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Direito Penal Brasileiro e psicologia jurídica: uma análise sobre os casos de psicopatia

Agenda 30/01/2016 às 09:27

No sistema jurídico brasileiro atual, o psicopata é tratado de duas formas: um doente mental ou como um ser humano de mente sã. Pretende-se, com este artigo, encontrar uma solução plausível para o enquadramento do psicopata no sistema penal vigente.


1 INTRODUÇÃO

Desde a promulgação da Constituição Federal de 1988 o psicopata possui apenas dois caminhos a seguir na Justiça Brasileira: o primeiro é ser considerado imputável e colocado em um presídio comum, mesclado com outros presos ''normais''; o segundo caminho é ser classificado como semi-imputavél, sendo-lhe aplicado medida de segurança, ficando o condenado internado para tratamento.

São caminhos divergentes e nem sempre adequados. Ao longo deste trabalho, poderá ser observado que a mente psicopata entende o fato criminoso que está sendo praticado. De conseguinte, isso já seria suficiente para o agente ser considerado imputável. Contudo, já foi comprovado que a mente dos psicopatas possui uma disfunção cerebral que afeta a área responsável pelas emoções, ou seja, colocá-los juntos de outros presos, em presídios comuns, não seria nada adequado. Em verdade, essa conduta estatal acaba por colocar os outros apenados em estado de perigo.

Pedro Rodrigues Filho e Francisco de Assis Pereira, dois nomes aparentemente desconhecidos. Ambos são considerados assassinos frios, sem remorso ou empatia pelo próximo. Pedro Rodrigues Filho já confessou ter matado mais de cem pessoas, incluindo o seu pai. Já foi preso, e dentro da penitenciária continuou com a série de homicídios. Ele sabe o que faz, mas diz que é algo de família (SILVA, 2008). Já foi condenado, somando todos os processos pelo qual respondeu, por cerca de 400 anos de prisão. Francisco de Assis Pereira é conhecido por estuprar e asfixiar as mulheres que seduzia.

Após ser descoberto, em seu interrogatório, Francisco falava manso e pausadamente como se matar mulheres com cadarço de tênis ou “cordinhas” fosse algo comum. Claramente, percebe-se que ambos os casos se tratam de homens diagnosticados com características psicóticas. Ambos matam porque querem, porque precisam alcançar um objetivo, e para eles nada pode interferir. São pessoas que não possuem chance de vida em sociedade por causa de características que serão abordadas neste trabalho. Prisão se torna um parque de diversões como pode-se perceber pela história de Pedro Rodrigues Filho. Sendo assim, onde indivíduos diagnosticados com um transtorno tão sério devem ser acondicionados? Onde esses homens já citados e mais conhecidos como “Pedrinho Matador” e “Maníaco do Parque”, respectivamente, devem ser colocados para evitar que façam mais vítimas?

Outra problemática se apresenta nesse contexto: Esse grave distúrbio no cérebro não apresenta chances de cura pela medicina, até o presente momento, apenas já se tem notícia de um método de inibição dos instintos antissociais; o meio social. Sendo assim, se o psicopata for internado para tratamento visando a cura do seu transtorno comportamental, o resultado seria inútil e ainda ocuparia o lugar de outros indivíduos que, de fato, têm chances de cura.

É sabido que, na década de 1930, o então Presidente Getúlio Vargas promulgou o Decreto nº 24.559/34, que tinha por objeto a figura do psicopata, seus bens, onde deveriam ser internados, dentre outras nuances. É lamentável que um assunto tão atual tenha sido debatido e discutido há quase 100 anos atrás, e, hodiernamente, com tantos crimes brutais ainda sendo cometidos por mentes psicopatas, a legislação penal do Estado Brasileiro não disponha de elementos que tratem especificamente do indivíduo criminoso-psicopata. Por conseguinte, pensando nessa necessidade de melhor adequação do psicopata no sistema penal do Brasil é que o autor deste artigo criou as “Medidas de Contenção”.

Essas “Medidas de Contenção” serão apresentadas no final deste estudo para que o leitor tenha uma noção geral do mínimo que uma pessoa com um distúrbio tão sério como a psicopatia deveria obter do Estado, seja ele um simples infrator ou um assassino em série. Os artigos penais referentes às “Medidas de Contenção” foram criados para tentar demonstrar que é possível proporcionar um melhor tratamento para o psicopata no atual sistema penal brasileiro. Uma simples tentativa de proteção dos mais fracos diante do mal em potencial advindo da figura do psicopata.

2 CARACTERÍSTICAS PARA DIAGNÓSTICAR A PSICOPATIA

Os psicopatas, ao longo dos tempos, têm sido figuras bastante emblemáticas. Filmes, novelas, livros, ou qualquer outro tipo de mídia artística sempre exploram os aspectos da mente psicótica. A dupla personalidade desses tipos de indivíduo é tão atraente para os artistas quanto o charme que eles transmitem, geralmente, para as vítimas. É sabido que os psicopatas geralmente são inteligentes, sedutores e conquistam o espaço que frequentam com rapidez. Não obstante, possam cometer crimes friamente calculados, com requintes de brutalidade, sejam eles físicos ou psicológicos.

