Símbolo do Jus.com.br Jus.com.br

Princípio da insignificância e seu caráter subjetivo

Princípio da Insignificância e seu caráter subjetivo.

RESUMO: O presente trabalho tem por finalidade demonstrar como que o Princípio da Insignificância ou Bagatela irá ser aplicado em cada caso concreto, sendo assim, demonstrando o seu caráter subjetivo, visto que dito Princípio não está tipificado no Código Penal, sendo, assim, fonte secundária do Direito Penal, porém de ampla aplicação, fazendo com que se consiga um ideal de Justiça.

PALAVRAS-CHAVE: Princípio da insignificância; atipicidade; subjetividade.

SUMÁRIO: 1. Introdução; 2. Desenvolvimento; 3. Conclusão; 4. Referências.

1. INTRODUÇÃO.

            O presente trabalho tem por fito estudar a possibilidade ou não do reconhecimento do Princípio da Insignificância ou Bagatela do Direito Penal, como que o Princípio surgiu, com qual finalidade ele surgiu, definir o que vem a ser dito Princípio.

            A pesquisa se justifica em razão do fortalecimento que o princípio da insignificância recebe pela doutrina nas últimas décadas, especialmente, a partir da análise finalística de Direito Penal como instrumento de proteção aos bens jurídicos mais importantes para a vida em sociedade, visto que o Direito Penal visa garantir os direitos mais importantes na vida da sociedade.

            Será verificado ainda, pela Doutrina e Jurisprudência, a análise de quando se pode usar dito Princípio e quando não podemos utilizar dito Princípio, de uma forma didática, usando sempre casos concretos, lembrando que o Direito não é decoreba, o Direito e feito para entender sua aplicação.

            O trabalho tem como fulcro verificar os critérios de aferição do Princípio da Insignificância, seus efeitos em cada caso concreto, visto seu caráter subjetivo de sua aplicação ou não.

            Mais adiante no trabalho, vai ser verificado como em cada caso concreto dito Princípio é utilizado, quando que vai ser considerado uma lesão a um patrimônio de relevo para o proprietário e quando não em cada caso concreto, sempre tendo em vista o seu caráter subjetivo.

            Identificar, em última análise, o que vem a ser o caráter subjetivo do Princípio da Insignificância ou da Bagatela em cada caso, e o motivo de seu caráter subjetivo, tendo em vista que cada caso é um caso, e o poder econômico vai mudar totalmente o entendimento do caso.

            Por fim, o trabalho tem o objetivo de ressaltar a impossibilidade da aplicação do Princípio da Insignificância e da Bagatela em casos de crimes que contenham grave ameaça ou lesão, visto que, a bem "vida" é sempre de grande relevância, sendo impossível a aplicação do Princípio nesses casos.

2. DESENVOLVIMENTO.

A origem do Princípio da Insignificância ou bagatela é do Direito Romano, brotando do brocardo mínima “non curat praetor”. levando a compreensão de que o Magistrado deve desprezar os casos insignificantes para cuidar dos delitos que realmente são inadiáveis, que comprometem a paz social e a ordem da sociedade.

De acordo com o Princípio da Insignificância ou da Bagatela quando existe uma lesão que é insignificante, não atingindo a paz social ou a ordem da sociedade, não há necessidade da utilização do Direito Penal e, consequentemente, da incidência de seus preceitos secundários, que carregam suas respectivas sanções, pois tal princípio exclui a tipicidade material do delito em cada caso concreto.

Sendo assim, podemos afirmar, sem sombra de dúvidas, que o Princípio da Insignificância ou da Bagatela é utilizado como um mensurador da tipicidade material, a medida que o Direito Penal só vai ser utilizado quando realmente aquela conduta delituosa afrontar a paz social e a ordem da sociedade, como explicado acima.

Vale ressaltar que, apesar do Princípio da Insignificância ou da Bagatela carregar em sua origem um viés patrimonial, onde temos que verificar o patrimônio que foi lesado em cada caso concreto, seu campo de atuação foi ampliado, devendo ser analisado, sobretudo, diante das circunstâncias de cada caso concreto e não necessariamente ligado aos crimes patrimoniais.

