dada a permissão. No entanto, devem ter transparência na apresentação dos serviços, informar quem os publica, como se armazenam tais informações e qual a finalidade, o que não ocorre na atualidade.

            O direito ao esquecimento, no contexto do direito norte-americano como the right to be alone, garante que as informações de seus usuários somente serão conservadas em seus bancos de dados durante o tempo necessário para suas finalidades e unicamente para identificação do usuário.

            Pode-se afirmar, que com o funcionamento inerente à grande rede, se o sistema não mudar, toda publicação realizada na internet ficará à disposição para todo o sempre. Entretanto, se estuda que a pena perpétua é uma medida extrema, não aceita no Brasil.

            Mesmo no direito penal, em que o indivíduo, em tese, comete delitos graves, se tem como objetivo, por meio de suas punições, ainda que em tese, a reintegração social e recuperação daquele que cometeu o ato ilícito. Assim, evidente que o indivíduo, quando confrontado em outras searas do direito poderá invocar o esquecimento. Como se depreende, sempre haverá argumentação no sentido de que esse ou aquele não têm condições de retornar à sociedade, mas a função primordial do direito penal deve ser vista de maneira genérica com a punição do indivíduo para que este pague sua dívida junto à sociedade e tenha oportunidade de vir a conviver pacificamente outra vez em coletividade.

  1. Os direitos e garantias fundamentais

            A rigidez de uma Constituição, caracterizada por um processo mais árduo do que o ordinário quando da alteração de suas normas, traz como consectário o atributo da supremacia, consistente na premissa de que toda norma existente dentro do ordenamento deve guardar a mais fiel correlação com a norma fundamental.

            A Constituição tem funções sociológicas, políticas e jurídicas. Com a função sociológica ela se aproxima do poder social, sendo concebida como fato social, e não como norma propriamente dita.  A Carta Magna é fruto do momento histórico da época de sua elaboração, de sua realidade social e das forças que exercem o poder na sociedade. A representação do poder pode se dar por meio de uma Constituição escrita como é o caso do Brasil. Mas não pode ficar apenas no papel, como enfatiza Michel Temer:

Representante mais expressivo do sociologismo jurídico é Ferdinand Lassalle, que, em obra clássica, sustentou que a Constituição pode representar o efetivo poder social ou distanciar-se dele; na primeira hipótese ela é legítima; na segunda, ilegítima. Nada mais é que uma ‘folha de papel’. A sua efetividade derivaria dos fatores reais do poder. A Constituição efetiva é o fato social que lhe dá alicerce. Assim, a ‘folha de papel’ – a Constituição – somente vale no momento ou até o momento em que entre ela e a Constituição efetiva (isto é, aquele somatório de poderes gerador ‘folha de papel’) houver coincidência; quando tal não ocorrer, prevalecerá sempre a vontade daqueles que titularizam o poder. Este não deriva da ‘folha de papel’, da Constituição escrita, mas dos fatores reais de poder (TEMER, 2010, p. 22).

            Ressalte-se, para que haja a concretização das normas constitucionais, isto é, para que a Constituição não seja simplesmente um “pedaço de papel”, na aplicação de seus dispositivos, deve-se reservar conceitos que exijam uma maior dose de subjetividade, para alguns conceitos imprescindíveis na efetivação da norma. Dessa forma, esses “novos conceitos”, quando de um caso concreto, poderão impedir algum entendimento contrário a Constituição. A título de exemplo, o princípio da dignidade da pessoa humana, que sempre deve ser interpretado com uma precisão cirúrgica de modo a atingir o fim que se deseja jurídica, política e socialmente falando.