Observando os seguintes exemplos, será possível identificar algumas características psicóticas, cujo estudo será afincado neste capítulo:

 

2.1 PSICOPATIA

Há anos, a figura do psicopata tem sido alvo de estudos. Philippe Pinel, um físico francês, há mais de 200 anos, classificava como psicopata um indivíduo sem remorso ou restrições, como se fosse um louco, mas que não sofre de confusões mentais. Dr. Robert Hare, um dos nomes atuais mais conhecidos, quando se trata do assunto relacionado à psicopatia, adaptou o pensamento de Pinel, imputando ao sujeito que não se importava com o certo ou o errado e, muito menos, suas consequências como um ser insano, mas sem delírios (TURVEY, 2012, p. 449).

Hare pesquisou os psicopatas por mais de 35 anos e formulou a “Hare Psychopathy Checklist (PCL), mais tarde reformulada e chamada de “Hare Psychopathy Checklist – Revised (PCL-R)[1], a partir da ideia de Hervey Cleckley que, na década de 40, já havia listado 16 características que envolvem a personalidade psicótica no seu livro “The Mask of Sanity. A lista feita por Hare é, atualmente, a fonte mais segura para se detectar a possibilidade de um indivíduo ser psicopata.

Para este estudo irá ser adotada a ideia de Hare sobre o que é um psicopata. Essas ideias podem se subdividir em duas:

Dos estudos realizados por Hare, algumas características de personalidade foram enumeradas na “lista de personalidades”, capazes de imputar a alguém o diagnóstico de psicopatia. Cada item pode classificar o paciente em n. 0, caso não se aplique ao sujeito, e, n. 1 se aplicado parcialmente ou n. 2, se a característica se aplica totalmente ao indivíduo estudado. São elas:

  1. Loquacidade – charme superficial;
  2. Falta de empatia;
  3. Manipulação;
  4. Versalidade criminal;
  5. Falha ao aceitar responsabilidade por atos;
  6. Grandiosidade em relação à autoestima;
  7. Impulsividade;
  8. Falta de remorso ou culpa;
  9. Pobreza de controle comportamental;
  10. Irresponsabilidade;
  11. Problemas comportamentais desde pequeno;
  12. Delinquência Juvenil;
  13. Falta de metas, ao longo prazo, verossímeis;
  14. Relacionamentos amorosos de curtos prazos;
  15. Necessidade de ser estimulado, por causa da propensão ao tédio;
  16. Mentiras patológicas;
  17. Estilo de vida parasita;
  18. Comportamento sexual promíscuo;
  19. Revogação da liberdade condicional;
  20. Rasa afetividade.[2]

A lista criada por Cleckley (1941, p. 338-339), que inspirou Hare, possui menos características. Contudo, assim como precursor do estudo da psicopatia moderna, e influência do Dr. Robert Hare, é pertinente ser observada:

  1. Carisma superficial e boa “inteligência”;
  2. Ausência de delírios e outros sinais de pensamento irracional;
  3. Ausência de manifestações psiconeuróticas;
  4. Desonestidade;
  5. Mentira e insinceridade;
  6. Falta de remorso ou culpa;
  7. Comportamento antissocial sem motivo adequado;
  8. Juízo pobre, dificuldade em aprender com a experiência;
  9. Egocentrismo patológico e incapacidade de amar;
  10. Pobreza generalizada em reações afetivas maiores;
  11. Déficit específico de “insight”;
  12. Irresponsabilidade generalizada em relações interpessoais;
  13. Comportamento fantasioso e desagradável sob o efeito de álcool (às vezes sem);
  14. Rara ocorrência de suicídio;
  15. Vida sexual superficial, trivial e fracamente integrada;
  16. Fracasso em seguir um projeto de vida.

Como foi possível analisar através das listas de diagnóstico criadas por Cleckley e Hare, vários desses itens podiam ser identificados no caso de Phineas Cage e Neville G. C. Heath como, por exemplo, a irresponsabilidade. Essa característica, além do conceito comum bastante difundido, envolve também a não aceitação de ter cometido um ilícito, bem como a falta de culpa.

É claro que ter uma das características de ambas ou de uma das listas não faz, diretamente, o sujeito um psicopata; é preciso um conjunto de características e uma pontuação considerável para que, no mínimo, seja o diagnóstico positivo de psicopatia considerado pelo avaliador.

2.2 ANÁLISE DE UMA PSICOPATIA SUPOSTAMENTE PROVOCADA E PSICOPATIA PADRÃO: casos Phineas Gage e Neville G. C. Heath

No caso de Gage, tanto a família quanto os amigos próximos notaram, como já citado alhures, que ele se tornou imprevisível e antissocial. Essas duas características podem desencadear vários fatores presentes na “Hare Psychopathy Checklist – Revised (PCL-R)” como, por exemplo, irresponsabilidade, mentiras patológicas, propensão ao tédio, pobreza de afetividade. Não estamos afirmando que Gage era um psicopata, mas que há uma relação direta entre o acidente sofrido e a patologia por ele adquirida, isso é um fato.

O grande segredo do caso de Phineas Gage se encontra no pós-acidente. Gage foi atingido por uma haste de ferro na região do córtex medial pré-frontal, região cerebral que recebe influência direta do sistema límbico, que está conectado com a tomada de decisões relacionadas à vida pessoal e social. Esse sistema límbico possui um componente importantíssimo para este trabalho - o núcleo amigdaloide – ou, simplesmente, amígdala. Esse componente é como o botão de acionamento das emoções.

