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Contribuições especiais:desvirtuamento do destino do produto da arrecadação

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Agenda 14/03/2016 às 10:03

Tem como objetivo analisar as particularidades das Contribuições Especiais, delineadas no artigo 149 da CF de 1988, especialmente no que tange a sua característica peculiar da destinação do produto arrecadado, que possui afetação à atividade estatal.

INTRODUÇÃO

            Como é cediço, a instituição e a majoração dos tributos constituem um tema de grande relevância no ordenamento jurídico pátrio, em virtude de corresponder na forma de arrecadar recursos públicos com o fim de financiar o Estado - permitindo o exercício de sua competência e do poder de polícia -, bem como custear os serviços públicos de sua responsabilidade - tais como a educação, assistência, saúde, segurança e transporte.

Diante da importância do tema, o presente trabalho pretende estudar sobre as circunstâncias que englobam as Contribuições Especiais no Sistema Tributário Nacional, mais especificamente a respeito da obrigatoriedade de afetação quanto ao destino do produto arrecadado a determinada atividade estatal.

Assim, o trabalho se inicia com o conceito e a classificação das Contribuições Especiais, de maneira a analisar os critérios diferenciadores, determinados pela Constituição Federal, para identificação das espécies tributárias. Para tanto, adota-se os critérios da materialidade, da destinação das receitas públicas e da possibilidade ou não de devolução dos valores.

A partir dessas conceituações, passa-se a analisar os principais princípios no âmbito Tributário e Orçamentário que influenciam direta e indiretamente as Contribuições Especiais.

Na sequência, são estudadas cada uma das espécies de Contribuições Especiais e suas respectivas peculiaridades, principalmente no tocante à materialidade e à destinação. As espécies de Contribuições Especiais encontradas são: i) sociais, ii) corporativas, iii) interventivas e iv) custeadoras de serviço de iluminação pública.

            Em seguida se discute sobre a obrigatoriedade de previsão do destino da arrecadação e sua correspondente alocação como receita e despesa pública, tanto na norma tributária de instituição, quanto na norma orçamentária - que se preocupa com os valores auferidos por intermédio da atividade tributária, relacionada às Contribuições Especiais.

            E, por fim, levantam-se questões e possíveis conclusões quando da eventual ocorrência de desvirtuamento da afetação da receita pública, seja no momento prévio - de elaboração da lei tributária, orçamentária ou norma regulamentadora -, seja quando do efetivo desvirtuamento das receitas públicas. Tudo com o intuito de permitir a verdadeira Segurança Jurídica, garantia fundamental de todos.

1. CONCEITO E CLASSIFICAÇÃO DAS CONTRIBUIÇÕES ESPECIAIS

          O conceito de Contribuição Especial varia na doutrina e na jurisprudência, em virtude da interpretação de que resulta da classificação dos tributos. As teorias de classificação mais adotadas pelos doutrinadores são a Teoria Tripatite - que tem como adeptos Paulo de Barros e Roque Carrazza - e a Teoria Quinquipartite - adotada por Hugo de Brito Machado, Ives Gandra da Silva Martins, dentre outros e pelo Supremo Tribunal Federal - STF[1].

            Desse modo, o conceito de Contribuição Especial para a doutrina que adota a Teoria Tripartite, por defendê-la numa concepção mais ampla, a enquadra ora como imposto, ora como taxa, tendo em vista adotar apenas o critério da materialidade e da base de cálculo para a classificação, como o faz Paulo de Barros Carvalho. Ou, ainda, classificá-los como tributos vinculados ou não vinculados, conforme defende Sacha Calmon Navarro Coelho.

            Nas palavras de Paulo de Barros, contribuições são:

 

“(...) figuras de impostos ou de taxas, em estrita consonância com o critério constitucional consubstanciado naquilo que nominamos de tipologia tributária no Brasil. Todo o suporte argumentativo calcava-se na orientação do sistema, visto e examinado na sua integridade estrutural. Penso que outra coisa não fez o legislador constituinte senão prescrever, manifestamente, que as contribuições são entidades tributárias, subordinando-se, em tudo e por tudo, às linhas definitórias do regime constitucional peculiar aos tributos” [2].

E ainda, segundo Roque Carrazza, também defensor da Teoria Tripartite:

 

“(...) contribuições são verdadeiros tributos (embora qualificados pela finalidade que devem alcançar). Podem, pois, revestir a natureza jurídica de impostos ou taxa, conforme as hipóteses de incidência e bases de cálculo que tiverem” [3].

Portanto, para aqueles que adotam a teoria Tripartite, as Contribuições podem ser tidas ora como impostos ora como taxas e, figuram, de modo geral, como entidades instituídas constitucionalmente e estudadas no Direito Tributário.

            No entanto, para aqueles os adeptos à Teoria Quimpartite - e adotada no presente estudo -, além de compreenderem que se trata de instituto de natureza tributária, entendem que as Contribuições Especiais devem ser consideradas como uma categoria autônoma dos impostos e das taxas, em razão de suas peculiaridades.

            Para essa teoria se adota os critérios da materialidade, destinação e restituição. Por tais razões, classifica em cinco espécies tributárias, quais sejam: impostos, taxas, contribuições de melhoria, contribuições especiais e empréstimos compulsórios.

            No tocante às contribuições existentes, de forma expressa na vigente Constituição de 1988, são elas, segundo classificação dada pelo STF[4]:

“ c) as contribuições, que são c.1) de melhoria (CF, art. 145, III), c.2) sociais (CF, art. 194), que, por sua vez, podem ser c.2.1) de seguridade social (CF, art. 195, CF, 195, § 4º) e c.2.2) salário educação (CF, art. 212, § 5º) e c.3) especiais: c.3.1) de intervenção no domínio econômico (CF, art. 149) e c.3.2) de interesse de categorias profissionais ou econômicas (CF, art. 149). Constituem, ainda, espécie tributária”.

      

            Diante disso, adotando-se a Teoria Quinquipartite, o critério jurídico que informa a classificação normativa das Contribuições Especiais está situado na destinação do produto da arrecadação, atribuindo-se, assim, uma característica diferenciadora das demais espécies tributárias.

            Ademais, cumpre informar que para os adeptos dessa teoria o art. 4º do CTN não foi recepcionado pela Constituição Federal, posto que a destinação constitui sim critério relevante para a adequada classificação das espécies tributárias[5].

            Para enfatizar essa peculiaridade das Contribuições, cumpre citar o ilustre doutrinador Roque Carrazza que, embora entenda que as Contribuições ora assumem natureza de Imposto, ora de Taxa e de Contribuição de Melhoria (por adotar a Teoria Tripartite), compreende que as Contribuições possuem a peculiaridade de vincular a sua destinação. Em suas palavras:

“Notamos, pois, que as ‘contribuições’ ora em exame não foram qualificadas, em nível constitucional, por suas regras-matrizes, mas, sim, por suas finalidades. Parece-nos sustentável que haverá esse tipo de exação sempre que implementada uma de suas finalidades constitucionais. (...) De qualquer modo, sejam quais forem suas hipóteses de incidência e base de cálculo, o produto da arrecadação das contribuições sempre deve destinar-se a atingir uma das supra-aludidas finalidades. (...) por imperativo da Lei Maior, os ingressos advindos da arrecadação destes tributos devem necessariamente ser destinados à viabilização ou ao custeio de uma das atividades mencionadas no art. 149 da CF. (...) Embora neguemos que, em regra, a destinação do produto da arrecadação é irrelevante para caracterizar o tributo, não podemos ignorar que as contribuições, ainda que venham a assumir roupagem de imposto, pressupõem, por comando expresso da Carta Magna, a vinculação da receita obtida a órgão fundo ou despesa. (...) Por aí já podemos notar que a finalidade é o caminho mais seguro para a identificação do regime jurídico das contribuições, o que equivale a dizer que qualquer desvio (...) acarretará a injuridicidade da própria cobrança destas exações” [6].

    

            Como já mencionado, mesmo que o professor Roque Carrazza adote a Teoria Tripartite, reconhece a característica singular das Contribuições, que as distinguem das demais espécies tributárias, qual seja: a destinação do produto da arrecadação. Por essa razão, pode-se constatar a importância em considerar o critério da destinação, para se obter a classificação de forma plena e clara das espécies tributárias, na interpretação da Constituição Federal.

