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A Aplicação do Princípio da Efetividade nas Execuções contra a União à luz do novo CPC

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Agenda 18/05/2016 às 10:50

Breve análise sobre o alcance prático da prestação jurisdicional efetiva, no que diz respeito ao cumprimento da obrigação por parte da União, isto é, parte da Fazenda Pública, na condição de executada, à luz do Novo Código de Processo Civil.

Introdução

Atualmente, em sede de processo de execução, encontra-se em evidência, indubitavelmente, o debate acerca da efetividade da prestação jurisdicional vindicada, visto que, a execução deve se destinar, entre outros escopos, a tentar proporcionar o mesmo resultado que existiria caso a obrigação fosse adimplida espontaneamente pelo devedor.

 A situação, por sua vez, se torna ainda mais emblemática quando a União, Fazenda Pública titula no polo passivo do processo de execução, haja vista que por dispor de prerrogativas legais - não extensíveis aos particulares -, torna-se questionável se a utilização desarrazoada das mesmas não se consubstanciaria em obstáculo à máxima efetividade da prestação jurisdicional, no bojo do processo executivo.

Assim, o presente estudo buscará analisar o alcance prático da prestação jurisdicional efetiva, no que diz respeito ao cumprimento da obrigação por parte da União, na condição de executada, de modo que esse trabalho foi estruturado com a finalidade de discorrer acerca da aplicação prática do Princípio da Efetividade nas Execuções contra a Fazenda Pública, visto que uma das finalidades precípuas do processo cível de execução é justamente tentar proporcionar o mesmo resultado que existiria caso a obrigação fosse adimplida espontaneamente pelo devedor.

 Dessa forma, no primeiro capítulo serão tecidas considerações acerca dos principais Princípios aplicáveis a Processo Cível de Execução, com a finalidade, pois, de evidenciar a importância, sobremaneira, do princípio da máxima efetividade da execução, no que diz respeito a tutela executiva jurisdicional.

Na sequência, apresentar-se-á ponderações a despeito das denominadas prerrogativas processuais da União, a fim de perquirir seus desideratos e repercussões práticas para tal ente, no bojo do processo executivo, elencando, ademais, algumas especificidades das mesmas, assim como apresentando quais seriam os fundamentos mais plausíveis para legitimar a incidência das mesmas sem que tal circunstancia represente uma afronta à máxima do princípio da isonomia.

Por conseguinte, no terceiro capítulo, o estudo cinge-se à situação da União, na condição de executada, partindo-se de breves considerações a despeito da própria execução, suas técnicas, cotejando-as, todavia, com as novas disposições do Código de Processo Civil, de 2015, de modo a serem tecidas considerações, especialmente, sobre as peculiaridades do Processo Cível de Execução contra a União, tendo em vista as hipóteses de execução por quantia certa, bem com o cumprimento de sentença, as eventuais matérias de defesa por parte da União, e por fim, o regime de precatórios e requisições de pequeno valor, que representam a forma como a união pode adimplir com os créditos em seu desfavor reconhecidos judicialmente.

Por fim, traçar-se-á um panorama a despeito das perspectivas do princípio da efetividade nas execuções contra a União, contrapondo-o, pois, às prerrogativas processuais de tais ente, objetivando-se, portanto, vislumbrar se a fruição de dessas pode comprometer o resultado prático do processo de execução, ao qual a própria União deve se submeter.

  1. Considerações acerca dos principais princípios aplicáveis ao Processo Cível de Execução.

De modo inaugural e de vista de uma série de características gerais da execução, pode-se apontar que tais características são comumente denominadas princípios da execução pela literatura correlata. No entanto, não são compreendidos como o mesmo sentido dos princípios visto nos demais ramos do direito, porquanto ao se referirem aos princípios da execução, tal qual os princípios da teoria geral dos recursos, se está a elencar, na verdade, uma série de características gerais, que os individualizam.

Perscrutando, destarte, a literatura correlata, pode-se apontar, em especial, que existem cerca de dez princípios relativos à execução, a depender, entrementes, da visão de cada autor.

No entanto, resta patente que existem dois dentre tais princípios, que uma vez interligados, representam os mais importantes aplicáveis ao tema em comento, quais sejam: o princípio da máxima efetividade da execução e o princípio da menor onerosidade ao executado. 

 Com efeito, considerando, pois, a relevância do princípio da máxima efetividade da execução, para a devida compreensão das nuances do processo cível executivo, conquanto aqui esteja sendo analisado sob o prisma da execução, deve ser considerado como um princípio que alcança a todos demais tipos de processo. 