No entendimento da jurisprudência pátria, grande tem sido a aplicação do Princípio da Insignificância pelos tribunais, por exemplo:

EMENTA: HABEAS CORPUSCRIME DE DESCAMINHO (ART. 334 DO CP). TIPICIDADE. INSIGNIFICÂNCIA PENAL DA CONDUTA. TRIBUTO DEVIDO QUE NÃO ULTRAPASSA A SOMA DE R$ 3.067,93 (TRÊS MIL, SESSENTA E SETE REAIS E NOVENTA E TRÊS CENTAVOS). ATIPICIDADE ORDEM CONCEDIDA. 1. O postulado da insignificância opera como vetor interpretativo do tipo penal, que tem o objetivo de excluir da abrangência do Direito Criminal condutas provocadoras de ínfima lesão ao bem jurídico por ele tutelado. Tal forma de interpretação assume contornos de uma válida medida de política criminal, visando, para além de uma desnecessária carceirização, ao descongestionamento de uma Justiça Penal que deve se ocupar apenas das infrações tão lesivas a bens jurídicos dessa ou daquela pessoa quanto aos interesses societários em geralMATERIAL DA CONDUTA.. 2. No caso, a relevância penal é de ser investigada a partir das coordenadas traçadas pela Lei 10.522/02 (objeto de conversão da Medida Provisória 2.176-79). Lei que determina o arquivamento das execuções fiscais cujo valor consolidado for igual ou inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais). Sendo certo que os autos de execução serão reativados somente quando os valores dos débitos inscritos como Dívida Ativa da União pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional ultrapassarem esse valor. 3. Incidência do princípio da insignificância penal, segundo o qual para que haja a incidência da norma incriminadora não basta a mera adequação formal do fato empírico ao tipo. Necessário que esse fato empírico se contraponha, em substância, à conduta normativamente tipificada. É preciso que o agente passivo experimente efetivo desfalque em seu patrimônio, ora maior, ora menor, ora pequeno, mas sempre um real prejuízo material. Não, como no caso, a supressão de um tributo cujo reduzido valor pecuniário nem sequer justifica a obrigatória cobrança judicial. 4. Entendimento diverso implicaria a desnecessária mobilização de u'a máquina custosa, delicada e ao mesmo tempo complexa como é o aparato de poder em que o Judiciário consiste. Poder que não é de ser acionado para, afinal, não ter o que substancialmente tutelar. 5. Não há sentido lógico permitir que alguém seja processado, criminalmente, pela falta de recolhimento de um tributo que nem sequer se tem a certeza de que será cobrado no âmbito administrativo-tributário do Estado. Estado julgador que só é de lançar mão do direito penal para a tutela de bens jurídicos de cuja relevância não se tenha dúvida. 6. Jurisprudência pacífica de ambas as Turmas desta Suprema Corte: RE 550.761, da relatoria do ministro Menezes Direito (Primeira Turma); RE 536.486, da relatoria da ministra Ellen Gracie (Segunda Turma); e HC 92.438, da relatoria do ministro Joaquim Barbosa (Segunda Turma). 7. Ordem concedida para restabelecer a sentença absolutória”. (STF HC 100177, Relator(a):  Min. AYRES BRITTO, Primeira Turma, julgado em 22/06/2010, DJe-154 DIVULG 19-08-2010 PUBLIC 20-08-2010 EMENT VOL-02411-03 PP-00575, disponível em: <www.jusbrasil.com.br>, acesso em 04 abr 2015, grifo nosso).

            Por meio desse julgado, fica cristalino ao afirmar que, o Princípio da Insignificância ou Bagatela é um princípio político-criminal, segundo o qual em cada caso concreto deve ser observado se a conduta causou ínfima lesão ao bem jurídico tutelado pelo Direito Penal, se a resposta for positiva não se aplica o Direito Penal, uma vez que só podemos utilizar esse ramo do Direito, quando não temos dúvida em relação a relevância do bem jurídico.

            Vale salientar que, em suma, o Princípio da Insignificância ou Bagatela, tem como objetivo, estabelecer limites para a tipificação penal, sendo assim, fica óbvio que a tipificação de uma conduta não pode ser feita somente pelo ponto de vista formal, ou seja, não deve observar somente se aquela conduta se amolda perfeitamente no tipo penal. (GRECO, 2011).