            Nessa perspectiva e com um foco maior no tema proposto no presente trabalho, as Contribuições Especiais podem ser conceituadas em razão de suas características, quais sejam: i) não vinculação, ii) destinação específica e iii) inexistência de direito à restituição.

            Nas palavras de Tácio Lacerda Gama:

“(...) adota-se a seguinte definição para o conceito de contribuições especiais: tributos, com destinação especificada em lei, hipótese de incidência desvinculada de atuação estatal e não restituível. A primeira característica apontada permite separar as contribuições de todos os demais tipos de prestação. Já as demais características eleitas servem para, no conjunto dos tributos, separar as contribuições das demais espécies tributárias sujeitas a regimes jurídicos diversos”[7].

 

            Trata-se, portanto, de um tributo não vinculado, posto que não está atrelado à contraprestação estatal, como ocorre com as taxas – pelas quais se exige um exercício do poder de polícia ou atividade específica e divisível. Observe-se que tanto o art. 149 quanto o art.195, ambos da Constituição, não há uma materialidade que indique a atuação direta do Estado. Isto quer dizer que não há uma relação contraprestacional entre os sujeitos da relação jurídica tributária.

            Possui, outrossim, destinação específica, conforme determina o caput  dos arts. 149 e 195 da Constituição:

“Art. 149. Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo” (Grifos Nossos).

“Art. 195. “A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:” (Grifos Nossos).

            Da leitura dos dispositivos supramencionados percebe-se que o destino da arrecadação possui íntima conexão com a extrafiscalidade, em virtude de a sua instituição constituir instrumento de políticas públicas, com o fim de direcionar o comportamento da sociedade e, sobretudo, com a finalidade de financiar despesas especificadas previamente na legislação que instituiu referida exação, em observância a sua peculiaridade como espécie autônoma de tributo. Sobre a destinação Misabel de Abreu Machado leciona:

“A Constituição de 1988, pela primeira vez, cria tributos finalisticamente afetados, que são as contribuições e os empréstimos compulsórios, dando a destinação que lhes é própria relevância não apenas do ponto de vista do Direito Financeiro ou Administrativo, mas igualmente do Direito Tributário”[8].

 

            Frise-se que a própria Constituição determina que os valores arrecadados sejam destinados a uma finalidade específica determinada preliminarmente.

            E, ainda, atento à particularidade da destinação, também denominada pela doutrina de referibilidade, Hamilton Dias de Souza assevera:

 

“Consequência desta destinação específica é que a exigência das contribuições somente pode ser feita, em regra, dos indivíduos que compõem um grupo que tenha interesse qualificado na atuação do Estado. É importante registrar, todavia, que tal interesse, por vezes chamado de benefício, vantagem ou referibilidade, não consiste, necessariamente, num proveito concreto ao sujeito passivo. Trata-se de qualquer interesse diferenciado, especial, que alguém tenha em determinada atividade estatal, passível de justificar a sua participação no custeio das despesas públicas de forma distinta dos demais. Significa uma vantagem individual suposta, admitida como presunção absoluta pela lei. A vantagem, em si, é do grupo que, como um todo, justifica e sofre os efeitos da atuação estatal, a ser custeada pela contribuição[9]. (Grifos Nossos)

 

            Entende-se, portanto, que a característica da referibilidade, está relacionada com a destinação dos recursos da arrecadação, característica esta presente nas Contribuições Especiais. Acrescente-se ainda que mesmo diante da referibilidade, não há que se falar em não natureza tributária das Contribuições. Salienta-se que as Contribuições, além de possuírem natureza tributária, compõem uma espécie autônoma de tributo.

            E, por fim, quanto à inexistência de direito à restituição, essa particularidade está presente nas Contribuições Especiais justamente pela ausência de vínculo direto entre os Sujeitos Ativo e Passivo. Como descrito alhures e, ainda, será estudado com maior profundidade mais adiante, a destinação do produto da arrecadação não está ligada a devolução de valores para com o sujeito passivo da obrigação tributária, mas sim com a finalidade específica da Contribuição Especial. A Restituição está presente apenas nos Empréstimos Compulsórios, outra espécie de tributo da classificação Quinquipartite.  

2. PRINCÍPIOS DIRETA E INDIRETAMENTE LIGADOS ÀS CONTRIBUIÇÕES ESPECIAIS

Antes de adentrar nos princípios que regem direta ou indiretamente as Contribuições Especiais, cumpre delimitar o conceito de princípio no Estudo do Direito. Os princípios podem ser conceituados como preceitos abstratos com conteúdo axiológico ou limitativo que direcionam condutas.

Vale trazer ao presente trabalho o conceito dado pelo Constitucionalista José Afonso da Silva:

“Mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico”[10].

 

Além de ser um alicerce que se irradia sobre diferentes normas, a maioria da doutrina entende que os princípios possuem determinada densidade normativa, com menor intensidade que a regra jurídica propriamente dita. Além disso, os princípios podem estar explícitos ou implícitos no ordenamento jurídico.

Reconhecendo essa carga normativa aos princípios e sua forma de disposição no ordenamento jurídico, Paulo de Barros assevera:

“Seja como for, os princípios aparecem como linhas diretivas que iluminam a compreensão de setores normativos, imprimindo-lhes caráter de unidade relativa e servindo de ato de fator de agregação num dado feixe de normas. Exercem eles uma reação centrípeta, atraindo em torno de si regras jurídicas que caem sob seu raio de influência e manifestam a orça de sua presença. Algumas vezes constam de preceito expresso, logrando o legislador constitucional enunciá-los com clareza e determinação. Noutras, porém, içam subjacentes à dicção do produto legislado, suscitando um esforço de feitio indutivo para percebê-los e isolá-los. São os princípios implícitos. Entre eles e os expressos não se pode falar em supremacia, a não ser pelo conteúdo intrínseco que representam para a ideologia  do intérprete, momento em que surge a oportunidade de princípios e de sobreprincípios”[11].

 

            No tocante aos tributos, por tocarem em direitos fundamentais do ser humano como o direito à propriedade e à liberdade, o legislador constitucional procurou estabelecer um direcionamento por meios de princípios fundamentais, com o intuito de limitar o poder de tributar. Diante disso, pode-se concluir que existem diversos princípios constitucionais que influenciam diretamente as relações jurídicas tributárias.

            De maneira geral, todos os princípios constitucionais tributários incidem direta ou indiretamente no Sistema Constitucional Tributário. No entanto, cumpre evidenciar, por meio de uma análise mais específica, os princípios constitucionais tributários que exercem maior influência sobre as Contribuições Especiais, são eles: Princípio da Legalidade, da Anterioridade, da Irrretroatividade, da Capacidade Contributiva, do Não Confisco, da Igualdade, da Solidariedade Tributária e da Uniformidade Geográfica.

            O Princípio da Legalidade, um dos mais relevantes do Direito Tributário, exerce influência porquanto é justamente ele que determina a utilização de lei (ora ordinária, ora complementar, conforme o que determina a Carta Maior) para a instituição ou majoração dos tributos. Nas palavras de Roque Carrazza:

“(...) é da essência de nosso regime republicano que as pessoas só devem pagar os tributos em cuja cobrança consentirem. Tal consentimento há que ser dado, por meio de lei ordinária, pelo Poder Legislativo, com este fito reunido, conforme a Constituição.

Inexiste o dever de pagar tributo que não tenha brotado de lei ordinária, já que somente por causa dela é que ele nasce e é exigível.

Não é por outro motivo que se tem sustentado que em nosso ordenamento jurídico vige, mais do que o princípio da legalidade tributária, o princípio da estrita legalidade.

Aliás, hoje mais do que nunca, como logo veremos, juristas de tomo têm feito empenho no sentido de que os tributos só podem ser criados ou aumentados por meio de lei ordinária, exceção feita aos empréstimos compulsórios, aos impostos residuais da União e às contribuições sociais previstas no 4º do art. 195 da CF, que demandam lei complementar para serem validamente instituídos.

Para afugentarmos, desde já, possíveis dúvidas, é bom dizermos que criar um tributo é descrever abstratamente sua hipótese de incidência, seu sujeito ativo, seu sujeito passivo, sua base de cálculo e sua alíquota. Em suma: é editar, pormenorizadamente, a norma jurídica tributária. Esta norma, por injunção do princípio da legalidade, repitamos, deve ser, no mais das vezes, veiculada por meio de lei ordinária (só as normas jurídicas dos empréstimos compulsórios, dos impostos da competência residual da União e das novas contribuições sociais, a que alude o art. 195, 4º, da CF, devem ser veiculadas por intermédio de lei complementar)”[12].

