Exercer o controle concentrado de constitucionalidade de uma lei ou ato normativo significa certificar a sua (in)compatibilidade com a Constituição Federal, verificando o Supremo Tribunal Federal se a lei (ou o ato normativo) se adequa formal e/ou materialmente aos ditames da Carta Política.
Diz-que uma norma é materialmente inconstitucional quando ela viola o conteúdo da Constituição, ainda que a referida norma tenha ingressado no ordenamento jurídico sem ferir as regras procedimentais do processo legislativo.
Por sua vez, será formalmente inconstitucional a norma (lei ou ato normativo) que tenha ingressado no mundo normativo sem a observância às regras constitucionais que balizam o devido processo legislativo. A inconstitucionalidade formal pode ser constatada se houver vício de iniciativa no projeto de lei (vício subjetivo) ou em relação às regras procedimentais do processo legislativo em si (vício objetivo), ou seja, haverá vício formal objetivo sempre que ficar constatado defeito na elaboração da espécie normativa, desde que não seja vício de iniciativa.
Tanto a inconstitucionalidade formal quanto a material podem ser veiculadas pela via da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), pois em ambos os casos estar-se-á impugnando uma atuação contrária à CF.
De acordo com importante decisão do Supremo Tribunal Federal (ADI 5081/DF) julgada em 27/5/2015, uma lei que tenha sido alvo de ADI por vício formal (subjetivo ou objetivo) pode, posteriormente, ser alvo de nova ADI, desde que esta última tenha a finalidade de constatar a inconstitucionalidade material daquela mesma norma. Vejamos:
Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E ELEITORAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. RESOLUÇÃO Nº 22.610/2007 DO TSE. INAPLICABILIDADE DA REGRA DE PERDA DO MANDATO POR INFIDELIDADE PARTIDÁRIA AO SISTEMA ELEITORAL MAJORITÁRIO. 1. Cabimento da ação. Nas ADIs 3.999/DF e 4.086/DF, discutiu-se o alcance do poder regulamentar da Justiça Eleitoral e sua competência para dispor acerca da perda de mandatos eletivos. O ponto central discutido na presente ação é totalmente diverso: saber se é legítima a extensão da regra da fidelidade partidária aos candidatos eleitos pelo sistema majoritário. 2. As decisões nos Mandados de Segurança 26.602, 26.603 e 26.604 tiveram como pano de fundo o sistema proporcional, que é adotado para a eleição de deputados federais, estaduais e vereadores. As características do sistema proporcional, com sua ênfase nos votos obtidos pelos partidos, tornam a fidelidade partidária importante para garantir que as opções políticas feitas pelo eleitor no momento da eleição sejam minimamente preservadas. Daí a legitimidade de se decretar a perda do mandato do candidato que abandona a legenda pela qual se elegeu. 3. O sistema majoritário, adotado para a eleição de presidente, governador, prefeito e senador, tem lógica e dinâmica diversas da do sistema proporcional. As características do sistema majoritário, com sua ênfase na figura do candidato, fazem com que a perda do mandato, no caso de mudança de partido, frustre a vontade do eleitor e vulnere a soberania popular (CF, art. 1º, parágrafo único; e art. 14, caput). 4. Procedência do pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade (grifos aditados).
Portanto, de acordo com esse importante julgado, podemos concluir que a validação formal de uma norma pela importante via da ADI não impede a propositura de nova ação constitucional de controle concentrado, desde que se discuta nessa nova ação os aspectos materiais (leia-se: o conteúdo) daquela mesma norma infraconstitucional.
Com razão o STF: o teor da discussão em ambas as ações são completamente diversos, ainda que tenham como objeto a mesma lei/ato normativo. Uma norma pode ser constitucional do ponto de vista formal e não sê-lo materialmente (e vice-versa). A completa tutela da Constituição contra ambas as espécies de inconstitucionalidade deve propiciar a instauração da nova ADI, ainda que a norma já tenha sido declarada formalmente constitucional pelo nossa Suprema Corte.