            Nesse contexto, imposta mencionar Jorge Miranda, citado por Alexandre de Moraes ao conceituar as normas programáticas:

[...] são de aplicação diferida, e não de aplicação ou execução imediata; mas do que comandos-regras, explicitam comando-valores; conferem elasticidade ao ordenamento constitucional; tem como destinatário primacial - embora não único - o legislador, a cuja opção fica a ponderação do tempo e dos meios em que vêm a ser revestidas de plena eficácia (e nisso consiste a discricionariedade); não consentem que os cidadãos ou quaisquer cidadãos as invoquem já (ou imediatamente após a entrada em vigor da Constituição), pedindo aos tribunais o seu cumprimento só por si, pelo que pode haver quem afirme que os direitos que dela constam, máxime os direitos sociais, têm mais natureza de expectativas que de verdadeiros direitos subjetivos; aparecem, muitas vezes, acompanhadas de conceitos indeterminados ou parcialmente indeterminado[4] (MIRANDA apud MORAES, 2011, p. 14).

            De antemão, importa salientar que nenhum princípio tem primazia sobre os demais, mesmo assim, o uso da ponderação entre princípios, bem como a reserva de conceitos de alguns comandos-regras, mostram-se necessários ao ordenamento jurídico.

            Neste cenário em que se situa a ponderação de interesses conflitantes encontram-se os direitos em questão, de um lado os direitos da comunicação, da publicidade, da informação, e do outro, a intimidade, a vida privada, a honra, a imagem das pessoas, o esquecimento e o fundamento do Estado, a dignidade da pessoa humana, entre outros.

            Sobre o princípio da liberdade da expressão e da informação destaca-se porque a comunicação teve um crescimento significativo nas últimas décadas, inclusive com o surgimento dos meios virtuais e equipamentos eletrônicos multifuncionais, o que confirma que a comunicação é um direito muito importante.

            Relaciona-se intrinsecamente ao direito de comunicar-se o acesso à informação, e isso possibilita uma livre circulação de ideias, o que faz com que o cotidiano de milhares de pessoas torne-se público. Contudo, o fenômeno faz nascer o direito que o sujeito tem de ver excluídas essas informações.

            O conceito cidadania, conforme se observa, perpassa os meios de comunicação, que no fundo acaba por ressaltar o poder das massas e restaurar um equilíbrio que há tempos não se dispunha. Ocorre, todavia, em várias situações, o indivíduo discute e repassa muito mais informações negativas do que positivas, promovendo-se, logo, um conflito entre direitos.

            Os direitos de informar e de comunicar, portanto, estarão em constante choque com os direitos atinentes à pessoa, em especial, ao esquecimento, o que requer maior precaução quando do exercício de um papel informador.

            A Constituição Federal de 1988 elevou a tutela e promoção da pessoa humana a um valor máximo, que comina com a dignidade do homem que é inviolável. Assim, reivindica-se o respeito dos direitos da pessoa humana em sua plenitude, já que o ser humano é o ponto central de todo o sistema jurídico.

6 O conflito aparente de normas e sua resolução

            É de opinião unívoca, conforme exposto alhures, inexistir hierarquia entre direitos fundamentais, visto nenhum direito estar acima do outro. Assim, há que se fazer um sopesamento dos direitos em contradição quando da análise do caso concreto, visto que toda pessoa tem direito de resguardar sua intimidade, vida privada, honra e imagem, em nome, sobremaneira, da sua dignidade.

Para Robert Alexy, quando do conflito horizontal de direitos fundamentais, no qual um dos princípios fundamentais deverá ser aplicado, deve-se ter cautela extrema, já que:  

Se dois princípios colidem – o que ocorre, por exemplo, quando algo é proibido de acordo com um princípio e, de acordo com outro, permitido – um dos princípios terá que ceder. Isso não significa, conduto, nem que o princípio cedente deva ser declarado inválido, nem que nele deverá ser introduzida uma cláusula de exceção. Na verdade, o que ocorre é que um dos princípios tem precedência em face do outro sob determinadas condições. Sob outras condições a questão da precedência pode ser resolvida de forma oposta. Isso é o que se quer dizer quando se afirma que, nos casos concretos, os princípios têm pesos diferentes e que os princípios com maior peso tem precedência [...] (ALEXY, 2008, p. 93-94).