 

            Assim, somente com a edição e publicação de lei, ordinária ou complementar, se poderá obrigar o pagamento de todo e qualquer tributo criado ou majorado, inclusive as Contribuições Especiais.

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            No tocante ao Princípio da Anterioridade, evidencia-se que esse decorre dos Princípios da Segurança Jurídica e da garantia da certeza do direito, posto que permite prevenir o sujeito passivo quando da instituição e/ou majoração de um tributo. Cumpre lembrar que são duas anterioridades: a do Exercício, que preconiza o respeito ao próximo exercício financeiro, art. 150, III, “b”, da CF, sempre presente na Constituição e o da Anterioridade Nonagesimal, que determina a transcorrência de 90 dias da publicação da lei, artigo 150, III, “c”, da CF, esta última só teve sua inserção em 2003, por meio da EC n. 42/2003.

            Ainda sobre esse Princípio, importante lembrar que para as Contribuições Sociais e em caso de redução e restabelecimento das alíquotas da Contribuição sobre Intervenção do Domínio Econômico sobre Combustíveis, a anterioridade do exercício é excepcionada, respeitando, portanto, apenas a Nonagesimal, como se observa nos arts. 195, §6º e 177, §4º, “b” da Constituição, respectivamente.

Por sua vez, o Princípio da Irretroatividade, que igualmente reflete a Segurança Jurídica, veda os entes da federação de cobrar tributos em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado, nos termos art. 150, III, “a”, da CF, aplicável a todos os tributos, inclusive às Contribuições Especiais.

     Referente ao Princípio da Capacidade Contributiva e do Não Confisco, infere-se que esses constituem o fundamento basilar do Direito Tributário e está expresso no art. 145, § 1º e art.150, IV, da Constituição, respectivamente:

“Art. 145. (...) § 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte”.

“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

(...)IV - utilizar tributo com efeito de confisco;”

 

Sobre o conceito de Capacidade Contributiva, Ives Gandra da Silva Martins leciona:

“(...) a capacidade do contribuinte relacionada com a imposição específica ou global, sendo, portanto, dimensão econômica particular de sua vinculação ao poder tributante, nos termos da lei;” já a capacidade econômica a “(...) exteriorização da potencialidade econômica de alguém, independentemente de sua vinculação ao referido poder.[13]

 

Portanto, aquele conceito (capacidade contributiva) é menos abrangente que o de capacidade econômica. Esses conceitos constituem direções para se assegurar a justiça tributária na repartição da carga tributária proporcionalmente àquela que o indivíduo pode suportar.

Outro conceito ligado à capacidade contributiva consiste no ‘não confisco’, Carraza entende que, por meio desse Princípio, se “exige do legislador uma conduta marcada pelo equilíbrio, pela moderação e pela medida, na busca da tributação justa”. [14] O legislador, quando da instituição ou majoração de todo e qualquer tributo, igualmente deverá levar em consideração esse princípio.

Importa registrar ainda, sobre a capacidade contributiva, que embora a Constituição mencione apenas impostos, o entendimento do STF[15] e da maioria da doutrina tende para o sentido da aplicação a todos os tributos, incluindo então as Contribuições Especiais.

No que se refere ao Princípio da Igualdade, a Constituição prevê expressamente, em seu art.150, II, a vedação em “instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos”.

Desse modo, a interpretação sistemática do texto constitucional direciona para o sentido de visar o bem comum, por meio da adoção de medidas de discriminação positiva tendentes a buscar a igualdade fática e real. Sobre a Igualdade, Celso Antonio Bandeira de Mello leciona:

“a Lei não deve ser fonte de privilégios ou perseguições, mas instrumento regulador da vida social que necessita tratar equitativamente todos os cidadãos. Este é o conteúdo político-ideológico absorvido pelo princípio da isonomia e juridicizado pelos textos constitucionais em geral, ou de todo assimilado pelos sistemas normativos vigentes”. [16]

 

O Princípio da Solidariedade Tributária também está presente, porém mais precisamente nas Contribuições Sociais. Pode-se afirmar que referido princípio decorre do Princípio da Igualdade e se traduz como um fator limitador de justificação da própria tributação, analisada sob seu aspecto como distribuidor de renda. Nesse sentido, embora com mais frequência no Direito Previdenciário, o STF tem aplicado o Princípio da Solidariedade com o objetivo de limitar o Poder de tributar do Estado, como se denota na jurisprudência:

TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO DESTINADA AO CUSTEIO DA SEGURIDADE SOCIAL. REVOGAÇÃO DO LIMITE PARA APURAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO. RAZÕES RECURSAIS GENÉRICAS. IMPUGNAÇÃO BASEADA APENAS NA RELAÇÃO DE RETRIBUTIVIDADE LINEAR (ISOMÉTRICA). DEFICIÊNCIA QUE IMPEDE O APROFUNDAMENTO DO DEBATE CONSTITUCIONAL. DECRETO-LEI 2.318/1986. ART. 165, XVI E PAR. ÚN. DA EC 01/1969. ART. 195, §5º DA CONSTITUIÇÃO DE 1988. Embora a adoção do modelo solidário de custeio da previdência esteja longe de chancelar todo e qualquer tipo de aumento da base de tributação, a referibilidade ou a retributividade linear postulada pela agravante também é inaplicável. A alegação genérica de que o aumento da contribuição deve ser respaldado diretamente por igual acréscimo do benefício (retributividade linear) é insuficiente, pois não enfrenta o alcance do princípio da solidariedade. Fazia-se necessário indicar de modo preciso e analítico como a revogação do limite implicaria excesso de exação ou desproporcionalidade, considerada a repartição do ônus de custeio da seguridade entre a União, os empregadores e os trabalhadores. Ausentes tais elementos do debate constitucional, é plenamente aplicável o reconhecimento incidental da constitucionalidade do texto atacado (RE 231.538, rel. min. Ilmar Galvão, Primeira Turma, DJ de 21.02.2003 e RE 202.294, rel. min. Ellen Gracie, Segunda Turma, DJ de 02.06.2006). Agravo regimental ao qual se nega provimento. (AI 724582 AgR / SP, Relator(a):  Min. JOAQUIM BARBOSA , DJe-065 DIVULG 05-04-2011)(Grifos Nossos)

 

Deve-se considerar, portanto, que o tributo pode ser um instrumento que vise uma política de redistribuição de rendas, todavia, não se pode justificá-lo com arbitrariedades, de modo a exceder os limites do poder de tributar.

Por fim, o Princípio da Uniformidade Geográfica, igualmente aplicável às Contribuições Especiais, constitui na vedação de a União “instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional ou que implique distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento de outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento socioeconômico entre as diferentes regiões do País”, nos termos do art.151, I da CF. Perceba-se que o legislador constituinte permitiu a União excepcionalmente conceder diferenciações, desde que com caráter de incentivo, com o fim de reduzir as desigualdades regionais.

Não obstante a influência de tais princípios no âmbito Constitucional Tributário há que se destacar a influência dos Princípios do Direito Orçamentário sobre as Contribuições Especiais, citam-se: Princípio do Equilíbrio, da Universalidade, da Exclusividade, da Unidade e da Não Afetação.

O Princípio do Equilíbrio exerce influência, sobretudo nas Contribuições Especiais, em virtude da sua característica peculiar que é a destinação. Por tal razão, referido princípio direciona e estabelece a necessidade de prever despesas e receitas com o fim de impedir que haja dívidas acumuladas. O professor Augustinho Paludo assevera:

“Este princípio está consagrado no art. 4o, inciso I, alínea a, da LRF que determina que a LDO disporá sobre o equilíbrio entre receita e despesa. Ele estabelece que a despesa fixada não pode ser superior à receita prevista, ou seja, deve ser igual à receita prevista. A finalidade deste princípio é deter o crescimento desordenado dos gastos governamentais e impedir o déficit orçamentário”[17].

 

Embora não esteja previsto na Constituição, tal princípio revela sua importância no campo das Contribuições, em razão da busca do equilíbrio entre as receitas arrecadadas e a destinação adequada desses valores (despesas).

