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Se o ritmo MORO (que pediu desculpas) prosseguir, castas intocáveis vão desMOROnar. Elas preferem, no entanto, o sistema da MOROsidade.

Agenda 31/03/2016 às 10:23

Meus amigos, fiquemos antenados: três movimentos estão em curso: (a) impeachment da Dilma/posse do Temer; (b) Operação Lava Jato (que está investigando e encarcerando as castas intocáveis mais poderosas do país); (c) Operação Abafa Tudo (surgida depois...

Meus amigos, fiquemos antenados: três movimentos estão em curso: (a) impeachment da Dilma/posse do Temer; (b) Operação Lava Jato (que está investigando e encarcerando as castas intocáveis mais poderosas do país); (c) Operação Abafa Tudo (surgida depois que mais de mil nomes graúdos de mais de 20 partidos foram divulgados pelas “planilhas” da Odebrecht). O Poder Político nacional, no momento, só pensa nisso. A movimentação de qualquer peça tem algo a ver com esse complexo tabuleiro de xadrez.

O “herói nacional” (Moro) também tem seus momentos de humano mortal (como todos nós). Teori o repreendeu e pediu-lhe explicações, salientando a possibilidade de uma tríplice responsabilidade: civil, administrativa e penal.

Moro se desculpou ao STF (três vezes) pelas suas “polêmicas” e “possíveis equívocos interpretativos” cometidos com a aquela aloprada divulgação da interceptação do Lula. A interceptação foi legal (e vale como prova), sendo discutível apenas aquela feita às 13.32h (porque aí já havia cessada a autorização judicial). O problema não foi a interceptação, foi a divulgação atabalhoada, inclusive de diálogos que nada tinham a ver com a investigação.

Nesse ponto, ao violar flagrantemente os arts. 8º e 9º da Lei 9.296/96, Moro teria cometido o crime do art. 10 do mesmo diploma legal (punido com pena de dois a quatro anos de prisão). Teoricamente ainda poderia responder por crime contra a segurança nacional (mas há séria dúvida sobre a constitucionalidade desse entulho autoritário do tempo da ditadura civil-militar-norte-americana).

Doravante, as castas intocáveis já decretaram a tolerância zero contra o Moro e a Lava Jato (que somente lhes interessava enquanto se castigava o PT e seus aliados). Para o sucesso da nossa guerra contra a corrupção desses intocáveis, os juízes, promotores e policiais não podem praticar nenhum tipo de excesso. Tudo dentro da lei ou teremos novas Satiagrahas e Castelos de Areia. Se a Lava Jato lavar de qualquer jeito vai virar só conta-gotas (ou a Cantareira em seu pior momento).

Todas as castas unidas procurarão massacrar os operadores da Lava Jato. Foi assim que os empresários e políticos malandros na Itália (com Berlusconi na liderança) conseguiram deter os avanços da Mãos Limpas. Aqui farão tudo que foi feito na Itália.

E quando falamos de castas intocáveis, não estamos nos referindo a pessoas comuns (evidentemente). Estamos falando de Cunha, Sarney, Renan, Aécio, Lula, Jader, Lobão, Collor, Odebrecht, UTC, Andrade Gutierrez… tudo junto e misturado (ou seja: são milhares de anos de experiências acumuladas contra o erário).

Para as castas intocáveis (depois das planilhas da Odebrecht) já não interessa o sistema MORO (que atua em ritmo alucinante, para os padrões clássicos da Justiça brasileira). Preferível, para elas, é o sistema da MOROsidade, que vigora para o STF (e não por ausência de vontade, sim, por absoluta falta de estrutura). Em dois anos de Lava Jato, o STF, até agora, só conseguiu receber uma única denúncia (contra Cunha). Não está realizando nenhuma instrução criminal. Aliás, não tem estrutura para isso.

Qualquer organismo vivo pode ser morto por falta de alimentação ou por excesso. Estão tramitando na PF mais de 40 inquéritos contra autoridades com foro especial (9 deles contra Renan). Em cada nova delação brotam mais inquéritos. Se todas as planilhas e o DPO (Departamento de Propinas da Odebrecht) forem investigados, serão centenas de inquéritos. Se as mil contas bancárias secretas recebidas pelo PGR das mãos do Ministério Público da Suíça forem investigadas, talvez os inquéritos alcancem a casa dos milhares.

Quando tudo isso chegar ao STF em forma de denúncia haverá transbordamento. E isso é tudo o que as castas intocáveis querem. Entupir para “melar”. Matar (neutralizar) o organismo julgador pelo excesso (pela bulimia). No mínimo, os políticos vão se garantir como ficha limpa para a eleição de 2018.