Segundo Ana Beatriz Barbosa Silva, médica graduada pela UERJ e pós-graduada em psiquiatria pela UFRJ, a partir do momento em que o sistema afetivo-límbico transmite menos informações ao lobo frontal (conhecido também como a área executiva do cérebro), o uso da razão supera a afetividade, resultando na ausência de emoção.

Desse modo, Silva (2008, p. 161) leciona que:

Se considerarmos que a amígdala é o nosso “coração cerebral”, entenderemos que os psicopatas são seres sem “coração mental”. Seus cérebros são gelados e, assim, incapazes de sentir emoções positivas como o amor, a amizade, a alegria, a generosidade, a solidariedade... Essas criaturas possuem grave “miopia emocional” e, ao não sentirem emoções positivas, suas amígdalas deixam de transmitir, de forma correta, as informações para que o lobo frontal possa desencadear ações ou comportamentos adequados.

Para corroborar com as ideias apresentadas, é pertinente citar a experiência feita por dois cientistas, H. Klüver e P. Bucy. Esses estudiosos danificaram o sistema límbico de macacos “Rhesus” e entre os componentes do sistema límbico lesado, estava a amígdala. Consequentemente, esse experimento resultou em uma mudança drástica comportamental dos animais. Essas alterações comportamentais ficaram conhecidas como síndrome de Klüver e Bucy (MACHADO, 2006, p. 281).

Dessas ideias, pode-se inferir que os psicopatas agem muito mais pela razão, entendendo suas ações, sabendo até onde podem ir e quais as consequências de seus atos. Os psicopatas são seres que não pensam na coletividade, apenas no seu bem-estar pessoal. Por conseguinte, pode-se inferir que os psicopatas não sentem as emoções de suas vítimas; eles não conseguem se colocar no lugar delas e entender o mal que estão causando. Assim, por agirem só pela razão, é muito improvável obter o sucesso da ressocialização em relação a essas mentes, a depender de cada indivíduo.

O caso de Neville G. C. Heath é o exemplo de um dos níveis de crueldade que um sujeito com as funções emocionais anormais pode praticar. Não importa o quanto as mulheres do caso Heath implorassem ou demonstrassem as dores que sentiam. Neville iria até o fim do ato para chegar ao seu objetivo, e nada, muito menos demonstrações profundas de dor, iria atravessar seu caminho. O foco no objetivo é o combustível propulsor das atrocidades de um psicopata.

Destaca-se que, não está sendo falado que os psicopatas possuem lesões físicas no cérebro ou algo similar. Foi dito que o sujeito com psicopatia possui alterações funcionais relacionadas com a área do cérebro que envolve as emoções. Gage teve alterações que lhe conferiram características muitas vezes encontradas na figura do psicopata, e Heath dispensa qualquer comentário. Pode-se concluir que o psicopata, assim como nas definições de Hare, é uma combinação de dois fatores: um ser com alterações neurobiológicas e sociais.

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Como Kent A. Kiehl e Joshua W. Buckholtz (2010) citam em um artigo científico, publicado pela “Scientific American”, conforme os investigadores pensam, há 50% de chance dos genes serem os responsáveis pelos comportamentos antissociais nos adultos, presume-se que, os elementos sociais que cercam o indivíduo, também contribuem para o surgimento do psicopata em sociedade. Sendo assim, o sujeito pode nascer com predisposição a ser um psicopata, ou seja, possuir disfunções neurobiológicas, todavia, se a base familiar é sólida, e se o ambiente em que o indivíduo cresceu foi condizente com o que se entende por “ambiente normal”, bem como vários outros fatores favoráveis, há grandes chances do ser psicopata não brotar em sua magnitude.

Como exemplo, pode-se citar o caso do professor de psiquiatria e comportamento humano da “University of California, Irvine (UCI)”, James Fallon. James fazia uma pesquisa, nos idos de 2005, cujo objeto era comparar cérebros de assassinos em série com cérebros de pessoas “normais”, para que assim pudesse descobrir se havia alguma relação entre os cérebros desses criminosos e seus atos comportamentais. James usava as tomografias de membros da família como critério de cérebro “normal”. Contudo, ao chegar ao fim da pilha de tomografias da sua família, ele percebeu que uma delas possuía alterações nas áreas que envolvem as emoções. Isso indicava a psicopatia. James ficou chocado ao saber que aquele exame tomográfico era o seu.

Segundo uma entrevista feita pela BBC Brasil com James Fallon (VASCONCELOS, 2013), o cientista relatou que se submetera ao teste do Dr. Robert Hare para ter certeza de que, de fato, tinha predisposição à psicopatia. Sabe-se que na escala feita por Hare, a pontuação máxima é 40. James disse que chegou a alcançar até 22 pontos.

De acordo com a entrevista, Fallon diz ter tido uma base familiar boa e que o amor dos entes próximos impediu que ele se tornasse um “predador social”. Genes vs. Meio. Um confronto em que apenas um irá se sobressair, levando, em consequência, o indivíduo a exteriorizar determinado comportamento. Seja ele um pai de família, com suas desordens de comportamento controláveis e sociáveis, um mero meliante de furtos e contravenções penais ou um legítimo psicopata.

