1. CONCEITO DE AGENTES PÚBLICOS
O Estado necessita de recursos humanos e materiais para a realização de atividades, serviços e obras que são de sua responsabilidade. Os recursos humanos, os únicos que nos interessam no presente trabalho, constituem-se em todas as pessoas físicas que, sob variados vínculos e, algumas vezes, sem qualquer liame aparente, prestam serviços à Administração Pública ou realizam atividades que estão sob sua responsabilidade, ainda quando o façam ocasional ou episodicamente. Essas pessoas são os agentes públicos.
Hely Lopes Meirelles define agentes públicos como "todas as pessoas físicas incumbidas definitiva ou transitoriamente, do exercício de alguma função estatal"[1].
Maria Sylvia Zanella Di Pietro conceitua agente público como "toda pessoa física que presta serviços ao Estado e às pessoas jurídicas da Administração Indireta"[2].
José dos Santos Carvalho Filho conceitua a expressão agentes públicos como "o conjunto de pessoas que, a qualquer título, exercem uma função pública como prepostos do Estado"[3].
Observe-se que os conceitos firmados acima pelos renomados juristas demonstram bem a abrangência do sentido da expressão agentes públicos.
A noção alcança todos os agentes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de qualquer dos Poderes dessas pessoas federativas, das suas autarquias, das fundações públicas e privadas, das empresas públicas, das sociedades de economia mista, dos delegados de serviços públicos e demais particulares que atuem em colaboração com o Poder Público.
Esta noção abrange todos os que desempenham uma função pública, função esta que pode ser definitiva ou transitória, política ou jurídica, remunerada ou gratuita, mas que os vincularão à Administração Pública.
A infindável gama de definições existentes para o termo agente público parece ter encontrado um resumo igualmente amplo, que resultou na normativização do conceito, insculpido no artigo 2º da Lei nº 8.429/92 – Lei de Improbidade Administrativa:
“Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior”.
Tais agentes atuam no mundo jurídico como instrumentos expressivos da vontade do Poder Público, a qual é imputada ao Estado, posto que o mesmo só se faz presente através de pessoas físicas que em seu nome atuam. Para tal, o agente público é investido de necessária parcela de poder público para o desempenho de suas atribuições, poder este que há de ser utilizado normalmente pelos agentes, de acordo com o que a lei lhes confere.
Ressalva que merece destaque é o tratamento dispensado a matéria em sede de matéria criminal. Para efeitos de aplicação da lei penal, o conceito dispensado àquele que responderá como funcionário público é ainda mais amplo.
Nos termos da atual redação atribuída ao § 1º do artigo 327 do Código Penal, “equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública.”
Hipoteticamente, médicos e administradores de hospitais credenciados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) não são funcionários públicos em sentido penal. No entanto, de acordo com a atual redação atribuída ao § 1º do art. 327 do Código Penal elide-se qualquer dúvida a respeito da matéria. Logo, os médicos e administradores de hospitais particulares participantes do SUS exercem atividades típicas da Administração Pública, mediante contrato de direito público ou convênio, nos termos do § 1º do art. 199 da Constituição da República, equiparando-se, pois, a funcionário público para fins penais, podendo, assim, ser processado por crime de concussão ou corrupção.
2. ESPÉCIES DE AGENTES PÚBLICOS
Os agentes públicos, que acima conceituamos, foram segregados em diferentes categorias pelos juristas objetivando a facilitação da compreensão do tema.
Trata-se de classificação de natureza didática, que reconhece a existência de grupamentos que guardam entre si fatores de semelhança.
Os eminentes administrativistas Oswaldo Aranha Bandeira de Mello e seu filho Celso Antônio Bandeira de Mello são, entre os autores brasileiros, os que mais se aprofundaram no estudo dos agentes públicos no artigo "Teoria dos servidores públicos", e na monografia "Apontamentos sobre os Agentes e Órgãos Públicos", respectivamente.