     No tocante ao Princípio da Universalidade infere-se que todas as receitas e despesas devem constar na lei orçamentária. Segundo Augustinho Paludo esse princípio:

“está contido nos arts. 2o, 3o e 4o da Lei no 4.320/1964, na Emenda Constitucional no 01/1969 e também no § 5o do art. 165 da Constituição Federal de 1988. Ele determina que o orçamento deve considerar todas as receitas e todas as despesas, e nenhuma instituição governamental deve ficar afastada do orçamento” [18].

    

            Há obrigatoriedade, portanto, de previsão da totalidade das formas de custeio e despesas, podendo ser excepcionadas apenas aquelas autorizadas por lei denominadas de extraordinárias, especiais ou suplementares.

O Princípio da Exclusividade, por sua vez, está previsto no §8º do art. 165 da Constituição e prevê que na Lei Orçamentária não poderá conter dispositivo estranho à previsão da receita e à fixação de despesa, não se incluindo na proibição a autorização para a abertura de crédito suplementares e contratações de operações de crédito, ainda que por antecipação de receita, nos termos da lei.

Sobre o Princípio da Unidade, entende-se que o orçamento deve ser um só, ou seja, a totalidade das despesas e receitas deve constar num mesmo conjunto, agrupado de acordo com as regras definidas em lei, conforme determina o §5º do art.165 da CF e art.2º da Lei n.4.320/1964.

Finalmente, o Princípio da Não Afetação veda a vinculação de receitas a finalidades específicas, nos termos do que prescreve o art.167, IV da CF:

“Art. 167. São vedados: (...) IV - a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os arts. 158 e 159, a destinação de recursos para as ações e serviços públicos de saúde, para manutenção e desenvolvimento do ensino e para realização de atividades da administração tributária, como determinado, respectivamente, pelos arts. 198, § 2º, 212 e 37, XXII, e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita, previstas no art. 165, § 8º, bem como o disposto no § 4º deste artigo”.

           

Ocorre que essa não afetação se aplica apenas aos Impostos, não abarcando, por essa razão, as Contribuições e as Taxas, mais um argumento para fundamentar a autonomia da espécie tributária Contribuições Especiais, conforme defendido no presente estudo.

3. ESPÉCIES DE CONTRIBUIÇÕES ESPECIAIS

 

            Como analisado alhures as Contribuições Especiais são espécies autônomas de tributo e possuem como fato gerador uma materialidade sem vínculo a uma atividade estatal, entretanto, destinada a uma finalidade determinada pela Constituição e pela lei, de caráter permanente, sem devolução.

            O posicionamento da doutrina é majoritário quanto à utilização do termo “Contribuições Especiais”, por ser o mais adequado e abarcar as contribuições constantes nos arts. 149 e 149-A da Constituição. Corroborando com esse entendimento, Leandro Paulsen assevera:

"Não é correto atribuir à espécie tributária a denominação de 'contribuições parafiscais', tampouco de 'contribuições sociais'. Isso porque a expressão contribuições parafiscais, em desuso, designava as contribuições instituídas em favor de entidades que, embora desempenhassem atividade de interesse público, não compunham a Administração direta. Chamavam-se parafiscais porque não eram destinadas ao orçamento do ente público. Mas temos, atualmente, tanto contribuições destinadas a outras entidades como destinadas à própria Administração, sem que se possa estabelecer, entre elas, qualquer distinção no que diz respeito à sua natureza ou ao regime jurídico a que se submetem. Ser ou não ser parafiscal é uma característica acidental, que, normalmente, sequer diz com a finalidade da contribuição, mas com o ente que desempenha a atividade respectiva. De outro lado, também a locução 'contribuições sociais' não se sustenta como designação do gênero contribuições. Isso porque as contribuições ditas sociais constituem subespécie das contribuições do art. 149, configurando-se quando se trate de contribuição voltada especificamente à atuação da União na área social. As contribuições de intervenção no domínio econômico, por exemplo, não são contribuições sociais. Assim, tem-se como gênero a designação 'contribuições especiais' e, como espécie, ao lado das contribuições de intervenção no domínio econômico, de interesse das categorias profissionais ou econômicas e de iluminação pública, as contribuições sociais"[19].

           

Desse modo, as espécies de Contribuições Especiais, segundo os arts.149 e 149-A, ambos da Constituição, são divididas em: Sociais, Corporativas, Interventivas e, ainda, com previsão determinada pela EC n. 39/2002, a de Serviço de Iluminação Pública.

           

3.1. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS

A primeira espécie de Contribuição Especial, a Social, tem por finalidade precípua custear a atividade estatal no que toca a atuação social – saúde, educação, ciência, tecnologia e meio ambiente. Assim, são duas modalidades de Contribuições Sociais: as de caráter genérico e as de seguridade social.

            As Contribuições Sociais de caráter geral estão previstas nos arts. 212, §5º, 177, §4º, 239 e 240 da Constituição e art. 74 do ADCT, para o custeio da educação, programa de infraestrutura de transportes, seguro-desemprego, sistema “S” (SENAI, SENAC, stc.) e saúde, respectivamente.

            Já a materialidade das Contribuições Sociais de Seguridade Social, de competência da União, está prevista no art. 195 da Constituição, podendo incidir sobre folha de salários e demais rendimentos do trabalhador, receita ou faturamento, lucro, concursos de prognósticos e, inserida pela EC n. 42/2003, sobre o importador de bens ou serviços do exterior. Vale evidenciar que a Constituição também previu a impossibilidade de incidir sobre as receitas de exportação, bem como a proibição da cumulatividade (§12 do art. 195 da CF).

Ainda quanto às Contribuições Sociais de Seguridade Social, que por ora se  denominará apenas como Contribuições Sociais, ressalta-se que estas observam diretamente o Princípio da Solidariedade, posto que, segundo o caput do art. 195 da CF, a seguridade social é financiada por toda a sociedade.

Quanto ao Princípio da Solidariedade e a característica da referibilidade das Contribuições Sociais, Leandro Paulsen denota:

“Só não haverá propriamente um juízo de referibilidade condicionando a posição de contribuinte para as contribuições sociais de seguridade social, pois o art. 195 da Constituição, ao impor o seu custeio por toda a sociedade, estabeleceu expressamente uma especial solidariedade entre toda a sociedade, forçando, assim, uma referibilidade ampla ou global de tal subespécie. Mas mesmo esta especial solidariedade não autoriza a cobrança de quem a lei não indique como sujeito passivo. Frise-se, ainda, que o art. 195 diz respeito exclusivamente às contribuições de seguridade social, sendo absolutamente descabida a invocação da especial solidariedade por ele estabelecida como se aplicável fosse a outras espécies ou subespécies das contribuições”[20].

 

Registre-se, como bem descreve o ilustre professor Paulsen, que a referibilidade continua presente nas Contribuições Sociais, porém, num aspecto mais abrangente comparado às demais Contribuições Especiais.     

Por fim, além dessas Contribuições Sociais com materialidades especificadas no caput do art.195, a Constituição reservou a possibilidade de instituição de Contribuições Sociais Residuais, conforme se observa do §4º do referido artigo.

Nos termos desse dispositivo, autoriza-se a União a instituir outras Contribuições Sociais para o custeio da Seguridade social, desde que instituídas por meio de Lei Complementar e que não possuam a mesma materialidade das já especificadas no caput do art. 195. Trata-se da competência residual para contribuições sociais que custeiam a Seguridade (Assistência, Saúde e Previdência)

3.2. CONTRIBUIÇÕES CORPORATIVAS

            As contribuições corporativas compreendem as contribuições para os conselhos de fiscalização profissional e a contribuição sindical, igualmente de competência da União.

Cumpre mencionar, em relação à contribuição sindical, que esta possui ordem compulsória, posto se tratar de tributo (Art.3º do CTN), cobrada de todos os membros de determinada categoria, independentemente de filiação ao sindicato, como forma de custeio do órgão representativo da classe. Diferentemente da contribuição confederativa destituída do caráter compulsório, em razão de sua natureza contratual, nos termos do art. 8º da CF.

            Tácio Lacerda Gama define as Contribuições Corporativas como:

“tributos, do gênero contribuições especiais, instituídos e arrecadados para fazer frente às despesas de órgãos de classe profissionais ou econômicos. Entre os órgãos de classe abrangidos por essa forma de atuação estatal estão aqueles que regulam e fiscalizam o exercício de profissões, tais como a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB ou Conselho Regional de Medicina – CRM. Já entre os que beneficiam categorias econômicas estão, por exemplo, aqueles que prestam serviços de formação profissional, como o SENAC, o SESC e o SENAI”[21].