2.3 SOBRE COMO O MEIO SOCIAL CONTRIBUI PARA O DESENVOLVIMENTO DOS TRANSTORNOS COMPORTAMENTAIS

Sobre a ideia do meio social como potencializador dos instintos psicóticos, é válido citar um estudo interessante ocorrido na Universidade de Stanford, Califórnia, em 1971, sob o comando do psicólogo Philip Zimbardo. Esse estudo ocorreu após alguns estudantes se candidatarem a um estudo sobre os efeitos psicológicos da vida prisional no indivíduo, através de um anúncio que tinham visto no jornal. Foram selecionados 24 estudantes dos Estados Unidos e do Canadá que queriam 15 dólares por cada dia que ficassem submetidos à experiência.

Os estudantes selecionados eram do sexo masculino, saudáveis, aparentemente dóceis e de classe média. Desses 24 estudantes, nasceram dois grupos, os guardas e os prisioneiros. No corredor do departamento de psicologia da Universidade de Stanford, foi construída uma réplica de uma prisão. Tudo ocorreu com ajuda de pessoas experientes, que conheciam o dia-a-dia de uma penitenciária.

A experiência começou no dia 14 de agosto de 1971, um domingo. Os estudantes que se passavam por condenados, eram tratados como tais; faziam chamadas, exercícios e recebiam castigos como ir para solitária ou ficar despidos enquanto recebiam spray (simulação da possibilidade deles terem trazido germes ou piolhos para o presídio). Ou seja, tudo era muito bem executado e, em poucos dias, a sensação de que estavam em uma penitenciária de verdade se apoderou dos estudantes que começaram a se comportar como apenados, chegando até fomentar rebeliões e fugas (EXPERIÊNCIA..., 1999).

Zimbardo (2013, p. 134) no seu livro “Efeito Lúcifer” cita:

Depois de menos de três dias imersos nessa situação bizarra, alguns dos estudantes que representam os guardas da prisão avançaram muito além da mera encenação. Internalizaram a hostilidade, a influência negativa e as características mentais de guardas de prisões de verdade, como se evidencia pelos relatórios de turno, diários retrospectivos e algumas reflexões pessoais.

Ou seja, o ambiente ajudou os estudantes a “entrarem’’ nos papéis designados. Só assim foi possível que a experiência tivesse chances de render frutos. Ainda sobre a forma como o ambiente gerou consequências nesses estudantes, um deles, Varnish (ZIMBARDO, 2013, p. 134), relata no livro “Efeito Lúcifer” que:

Tive de desligar intencionalmente todos os sentimentos com relação aos prisioneiros, perder a simpatia e qualquer respeito que tinha por eles. Comecei a tratá-los, verbalmente, o mais frio e rigidamente possível. Procurei não demonstrar quaisquer sentimentos que eles gostariam de ver em mim, como raiva e desespero.

Varnish tinha um dever a cumprir, e o ambiente em que estava inserido o forçou a ser quem ele não era para alcançar seu objetivo. Em consequência a esse tipo de declaração a experiência passou a se tornar tão real a ponto de haver colapsos nervosos entre os presos, choro, raiva, entre outros estresses que uma situação dessas pode causar. A experiência foi tão impactante que os pais de alguns estudantes quiseram que Zimbardo chamasse um advogado para liberar os filhos. A partir desse momento Zimbardo viu que era a hora de parar. O estudo havia tomado caminhos nunca imaginados. Humilhações, torturas psicológicas nos estudantes presos, tentativas de confronto destes com os outros integrantes do experimento que se passavam por guardas. Em suma, tudo havia se tornado um filme de terror para os envolvidos. O clima era tenso, assustador. Zimbardo (EXPERIÊNCIA..., 1999) revela que:

Terminei o estudo prematuramente por duas razões. Em primeiro lugar, tínhamos constatado, através de vídeos, um agravamento dos abusos aos reclusos a meio da noite por parte dos guardas quando pensavam que nenhum investigador os estava a observar e que a experiência estava "desligada". O seu aborrecimento levou-os a abusos mais pornográficos e degradantes dos reclusos. Em segundo lugar, Christina Maslach, uma recém doutorada de Stanford, que tinha sido convidada a realizar entrevistas a guardas e reclusos, opôs-se fortemente quando viu os nossos reclusos serem conduzidos para a casa de banho, com sacos enfiados nas cabeças, pernas acorrentadas, com as mãos nos ombros uns dos outros. Cheia de indignação, afirmou: "O que vocês estão a fazer a estes rapazes é terrível!" No meio de 50 ou mais indivíduos externos que viram a nossa prisão ela foi a única que questionou o seu estatuto moral. Contudo, após a sua chamada de atenção para o efeito poderoso da situação, ficou claro que o estudo deveria terminar.

Não há estudo melhor para comprovar o poder do ambiente quanto esse experimento ocorrido em Stanford e organizado por Zimbardo na década de 70. Se até estudantes comuns sucumbiram ao “poder do meio”, porque um sujeito predisposto à psicopatia seria diferente? Infelizmente, não o é. O sujeito com tendências psicopatas irá aflorar seus extintos em algum momento da vida caso não possua o devido cuidado na sua educação, conforme comprova-se pela situação de James Fallon, que apesar de não ser a regra, é uma esperança que nasce diante de tantas informações negativas acerca do tratamento sem sucesso de um psicopata.

3 O psicopata no direito penal brasileiro

Com todas essas ideias expostas, fica a dúvida de como tratar esses seres predispostos à psicopatia, quando o meio contribui para o seu surgimento, à luz do Direito Penal brasileiro. Como esses sujeitos são considerados pela nossa política criminal e como eles deveriam ser tratados? Este capítulo irá tentar responder tais dúvidas.