Assim, pontua-se que o princípio da máxima efetividade da execução se destina a garantir o direito fundamental à tutela executiva, na medida em que deve se destinar à busca da satisfação de qualquer direito merecedor da tutela vindicada.

Somado a isso, tem-se em evidência, como dito alhures, o princípio da menor onerosidade ao executado, segundo o qual, nos casos em que o credor detém vários meios para promover a execução, esta deve seguir pelo modo menos gravoso para o devedor, logo, uma vez havendo vários meios executivos aptos a prover a tutela adequada e efetiva do crédito, meios esses considerados todos igualmente eficazes, deve-se escolher a via menos onerosa ao executado, visto que tal norma objetiva impedir a execução abusiva. 

Dito isso e traçados, pois, tais paralelos, com o intuito de antecipar as finalidades do presente estudo, passasse adiante às demais considerações acerca dos principais princípios aplicados à execução civil, sem, contudo, objetivar esgotar o tema.

  1. Princípios em Espécie

1.1.1 Princípio da Autonomia do Processo de Execução

       Tradicionalmente, o princípio da autonomia do processo de execução apregoa que o processo de execução se desenvolve de forma autônoma, constituindo um ente à parte dos processos de conhecimento e cautelar, de modo que não pode o primeiro ser considerado como mero desfecho do processo de conhecimento.

No entanto, após a reforma com a Lei Nº 11.302/05, apenas o processo de execução de título extrajudicial passou a constituir um processo autônomo, com as ressalvadas, todavia, da execução da sentença arbitral, penal condenatória, estrangeira ou contra a fazenda pública.

Por conseguinte, a execução de sentença condenatória passou a ser mera fase do processo de conhecimento, falando-se, assim, em fase cognitiva e fase executiva ou sincretismo entre cognição e execução, de modo que a sentença nos casos dos então art. 461 e 461-A do CPC/73 já eram executivas e os atos executivos se realizavam no mesmo processo.

Nesse viés, portanto, parte da doutrina passou a sustentar que o a autonomia dos processos, notadamente, o de execução, passava por sentida crise (NEVES), havendo forte concorrente doutrinária que defendia um sincretismo total entre os processos previstos pelo ordenamento processual, imaginando-se, todavia, que num mesmo processo seja possível a realização de atos cognitivos, executivos e cautelares.

Desta feita, tem-se que, nos dias atuais, mediante as transformações operadas, principalmente, pelo novo Código de Processo Civil, o tradicional princípio da autonomia do processo executivo deve ser reavaliado à luz do novo diploma. Nesse sentir, preceitua José Miguel Garcia Medina[1]:

A doutrina arrola o princípio da autonomia dentre os princípios do processo de execução, fazendo crer que, ainda hoje, este é o princípio que revela a relação existente entre processo de conhecimento e processo de execução. A modificação das estruturas processuais propugnadas pelas reformas, no entanto, realçou a existência de situações em que cognição e execução se realizam na mesma relação jurídico-processual, que antes figuravam como mera exceção ao princípio da autonomia da execução perante a cognição.

1.1.2 Princípio Nulla Executio Sine Titulo

De modo pontual, a ideia central do princípio da “nulla executio sine titulo” é a de que não há de ser falar em execução válida sem que exista título, revestindo-se, pois, de condição sine qua non para a execução.

Disto, para Candido Dinamarco: “exige-se a existência de título que demonstra ao menos uma probabilidade de que o crédito representado no título efetivamente exista para justificar essas desvantagens que serão suportadas pelo executado”.

Com efeito, independente da forma como a execução se processa, se indiretamente, se por sub-rogação, através de processos autônomo ou cumprimento de sentença, resta patente que o executado é, de fato, colocado em uma situação de desvantagem, a qual se opera tanto no aspecto material quanto formal, uma vez que a execução é tida como processo do credor, a qual serve para satisfazê-lo, naquilo que lhe é devido.

Assim, tem-se que o executado não busca tutela jurisdicional na execução porque, conforme dito alhures, a execução serve, especialmente, para o exequente, de modo que não buscando tutela jurisdicional na execução, processualmente, o executado atua, sobremaneira, para evitar eventuais exageros.

Dito de outra forma, pode-se consignar que o executado para buscar a limitação do sacrifício que terá que suportar, objetivando que a execução siga pela menor onerosidade, fundamenta suas razões com esteio no art. 805, do NCPC, que dispõe que: “Quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado”.

Demais disso, a situação de desvantagem ora apresentada, se manifesta também no aspecto material, visto serem, justamente, através do processo de execução, que são autorizados os atos de constrição de bens, restrição de direitos, de modo que, uma vez ocorrendo, por exemplo, a penhora, já se opera a invasão do patrimônio do executado.

