A Lei 13.228/15, de 28 de dezembro de 2015 inclui um parágrafo quarto no artigo 171, CP (Estelionato), prevendo um aumento de pena em dobro para os casos de Estelionato cometidos contra idoso.
Trata-se de mais uma ação de discriminação positiva em prol do idoso, na esteira do que já ocorreu com o advento da Lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso) em diversos dispositivos e, especialmente, da inclusão do inciso III, no artigo 183, CP, afastando as imunidades absolutas e relativas (artigos 181 e 182, CP) nos crimes patrimoniais, ainda que não informados por violência ou grave ameaça, sempre que a vítima for idosa. Aliás, como se vê da própria redação do artigo 183, inciso III, CP, idosa é a pessoa que conta com 60 anos completos ou mais, em consonância com o disposto no artigo 1º. do Estatuto do Idoso.
Essas iniciativas de agravamento da reprimenda tendo em vista a pessoa idosa como sujeito passivo estão em harmonia com o disposto no artigo 230, CF que indica a hipossuficiência dessa categoria e sua inclusão no rol daqueles que necessitam de uma chamada “proteção integral”. Também há concordância com o disposto na Lei 8.842/94 (Lei sobre a Política Nacional do Idoso), especificamente no seu artigo 10, inciso IV, alíneas “a” e “b”, apontando, na área da Justiça, como objetivos básicos “promover e defender os direitos da pessoa idosa” e “zelar pela aplicação das normas sobre o idoso determinando ações para evitar abusos e lesões sobre os seus direitos”.
Não é preciso dizer que a lei penal mais gravosa não será, como nunca foi, a panaceia capaz de curar todas as chagas sociais, dentre elas a falta de respeito com que os idosos são frequentemente tratados. No entanto, é fato que especificamente no caso do estelionato, o idoso é uma vítima preferencial porque, ao menos em regra, se trata de pessoa mais suscetível ao engodo e à fraude, principalmente quando há envolvimento de modernidades não acompanhadas pelo indivíduo em seu processo de envelhecimento. São inúmeros os casos em que idosos são lesados mediante ardis e artifícios que normalmente não serviriam para iludir outro adulto. Por esta razão a conduta do infrator nesses casos é realmente mais grave e merece uma reprimenda à altura, obedecendo à proporcionalidade e cumprindo os demais ditames legais e constitucionais que versam sobre a pessoa idosa e sua proteção (visão sistemática do ordenamento jurídico pátrio), conforme acima já exposto.
Fato é que a partir de agora a pena para o Estelionato contra idoso, que era de reclusão, de 1 a 5 anos e multa, passa a ser de reclusão, de 2 a 10 anos e multa.
A alteração merece algumas observações:
Não é possível aplicar a atual majorante a casos pretéritos, ocorridos antes de sua publicação, pois que se trata de “novatio legis in pejus”, o que veda sua retroatividade. Portanto, sua aplicação somente se dará para os casos de Estelionatos perpetrados contra idosos ocorridos a partir de 28.12.2015. Isso porque estabelece a Constituição que a “lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu” (artigo 5º., XL, CF c/c artigo 2º., Parágrafo Único, CP).
O Estelionato Simples permite o benefício da Suspensão Condicional do Processo, previsto no artigo 89 da Lei 9.099/95, tendo em vista que sua pena mínima não ultrapassa 1 ano. Contudo, após o advento da Lei 13.228/15, dobrando a pena, a sanção mínima para o caso de vítima idosa passa a ser de 2 anos de reclusão, o que impede o benefício da Suspensão Condicional do Processo. Agora já não se trata de um Estelionato Simples quando a vítima for idosa, mas de um Estelionato Majorado.
Importa também consignar que o aumento de pena agora previsto pela Lei 13.228/15 se limita ao crime de Estelionato (artigo 171, CP), de modo que o aumento da pena em dobro não atinge, por exemplo, crimes que podem lesar patrimonialmente os idosos, previstos no Estatuto respectivo, como, por exemplo, os artigos 102, 104, 106. 107 e 108 da Lei 10.741/03.
A prova da condição de pessoa idosa a ensejar o aumento de pena se fará mediante juntada aos autos de documentos tais como identidade, certidão de nascimento, certidão de casamento etc. A comprovação é meramente documental, não sendo o caso de avaliar a vulnerabilidade maior ou menor deste ou daquele idoso. A única possibilidade de afastamento da majorante, em se tratando de vítima com 60 anos ou mais, será o caso de eventual erro em que o infrator desconheça justificadamente a idade do sujeito passivo (inteligência do artigo 20, CP). Nesse passo, portanto, é necessário, para a aplicação da majorante, a comprovação de que o sujeito ativo tinha consciência de que ludibriava um idoso. Do contrário estaríamos navegando nos perigosos mares da responsabilidade penal objetiva, em boa hora alijada do Direito Penal Moderno.
Conclui-se que se trata de um incremento de pena justificável, tendo em vista a proporcionalidade e uma interpretação sistemática do ordenamento jurídico brasileiro, passando pela Constituição e leis ordinárias que regulam o tratamento a ser conferido aos idosos. Não obstante, deixa-se sempre em destaque o fato de que medidas penais não são, ao menos isoladamente, solução para qualquer problema. Geralmente são as medidas menos eficazes para essas soluções. A efetiva melhora das condições do idoso na sociedade brasileira passa por um necessário processo de efetivação de muitas normas constitucionais e ordinárias que, por agora, ainda somente se apresentam com uma característica meramente simbólica. Passam, ainda mais, por um necessário processo de desenvolvimento cultural e civilizacional, este sim capaz até mesmo de tornar as normativas legais despiciendas.