No atual sistema penal brasileiro, duas são as opções que o magistrado tem para aplicar, a título de sanção penal: pena ou medida de segurança.

Segundo Gomes (2007, p. 654): “Pena: é a sanção (castigo) imposta pelo Estado (pela autoridade judicial competente), quando necessária (para fins de repressão e de prevenção), de acordo com o devido processo legal, ao agente culpável de um fato punível”.

Pode-se conceituar a pena como sendo “a sanção imposta pelo Estado, através da ação penal, ao criminoso, cuja finalidade é a retribuição ao delito perpetrado e a prevenção a novos crimes (NUCCI, 2013, p. 400).

São espécies da pena, a privação de liberdade, penas restritivas de direito e pena pecuniária. Atualmente, os indivíduos com plena capacidade mental podem ser considerados autores imputáveis de um ato injusto. Se o sujeito é imputável, quer dizer que ele passou pelo “teste de admissibilidade” para ser responsabilizado pelo seu ato, ou seja, ele praticou um ato ilícito, típico e culpável.

Em se tratando do sujeito que cumpre pena através da privação de liberdade, algumas garantias são fornecidas, acaso tenha bom comportamento, não for reincidente, entre outros requisitos. Tais garantias são: progressão de regime, livramento condicional, suspensão condicional da pena, permissão de saída ou remição.

No caso da progressão de regime, esta ocorre, em regra, quando o sujeito cumpri pelo menos um sexto da pena no regime anterior e apresentar bom comportamento carcerário.

Em relação ao livramento condicional, o magistrado pode permitir a redução do tempo de prisão, concedendo antecipadamente e provisoriamente a liberdade do apenado, mediante preenchimento de determinados requisitos e condições impostas. São alguns requisitos para o livramento condicional segundo o art. 83 do CP: cumprimento de um terço da pena, se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes, comprovado comportamento satisfatório na execução da pena e nos trabalhos realizados, bem como comprovar que possui meios de sustento mediante trabalho honesto caso seja liberado.

A suspensão condicional da pena é um instituto que encontra correspondente no art. 77 do Código Penal. Possui como objetivo a suspensão da execução da pena privativa de liberdade, evitando o consequente encarceramento do condenado.

O art. 77 do CP (BRASIL, 1940) aduz que para a concessão da suspensão condicional da pena é necessário:

I – o condenado não seja reincidente em crime doloso;

II – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstancias autorizem a concessão do benefício;

III – não seja indicada ou cabível a substituição prevista pelo art. 44 deste código [...]

Percebe-se que, novamente, o comportamento do sujeito e seu passado são analisados para se estudar uma possível melhora na condição do criminoso. A permissão de saída é um instituto que pode ser encontrado na Lei de Execução Penal (LEP), em seu art. 120. Na permissão da saída, o sujeito que cumpre pena em regime fechado ou semiaberto, ou se for preso provisório, pode, por um tempo determinado e devido a uma finalidade comprovada, sair do ambiente carcerário. Como exemplo, pode-se citar o falecimento da mãe de um preso. Através da permissão de saída concedida pelo diretor do estabelecimento em que se encontra o preso, o sujeito poderá ir ao enterro da genitora.

Por fim, a remição seria a possibilidade do apenado cumprir menos tempo de pena devido ao trabalho e o estudo exercidos no tempo em que estava em regime fechado ou semiaberto. Um dia de pena pode ser diminuído a cada 12 horas de frequência escolar, fracionadas, no mínimo, em três dias. Também, a cada três dias trabalhados, o prisioneiro terá a redução de um dia da pena total aplicada.

Aplicando os institutos acima para uma pessoa diagnosticada com psicopatia, alguns problemas sérios são encontrados e se correlacionam com o que foi estudado no capítulo 2 deste trabalho.

É sabido que o psicopata não possui respeito por normas, e se acha acima de todas elas. Ele é capaz de tirar proveito de uma possível condenação fomentando rebeliões, matando indivíduos, participando de sessões de terapia em grupo na penitenciaria unicamente com o objetivo de aprender sobre as fraquezas humanas, e, principalmente, dos seus colegas de cela. Conforme leciona Trindade (2010, p. 172), “psicopatas não se intimidam com a severidade do castigo, nem aprendem com a experiência”. O próprio caso já relatado na introdução deste estudo, sobre “Pedrinho matador”, revela como uma prisão comum se torna um mundo inteiramente cheio de possibilidades para a sua carreira, quem sabe até criar novos delitos e usar os presidiários como cobaias humanas.

Seguindo esse raciocínio, acondicionar o sujeito diagnosticado com psicopatia em uma cela comum do sistema penitenciário seria um equívoco. Contudo, diante da falta de um local diferenciado e adequado para esses indivíduos, atualmente, eles são condenados como presos comuns quando considerados imputáveis.