            A tipicidade penal deve ser entendida nos seus dois aspectos, sendo eles, a tipicidade formal e a tipicidade material, ou seja, deverá levar em consideração a relevância do bem jurídico tutelado, apesar, de se amoldarem perfeitamente no tipo penal.

            Cezar Roberto Bitencourt ilustra bem sobre a aferição da insignificância de determinada conduta, em suas magistrais palavras:

Os delitos de  lesão  corporal  leve, de  ameaça, injúria, por exemplo, já sofreram a valoração do legislador (...)  as ações que  lesarem tais bens, embora  menos importantes se comparados a outros bens como a vida e liberdade sexual, são social e  penalmente  relevantes.  Assim, a irrelevância ou insignificância  de determinada  conduta  deve  ser aferida não apenas em relação a importância do bem juridicamente atingido, mas especialmente em relação  ao grau de sua intensidade, isto é, pela extensão da lesão produzida.                  (BITENCOURT, 1999, p. 50).

             

            Sendo assim, não existe mais a coadunação com a simples conduta ao tipo penal, tendo que sempre haver a preocupação se aquela conduta, é relevante ao Direito Penal, e para isso, é necessário sempre verificar se aquela conduta atingiu a paz social ou a ordem da sociedade.

            Cumpre ressaltar que, dito Princípio, surge como um instrumento de interpretação que restringe a utilização do tipo penal que, de acordo com a dogmática moderna, não deve ser observado somente em seu aspecto formal, ou seja, a letra da lei, mas, também, em seu conteúdo material, de cunho valorativo, verificando sua efetiva lesividade ao bem jurídico tutelado pela normal penal, lembrando da Intervenção mínima do Direito Penal.

            Durante muito tempo, tanto a jurisprudência, como a doutrina do Direito Penal, não tinha critérios pré-fixados para a aplicação do Princípio da Insignificância ou Bagatela, pois, o mesmo não se encontrava positivado no Direito Penal comum, ressalta-se que os atuais critérios consignados pela jurisprudência e pela Doutrina do Direito Penal não são vinculantes, afirmando, com isso, novamente, que para a sua aplicação vai depender de cada caso concreto. 

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

            Note-se que, para que seja aplicado o Princípio da Insignificância e da Bagatela em um fato, segundo a doutrina (GRECO, 2011) é necessário a concorrência da insignificância da conduta e do resultado, sendo assim, não se aplica dito princípio, em crimes como, por exemplo, de roubo, previsto no artigo 157 do Código Penal, visto que, o mesmo coaduna com violência ou grave ameaça, sendo assim, não existindo a insignificância para o resultado, nesse sentido é de suprema importância analisar alguns julgados:

HABEAS CORPUS. CRIME DE ROUBO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. LESÃO AO PATRIMÔNIO E À INTEGRIDADE FÍSICA DA VÍTIMA. PRECEDENTES. ORDEM DENEGADA. 1. A questão tratada no presente writ diz respeito à possibilidade de aplicação do princípio da insignificância ao crime de roubo. 2. Como é cediço, o crime de roubo visa proteger não só o patrimônio, mas, também, a integridade física e a liberdade do indivíduo.3. Deste modo, ainda que a quantia subtraída tenha sido de pequena monta, não há como se aplicar o princípio da insignificância diante da evidente e significativa lesão à integridade física da vítima do roubo. 4. Ante o exposto, denego a ordem de habeascorpus. (STF HC 96671, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 31/03/2009, DJe-075 DIVULG 23-04-2009 PUBLIC 24-04-2009 EMENT VOL-02357-04 PP-00665, site Jusbrasil, disponível em <www.jusbrasil.com.br>, acesso em 10 mai. 2015, grifo nosso).   

PENAL. RECURSO ESPECIAL. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STF E STJ. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Em crimes praticados mediante violência ou grave ameaça a vítima, como ocorre no roubo, não há falar em aplicação do princípio da insignificância, não obstante o ínfimo valor da coisa subtraída.Precedentes do STF e do STJ. 2. Recurso especial provido para restabelecer a sentença.(STJ REsp 1159735/MG, Rel. Ministro  ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 15/06/2010, DJe 02/08/2010, site Jusbrasil, disponível em <www.jusbrasil.com.br>, acesso em 12 mai 2015, grifo nosso).  