Ambos os autores classificaram os agentes públicos em três categorias:
- Agentes Políticos;
- Servidores Estatais, abrangendo os servidores públicos e os servidores governamentais de direito privado;
- E os Particulares em colaboração com o Poder Público.
Essa classificação não é única dentre os autores pátrios, todavia, adotaremos no presente trabalho a classificação destes dois grandes administrativistas, introduzindo as necessárias alterações para adaptá-la à Constituição de 1988, acrescentando os entendimentos diversos em conformidade com a doutrina pátria.
3. AGENTES POLÍTICOS
Há dissenso entre os doutrinadores pátrios sobre o conceito de agentes políticos.
Para Celso Antônio Bandeira de Mello, os agentes políticos são "os titulares dos cargos estruturais à organização política do País, ou seja, os ocupantes dos cargos que compõem o arcabouço constitucional do Estado, o esquema fundamental do poder. São os que se constituem nos formadores da vontade superior do Estado."[4].
Para o autor, os agentes políticos são os Chefes do Executivo (Presidente, Governadores e Prefeitos e os respectivos Vices), seus auxiliares (Ministros, Secretários Estaduais e Secretários Municipais) e os Membros do Poder Legislativo (Senadores, Deputados Federais, Deputados Estaduais e Vereadores).
Já Hely Lopes Meirelles conceitua agentes políticos como "os componentes do Governo nos seus primeiros escalões, investidos em cargos, funções, mandatos ou comissões, por nomeação, eleição, designação ou delegação para o exercício de atribuições com prerrogativas e responsabilidades próprias, estabelecidas naConstituição e em leis especiais"[5]. O autor dá sentido mais amplo a esta categoria, incluindo os Magistrados, os membros do Ministério Público e os membros dos Tribunais de Contas[6].
A Emenda Constitucional nº 19/98, deu força ao entendimento de Hely Lopes Meirelles, pois parece ter agrupado também entre os agentes políticos, os Magistrados, os membros do Ministério Público e dos Tribunais de Contas, quando estabeleceu no artigo 37, XII, o trecho “dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos”. Ou seja, haveria outros agentes políticos (os Magistrados, os membros do Ministério Público e dos Tribunais de Contas) além daqueles que tradicionalmente detém cargos eletivos. Entretanto, entende a doutrina majoritária que essa classificação, emanada do sistema da Reforma Administrativa, só deve ser considerada para fins remuneratórios, e não para definição da natureza do vínculo jurídico que liga o agente ao Poder Público.
Neste ponto, o candidato de concurso público deve ter atenção tanto à composição da banca examinadora quanto ao cargo para o qual concorre. É óbvio que se o cargo pretendido está entre aqueles sobre os quais recai a controvérsia, melhor seria adotar o entendimento que os classifica como agentes políticos.
A primeira corrente tem a primazia entre os autores pátrios (Celso Antônio Bandeira de Mello, Maria Sylvia Zanella Di Pietro, José dos Santos Carvalho Filho, Diógenes Gasparini, Edimur Ferreira Faria), criticando-se o entendimento do grande professor Hely Lopes Meirelles com o argumento de que o que caracteriza o agente político não é só o fato de ser mencionado na Constituição, mas sim o de se associar às ideias de governo e função política, decidindo sobre os rumos a serem seguidos pelo Estado.
Na lição de Marcello Caetano, função política é "uma atividade comandada pelo interesse geral e que se desenvolve para assegurar a unidade e a coesão nacionais, definir os ideais coletivos, escolher os objetos concretos a prosseguir em cada época e os meios mais idôneos para alcançá-los, manter o equilíbrio constitucional das tensões políticas e das forças sociais, garantir a segurança do Estado e defender os interesses nacionais na ordem externa"[7].
As funções políticas compreendem basicamente as atividades de direção e as co-legislativas e ficam a cargo, em sua maioria, dos órgãos do Poder Executivo e, em parte, do Poder Legislativo.