Quando o magistrado considera o psicopata um ser imputável significa que possui, conforme leciona Nucci (2014, p. 253), “condições pessoais, envolvendo inteligência e vontade, que permite ao agente ter entendimento do caráter ilícito do fato” [...]. Já foi comprovado, por estudos, conforme o disposto no capítulo 2, que o psicopata entende perfeitamente o que está fazendo, racionalizando ao máximo cada ato que pratica. O próprio Dr. Robert Hare (apud TRINDADE, p. 174, 2010) quando questionado acerca da possibilidade de se considerar o psicopata um ser imputável, respondeu: “O senhor acredita, do ponto de vista jurídico, que os psicopatas são totalmente responsáveis por seus atos? ‘Eu diria que a resposta é sim’”

Em contraposição ao pensamento exposto, está a possibilidade do psicopata ser considerado pelo magistrado pátrio, semi-imputável. O art. 26 do Código Penal trabalha o destino do indivíduo considerado inimputável ou semi-imputável. O caput do artigo diz que o inimputável é o sujeito que, devido à doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou omissão, inteiramente incapaz de entender que estava praticando um fato ilícito, ou seja, contrário ao direito, sendo, então, isento de pena.

Já o semi-imputável, segundo o parágrafo único do art.26, sofre uma redução de pena imposta se ao tempo da ação ou omissão, possuía alguma perturbação mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado. A diferença básica entre o caput do art. 26 e seu parágrafo único, é o conceito de perturbação mental. Essa perturbação seria uma possibilidade de que, ao meio da confusão mental, o agente ainda tivesse certa compreensão do ato praticado. Enquadrar o psicopata nesse sentido, seria admitir que ele não sabe o que faz.

Ainda há a possibilidade do juiz do processo, caso perceba que a perturbação mental é extrema o suficiente para justificar um tratamento curativo, converter a pena em medida de segurança que é uma outra espécie de sanção penal. Junto com a pena, essa medida de segurança forma as duas possibilidades de aplicação de sanção a um condenado pela via criminal.

Nucci (2014, p. 528-529) leciona sobre as formas como a medida de segurança pode ser aplicada ao agente ativo do delito:

  • Internação, que equivale ao regime fechado da pena de privação de liberdade, inserindo-se o sentenciado no hospital de custódia e tratamento, ou estabelecimento adequado; (art. 96, I, CP)
  • Tratamento ambulatorial, que guarda relação com a pena restritiva de direitos, obrigando o sentenciado a comparecer, periodicamente, ao médico para acompanhamento (art. 96, II, CP).

Como pode-se notar, a medida de segurança possui uma natureza muito mais de prevenção e cura do sujeito, bem diferente da pena através do seu caráter de retribuição do mal pelo mal, ainda que se tenha um desejo de ressocialização e de prevenção.

Uma das características principais da medida de segurança é que ela é imposta, geralmente, ao inimputável. Já ao semi-imputável, esse tipo de sanção só ocorrerá, como já explicado, caso a perturbação mental do sujeito justifique a sua internação ou o tratamento ambulatorial. Aplicando-se o instituto em análise ao psicopata, estar-se-ia admitindo que o psicopata é um doente mental ou que possui perturbações mentais gravíssimas a ponto de submetê-lo a um tratamento curativo.

É consabido que esses indivíduos possuem uma desordem cerebral que poderia “justificar” seus atos. Contudo, a partir do momento que se descobre o nível de razão com o qual os psicopatas agem, conhecendo o mal que causam, notadamente quando praticam atos criminosos para alcançar seu sucesso pessoal, essa ideia de mera perturbação mental ou que eles sejam portadores de doença mental não se encaixa como deveria. Eles podem não ser “normais” como os demais seres humanos, mas também não são “diferentes” a ponto de serem taxados de débeis mentais.

Trindade (2010, p. 172-173) cita, em seu livro, duas sentenças que deixam bem claro como os psicopatas funcionam, em se tratando de tratamento ou internação:

  • Psicopatas não se intimidam com a severidade do castigo e nem aprendem com a experiência;
  • Psicopatas não aderem voluntariamente a nenhum tipo de tratamento e, se e quando fazem, é apenas para obter benefícios e vantagens secundárias.

Seguindo o raciocínio de Jorge Trindade, chega-se à conclusão de que colocar o psicopata para tratamento é um risco em potencial. Afinal, o sujeito psicopata pode muito bem querer participar de grupos de terapia para, justamente obter mais informações acerca da fragilidade dos outros humanos. E isso pode ser aplicado até mesmo na pena privativa de liberdade. Saber as faltas e os problemas psicológicos dos colegas de cela, em uma sessão de terapia em grupo, abre um rol de possibilidades de tramas para o psicopata simplesmente satisfazer seu interesse pessoal.

Silva (2008, p.169) relata:

Temos que ter em mente que as psicoterapias são direcionadas às pessoas que estejam em intenso desconforto emocional, o que as impede de manter uma boa qualidade de vida. Por mais bizarro que possa parecer, os psicopatas parecem estar inteiramente satisfeitos consigo mesmos e não apresentam constrangimentos morais ou sofrimentos emocionais como depressão, ansiedade, culpa, baixa autoestima etc. Não é possível tratar um sofrimento inexistente.

Sendo assim, o que poderia ser feito para melhor adequar a personagem do psicopata para que a sociedade tivesse uma resposta eficaz do mal que um dia pairou sobre ela? Esta será a pergunta trabalhada na próxima seção.