HABEAS CORPUS. PENAL. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. DELITO COMPLEXO. PLURALIDADE DE BENS JURÍDICOS OFENDIDOS. PRECEDENTES DESTA CORTE E DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PRETENDIDA DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE CONSTRANGIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Conforme orientação desta Corte Superior de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, é inaplicável, ao crime de roubo, o princípio da insignificância – causa excludente da tipicidade penal –, pois, tratando-se de delito complexo, em que há ofensa a bens jurídicos diversos (o patrimônio e a integridade da pessoa), é inviável a afirmação do desinteresse estatal à sua repressão. 2. Se a conduta do Paciente descrita na denúncia preenche todos os elementos do tipo previsto no art. 157 do Código Penal, não há como se acolher a pretendida desclassificação para o delito de constrangimento ilegal. 3. Ordem denegada.”(STJ HC 142.661/MG, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 15/06/2010, DJe 28/06/2010, site Jusbrasil, disponível em <www.jusbrasil.com.br>, acesso em 14 mai 2015, grifo nosso).  

Nesses casos, não há que se falar em insignificância quer conduta ou de resultado ou de ambos, evidenciando assim, que em crimes desse calibre não se admite a aplicação do Princípio da Insignificância ou da Bagatela, os critérios adotados pelo Supremo Tribunal Federal, são critérios que possuem conteúdo normativo evidente, ou seja, necessitam da valoração do Magistrado, pois os critérios elencados na Jurisprudência e na Doutrina brasileira de Direito Penal, não são suficientes, devendo o Juiz avaliar cada caso concreto e suas circunstâncias para uma verdadeira aplicação da tão sonhada Justiça.

Para não sobrecarregar ainda mais o Judiciário, desde o século passado, autores como Von Liszt advertem quanto à necessidade de acabar com as ínfimas questões do setor do ilícito penal, e que o Direito Penal, no âmbito do Judiciário, encontra sobrecarregado.

As magistrais palavras de Celso Antonio Bandeira de Mello afirmam: "somente há uma disciplina jurídica autônoma quando corresponde a um conjunto sistematizado de princípios e normas que lhe dão identidade, diferenciando-a das demais ramificações do Direito". (MELLO, 1994, p 15).

Sendo assim, considerando o Princípio como definidor de todo o sistema, é de se salientar que, é muito mais grave transgredir um princípio que uma norma, pois se isso acontecer, não estará atingindo somente a um preceito normativo, mas sim a um conjunto de preceitos, pois os Princípios, e nesse caso o Princípio da Insignificância ou da Bagatela, esta incorporado ao sistema, transformando-se em norma-princípio.

Nas sábias palavras de Diomar Ackel Filho, afirma-se:

O Direito Penal, a exemplo do que ocorre com os demais ramos da ciência jurídica, é informado por determinados princípios básicos que lhe imprimem determinado caráter e direcionam o seu rumo. Assim, as suas normas se inspiram e orientam nesses princípios, aos quais se ligam como o corpo se liga ao espírito. (ACKEL FILHO, 1988, p. 72).

Logo, é fácil ressaltar que, quando se pensa em Princípio da Insignificância ou da Bagatela, faz-se necessário a análise do seguinte ponto: Será que quando o Legislador elaborou essa norma, ele gostaria que tais condutas que não são de relevância para o Direito Penal fossem também alcançadas? A resposta, é claro que é negativa, embora o crime de furto, por exemplo, esteja previsto na legislação, a conduta de furtar uma bala em um mercado não merece a punição do Direito Penal, posto que o dano causado ao patrimônio seria uma ninharia, o que é diferente de furtar um valor de R$ 10,00 de um mendigo, pois para aquela pessoa, essa quantia não é irrelevante, por isso, mais um vez, vale reafirmar que, a aplicação de dito Princípio, irá depender de cada caso concreto.