No Brasil, é praticamente inexistente a participação do Poder Judiciário nas decisões políticas, pois a sua função se restringe quase exclusivamente à atividade jurisdicional.
O mesmo se pode dizer em relação ao Ministério Público e ao Tribunal de Contas, o primeiro exercendo uma das funções essenciais à justiça, ao lado dos Delegados de Polícia, da Advocacia Pública, da Defensoria Pública e da Advocacia; e o Tribunal de Contas, exercendo a função de auxiliar do Poder Legislativo no controle externo da atividade financeira e orçamentária do Estado.
São, portanto, agentes políticos, no direito brasileiro, apenas os Chefes dos Poderes Executivos Federal, Estadual e Municipal; os Ministros, Secretários Estaduais e Municipais; e os Senadores, Deputados Federais, Deputados Estaduais e Vereadores.
Estes são os detentores dos cargos da mais elevada hierarquia da organização da Administração Pública, estando voltados, principalmente, à formação e exteriorização da vontade superior da Administração Pública e incumbidos de traçar e imprimir a orientação superior a ser observada pelos órgãos e agentes que lhes devam obediência.
O vínculo que os prende à Administração Pública é de natureza política e os que os capacita para o desempenho dessas altas funções é a qualidade de cidadãos. Seus direitos e suas obrigações derivam diretamente da Constituição e das leis e, por esse motivo, podem ser alterados sem que a isso possam opor-se.
Sua forma de investidura é a eleição, com exceção dos cargos de Ministros, Secretários Estaduais e Municipais, que são providos por ato de nomeação, tratando-se de cargos de recrutamento por escolha política dos Chefes dos Executivos, de livre nomeação e exoneração.
Os agentes políticos têm plena liberdade funcional e maior resguardo para o desempenho de suas funções, realizando suas atribuições com prerrogativas e responsabilidades próprias, estabelecidas na Constituição Federal e em leis especiais. Para o fiel desempenho de suas funções ficam a salvo de responsabilização civil por seus eventuais erros de atuação, a menos que tenham agido com culpa grosseira, má-fé ou abuso do poder.
Estas prerrogativas que se concedem aos agentes políticos, nas palavras do grande mestre Hely Lopes Meirelles "não são privilégios pessoais; são garantias necessárias ao pleno exercício de suas altas e complexas funções governamentais e decisórias. Sem essas prerrogativas funcionais os agentes políticos ficariam tolhidos na sua liberdade de opção e de decisão, ante o temor de responsabilização pelos padrões comuns da culpa civil e do erro técnico a que ficam sujeitos os funcionários profissionalizados."[8].
Para fins penais, esses agentes são equiparados a funcionários públicos quanto aos crimes relacionados com o exercício de sua função, nos termos do artigo 327 doCódigo Penal Brasileiro[9], com as ressalvas das imunidades constitucionais. Respondem também pelos atos que possam caracterizar crime de responsabilidade.
Por último, cabe ressaltar que, nos termos da Emenda Constitucional nº 19/98, que implementou a Reforma Administrativa do Estado, esses agentes serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, de acordo com o artigo 39, § 4º do Texto Constitucional.
E, por fim, cabe mencionar que a idade mínima para ingresso no STF, Tribunais Superiores (STJ, TST, STM e TSE) e TCU poderá ser fixada em 50 anos e para Tribunais Regionais e TJs, em 40 anos. O aumento está previsto na PEC 54/15, já aprovada, pela CCJ do Senado.
A Constituição Federal fixa em 35 anos a idade mínima para ingresso nos Tribunais Federais e no TCU e em 30 anos para os Tribunais Regionais. Já a idade máxima para entrar nessas Cortes é 65 anos.