A população (que quer ver os políticos processados e, eventualmente, condenados) ficará desapontada com o ritmo do STF (da MOROsidade), que não tem nada a ver com o sistema MORO (de Curitiba). O desapontamento do povo leva ao desânimo e à apatia. Assim morreu a Mãos Limpas.

Sistema MORO (PT e aliados) “versus” sistema da MOROsidade (PSDB)

O povo foi para as ruas dia 13/03/16 e pediu providências concretas contra os corruptos. Vangloriou o sistema Moro. “Trensalão”, “Furnas”, “MetrôSP”, “Merenda escolar”, ações de improbidade contra Serra, Malan e Parente, investigação de FHC (pensão para ex-amante): tudo isso não segue o sistema Moro, sim, o da MOROsidade[1]. No mensalão valeu o sistema Joaquim Barbosa; na Lava Jato vale o sistema Moro.

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Como funciona o sistema da morosidade? Inquéritos estacionados, juízes arquivando investigações, lentidão e penas prescrevendo. No caso Furnas, 156 políticos (dentre eles alguns do PT) teriam recebido 40 milhões de “doações” e “caixa 2” (5,5 milhões para o Aécio). Alckmin e Serra aparecem na lista (ver Carta Capital). Esse assunto até hoje (desde 2002) não foi ainda passado a limpo. Youssef e Fernando Baiano delataram (novamente) esses fatos. Nada avançou. O inquérito está no RJ desde 2012, sem progressos conhecidos.

Desde 1997 a população está interessada em saber como funcionava o esquema de cartel no Metrô e na CPTM em São Paulo (nas gestões de Covas, Serra e Alckmin). Há várias denúncias, mas tudo caminha pelo sistema da morosidade. Nenhuma condenação até agora e praticamente nada ou muito pouco foi reparado (o prejuízo passaria de R$ 800 milhões). Alstom e Siemens já confessaram seus desvios e mesmo assim as coisas não andam. Nenhum político até agora foi denunciado. Uma das denúncias chegou até a ser rejeitada pelo juiz. Só em segunda instância determinou-se seu prosseguimento. Em 2015 o STF bloqueou a possibilidade de qualquer investigação contra os deputados Rodrigo Garcia e José Anibal.

O caso de desvio de dinheiro público no PSDB de Minas Gerais (caso impropriamente conhecido como mensalão tucano) também é emblemático. Eduardo Azeredo só foi condenado em 2015, depois de 17 anos. Crimes de 1998, com denúncia apenas em 2007 (9 anos depois). Quando ele estava na iminência de ser julgado pelo STF, renunciou ao seu mandato de deputado (e o STF aceitou a manobra, remetendo o caso para a 1ª instância).

A juíza do caso (que condenou Azeredo a mais de 20 anos de prisão) sublinhou: “Triste se pensar que, talvez toda essa situação, bem como todos os crimes de peculato, corrupção e lavagem de dinheiro, tanto do presente feito, quanto do mensalão do PT, pudessem ter sido evitados se os fatos aqui tratados tivessem sido a fundo investigados quando da denúncia formalizada pela coligação adversária perante a Justiça Eleitoral”.

Esse é o sistema da MOROsidade e da impunidade, do qual se valem as castas poderosas (o establishment) para perpetuar (tanto quanto possível) sua imunidade penal.

CAROS internautas que queiram nos honrar com a leitura deste artigo: sou do Movimento Contra a Corrupção Eleitoral (MCCE) e recrimino todos os políticos comprovadamente desonestos assim como sou radicalmente contra a corrupção cleptocrata de todos os agentes públicos (mancomunados com agentes privados) que já governaram ou que governam o País, roubando o dinheiro público. Todos os partidos e agentes inequivocamente envolvidos com a corrupção (PT, PMDB, PSDB, PP, PTB, DEM, Solidariedade, PSB etc.), além de ladrões, foram ou são fisiológicos (toma lá dá cá) e ultraconservadores não do bem, sim, dos interesses das oligarquias bem posicionadas dentro da sociedade e do Estado. Mais: fraudam a confiança dos tolos que cegamente confiam em corruptos e ainda imoralmente os defende. 

[1] Ver http://brasil.elpais.com/brasil/2016/02/19/politica/1455891750_478342.html, consultado em 22/02/16

Sobre o autor
Luiz Flávio Gomes

Doutor em Direito Penal pela Universidade Complutense de Madri – UCM e Mestre em Direito Penal pela Universidade de São Paulo – USP. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Jurista e Professor de Direito Penal e de Processo Penal em vários cursos de pós-graduação no Brasil e no exterior. Autor de vários livros jurídicos e de artigos publicados em periódicos nacionais e estrangeiros. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998), Advogado (1999 a 2001) e Deputado Federal (2019). Falecido em 2019.

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