 

            Desse modo, no tocante às contribuições corporativas, o valor arrecadado será destinado integralmente aos órgãos que atuam em nome da União em benefício das categorias profissionais ou econômicas.

 

3.3. CONTRIBUIÇÕES INTERVENTIVAS

                As Contribuições Interventivas – CIDEs – são exações tributárias que incidem, de maneira geral, sobre a ordem econômica, para o financiamento de ações de intervenção no domínio econômico, nos termos do art.149 da CF.

Em outras palavras, a Constituição concedeu competência à União para intervir na atuação da atividade privada, no que se refere a determinado segmento da economia, observados os Princípios da Ordem Econômica instituídos no art. 170 da CF.

            Para compreender melhor o tema, cumpre trazer a baila o conceito de “domínio econômico” e “ordem econômica” de Tácio Lacerda Gama:

“(...) ‘domínio econômico’ é a expressão destinada a nomear o plano da linguagem social, consistente no conjunto das atividades de produção, circulação de riqueza e prestação de serviços. Já o conceito de ‘ordem econômica’ designa o conjunto de normas jurídicas que regula as relações humanas no domínio econômico. Nesse conjunto de normas jurídicas, identificam-se diversas formas de atuação. De ato, analisando o conjunto de enunciados que forma a ‘ordem econômica’, percebem-se diversas competências atribuídas ao Estado no plano das relações sociais que visam à produção de riquezas. São permissões para atuar, com vista à implementação dos princípios que integram a ‘ordem constitucional econômica’” [22].

            Assim, o Estado intervirá na ordem econômica, seja prestando serviços em regime de direito público (atuação positiva); seja regulamentando, de modo a exercer o poder de polícia ou a exercer incentivos, conforme arts. 173 e 174 da Constituição, respectivamente.

                Frise-se que a instituição das referidas contribuições tem como finalidade única o financiamento da atividade de intervenção no domínio econômico, nos termos do que determina o art. 149 da CF e não no sentido de que a cobrança gera um caráter interventivo, como bem esclarece Leandro Paulsen:

“Não há sustentação para o entendimento de que a contribuição de intervenção possa ser em si interventiva, ou seja, que a sua própria cobrança implique intervenção; a contribuição é estabelecida para custear ações da União no sentido da intervenção no domínio econômico. Quanto às bases econômicas passíveis de tributação, as contribuições de intervenção no domínio econômico estão sujeitas ao art. 149, § 2º, III, de modo que as contribuições instituídas sobre outras bases ou estão revogadas pelas EC 33/01, ou são inconstitucionais” [23].

            Por fim, igualmente às demais Contribuições Especiais, a totalidade do produto da arrecadação deverá ser destinada ao custeio da intervenção, em conformidade com os princípios da Ordem Econômica e a materialidade atribuída pela União por meio de Lei Ordinária.

 

3.4. CONTRIBUIÇÕES DE SERVIÇO DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA - COSIP

            Trata-se da Contribuição Especial de Competência Municipal, instituída pela Emenda Constitucional n.39/2002, depois de passar por diversas discussões doutrinárias e jurisprudenciais[24], pois anteriormente foi instituída por meio de Taxa, a antiga TIP.

            A COSIP fora instituída com a finalidade única de custear o serviço de iluminação pública prestado à população em geral nos logradouros públicos.

            Nesse sentido Leandro Paulsen enfatiza:

“O serviço de iluminação pública é aquele prestado à população em caráter geral nos logradouros públicos. Não se presta, pois, ao custeio das despesas de energia elétrica relativas aos bens públicos de uso especial, como as dos prédios em que funcionem os órgãos administrativos do Município ou a câmara de vereadores. Tal desvio, se normativo, autoriza o reconhecimento da inconstitucionalidade da exação, ao menos parcial, devendo-se verificar em que medida desborda da autorização constitucional, reduzindo-se o tributo ao patamar adequado[25]. (Grifos Nossos)

 

Portanto, a COSIP serve para custear tão e somente o serviço de iluminação pública prestada nos logradouros públicos, não incluindo a iluminação de uso especial da Administração Pública.

4.  DO DESTINO DO PRODUTO DA ARRECADAÇÃO DAS CONTRIBUIÇÕES ESPECIAIS

Convém, neste tópico, evidenciar novamente e com maior profundidade a importância do destino do produto da arrecadação das Contribuições Especiais - espécie autônoma de tributo, nos termos do que defende a adotada Teoria Quinquipartite.

Conforme defendido alhures, o Princípio Orçamentário da Não Afetação aplica-se apenas aos Impostos, não se aplicando, desse modo, às Contribuições Especiais, em virtude de que sua peculiaridade diferenciadora ser justamente a obrigatoriedade do destino do produto da arrecadação.

Tal regramento deve ser observado inclusive como pressuposto para o exercício da competência do ente federativo conferida pela própria Constituição Federal. Nessa linha de pensamento, vale lembrar que o legislador deve se guiar pelo que prescreve a Constituição e a Legislação Complementar recepcionada por aquela (Art. 146 da CF).

Nos ensinamentos de José Eduardo Soares de Melo:

“Considerando que a Constituição expressamente indica as espécies tri-butárias, à lei complementar pouco restaria fazer, salvo a instituição de empréstimos compulsórios (art. 148), dos impostos sobre grandes fortunas (art. 153, VII), bem como impostos e contribuições decorrentes da competência residual da União (arts. 154, I, e 195, § 4º), ainda assim sem modificar a natureza de cada tipo tributário, que se encontra plasmado nas normas e princípios constitucionais, que podem ser captadas pelo hermeneuta. Impertinente a definição de taxa, em face da compreensão do conceito encartado no inciso II do art. 145 (exercício regular do poder de polícia pela utilização, efetiva ou potencial e prestação de serviços públicos, específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição). A lei complementar que pretendesse defini-la nada poderia acrescentar, muito menos restringir” [26]. (Grifos Nossos) 

 

Observe-se que a natureza do tipo tributário das Contribuições Especiais está expressa e implicitamente definida pela Constituição (Arts. 149 e 195 da CF), mais uma razão que demonstra a relevância do destino da arrecadação das Contribuições, que além de as diferenciar dos demais tributos, tem como fim justificar a sua instituição.

            Em outras palavras, Heleno Taveira Torres:

“A competência do legislador já se encontra estritamente balizada na Constituição Federal, que determina os motivos, prazo e modos de elaboração do texto legal. Assim, no Direito Tributário. Nesse campo, cabe ao legislador apreciar se o tributo que deseja criar enquadra-se num ou noutro motivo que a Constituição Federal determina como critério prévio de instituição, além do procedimento específico e da autoridade competente para tal. É preciso avaliar, sempre, caso a caso, se o legislador respeitou, ou não, os limites atribuídos pela Constituição”[27].

Desse modo, ao passo que a destinação específica do tributo representar definição constitucional de competência, conclui-se ser absolutamente coerente o respeito a tal destinação, seja na norma instituidora do tributo, seja na norma que regula a aplicação da receita arrecadada – norma Orçamentária.

Vale destacar que se não houver a expressa definição do destino da receita arrecadada no momento da instituição do referido tributo pelo legislador, acarretar-se-ia irremediavelmente a inconstitucionalidade dessa lei e consequentemente a da sua cobrança.

                Por essas razões, há a necessidade do controle da destinação do produto da arrecadação das Contribuições, com o intuito de ver observados os preceitos constitucionais que envolvem essa espécie tributária.

            Uma das formas desse controle que se constata primordialmente revela-se quando da instituição do referido tributo, a norma introdutora deverá prever necessariamente em sua estrutura lógica a afetação da receita da Contribuição Especial, sob pena de desvirtuamento da competência constitucional conferida.

Isso quer dizer que na regra matriz de incidência tributária deverá conter no consequente da norma tributária o critério específico da destinação da totalidade da receita arrecadada. Frise-se que a destinação constitui sim a razão de ser da espécie tributária Contribuição Especial, observando-se, assim, o Princípio da Tipicidade.