            Observa-se in casu (em caso), que o direito de comunicação e informação estará em constante conflito com os direitos inerentes à pessoa humana. Deste modo, o caso concreto fornecerá os elementos necessários para que o operador do direito tenha condições de estabelecer a exata medida de se haver a prevalência dos direitos de comunicação e informação, ou da intimidade, da vida privada, bem como dos demais aqui trabalhados.

            Sobre o tema, não existe nenhuma regra que possa ser aplicada a todos os casos igualmente, pois cada qual tem sua peculiaridade a ser levada em conta quando se fizer o sopesamento entre tais direitos. A título de exemplo, o político que trabalha diretamente com verbas públicas não pode dizer que seu patrimônio não deve ser exposto por não ser de interesse da população. Noutra vértice, não pode a mídia usar da imagem pública de um artista de modo afim de aumentar seus ganhos financeiros, explorando sua imagem sem que se ofereça nenhuma vantagem financeira em troca.

            Logo, os princípios constitucionais podem e devem se aplicar de forma autônoma, e utilizar toda a força do direito fundamental, sempre a considerar o sopesamento dos direitos individuais (do indivíduo) com os coletivos (da sociedade). Não se deve, no entanto, utilizar-se o fundamento dignidade da pessoa humana de forma superficial, para que esta não venha cair na banalidade.

            Sobre o tema, sugere Alexy:

O que se pergunta é se o indivíduo tem um direito subjetivo constitucional a essa proteção, e como esse direito deve ser fundamentado. [...] dever estatal de proteger a dignidade humana, [...] transfere o dever de proteção aos direitos fundamentais subsequentes. A vantagem dessa construção reside no fato de ela se apoiar diretamente no texto constitucional; sua desvantagem, no fato de que ela se vê diante do dilema de ou ampliar de forma extrema o conceito de dignidade humana, para poder abarcar tudo aquilo que seja digno de proteção, o que implica o sempre suscitado risco de trivializar a dignidade humana, ou renunciar a abarcar algumas coisas dignas de proteção (ALEXY, 2009, p. 454).

            Nesse sentido, aos operadores do direito pertence a responsabilidade de fazer valer o texto constitucional, em seu verdadeiro propósito, principalmente, quando se pena na plena efetividade da dignidade da pessoa humana.

7 Considerações finais

            A título de considerações finais, cumpre destacar que o Direito passa por diversas mutações com o escopo de atender às demandas dos novos paradigmas que se apresentam pelo povo ao longo da evolução histórica.

            O direito ao esquecimento, por sua feita, requer o exercício dessa renovação, tratando-se de uma consequência do desenvolver tecnológico da sociedade. Há algum tempo esse direito não era tão importante, porém, diante do contexto do superinformacionismo, presente na atual sociedade, o exercício do direito ao esquecimento passou a ser fundamental, cuja proteção, encontra guarida no fundamento dignidade da pessoa humana.

            Trata-se, portanto, da questão de existir um meio no qual possa haver o mínimo de controle sobre o tipo de informação que se armazena e se divulga a respeito do indivíduo, para que não haja exagero na comunicação e nem violação dos direitos individuais e coletivos. Destarte, quando não se tratar de figura pública, inexiste interesse transidividual para que as informações fiquem disponíveis ao público ad eternum.

            A influência da publicidade, através de qualquer meio de comunicação, bem como o excesso de informação, atingem não somente o âmbito dos direitos individuais e coletivos, o que por si só, revela grande preocupação, mas também devastam outras searas jurídicas.

            Os atos processuais, por exemplo, não poucas vezes, são alvos do superinformacionismo. É bem verdade que a presença do público nas audiências e também a possibilidade de analisar processos importam em instrumentos fiscalizadores que a sociedade possui para vigiar o trabalho dos juízes, promotores, servidores públicos e advogados. Entretanto, a responsabilidade das decisões judiciais assume outro tamanho quando são tomadas diante da população.