            A justificação para criação do Princípio da Insignificância e da Bagatela, é dada por dois motivos, que são bem claros quando se aprofunda os estudos nesse ponto, primeiramente a desproporção entre o crime e a pena, ou seja, é de tratamento igualitário tratar um infrator que furta um carro da mesma forma que uma infrator que furtou uma galinha? A resposta, obviamente é negativa, logo há necessidade da aplicação do Princípio da Razoabilidade, e a outra justificativa, foi a já explica acima, que é a de desafogar o Poder Judiciário, bem assim compreendido o sistema carcerário.

A punição de uma conduta, que é insignificante, que de forma alguma abalou significativamente o bem jurídico da vítima, tem que ser tratada de forma desigual daquelas que afetaram significativamente o bem jurídico da vítima, pois se assim não fosse, estaríamos diante de uma aberração jurídica. A punição de uma conduta cujo prejuízo é praticamente inexistente não colabora em nada para o caráter preventivo da pena, pelo contrário, permite a igualdade de punições entre um infrator que furtou um cordão de uma joalheria no valor de R$ 50.000, e um infrator que furtou um urso de pelúcia para dar de presente para o seu filho.

O Princípio da Bagatela, vem nessa esteira, para adequar a desproporção de punições à uma conduta que formalmente é considerada como crime, porém, mas não apresenta ofensa ao bem jurídico.

A aplicação do Princípio da Bagatela ou da Insignificância é aceita na maioria dos tipos penais nos dias atuais, desde que causem danos insignificantes ao bem jurídico. Na doutrina há ampla aceitação do Princípio da Bagatela, como instrumento político-criminal, como já acima demonstrado, atendendo o movimento de descriminalização. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, contudo, exige requisitos para sua aplicação, como podemos verificar:

HC 95445 / DF - DISTRITO FEDERAL. EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL. LESÃO CORPORAL LEVE [ARTIGO 209, § 4º, DO CPM]. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. 1. O princípio da insignificância é aplicável no âmbito da Justiça Militar de forma criteriosa e casuística. Precedentes. 2. Lesão corporal leve, consistente em único soco desferido pelo paciente contra outro militar, após injusta provocação deste. O direito penal não há de estar voltado à punição de condutas que não provoquem lesão significativa a bens jurídicos relevantes, prejuízos relevantes ao titular do bem tutelado ou, ainda, à integridade da ordem social. Ordem deferida”. (HC 95445, Relator(a):  Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 02/12/2008, DJe-152 DIVULG 13-08-2009 PUBLIC 14-08-2009 EMENT VOL -02369-05 PP-00929, site Jusbrasil, disponível em <www.jusbrasil.com.br>, acesso em 14/05/2015).  

Nesse caso, estão presentes todos os requisitos para a aplicação de dito Princípio, o resultado e a conduta são ínfimos, insignificantes, não restando dúvida para a aplicação de dito Princípio, sempre lembrando que deve ser observado cada caso concreto, para que se possa conseguir o ideal do que denominamos como Justiça.

Ocorre que, deve ser verificado em cada caso concreto, se houve pequeno valor e pequeno prejuízo para a vítima, assim como a ofensividade da conduta para a sociedade, é importante ressaltar, que para alguns doutrinadores, afirmam que o importante para a aplicação de dito Princípio não é o valor econômico do bem jurídico, mas a lesão causada, analisando o dano causado à vítima, e o perigo que a conduta traz a sociedade.

Vale Salientar ainda que, existem os elementos objetivos do Princípio da Insignificância ou Bagatela, que são os que já foram apresentados no trabalho em tela, porém, além deles, existem os elementos subjetivos, que são: Os antecedentes, visto que, se for um criminoso habitual, não há possibilidade da aplicação de dito princípio, conduta social, personalidade do agente que pratica o delito, e, ainda, os motivos, conforme preleciona o artigo 59 do Código Penal.

O ilustre Doutrinador Rogério Greco, reafirma tudo o que já foi mencionado, ipsis litteris:

Tipicidade formal é a adequação perfeita de conduta do agente ao modelo abstrato (tipo) previsto na lei penal. No caso em exame, haveria a chamada tipicidade formal, uma vez que o legislador fez previsão expressa para o delito de lesão corporal de natureza culposa cometido na direção de veículo automotor. (GRECO, 2011, p. 63)

Contudo, será que poderíamos falar em tipicidade conglobante?