Ademais, cumpre mencionar que a destinação deve ser relacionada com atividade estatal ligada ao campo de atuação do Estado, seja no campo social, corporativo, econômico ou de prestação de serviço público (quanto a este último, cite-se o caso da iluminação pública). Tal norma introdutora deverá indubitavelmente prever, portanto, o fundo específico ou então a vinculação do produto arrecadado com a despesa a ser instituída.

Nesse diapasão, Misabel Abreu Machado Derzi denota:

“se inexiste o órgão, a despesa ou a pessoa que, necessariamente devem financiar, falece competência à União para criar contribuições ou empréstimos compulsórios. Inexistindo o fundamento constitucional, legitimador do exercício da faculdade legislativa, o contribuinte pode opor-se à cobrança, pois indevido o tributo que nasce da norma sem validade”[28].

            Como bem constata Misabel Abreu Machado Derzi, o sujeito passivo pode se opor à cobrança, quando do desvirtuamento do destino da arrecadação, realizando, assim, um controle concreto de legalidade e constitucionalidade.Trata-se de direito garantido pela Constituição, previsto, inclusive, em diversos dispositivos, como art.37. §4º e art. 5º, como será analisado no tópico a seguir.

            Ainda quanto ao controle, outra forma de se manter sob supervisão, com o intuito de evitar o desvirtuamento do destino da arrecadação, é a Lei Orçamentária que prescreve a fonte de receita e sua correspondente despesa, devendo ser observada por todos os envolvidos.

            Cumpre esclarecer que a Lei Orçamentária abrange o Plano Plurianual, a Lei de Diretrizes Orçamentárias e a Lei Orçamentária Anual. Esta última constitui o produto final do processo orçamentário, posto que abrange o exercício financeiro, com a previsão das receitas e a autorização das despesas.

            Augustinho Vicente Paludo bem descreve a composição da Lei Orçamentária Anual:

“A LOA é o documento que define a gestão anual dos recursos públicos, e nenhuma despesa poderá ser realizada se não for por ela autorizada ou por lei de créditos adicionais. É conhecida como a lei dos meios porque é um ‘meio’ para garantir créditos orçamentários e recursos financeiros para a realização dos planos, programas, projetos e atividades dos entes governamentais. A Lei Orçamentária Anual é um instrumento de planejamento que operacionaliza no curto prazo os programas contidos no Plano Plurianual. O projeto de Lei Orçamentária Anual contempla, conforme selecionado pela LDO, as prioridades contidas no PPA e as metas que deverão ser atingidas no exercício financeiro. A lei orçamentária disciplina todas as ações do Governo Federal no curto prazo. É com base nas autorizações da Lei Orçamentária Anual que as despesas do exercício são executadas. Ela é composta pelos orçamentos Fiscal, da Seguridade Social e de Investimento das estatais. Ela prevê os recursos a serem arrecadados e fixa as despesas a serem realizadas pelo Governo Federal, referentes aos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário[29]. (Grifos Nossos)

A Lei Orçamentária Anual (LOA) possui relevante papel, principalmente no que se refere às Contribuições Especiais, em virtude de a lei tributária, que institui a referida exação, ter a competência de prever tão e somente o fundo específico ou a destinação com sua respectiva finalidade, sem estabelecer sobre a autorização das despesas, como o faz a LOA. Por essa razão pode-se dizer que há íntima ligação entre a lei tributária e a lei orçamentária, cada qual com a sua correspondente competência e função, assegurando o que determina o Texto Maior.

Do exposto, como já defendido, tanto a lei tributária instituidora, quanto a lei orçamentária devem estar em harmonia, de modo que se faça observar a adequada destinação das receitas provenientes da arrecadação das Contribuições Especiais, admitir o contrário implicaria na violação da Constituição Federal.

Nesse sentido Paulo Aires Barreto assevera:

“Ao desvincular-se produto da arrecadação de contribuição, suprime-se a garantia individual do contribuinte de só se sujeitar ao pagamento de contribuição se, e somente se, o destino do montante exigido for integralmente utilizado nos fins que justificaram a criação do tributo. Além disso, rompe-se o imprescindível liame que deve existir entre a causa autorizativa do tributo e sua destinação. Se o produto da arrecadação é desvinculado, ainda que parcialmente, não há como alcançar os fins almejados[30]. (Grifos Nossos)

            Tudo isso porque, como bem leciona Paulo Aires Barreto, a instituição das Contribuições Especiais se justifica para efetivamente custear as despesas para as quais foi destinada, segundo a lei que a instituiu. Portanto, há uma necessária vinculação da receita, o que implica na possibilidade de o Sujeito Passivo da relação jurídica tributária e demais pessoas autorizadas pela Constituição e pela Lei se oporem quando de sua violação. Essa oposição será estudada no tópico a seguir.

5. MEDIDAS DE CONTROLE E OPOSIÇÃO DO SUJEITO PASSIVO PARA VER A DESTINAÇÃO DO PRODUTO DA ARRECADAÇÃO DAS CONTRIBUIÇÕES REALIZADA ADEQUADAMENTE

            Quanto ao direito de se opor ao Ente Federado quando do desvirtuamento do destino da arrecadação das receitas decorrentes das Contribuições Especiais, muito se discute sobre a possibilidade de se pedir restituição dos valores recolhidos. Entretanto, como será demonstrado neste tópico, essa alternativa não se constitui acertada de primeiro momento.

            Não há legitimidade processual do sujeito passivo da relação jurídica tributária envolvendo Contribuição Especial para o pedido direto pela devolução de valores em virtude do desvirtuamento do produto da arrecadação, por si só. Isso porque inexiste vinculação direta entre o Sujeito Passivo e Sujeito Ativo. Observe-se que as Contribuições Especiais não possuem a característica da relação contraprestacional, como ocorre com as Taxas.

Justificaria o pedido de repetição no caso de haver primeiramente a comprovação da Inconstitucionalidade ou da Ilegalidade da exação tributária confirmada pelos Poderes que possuem competência para tanto.      Corrobora com esse entendimento o Supremo Tribunal Federal, embora numa análise analógica sobre a Desvinculação das Receitas da União – DRU do art. 76 do ADCT:

“O disposto no art. 76 do ADCT — que desvincula 20% do produto da arrecadação da União em impostos, contribuições sociais e contribuições de domínio econômico de órgão, fundo ou despesa —, independente de sua validade constitucional, não gera direito a repetição de indébito. Com base nesse entendimento, o Plenário desproveu recurso extraordinário em que se discutia a constitucionalidade da desvinculação tributária levada a efeito pelas EC 27/2000 e EC 42/2003. No caso, a recorrente alegava ter direito à restituição da denominada Desvinculação de Receitas da União - DRU em razão de sua suposta inconstitucionalidade. O Tribunal afirmou que os impostos seriam tributos classificados como não-vinculados. Assim, seria possível a exação sem contraprestação específica de determinado serviço público, pois o montante arrecadado não teria destinação predeterminada (CF, art. 167, IV). Todavia, a Constituição vincularia a arrecadação de impostos a determinados fins, conforme observado de seus artigos 158, 159, 198, § 2º, 212 e 37, XXII. As contribuições sociais e as contribuições de intervenção no domínio econômico, por outro lado, seriam tributos com destinação de arrecadação vinculada. Todas seriam alcançadas pela desvinculação estabelecida pelo art. 76 do ADCT. De qualquer forma, não seria possível concluir que, da eventual inconstitucionalidade da desvinculação parcial da receita das contribuições sociais, decorreria a devolução ao contribuinte do montante correspondente ao percentual desvinculado. Sublinhou que a tributação não seria inconstitucional ou ilegal, hipótese em que se autorizaria a repetição do indébito tributário ou o reconhecimento de inexistência de relação jurídico-tributária. Portanto, faltaria legitimidade processual à recorrente, pois ela não seria beneficiada pela declaração de inconstitucionalidade. RE 566007/RS, rel. Min. Cármen Lúcia, 13.11.2014”. (RE-566007, INFORMATIVO Nº 767, Rel. Min. Cármen Lúcia, 13.11.2014) (Grifos Nossos)

De maneira mais detalhada, ainda sobre esse mesmo acórdão, a Ministra e Relatora Cármen Lúcia esclarece, no caso da Desvinculação das Receitas da União previstas no art.76 do ADCT:

Se a inconstitucionalidade fosse da desvinculação, a única consequência cabível seria o retorno à situação anterior, ou seja, a observância da vinculação originariamente estabelecida pela Constituição da República. Não é possível concluir que da eventual inconstitucionalidade da desvinculação parcial da receita das contribuições sociais decorreria a devolução ao contribuinte do montante correspondente ao percentual desvinculado, pois a tributação não seria inconstitucional ou ilegal, única hipótese em que se autorizaria a repetição do indébito tributário ou o reconhecimento de inexistência de relação jurídico-tributária. Falta, portanto, legitimidade processual à Recorrente, porque ela não seria beneficiada pela declaração de inconstitucionalidade. Aliás, por se tratar de mandado de segurança, não há direito da Recorrente que se comprove, de plano, ter sido lesado, menos ainda algum que pudesse ser considerado dotado de liquidez e certeza quanto ao não recolhimento de contribuições sociais no percentual da desvinculação”. (Grifos Nossos)

Sobre as Contribuições Especiais, enfatize-se que essas são consideradas sim espécie autônoma de tributo, justamente pela característica peculiar da destinação do valor arrecadado, porém destituída de natureza contraprestacional, o que por lógica não autoriza um pedido de repetição com esse fundamento de vínculo jurídico direto (Contraprestacional), pelo simples fato de o sujeito passivo não se sentir beneficiado pela destinação.