A proposta é de autoria do senador Raimundo Lira. No texto original, propôs-se que a idade mínima para o STF fosse de 55 anos. No entanto, a relatora na CCJ, senadora Simone Tebet, apresentou uma emenda para fixá-la em 50 anos, mas manteve a sugestão do autor de fixar em 50 anos a idade mínima para juízes do STJ, TST, STM, TCU e para os dois advogados que são indicados pelo Supremo para o TSE.
O objetivo da proposta, segundo o autor, é levar aos Tribunais federais e estaduais magistrados com mais experiência jurídica e vivência prática. A relatora endossou esse argumento.
"A elevação da idade mínima para ingresso no STF, TCU, Tribunais Superiores, Tribunais Regionais e Tribunais de Justiça permitirá que tais Cortes sejam formadas por profissionais mais experientes e qualificados, com a maturidade necessária para examinar os processos e proferir decisões que refletem diretamente na vida dos litigantes."
A relatora lembrou que a EC 88 ampliou de 70 para 75 anos a idade para aposentadoria compulsória dos membros do STF, TCU e Tribunais Superiores. A elevação da idade mínima para ingresso, conforme observou, possibilitará renovação dos quadros dos tribunais.
3.1. Estudo de Caso Concreto
– A Câmara municipal de General Severiano deflagrou processo legislativo com a edição do seguinte Projeto de Lei:
PL n. 1111, de 10 de abril de 2009.
CRIA CARGOS NA ADMINISTRAÇÃO DIRETA E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS
AUTOR: Poder Legislativo
O Presidente da Câmara municipal de General Severiano, no uso de suas atribuições legais,
PROMULGA:
Art. 1º. Ficam criados 5 (cinco) cargos vitalícios de Assessor Jurídico Pleno e 4 (quatro) cargos efetivos de Consultor Jurídico Auxiliar, no âmbito da Secretaria Municipal de Fazenda, com atribuições xxxxxxxxx e remuneração zzzzzzzzzzz.
Art. 2º. Os cargos de Consultor Jurídico Auxiliar serão preenchidos por concurso público de provas ou provas e títulos, por advogados detentores de prática forense não inferior a dois anos.
Art. 3º. O provimento dos cargos de Assessor Jurídico Pleno se dará por ascensão do cargo de Consultor Jurídico Auxiliar, conforme critérios a serem definidos em Decreto.
Art. 4º. Ficam extintos, automaticamente, os cargos de Analista de Processo que estejam vagos por ocasião da data da vigência desta Lei.
Art. 5º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Considerando o texto acima, proceda da seguinte maneira:
1. Identifique no Ato Legislativo suas inconstitucionalidades, apontando, quando couber, o respectivo dispositivo constitucional atingido.
(i) A criação e extinção de cargos na estrutura da Administração Pública é matéria de lei de iniciativa do Chefe do Executivo, à luz do disposto no art. 61, § 1º, II, a, daCRFB/88, salvo na hipótese de extinção de funções ou cargos declarados vagos, que pode ser feito por decreto (art. 84, VI, b); (ii) A vitaliciedade do cargo é prerrogativa atribuída pela Constituição, não sendo admissível que constituições ou leis municipais criem cargos com esta garantia, conforme decisão exarada na ADIN n. 2.729-RN; (iii) A ascensão, que é a forma de progressão pela qual o servidor é elevado de cargo situado na classe mais elevada de uma carreira para o cargo da classe inicial de carreira diversa ou de carreira tida como complementar da anterior, foi banida do cenário jurídico pátrio por ter sido considerada inconstitucional pelo STF, por afronta ao princípio concursivo – art. 37, II da CRFB/88.
2. Redija o Projeto de Lei de forma mais adequada, suprimindo, alterando ou acrescentando texto, mantendo sua substância e expungindo as inconstitucionalidades.
PL n. 1111, de 10 de abril de 2009.