3.1 COMO PODERIA SER O DESTINO DO PSICOPATA À LUZ DO DIREITO PENAL BRASILEIRO

Há cerca de 80 anos atrás, o então Presidente da República, Getúlio Vargas promulgou o decreto 24.559/34 (BRASIL, 1934). Esse decreto discorria sobre o psicopata e seu destino, à luz da realidade da época. Alguns artigos podem ser citados para a melhor compreensão acerca do decreto de 1934:

O decreto é antigo e não corresponde com muitas das descobertas já feitas em relação ao psicopata. Pode-se perceber que o texto do decreto quer transmitir a possibilidade do psicopata ser um doente assim como um enfermo mental. Contudo, deve-se registrar como o até então presidente era visionário em muitos assuntos. Vargas simplesmente dedicou 34 artigos de um decreto para tratar dos psicopatas e indivíduos com patologia análoga, incluindo até mesmo a perícia médica para se constatar se, de fato, o sujeito era ou não um psicopata.

Mais do que isso, o decreto de 1934 ofereceu um destino certo e seguro aos psicopatas, bem diferente do que vem ocorrendo atualmente no nosso país em que ou ele é preso como um cidadão comum, ou levado a tratamento ou internação, através da medida de segurança.

Palhares e Cunha (2012) citam que “em alguns países desenvolvidos os psicopatas são separados em celas específicas (individualizadas) em relação aos demais presos (Canadá, Austrália e parte dos Estados Unidos, por exemplo) ”. Sendo assim, o que impediria o Brasil de adotar o exemplo desses países? Se há 80 anos já se pensava que o psicopata devia ficar separado e isolado da sociedade, por qual razão isso ainda não é aplicado em uma sociedade que já conhece tanto sobre esses seres “antissociais”?

São perguntas que só o tempo poderá responder. Só uma nova política criminal poderia dar um rumo mais concreto ao psicopata. Todavia, uma nova política criminal não bastaria se o Governo Federal não construísse locais apropriados para acondicionar os portadores de psicopatia. Neste local não iria ser focado todos os esforços em tratamentos, já que foi demonstrado que, por hora, são ineficazes, especialmente para os psicopatas mais graves como os assassinos em série. Mas sim mantê-los longe das suas presas, os cidadãos em geral, bem como os apenados não portadores de psicopatia. Trabalhos manuais, estudos, qualquer tipo de atividade seria válido para manter o psicopata ocupado, evitando que ele use do seu intelecto para ludibriar, assassinar ou causar danos psicológicos a inocentes.

A partir das sugestões e conselhos do delegado de polícia civil do Rio Grande do Norte, Alexandro Gomes Bezerra dos Santos (2014), foi considerada a formulação de “Medidas de Contenção” como espécie de pena que poderia existir em contra-ataque aos delitos praticados por psicopatas. Diante dessa necessidade de uma quarta espécie de pena, o autor deste trabalho teve a liberdade de escrever nove artigos dispondo sobre o psicopata e sua melhor adequação no sistema penal. Esses artigos foram uma inovação jurídica feita por este trabalho para que o leitor possa ter uma noção de como esses indivíduos poderiam ser “cuidados” pelo Código Penal brasileiro.

Essas “Medidas de Contenção” constariam, inicialmente, no rol constante do art. 32 do Código Penal que delimita as espécies de pena, deixando claro que o estudo aprofundado das “Medidas de Contenção” (conforme dispõe os artigos abaixo) ocorreria na seção IV do capítulo I (DAS ESPÉCIES DE PENA), do título V (DAS PENAS) do Código Penal vigente.

Das Medidas de Contenção (Elaborado e organizado por Wendell Henrique Silva Santana):

Como pode-se inferir a partir da leitura dos artigos, as medidas de contenção não privilegiam o tratamento, e sim a simples e propriamente dita “contenção”. Seus artigos foram escritos com o objetivo de ofertar um destino mais adequado aos indivíduos diagnosticados com a psicopatia.

Os referidos artigos se preocuparam tanto com os direitos fundamentais dos psicopatas que, inclusive, pode-se identificar a possibilidade deles retornarem à sociedade (dependendo de cada caso e da gravidade da psicopatia) de acordo com os laudos apresentados pelos médicos responsáveis a cada um sexto de pena cumprido pelo condenado. Contudo, para um maior controle do retorno desses indivíduos ao convívio social, o livramento condicional nem a suspensão condicional da pena são admissíveis para os condenados ao CDCON.

Em suma, as medidas de contenção funcionam da seguinte maneira (tomando como base um caso em que a psicopatia demostra-se evidente): o condenado por um crime praticado com requintes de crueldade e notória violência, assim que recebesse sua pena iria ser encaminhado ao menos a três psiquiatras nomeados pelo próprio juiz que julgou o caso, para que elaborassem laudos médicos baseado na regulamentação oficial internacional utilizada para os indivíduos com psicopatia, e que no momento em que este artigo foi escrito seria a “Hare Psychopathy Checklist – Revised (PCL-R). Outros exames complementares que se fizessem necessários poderiam ser realizados para se chegar a um diagnóstico satisfatório e seguro do sujeito.

Caso diagnosticada a psicopatia no indivíduo, este seria encaminhado para um CDCON mais próximo da região em que mora. Caso o CDCON não tivesse sido construído como prevê os artigos mencionados seria possível mantê-lo em um presídio de segurança máxima, desde que ficasse isolado. Afinal, as demais regras do sistema penal em curso só podem ser aplicadas nas medidas de contenção se aquelas não entrassem em conflitos com os princípios destas.