A característica da destinação para uma finalidade específica significa dizer que o benefício abrangerá a coletividade, de maneira geral, a que for alvo objetivado na conformidade do que for previamente definido em lei.

Diante disso, pode-se chegar à conclusão de que há duas relações jurídicas presentes nas Contribuições Especiais, quais sejam: i) a existente entre o Sujeito Ativo e o Sujeito Passivo, justificadora da cobrança da exação tributária e; ii) a existente entre o Ente Federativo que arrecadou e os beneficiários ligados à finalidade específica a que se destina o produto da arrecadação, tudo na conformidade da legislação e Constituição.

Quanto a essa última relação jurídica, observe-se que pode ocorrer de não coincidir de os beneficiários serem os próprios sujeitos passivos da primeira relação jurídica. Cite-se, exemplificativamente, as Contribuições Sociais destinadas à Saúde, Previdência e Assistência Social. No tocante à Saúde, a Constituição, em seu art. 196, determina que a Saúde “é direito de todos e dever do Estado”. Dessa premissa conclui-se que mesmo aqueles que não contribuem, se beneficiam dos investimentos realizados em prol da Saúde, com as receitas decorrentes das Contribuições Sociais, em respeito ao Princípio da Solidariedade. Trata-se, portanto, de mais uma comprovação da inexistência de vínculo contraprestacional, característica presente na espécie tributária Taxas.

De todo modo, mesmo que não haja legitimidade para pedido de restituição na forma direta, o sujeito passivo tem todo o direito de se opor quando ocorrer o desvirtuamento ou a ausência de destinação do produto da arrecadação das Contribuições Especiais.

Compartilha desse entendimento Marco Aurélio Greco, quando afirma que:

"Ora, se a destinação dos recursos que não é elemento constitucional essencial para os impostos, pode comportar exame a ponto de levar ao reconhecimento da inconstitucionalidade da respectiva lei, por maior razão este exame é pertinente e com igual alcance nas contribuições, pois, nestas, a Constituição exige a vinculação a uma determinada finalidade (...). Em suma, o destino do produto da arrecadação das contribuições é elemento essencial à sua constitucionalidade. Não apenas a previsão abstrata, mas a sua aplicação efetiva. O juízo, sobre o grau de inadequação da destinação do produto da arrecadação para o efeito de considerar ocorrida a violação constitucional, pode comportar mais de uma avaliação, mas entendo fundamental reconhecer que o vício na destinação gera inconstitucionalidade arguível pelo sujeito passivo, pois o que estará sendo cobrado não será mais uma verdadeira contribuição[31]. (Grifos Nossos)

Desse modo, se a Fazenda Pública adota conduta que se desvirtua do comando legal surge, dessa ocorrência, o direito subjetivo do sujeito passivo - e daqueles que possuem competência constitucional e legal para tanto - em se rebelar e pleitear a inaplicabilidade da exação em relação a sua pessoa, por instrumentos judiciais próprios.

            Há diversos meios de controle de constitucionalidade e de legalidade possíveis, com o intuito de promover a fiscalização, a proteção ao patrimônio público, a probidade administrativa e de ver adequada a utilização das receitas públicas, especificamente das decorrentes das Contribuições Especiais, objeto de estudo do presente trabalho.

            O primeiro controle, que se pode mencionar, consiste no já mencionado anteriormente, conhecido como controle Preventivo de Constitucionalidade, realizado pelo Poder Legislativo e pelo Poder Executivo quando da instituição da lei tributária, orçamentária e respectiva regulamentação das Contribuições Especiais, tudo na conformidade do que determina a Constituição Federal.

            Além desse controle Preventivo, há o Posterior, em geral, realizado pelo Poder Judiciário. Esse controle pode ser feito na forma abstrata ou difusa.

Na forma abstrata o controle se concentra em um único órgão, qual seja: o Supremo Tribunal Federal. Nesses casos, aqueles legitimados do art. 103 da Constituição, diante de flagrante inconstitucionalidade, desvio da destinação do produto da arrecadação das Contribuições Especiais ou outra inconstitucionalidade identificada, podem ajuizar Ação Declaratória de Inconstitucionalidade - ADI. Ou, ainda, no caso de confirmação de sua constitucionalidade, ajuizar a Ação Declaratória de Constitucionalidade – ADC, tudo nos termos do art. 102 da Constituição e Lei n. 9.868/1999.

Com o intuito de proporcionar maior concretude no estudo em análise, segue o entendimento do STF, que entende adequado o exercício de controle abstrato, em relação à norma orçamentária da Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico:

“PROCESSO OBJETIVO - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI ORÇAMENTÁRIA. Mostra-se adequado o controle concentrado de constitucionalidade quando a lei orçamentária revela contornos abstratos e autônomos, em abandono ao campo da eficácia concreta. LEI ORÇAMENTÁRIA - CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO - IMPORTAÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO DE PETRÓLEO E DERIVADOS, GÁS NATURAL E DERIVADOS E ÁLCOOL COMBUSTÍVEL - CIDE - DESTINAÇÃO - ARTIGO 177, § 4º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. É inconstitucional interpretação da Lei Orçamentária nº 10.640, de 14 de janeiro de 2003, que implique abertura de crédito suplementar em rubrica estranha à destinação do que arrecadado a partir do disposto no § 4º do artigo 177 da Constituição Federal, ante a natureza exaustiva das alíneas "a", "b" e "c" do inciso II do citado parágrafo”. (ADI 2925 / DF - DISTRITO FEDERAL, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, DJ 04-03-2005 PP-00010) (Grifos Nossos)

Por outro lado, na forma difusa, o controle poderá ser realizado de maneira concreta, em que aquele indivíduo que se sente prejudicado pode ajuizar Recurso Extraordinário, Reclamação Constitucional ou, ainda, pedir a Declaração Incidental da Inconstitucionalidade, que poderá ser deferida pelo STF nos primeiros casos, ou por maioria absoluta dos membros do tribunal ou órgão especial (Cláusula de Reserva de Plenário), no caso da última, conforme artigos 102 e 97 ambos da Constituição.

Tanto nesses casos, como nos de controle abstrato, vislumbra-se a possibilidade de se cumular o pedido de repetição de indébito junto ao Poder Judiciário, posto que o fundamento se foca justamente no desvirtuamento da finalidade específica da Contribuição Especial, como se observa dos ensinamentos de Paulo Aires Barreto:

“A norma que estabelece a vinculação do pagamento de contribuição a órgão, fundo ou despesa tem, para fins tributários, o mesmo relevo da regra matriz de incidência. Contribuição, como espécie tributária autônoma, pressupõe o cumprimento de duas condutas distintas: (i) o dever jurídico do contribuinte de pagar o tributo; e (ii) o dever jurídico de o ente tributante aplicar o crédito tributário recebido no respectivo órgão, fundo ou despesa. Cumpridas ambas as condutas, estará, de um lado, extinto o crédito tributário e, de outro, restará desonerado o ente tributante da devolução do montante recebido. Pago o tributo, mas desviado o montante arrecadado, tem o contribuinte assegurado o direito subjetivo de repetir o indébito tributário. Se o tributo não for pago pelo contribuinte, assegura-se ao ente tributante o direito subjetivo de exigir, de forma coativa, o adimplemento da obrigação”[32]. (Grifos Nossos)

            Observe-se que a discussão da constitucionalidade das Leis que envolvam as Contribuições Especiais, tendo como parâmetro a Constituição Federal, poderá tender tanto para o aspecto processual, quanto para o material. Embora o foco do presente estudo seja o conteúdo (material), em razão da importância de se fazer constar expressamente a adequada destinação do produto da arrecadação para a finalidade que justificou a instituição da exação tributária.