CRIA CARGOS NA ADMINISTRAÇÃO DIRETA E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS
AUTOR: Poder Legislativo Executivo
O PREFEITO DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO,
Faço saber que a Câmara Municipal decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º. Ficam criados 5 (cinco) cargos vitalícios efetivos de Assessor Jurídico Pleno e 4 (quatro) cargos efetivos de Consultor Jurídico Auxiliar, no âmbito da Secretaria Municipal de Fazenda, com atribuições xxxxxxxxx e remuneração zzzzzzzzzzz.
Art. 2º. Os cargos de Consultor Jurídico Auxiliar e Assessor Jurídico Pleno serão preenchidos por concurso público de provas ou provas e títulos, por advogados detentores de prática forense não inferior a dois anos.
Art. 3º. O provimento dos cargos de Assessor Jurídico Pleno se dará por ascensão do cargo de Consultor Jurídico Auxiliar, conforme critérios a serem definidos em Decreto.
Art. 4º. Ficam extintos, automaticamente, os cargos de Analista de Processo que estejam vagos por ocasião da data da vigência desta Lei.
Art. 5º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
4. SERVIDORES ESTATAIS
Para Celso Antônio Bandeira de Mello, a designação "servidores estatais", que ora se sugere em atenção à Reforma Administrativa, abrange "todos aqueles que mantêm com o Estado e suas entidades da administração indireta, independentemente de sua natureza pública ou privada (autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista) relação de trabalho de natureza profissional e caráter não eventual sob vínculo de dependência"[10].
O autor divide os servidores estatais em dois grupos: os servidores públicos e os servidores das pessoas governamentais de direito privado.[11]
Os servidores públicos são a categoria mais numerosa entre os agentes públicos, e os de mais significativa importância no estudo de Direito Administrativo, e sendo o tema de estudo deste trabalho, será o mesmo analisado mais detidamente nos tópicos adiante.
Os servidores das pessoas governamentais de direito privado ou servidores governamentais[12]são os agentes que se ligam sob um vínculo de dependência às empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações públicas de direito privado, mediante uma relação de trabalho (regime contratual) de natureza profissional e perene.
Com tais características existem servidores na Administração Pública direta, autárquica e fundacional pública, sem que possam ser considerados servidores governamentais, visto que não se vinculam a qualquer das supra-citadas entidades. Esses são os chamados empregados públicos. Os servidores governamentais são, portanto, os empregados das empresas privadas criadas pela Administração Pública direta de qualquer das entidades políticas.
Há que trazer, neste ponto, outro entendimento de relevo. O professor José dos Santos Carvalho Filho defende que os mencionados empregados públicos são, segundo sua definição, servidores públicos trabalhistas (ou celetistas) e que os empregados das empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações públicas de direito privado não são servidores públicos (ou estatais, para a posição aqui sustentada), uma vez que o artigo 173, § 1º da CF estipula que tais entidades sujeitar-se-ão às regras de direito privado quanto às obrigações trabalhistas.
Sem adentrar às classificações, o Pleno do STF decidiu em 2013[13] pela inaplicabilidade do instituto da estabilidade no emprego aos trabalhadores de empresas públicas e sociedades de economia mista. Esse direito é assegurado pelo artigo 41 da Constituição Federal (CF) aos servidores públicos estatutários.
O recurso foi interposto pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) contra acórdão (decisão colegiada) do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que entendeu inválida a despedida do empregado, por ausência de motivação. O TST fundamentou sua decisão no argumento de que a ECT gozaria de garantias equivalentes àquelas atribuídas à Fazenda Pública. Entretanto, parte dos fundamentos do acórdão daquela Corte foram rejeitados pelo Plenário do STF. Foi afastada, também, a necessidade de instauração, pelas empresas públicas e sociedades de economia mista, de processo administrativo disciplinar (PAD), que deve preceder a dispensa de servidor público estatutário.
