1. INTRODUÇÃO
Muito se discute acerca da eficácia preclusiva da decisão de saneamento do processo. A discussão intensifica-se quando se trata de decisão de admissibilidade do processo e a questão a ser apreciada pode ser reconhecida de ofício pelo julgador. Neste estudo serão analisados o instituto da preclusão e a decisão de saneamento do processo para, em seguida, enfrentar o caso concreto apresentado.
2. DESENVOLVIMENTO
A decisão de saneamento processual encontra previsão no art. 357 do novo Código de Processo Civil. Em tal fase, serão decididas questões processuais pendentes e serão delimitados os fatos, o direito e os meios de prova a serem utilizados na frase probatória. Nesta fase ainda será definida a distribuição do ônus da prova e designada a audiência de instrução e julgamento, caso necessária.
Dado seu conteúdo, infere-se que a decisão de saneamento tem como objetivo organizar o processo, de modo a garantir que a fase probatória seja efetiva, célere e respeite o contraditório.
Uma vez proferida a decisão de saneamento, as partes terão o prazo de 5 (cinco) dias para requerer esclarecimentos ou ajustes (art. 357, § 1º, CPC/15). Findo tal prazo sem manifestação das partes, a decisão de saneamento tornar-se-á estável.
Esta estabilidade é essencial para evitar retrocessos processuais, impedindo que as questões já decididas sejam novamente questionadas pelas partes. Conforme ensina Fredie Didier Jr.1, a estabilidade decorrente da decisão de saneamento deve ser prestigiada: “Não por acaso o legislador somente permitiu ampliações e alterações objetivas do processo até esse momento (art. 329, II, CPC)”.
Questão muito discutida pela doutrina consiste na eficácia preclusiva da decisão de saneamento e organização do processo quando envolver o reexame de questões que podem ser decididas de ofício pelo órgão jurisdicional.
Não se discute a eficácia preclusiva da decisão de inadmissibilidade do processo; é amplamente admitida. Todavia, quando se trata de decisão de admissibilidade que aborda questão reconhecível ex officio, há divergência doutrinária.
A doutrina hoje prevalente entende que, nesses casos, não há preclusão, por força do § 3º do art. 485 do CPC/15, o qual admite o reconhecimento ex officio das matérias ali previstas. Entendem que, tendo em vista que tais matérias permitem o ajuizamento de ação rescisória, o julgador poderia reexaminar estas questões, posto que não seriam atingidas pela preclusão.
Fredie Didier Jr., todavia, traz uma série de reflexões que rebatem o pensamento predominante na doutrina. Dentre os diversos argumentos, destaca o professor que o art. 485, § 3º, CPC/15 apenas permite que o julgador conheça de tais matérias sem a provocação das partes. Não faz qualquer referência, no entanto, à possibilidade de reexame de tal questão quando já analisada pelo julgador e não impugnada pela parte prejudicada.
De modo a fundamentar seu pensamento, Didier refere-se aos artigos 505 e 507 do Código de Processo Civil, os quais, dado sua relevância, transcrevo a seguir:
Art. 505. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas relativas à mesma lide, salvo:
I - se, tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença;
II - nos demais casos prescritos em lei.
Art. 507. É vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão.
Da leitura dos dispositivos acima, depreende-se que o reexame de questões é vedado após a preclusão. Especificamente em relação à decisão de saneamento, há o prazo de cinco dias para solicitar ajustes (art. 357, §1º, CPC/15) ou, dependendo da matéria ali abordada, caberá agravo de instrumento (art. 1.015, CPC) ou apelação (art. 1009, §1º, CPC/15). Não sendo utilizados tais meios de impugnação, haverá a preclusão da decisão de saneamento.
No caso sob análise, questiona-se a possibilidade de o juiz, após o início da fase instrutória, reconsiderar decisão de saneamento que rejeitou a alegação do réu que estaria ausente litisconsorte necessário unitário passivo. Adotando o pensamento de Fredie Didier Jr., conclui-se que não.
De fato, a ausência de litisconsorte necessário unitário passivo gera nulidade absoluta, nos termos do art. 115, I, CPC/15; assim, é reconhecível de ofício pelo magistrado. Ao ser rejeitada a alegação do réu de que haveria litisconsortes necessários unitários, deveria o requerido ter manejado um agravo de instrumento (art. 1.015, VII, CPC/15). Ao quedar-se inerte, permitiu que houvesse a preclusão da decisão, razão pela qual posteriormente o juiz não poderá reapreciar a matéria.
3. CONCLUSÃO
Dado o acima exposto, depreende-se que a maior parte da doutrina entende que o juiz, após iniciada a instrução, poderá reconsiderar decisão que indeferiu a alegação de ausência de litisconsortes necessários unitários passivos, posto ser causa de nulidade absoluta e, portanto, reconhecível de ofício. Fredie Didier, todavia, traz tese divergente muito bem fundamentada de que é vedado o reexame de ofício.
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 3 ed. São Paulo: MÉTODO, 2011.
DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Salvador: Edições JusPODIVM, 2015, v. 1.
1 DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. Vol I. Salvador: Edições JusPODIVM, 2015, p. 693.