No tocante ao vício material Pedro Lenza o define como:

“Por seu turno, o vício material (de conteúdo, substancial ou doutrinário) diz respeito à ‘matéria’, ao conteúdo do ato normativo. Assim, aquele ato normativo que afrontar qualquer preceito ou princípio da Lei Maior deverá ser declarado inconstitucional, por possuir um vício material. Não nos interessa saber aqui o procedimento de elaboração da espécie normativa, mas, de fato, o seu conteúdo. Por exemplo, uma lei discriminatória que afronta o princípio da igualdade”[33]. (Grifos Nossos)

Por essas razões, constando-se que não existe previsão legal de destinação ou que a referida destinação não é efetiva, haverá interesse processual em arguir a inconstitucionalidade da lei (seja lei tributária ou orçamentária) que estiver violando os preceitos constitucionais.

Ademais, sob outra perspectiva, no caso de o Regulamento expedido pelo Poder Executivo estar em desconformidade com a lei tributária ou a lei orçamentária, poderá haver controle de Legalidade, em virtude de o parâmetro do regulamento ser a Lei e não a Constituição, devendo a ação ser ajuizada na Justiça Federal - art. 109 da Constituição, quando a União for parte na relação jurídica.

Outra forma de controle Posterior, porém de legalidade, possível, consiste na realizada pelo Poder Legislativo em face do Poder Executivo, que se configura pela sustação de “atos normativos que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa”, nos termos do art. 49, V da Constituição.

Nesses casos, caso o ato normativo que regulamente a lei tributária ou orçamentária transcenda esse poder, o Congresso Nacional poderá sustá-lo por meio de Decreto Legislativo. Sobre essa forma de controle, Pedro Lenza esclarece:

“(...) é de competência exclusiva do Presidente da República expedir decretos e regulamentos para a fiel execução da lei (art. 84, IV). Portanto, ao Chefe do Executivo compete regulamentar uma lei expedida pelo Legislativo, e tal procedimento será feito através de decreto presidencial. Pois bem, se no momento de regulamentar a lei o Chefe do Executivo extrapolá -la, disciplinando além do limite nela definido, este ‘a mais’ poderá ser afastado pelo Legislativo por meio de decreto legislativo. Cabe alertar que, no fundo, esse controle é de legalidade e não de inconstitucionalidade, como apontado por parte da doutrina, pois o que se verifica é em que medida o decreto regulamentar extrapolou os limites da lei[34]. (Grifos Nossos)

            Portanto, também há a possibilidade de controle de legalidade por meio do Poder Legislativo, nos termos do art.49, V da CF ou de constitucionalidade, conforme arts. 68 (Leis Delegadas, em desuso atualmente) e art. 62 (Medidas Provisórias) da CF.

            Não obstante os instrumentos já especificados, há que se citar também as medidas de impugnação administrativa cabíveis quando da constituição do crédito tributário e consequente notificação para pagamento, por meio de Mandado de Segurança ou Ação Anulatória, quando na fase de Conhecimento, tendo como causa de pedir justamente a inadequada destinação ou o seu desvio, em desconformidade com o que  determina a norma tributária ou orçamentária.

            Ademais, quando do desvio do destino da arrecadação das Contribuições se der por atos do próprio administrador tributário ou orçamentário, em contrariedade às normas de competência, orçamentária, administrativa, responsabilidade fiscal e probidade administrativa, de modo a se apropriar indevidamente ou lesar o erário, por exemplo, caberá as providências no âmbito penal, civil e administrativo. Podendo-se proceder por meio de denúncia ao Ministério Público ou ao Tribunal de Contas, conforme dispõe os arts. 70 e seguintes, arts. 127 e seguintes todos da Constituição, Lei de Improbidade Administrativa n. 8.429/92 e Lei de Responsabilidade Fiscal LC n. 101/2000.

            Por todo exposto, constata-se que a afetação da receita constitui elemento indispensável para justificar a instituição das Contribuições Especiais. Evidencia-se, portanto, que, para o adequado contorno legislativo, exige-se que na lei tributária de regência preveja expressamente a destinação a ser dada para o produto da arrecadação e, concomitantemente, a lei orçamentária preveja as corretas alocações de receitas e despesas, para conferir o devido direcionamento das receitas para com a finalidade específica contida na legislação tributária.

Sendo assim, na ocorrência de desvirtuamento seja prévio (na elaboração da lei), seja posterior (quando do desvio das receitas públicas), ocasiona-se consequentemente o direito subjetivo do sujeito passivo ou daqueles legitimados constitucionalmente de se opor, seja para evitar ou remediar, por meio dos controles preventivo e posterior citados alhures, tudo com o fim de ver observados os Princípios da Segurança Jurídica, da certeza do direito, da Legalidade, da Igualdade, dentre outros, e direitos fundamentais determinados pela Constituição Federal

CONCLUSÃO

            Por todo exposto, constata-se que o ordenamento jurídico pátrio admite a existência de diferentes espécies tributárias. Em virtude disso, abre-se caminho para a interpretação doutrinária e jurisprudencial com o fim de oferecer uma coerente classificação. Ocorre que, como estudado, essa classificação não é pacífica, por conta dos critérios utilizados.

            No presente trabalho adota-se a classificação Quinquipartite, com base nos critérios da materialidade, da destinação e da possibilidade de restituição dos valores; dividindo-se, assim, as espécies tributárias em 5 (cinco), quais sejam: impostos, taxas, contribuições de melhoria, contribuições especiais e empréstimos compulsórios.

            Desse modo, mais especificamente as Contribuições Especiais, objetos do estudo, possuem natureza de espécie tributária autônoma, dotadas da característica da afetação, entendendo-se como tal a obrigatória destinação das receitas arrecadadas.

            As Contribuições Especiais são subdivididas em Sociais, Interventivas, Corporativas e custeadoras de Serviço de Iluminação Pública, e possuem materialidades e finalidades especificadas pela Constituição em determinados casos, e pela Legislação tributária nos demais.

            Quando da análise da peculiaridade da destinação obrigatória das receitas provenientes da arrecadação das Contribuições Especiais, identifica-se a necessidade do controle da efetiva e adequada destinação, obedecendo a norma tributária instituidora e a norma orçamentária reguladora da correta aplicação das receitas públicas.

            Esse controle pode se dar por meio preventivo ou posterior, incidindo em momentos diferentes, seja no plano abstrato legal ou no fático concreto. Conforme estudado, a destinação pode ser controlada de diversas formas, tudo para que ocorra o efetivo respeito da destinação das receitas públicas à finalidade específica a que foi previamente definida pela Constituição e pela Legislação.

            Assim, conforme constatado no presente trabalho, a afetação da receita constitui componente indispensável para criação da legislação tributária - que pretenda instituir tributos no sistema jurídico brasileiro - ou da lei orçamentária - responsável pela adequada alocação das receitas. Por essa razão, no caso de haver o desvirtuamento das referidas receitas, gera-se considerável quebra da segurança jurídica, o que permite a oposição do sujeito passivo prejudicado e daqueles competentes constitucional ou legalmente.

Para tanto, no presente trabalho, longe de tentar solucionar todos os problemas epistemológicos, são oferecidos instrumentos diversos, com inclusive apoio jurisprudencial (do STF), que podem auxiliar ou proporcionar a verdadeira garantia dos direitos fundamentais do sujeito passivo e dos beneficiários - destinatários das receitas públicas -, em ver efetivamente a certeza jurídica de que o valor recolhido será verdadeiramente destinado para a situação prevista na lei e no Texto Maior.

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Sítios consultados:

www.stf.jus.br

 

Sobre a autora
Carla Tanida

Advogada, Formada em Direito na PUC/PR, especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários - IBET.<br>

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Trata-se de trabalho de conclusão de curso apresentado ao Programa de Pós-Graduação do Instituto Brasileiro de Estudos Tributários - IBET, como requisito parcial para a obtenção do grau de Especialista em Direito Tributário.

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