5. PARTICULARES EM COLABORAÇÃO COM O PODER PÚBLICO
Particulares em colaboração com o Poder Público são as pessoas naturais ou jurídicas privadas que, transitoriamente, prestam serviços voluntária ou compulsoriamente à Administração Pública. São agentes que exercem funções especiais que podem ser qualificadas como públicas, em razão do vínculo jurídico que os prende ao Estado. Não ocupam cargo ou emprego público, não possuindo qualquer vínculo empregatício ou estatutário com o Estado, e na realização de determinadas funções, sequer percebem remuneração.
Não incidem sobre esses agentes, as proibições constitucionais de acumulação de cargos, empregos e funções (artigo 37, incs. XVI e XVII, da CF/88), porque sua vinculação com o Estado é sempre de caráter transitório.
Para fins penais são equiparados a funcionários públicos, de acordo com o que determina o artigo 327 do Código Penal.
Os primeiros agentes particulares colaboradores, são os colaboradores por compulsão. São os requisitados pela Administração Pública mediante ato unilateral, fundado em lei, para desempenhar certa função ou executar determinado serviço. Desses agentes são exemplos os jurados (componentes do Conselho de Sentença do Tribunal do Júri), os mesários eleitorais, os escrutinadores (componentes das juntas apuradoras de votos) e os convocados para a prestação de serviço militar obrigatório.
Subordinam-se à autoridade do requisitante e, em geral, pela colaboração que prestam ao Estado, não recebem remuneração, mas podem receber alguma compensação como o apostilamento da situação nos prontuários funcionais ou a concessão de um período de descanso remunerado após o cumprimento da tarefa[14]. Estes agentes não possuem qualquer vínculo com a Administração, com exceção dos recrutados ao serviço militar obrigatório. O tempo de prestação desses serviços é contado para certos efeitos, a exemplo do necessário à aquisição da aposentadoria. Pelos danos que estes agentes causarem a terceiros, responde o Estado, ressalvado o direito de regresso em casos de dolo ou culpa.
Outra categoria de agentes de colaboração são os gestores de negócios públicos, os quais, na eventual falta ou impedimento de autoridades constituídas ou de agentes regulares, assumem espontânea e validamente a gestão de atividades públicas em situações de emergência, como por exemplo, em casos de enchentes, incêndios, epidemias, ou no caso de prisão de um criminoso.
Esses agentes não possuem vínculo empregatício e, em princípio, nada recebem pela colaboração que prestam. Entre estes agentes e o Poder Público não há qualquer vínculo formal. O tempo de prestação de serviço não é computado para nenhum efeito. Os gestores de negócios públicos respondem por seus atos e comportamentos.
Por último, são agentes de colaboração, os concessionários e os permissionários de obras e serviços públicos, os quais realizam as incumbências que lhes foram delegadas em nome próprio, por sua conta e risco, mas segundo normas impostas pelo Poder Público e sob a permanente supervisão e fiscalização da entidade delegante.
Também são agentes de colaboração, os titulares de serventias não oficializadas incumbidos dos serviços notariais e de registros públicos (artigo 236 da CF e Lei nº8.935/94), que apesar de desempenharem funções em caráter privado, sua investidura depende de aprovação em concurso público e submetem-se ao controle do Poder Judiciário; os leiloeiros, tradutores e intérpretes públicos; os diretores de faculdades particulares; e os contratados por locação civil de serviços (como, por exemplo, um advogado ilustre contratado para sustentação oral perante Tribunais). Este último enseja alguma controvérsia, pois parte da doutrina não o elenca como agente colaborador. É o caso do Professor José dos Santos Carvalho Filho, que entende neste caso haver mero vínculo contratual, com objeto definido e determinado[15].
Pela colaboração com o Poder Público recebem remuneração, segundo os termos e condições dos atos de delegação e dos contratos que os ligam ao Estado. Ainda, de acordo com esses instrumentos e legislação pertinente, respondem pelos seus atos, cabendo ao Estado, no caso, por exemplo, dos delegados de serviço público, tão só a responsabilidade subsidiária. E, para fins penais, também são considerados funcionários públicos, na forma do artigo 327 do Código Penal.