Para que se possa concluir pela tipicidade conglobante, é preciso verificar dois aspectos fundamentais: a) se a conduta do agente é antinormativa; b) se o fato é materialmente típico. O estudo do Princípio da Insignificância reside neste segunda vertente da tipicidade conglobante, ou seja, na chamada tipicidade material”.

É mister salientar a importância desse princípio interligando o mesmo ao ramo do Direito Constitucional, o Direito Penal, visando assegurar os interesses  da coletividade, sendo norma aplicada como ultima ratio na segurança dos bens jurídicos mais importantes segundo o legislador, deverá pautar-se em tais princípios, uma vez que é  fragmentário, e o Estado, ou seja, o Juiz, como órgão do Estado, exercerá o Juízo de valor, do que é mais relevante ou e o que seria insignificante, sempre usando a proporcionalidade e razoabilidade.

É notório, após a leitura desse breve desenvolvimento, que o Direito Penal, é o ramo do Direito que deve ser utilizado em última opção, sendo certo que, com o Princípio da Insignificância, isso fica possível, pois o mesmo, é utilizado de forma a equilibrar os delitos cometidos, fazendo uma espécie de “peneira” dos infratores, onde é levado sempre em consideração os elementos objetivos e subjetivos, e verificando cada caso concreto, e esse trabalho tão difícil e importante para que se possa fazer Justiça fica a cargo dos Juízes, onde irão ter que observar o motivo que levou aquele infrator a cometer aquela conduta delituosa, e depois de fazer dito trabalho aplicar a pena ou deixar de aplicar com base no Princípio supra mencionado.

3. CONCLUSÃO.

            O Direito como um todo é mutante, ou seja, ele precisa acompanhar as mudanças na sociedade, logo, se a sociedade muda de comportamento, o Direito vai tentar tutelar aquela mudança de comportamento que surge.

            É oportuno salientar que, para a aplicação das Leis, ou melhor dizendo, aplicação do Direito como um todo, os operadores da área do Direito, não podem ficar engessados na análise fria da letra da Lei que pode ou não ser aplicada, o certo, para a aplicação da mais inteira Justiça é aquele operador do Direito analisar a “mens legis”, ou seja, o espírito da Lei.

            Quando os operadores do Direito, e quando eu falo em operadores eu estou falando todos eles, desde os Advogados até os Desembargadores, se preocuparem com o espírito da Lei, ou seja, os motivos que levaram a criação daquela Lei, com toda certeza a Justiça vai ser mais transparente, pois teremos a justa aplicação.

            Cumpre salientar que, após essa análise, pode-se afirmar que, quando o Legislador, criou o Tipo Penal de Furto, contido no artigo 155 do Código Penal, o mesmo queria regrar aquelas pessoas que são criminosos habituais, ou, que furtam grande quantia, e não aquele que furta um urso de pelúcia, como exemplo, logo fica fácil verificar se deve ou não ser aplicado o Princípio da Insignificância ou da Bagatela, quando se faz a análise do espírito da Lei.

            Quando se fala em Princípio da Insignificância ou Bagatela, faz-se necessário ter uma visão de cunho Constitucional, pois o mesmo Princípio carrega uma carga de proporcionalidade e razoabilidade, logo faz-se necessário, também, citar um consagrado jurista na área de Direito Constitucional que é o Pedro Lenza, quando afirma em seu livro que: “Trata-se de Princípio extremamente importante, especialmente na situação de colisão entre valores constitucionalizados”. 

            Conforme se denota do trabalho ora apresentado, a preocupação da aplicação justa do Direito é de suprema importância, pois só se faz justiça, com a aplicação justa do Direito, logo, o Princípio da Insignificância ou Bagatela também é de alta importância nesse sentido, uma vez que o mesmo observa não só a Tipicidade Formal, mas também a Tipicidade Material, formando a Tipicidade Conglobante.

            Vale concluir também que, o Princípio da Insignificância ou Bagatela, apesar de ser extremamente importante nos dias atuais, não esta previsto expressamente no ordenamento jurídico brasileiro, e sim, sendo constantemente utilizado pela Jurisprudência, sendo assim, é válido ressaltar que, sendo utilizado pela Jurisprudência, não raro, a mesma decide casos análogos de maneira totalmente conflitantes.