            Sucede, ainda, o excesso de informação provoca, em todo mundo, intensa manifestação de protesto, não só os juízes se perturbam por uma curiosidade malsã, mas também as próprias partes e testemunhas se encontram submetidas a excessos de publicidade que infringem seu direito à intimidade, além de conduzirem à distorção do próprio funcionamento da Justiça através de pressões impostas a todos os figurantes do processo judicial.        

            Ademais, o avanço tecnológico, com o aumento da troca de informações, tem efeito paralelo, por ser possível a captação, monitoração e utilização desses dados pelos governos. Em recente caso, o Brasil, bem como vários países, foram objeto de espionagem com a revelação de que o sistema secreto dos EUA teria acesso irrestrito a dados que trafegam por serviços de comunicações. Ora, por óbvio se percebe que essa violação agride frontalmente a soberania dos países, acarretando efeitos políticos extremamente negativos.

            Há de se ressaltar ainda que ninguém está imune ao superinformacionismo. As pessoas têm, hoje, a sensação de que estão desprotegidas em relação a tanta tecnologia uma vez que para publicar qualquer coisa na internet não se faz necessário nenhum aviso prévio ou alguma permissão para divulgação de dados, documentos, áudio e vídeo. E a velocidade com que se propaga é tamanha, impossibilitando a ação de qualquer meio para barrar essas informações ou que as faça desaparecer do mundo virtual.         

            Essa discussão, sem dúvida está atrelada aos direitos fundamentais e à dignidade da pessoa humana, sendo certo que o caminho é conseguir que subsistam em harmonia, tanto o princípio da publicidade, como o direito da intimidade, vida privada honra e imagem. Não se trata, de forma alguma, de criar meios de censura, mas de preservar o direito ao esquecimento a todos aqueles que são cobertos pelo manto da Constituição.

            Cabe, portanto, à técnica legislativa, encontrar o justo equilíbrio e dar ao problema, a solução mais condizente à experiência e aos costumes de cada povo, seja ao determinar prazos para que as informações se apaguem ou obrigar as empresas que tenham as ferramentas adequadas para proporcionarem aos interessados uma maneira efetiva no sentido de que retirem o conteúdo causador da violação dos direitos fundamentais da internet ou de outro meio de comunicação, mesmo que sob supervisão, o que não ocorre no cotidiano, já que quando acontece referida situação, o embaraço acaba por bater na porta do Judiciário, sobrecarregando ainda mais um sistema que já se encontra à beira da exaustão. Ora, não se pode resolver tal questão, celeremente, com a parceria de todos os envolvidos?

            No que se refere ao trabalho dos magistrados, por sua vez, é dever deles fomentar o devido equilíbrio dos direitos fundamentais, ancorados no princípio da dignidade da pessoa humana, quando de demandas que tratem do assunto ao esquecimento, ou seja, da eliminação de dados desprovidos de interesses públicos.

            Concluindo, o direito, como instrumento de pacificação social, deve ter como elemento central, tanto a sociedade quanto o ser individual, devendo proteger de forma inexorável tanto o direito a publicidade, que traz em seu âmago um leque de grandes benefícios para a sociedade, quanto os direitos individuais, sem os quais é impossível ao indivíduo alcançar a plena efetividade de sua dignidade.

8 Referências

ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros Editores, 2009.

ARANTES, Delaíde. Opinião pública não pode pautar decisões do Judiciário. Ministra do Tribunal Superior do Trabalho. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2012-mai-10/opiniao-publica-nao-pautar-decisoes-judiciario-dizem-especialistas>. Acesso em: 4 de dez. 2014.

BELLIZZE, Marco Aurélio. Opinião pública não pode pautar decisões do Judiciário. Ministro do STJ. Brasília, 2012. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2012-mai-10/opiniao-publica-nao-pautar-decisoes-judiciario-dizem-especialistas>. Acesso em: 4 de dez. 2014.