6. AGENTES PÚBLICOS DE FATO
Cada agente público executa uma função pública, na qual foi regularmente investido pelo Estado. Estes agentes são agentes de direito.
Existem, entretanto, agentes que desempenham funções, em caráter temporário ou permanente, sem que estejam regularmente investidos. São os agentes de fato.
O agente de fato desempenha função pública para atender a interesse público, tal como o agente de direito. Esta função é desempenhada pelo agente de fato em nome do Poder Público, em decorrência de uma situação excepcional ou por erro.
Não se deve confundir essa figura com a do usurpador. O usurpador é a pessoa que, sem nenhum título, nem investidura, e sem aparentar qualquer legitimidade, apodera-se de uma função pública pela fraude ou violência, para atingir a satisfação de interesses privados. O que distingue o agente de fato do usurpador é que, o primeiro cumpre a sua função com a aparência de legitimidade, enquanto o segundo carece totalmente dessa presunção.
Os agentes públicos de fato podem ser distinguidos em duas categorias: os agentes necessários e os agentes putativos.
Os agentes necessários são aqueles indivíduos que, em estado de necessidade pública, praticam atos e desempenham atividades, agindo como o faria o agente regularmente provido.
Os atos realizados por estes agentes são confirmados pelo Estado em razão da excepcionalidade da situação ocorrida e do interesse público; convalidando-se a competência do ato, e suprindo-se os demais requisitos legais.
O outro grupo é o dos agentes putativos. Esses agentes são os que desempenham funções públicas na presunção de que as estão exercendo com legitimidade, embora tenham sido investidos com violação do procedimento legalmente exigido. Um exemplo de agente putativo seria o de servidor que pratica inúmeros atos de administração tendo sido investido sem aprovação em concurso público.
Quanto aos agentes putativos, os seus atos praticados internamente, perante a Administração, padecem de vício de competência e, assim, não obrigam enquanto não forem objeto de sanatória. Porém, externamente, os seus atos têm os efeitos válidos, para evitar que terceiros de boa-fé sejam prejudicados pela falta de uma investidura legítima. A presumida boa-fé dos administrados é relativa, cedendo ante a prova de conluio ou pré-conhecimento por parte do terceiro, eventualmente beneficiado pela irregularidade da investidura do agente.
Frederico Rezende Bilheri Especialização em Direito Público: Constitucional, Administrativo e Tributário, Especialização, MBA em Marketing Político e Comunicação Eleitoral, Doutor Honoris Causa pela Academia Nacional de Juristas e Doutrinadores.
[1]MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro.34º ed. São Paulo, Malheiros Editores, 2008, p. 418.
[2]DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. Cit., p. 477.
[3]CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. Cit., p. 488.
[4]MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 2007, p. 199.
[5]MEIRELLES, Hely Lopes. Op. Cit., p. 98.
[6]Com o mesmo entendimento, TOSHIO MUKAY (Direito Administrativo Sistematizado, 1999, p.152).
[7] CAETANO, Marcelo. Manual de Direito Administrativo, 2005, p. 18.
[8] MEIRELLES, Hely Lopes. Op. Cit., p. 88-89.
[9] "Art. 327. Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. § 1º Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública." (Decreto-Lei "nº 2.848, de 7/12/1940).
[10] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, p. 192.
[11]Diversos autores pátrios se utilizam das expressões" servidores públicos em sentido amplo e servidores públicos em sentido estrito "para designar, respectivamente," servidores estatais e servidores públicos ".
[12] Denominação utilizada pelo autor DIÓGENES GASPARINI (Direito Administrativo, 2008, p. 177).
[13] (RE) 589998
[14] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. Cit., p. 539.
[15] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. Cit., p. 539.