            Por esse motivo, os ensinamentos doutrinários caminham na mesma direção, porém o vazio legislativo acerca de sua inclusão no ordenamento jurídico brasileiro possibilita o surgimento de diversos entendimentos jurisprudenciais para o seu conhecimento ou não em cada caso concreto.

            Logo, infelizmente, fica claro que ainda não há um posicionamento jurisprudencial preciso, no que se trata ao Princípio da Insignificância ou da Bagatela, o que causa a não certeza da sua aplicação em determinados julgamentos, causando a insegurança.

            Toda vez que se falar do Princípio da Insignificância ou da Bagatela, o aplicador, para ter a certeza de sua aplicação ou não, deve analisar se o bem jurídico foi atingido significativamente, ou seja, se houve realmente uma lesão significativa, tendo em vista o ramo do Direito Penal só agir como última opção, sendo assim, sempre vai ser mister analisar tanto o delito, quanto o bem jurídico, e verificar se houve ou não uma lesão significativa, se a resposta for negativa, ou seja, não houve uma lesão significativa, o Direito Penal não vai ser aplicado.

            É claro que, a vítima não vai ficar desamparada, nada impede da mesma propor uma ação de reparação por danos morais e materiais, porém, a aplicação do ramo do Direito Penal que não vai acontecer, tendo em vista esse ramo ser a última opção, ou seja, se nenhum dos outros ramos do Direito resolver, ai o Direito Penal resolve, nesse caso fica evidente que a vítima pode se utilizar do ramo do Direito Civil para reparar o dano que ocorreu.

            A aplicação ou não do Princípio da Insignificância ou da Bagatela, vai ser verifica com cautela em cada caso concreto, logo, muitos operadores do Direito, tem a dificuldade de verificar se há ou não a possibilidade da aplicação de dito princípio naquele caso concreto, até mesmo pela falta de previsão no nosso ordenamento jurídico brasileiro, só existindo nas doutrinas, o ponto é, sempre deve ser feito a pergunta: Houve lesão significativa ao bem jurídico tutelado? Se a resposta for negativa, e é claro não havendo a presença de violência ou grave ameaça, a aplicação do dito Princípio é justa, pois outros ramos do Direito podem tutelar aquela lesão que é insignificante ao ramo do Direito Penal.

            Sempre é necessário observar, também, o Princípio da Razoabilidade e da Proporcionalidade, ou seja, novamente, se faz necessário a afirmação que vai depender de cada caso concreto a aplicação ou não do Princípio da Insignificância ou da Bagatela, pois, se uma pessoa furtar R$ 10,00 reais (Dez reais) de um mendigo na rua, essa quantia para o mendigo irá fazer falta, logo atinge com toda a certeza, e significativamente o mendigo, porém se uma pessoa furtar R$ 100,00 (Cem reais) de um pequeno empresário, essa conduta não vai atingir significativamente o patrimônio, ou seja, o bem jurídico que o legislador previu no artigo 155 do Código Penal, logo a aplicação será validade de dito Princípio.

            Esse Princípio tem um ponto muito importante, quando os doutrinadores começaram a falar sobre ele, porque tinham a preocupação de um delito de furto de galinha, por exemplo, ser apenado da mesma forma que um delito de furto de carro, e ambos irem para a mesma prisão, o que me parece totalmente justo, tendo em vista o Sistema Carcerário ser totalmente precário, e na verdade a prisão não tem aquele ideal de ressocialização como é visto na Doutrina, pois os presos ficam apertados, em condições terríveis, e por mais que cometeram erros, ou seja, Crimes, a Constituição da República, garante o respeito a integridade física e moral do preso, o que na prática, não é respeitado, logo, se uma pessoa que furtou uma galinha fosse parar nesse Sistema, a tendência iria ser só piorar uma coisa que não lesou significativamente nenhum bem jurídico, nenhum patrimônio, pois ninguém fica mais rico ou mais pobre por um furto de galinha, por exemplo.

            Para que se possa manter o mais justo sentimento de Justiça na sociedade, são criadas algumas ferramentas, e, sempre vai ser usado o Princípio da proporcionalidade, pois se assim não fosse iria gerar um sentimento de revolta em toda a sociedade, uma dessas ferramentas é o Princípio da Insignificância ou da Bagatela.