Esse condenado teria acompanhamento interno no CDCON´s por psiquiatras e, após no mínimo um sexto de cumprimento de pena, o apenado teria que ser submetido, no mínimo, a dois novos exames médicos para confirmar sua psicopatia.

Esses laudos seriam apresentados com os mesmos requintes de rigorosidade dos laudos iniciais. Caso os dois exames médicos iniciais realizados após o cumprimento de um sexto da pena confirmassem que os primeiros laudos estavam errados, o que seria uma chance remota, o preso seria transferido para um complexo de segurança máxima, média ou posto em liberdade, a depender do delito cometido e da pena imposta.

Ainda, se esses laudos confirmassem que o sujeito é, de fato, um psicopata, novos pareceres acerca do seu caso seriam apresentados a cada um sexto de pena cumprida a contar da data dos últimos laudos apresentados. Se, de acordo com o perfil do acusado, estilo de vida passado, crimes cometidos e, especialmente, o nível de sua psicopatia, o médico responsável vislumbrasse a possibilidade do retorno do sujeito ao convívio social mediante monitoração eletrônica (seja qual for o dispositivo eletrônico usado na época) e acompanhamento pelo Psiquiatra do CDCON em que ele estava contido, o condenado poderia ser solto. Do contrário, o apenado ficaria no CDCON até o término de sua pena ou até 30 (trinta) anos, no máximo.

Posto isto, verifica-se que as medidas de contenção foram criadas visando andar de mãos dadas com a constituição, sempre respeitando o condenado ao mesmo tempo em que lhe aplica a sanção cabível. É de extrema importância que ao ler os artigos da medida de contenção, o leitor tenha em mente que está sendo trabalhado medidas de pena para alguém que já nasce com um problema, até então, incurável. O psicopata não escolheu ser o que é, assim como nem todos são estupradores, violentos ou assassinos!

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O psicopata é um indivíduo que ainda precisa ser muito estudado. Eles são seres complexos e que precisam de atenção por parte das autoridades para que não tragam mais danos a sociedade que frequentam.

Foi mencionado através deste estudo que o psicopata não é um ser desprovido de entendimento dos seus atos. Suas emoções ficam em segundo plano e a razão toma as rédeas da maioria, senão todas, as situações do dia-a-dia.

Atualmente, tratamentos curativos para esses indivíduos, especialmente os mais violentos, são praticamente ineficazes. Os psicopatas são seres que se acham os mais normais dos seres humanos, sendo assim, tratar alguém que não se considera doente é muito complicado.

Entretanto, mesmo sendo dito neste trabalho que o psicopata não é um ser humano “comum”, não quer dizer que ele seja um doente mental. Longe disso! Os estudos aqui demonstrados comprovaram as alterações no cérebro dos psicopatas, sem prejuízo das reponsabilidades pelos atos praticados que eles precisam ser submetidos.

Mas diante de tantas conclusões não muito animadoras, uma luz no fim do túnel insiste em se manter acessa. Uma luz chamada afeto. O meio social pode ser o melhor tratamento para evitar que o psicopata “acorde”. Os CDCON´s jamais substituirão as necessidades básicas do ser humano como o afeto, o amor, a boa educação e um bom ambiente social. Afinal, longo período nos CDCON`s serve apenas para os sujeitos que já não possuem mais esperanças de controle de sua psicopatia, sendo que o caso de James Fallon comprova que o meio social e os fatores relacionados a convivência familiar, são um potencial inibidor das características dos psicopatas.

Psicopatia, hoje, não possui cura. O ambiente continua sendo o cenário essencial para a formação dos sujeitos, seja ele saudável, com necessidades especiais ou até mesmo para o psicopata que está esperando o primeiro deslize social para se mostrar para o mundo.

   REFERÊNCIAS

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   NOTAS

[1] O portal www.hare.org pode ser acessado caso deseje mais informações sobre as pesquisas acerca da psicopatia desenvolvidas pelo professor canadense Dr. Robert Hare.

[2] A “Hare Psychopathy Checklist – Revised (PCL-R) ” pode ser consultada com seus termos originais na língua inglesa através do livro “Criminal Profiling” de Brent E. Turvey, 2012, p. 450. Bem como, no endereço eletrônico citado pelo portal do Dr. Robert Hare: <http://www.telegraph.co.uk/culture/books/10737827/Psychopaths-how-can-you-spot-one.html?fb>. Acesso em: 10 set. 2014.

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Sobre o autor
Wendell Henrique Silva Santana

Acadêmico do Curso de Direito do Centro Universitário do Rio Grande do Norte (UNI-RN).Tenho experiência como estagiário na área do Direito, tendo estagiado voluntariamente no Fórum Desembargador Miguel Seabra Fagundes em Natal-RN por um semestre e participado, também de forma voluntária, no projeto Natal Sem Dívida que ocorreu entre 18 de novembro de 2013 a 13 de dezembro de 2013. O primeiro estágio remunerado e conquistado mediante concurso público foi na Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Norte - núcleo cível e criminal - durante um ano e quatro meses. Fui também convocado para estagiar em outros órgãos públicos como Justiça Federal, Ministério Público do Rio Grande do Norte e Defensoria Pública da União. <br>Com relação às atividades que não correspondem à área do Direito, destaco a publicação do meu primeiro livro de ficção em 2013, intitulado "Os Viajantes dos Séculos" e a finalização do meu segundo livro, também de ficção e que será submetido a concursos literários, chamado "Segredos Imperfeitos".

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