BELO HORIZONTE. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Apelação Cível. Ação Indenizatória. Danos Morais. Cerceamento de Defesa. . Relator(a): Des.(a) João Cancio , 18ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 15/07/2014, publicação da súmula em 17/07/2014. Disponível em: http://www5.tjmg.jus.br/ jurisprudencia/pesquisaNumero CNJEspelhoAcordao.do?numeroRegistro=1&totalLinhas=1&linhasPorPagina=10&numeroUnico=1.0567.13.006360-3%2F001&pesquisaNumeroCNJ=Pesquisar. Acesso em: 27 de set. 2014.

BRASIL. Código de Processo Civil. Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Edição Especial. Vade Mecum. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014. (Legislação brasileira).

BRASIL. Código de Processo Penal. Decreto-Lei 3.689, de 3 de outubro de 1941. Edição Especial. Vade Mecum. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014. (Legislação brasileira).

BRASIL. Congresso Nacional. Projeto de Lei 7881 de 2014. Disponível em: http://convergenciadigital.uol.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?amp%3Bsid=5&infoid=38207&sid=11#.VGLGK8mwduY. Acesso em: 20 de agosto de 2014.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. de 1988. Edição Especial. Vade Mecum. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014. (Legislação brasileira).

BRASIL. Lei 8.906, de 4 de julho de 1994. Dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil. Edição Especial. Vade Mecum. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014. (Legislação brasileira).

CALSING, Maria. Opinião pública não pode pautar decisões do Judiciário. Ministra do Tribunal Superior do Trabalho. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2012-mai-10/opiniao-publica-nao-pautar-decisoes-judiciario-dizem-especialistas>. Acesso em: 4 de dez. 2014.

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SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros Editores, 2005.

TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. 23. ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2010.


[1] MARX, Karl. A liberdade de imprensa. “Debate sobre a liberdade de imprensa e comunicação” (série de artigos publicados no Rhemische Zeitung, em 5, 8, 10, 12 e 19.5.1842.

[2] Non bis in idem - princípio segundo o qual ninguém pode ser processado mais de uma vez pelo mesmo fato, veda-se ainda a possibilidade de valoração de qualquer circunstância que já tenha sido analisada pelo julgador na aplicação da pena.

[3]http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1270760&filename=Tramitacao-PL+7881/2014.

[4] MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. 4.ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1990. 4 t.

Sobre os autores
Hugo Garcez Duarte

Mestre em Teoria do Direito - Hermenêutica e Direitos Fundamentais

Francelly Carellos Bernardes Martins

Graduou-se em Direito pela Faculdade de Direito e Ciências Sociais do Leste de Minas, FADILESTE, em janeiro de 2015. Aprovada na Ordem dos Advogados do Brasil pelo XII Exame de Ordem Unificado, sendo inscrita nos quadros da OAB/MG sob o número 158.133. Atualmente trabalha como advogada no escritório, Advocacia Bernardes, onde atende a população dos municípios de Ipanema, Pocrane e Conceição de Ipanema, atuando especialmente nas áreas: cível, empresarial, consumidor, trabalhista, tributária e previdenciária. Realizou estágio no Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, Vara Única da Comarca de Ipanema, onde realizava audiências de conciliação, triagem dos processos enviados em conclusão, separação conforme a ordem de prioridade e tipo de decisão a ser proferida, além de elaborar minutas de despachos, decisões e sentenças sob orientação e supervisão do Juiz. Atuou ainda como Escrevente nomeada pelo Magistrado auxiliando na digitação das atas das Audiências de Instrução e Julgamento realizadas na Comarca. Tem experiência na área jurídica, em especial, no Direito de Família e nos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, onde já atuou como conciliadora. Trabalhou como auxiliar contábil nos anos de 2010 até 2012, nesse período ainda estagiava em Escritórios de Advocacia. <br><br>

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