            O Princípio da Insignificância, vêm para dar uma segunda chance para aqueles que não atingiram a Tipicidade Material, pois, quando o infrator verifica que teve uma segunda chance, muitas das vezes ele não volta a cometer qualquer outro delito, pois sentiu a adrenalina de ser ou não ser preso no Sistema Carcerário Brasileiro, logo, a utilização de dito Princípio, é de total importância.

            Vale ressaltar que, a importância supra citada, não é só dar uma segunda chance para o infrator que não atingiu a Tipicidade Material do Tipo Penal, mas, também, não superlotar mais ainda o Sistema Carcerário Brasileiro, pois o mesmo já se encontra precário em todos os aspectos, imagine que todos aqueles no Brasil que cometem pequenos furtos fossem condenados a pena máxima, não existiria mais prisão no Brasil, logo, faz-se necessário sempre a utilização desse princípio, que exclui a Tipicidade Material, fazendo com que não existe o binômio da Tipicidade Formal mais a Tipicidade Material, formando a Tipicidade Conglobante, fazendo assim, que a conduta daquele infrator, seja atípica, pois apesar de atingir a Tipicidade Formal, ou seja, a conduta do infrator se amoldar perfeitamente ao Tipo Formal, não atinge a Tipicidade Material (verdadeira intenção do Legislador ao criar aquele Tipo Penal).

            Cumpre, ainda, ressaltar que, o Princípio da Bagatela ou Insignificância devido ainda não estar positivado no ordenamento jurídico brasileiro, possui seu caráter subjetivo, havendo, assim, decisões de casos semelhantes totalmente conflitantes.

            Para concluir, o Princípio da Insignificância, conforme explicado acima, é de extrema importância para os militantes nas áreas do Direito Penal, é com ele que os Advogados conseguem defender seus clientes que praticaram pequenos furtos, por exemplo, fazendo com que exista o sentimento de Justiça, uma vez que se todos os operadores e estudiosos da área do Direito Penal para o exercício do seu trabalho, só se atentar para a letra da lei, de forma fria, ou seja, somente a Tipicidade Formal, não se importando com o espírito da Lei, não se importando com o objetivo que o Legislador queria atingir com aquela determinada Lei, não existirá nunca a Justiça plena.

4. REFERÊNCIAS.

ACKEL FILHO, Diomar. O Princípio da Insignificância no Direito Penal (in) Revista de Jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo, v 94, 1988, p. 72-77.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de Direito Penal – Parte Geral. 5ª ed, rev. ampl. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999.

BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848 de 07 de Dezembro de 1940. Código Penal.  Disponível em: <www.planalto.gov.br>, acesso em 27 abr. 2015.

______. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, promulgada em 05 de outubro de 1988, atualizada até a EC nº 88, disponível em: <www.plantalto.gov.br>, acesso em 27 abr. 2015.

______. JusBrasil. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br>, pesquisa de jurisprudência realizada no período de 12/04/2015 a 19/05/2015.

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal – Parte Geral. 13ª. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2011.

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 1994.


Sobre os autores
José Maria Pinheiro Madeira

professor da pós-graduação da Faculdade de Direito da Universidade Estácio de Sá, professor do Centro Universitário Moacyr Sreder Bastos, professor do CEPAD (Centro de Estudos Pesquisa e Atualização em Direito), professor palestrante do IBEJ (Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos)

Luiz Paulo Figueiredo de Araujo

Bacharelando em Direito pela Universidade Estácio, Autor de Artigos Jurídicos, Cursando Pós-Graduação em Direito Público na Acadêmia Nacional de Juristas e Doutrinadores ANAJ, membro da Comissão de Ciência Política e Administração Pública OAB/RJ.

Kim Reis Gusmão Soares

Kim Reis Gusmão Soares, Bacharel em Direito pela Universidade Estácio de Sá, Autor de Artigos Jurídicos, Cursando Pós-Graduação em Direito Público, Direito Penal e Direito Processual Penal, Membro do Conselho de Direito Ambiental da OAB, Perito Judicial Grafotécnico pela Academia Nacional dos Peritos Judiciais da República Federativa do Brasil.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!