A propósito, fora a partir de indagações sobre qual seria a justificativa para legitimar a invasão do patrimônio do executado que se chegou ao argumento de que isso decorreria da grande probabilidade de o direito exequendo existir, ou seja, invade-se o patrimônio, muito provavelmente, porque ele é o devedor e se encontra em uma situação de desvantagem, tendo em vista a existência do título executivo em seu desfavor.

Logo, essa grande probabilidade de o direito existir é encontrada no título executivo, de modo que legitima a desvantagem do executado, encerrando, assim, um ciclo de interpendência.

  1. Princípio da Nulla Titulus Sine Lege

Na literalidade do sentido apontado, nulla titulus sine lege significa que só a lei pode criar títulos executivos, de modo que o não estiver previsto em lei como título executivo, como tal não poderá ser considerado.

Assim, resta pacificado que a jurisprudência, a doutrina, as partes, não podem criar títulos executivos. Contudo, discussão jurídica se avoluma sobre a circunstância de que, diante da existência de uma decisão interlocutória, que antecipa a tutela, poderia tal decisão ser considerada um título executivo.

Com efeito, à título de condensação das características primordiais do princípio em comento, traz-se à baila, o ensinamento de Medina[2], no sentido de que:

O legislador, no entanto – a nosso ver, com razão, optou por outro caminho: ao revogar a regra antes contida no art. 583 do CPC, deixou claro que, embora o título executivo possa ser requisito para obtenção de algumas das modalidades de tutela executiva, nem toda execução tem por base título executivo. O princípio da nulla executio sin titulo, assim convive com um princípio que lhe é oposto, já que há situações em que se autoriza a execução, embora inexistente título executivo que lhe sirva de base.

  1. Princípio da Tipicidade dos Títulos Executivos e Adequação dos Meios Executivos

       De modo tradicional, Cássio Scarpinella Bueno[3] o denomina princípio da adequação, cujo significado é no sentido de que a depender da modalidade obrigação tem-se um tipo de execução, devendo, todavia, o exequente formular a pretensão adequada ao tipo de obrigação, sendo, desse modo, corolário da tipicidade, já que este último preceitua que todos os atos executivos devem estar previa e pormenorizados descritos na lei processual, restando daí a necessidade de escolha dos atos adequados conforme a previsão normativa.

       Assim, pode-se sintetizar o entendimento quanto ao princípio da adequação, no sentido de que, a depender da modalidade obrigacional, apresenta-se um tipo de execução, devendo, pois, o exequente formular a pretensão adequada ao tipo de obrigação, quais sejam, fazer, não-fazer, dar coisa, pagar.

       Demais disso, tem-se que o princípio da tipicidade objetiva, justamente, fixar certa previsibilidade quanto à tutela executiva que o executado terá demandada contra si. A propósito, em consonância com tais consideração, convém destacar o que preceitua Marcelo Abelha[4]:  

 

Sendo a atividade executiva uma função jurisdicional que substitui e que estimula a vontade do executado para atuar a vontade concreta da lei, tem-se aí uma autorização normativa para que o Estado, ao mesmo tempo que impede a autotutela, se veja compelido a entrar na esfera patrimonial do indivíduo visando a atuar a norma jurídica concreta. Todavia, para “controlar” e “delimitar” a atuação e interferência do Estado na liberdade e propriedade, previa o CPC/73 – além da segurança de que o Estado só atuaria se fosse provocado – a tranquila regra (para o executado), de que este só perderia seus bens em um processo específico, com um mínimo de previsibilidade, e, especialmente, sabendo de antemão quais seriam as armas executivas a serem utilizadas pelo Estado durante a atuação executiva. Mas não é só, pois o modelo liberal do processo executivo dava ao jurisdicionado a certeza e segurança das armas que seriam utilizadas pelo Estado, bem como quando e como as utilizaria. Isso quer dizer que em um Estado liberal vigora o princípio da tipicidade dos meios executivos, de forma que ao juiz não cabe a escolha do meio executivo, senão porque lhe compete apenas e tão-somente cumprir as regras previstas da tutela processual executiva que estão delimitadas no “didático e exaustivo manual de instruções previamente estabelecido pelo legislador processual.

        À visto disso, sobressai-se que todos os atos executivos estão previa e pormenorizadamente descritos na lei processual. Todavia, o Código de Processo Civil passou a flexibilizar tal princípio, prevendo a atipicidade dos atos, permitindo, assim, ao juiz criar o melhor ato executivo, de acordo com o caso contrato.

       Portanto, pode-se inferir que existe uma tendência doutrinaria no que diz respeito a reconhecer a atipicidade dos meios executivos, como consequência lógica do princípio da efetividade da tutela jurisdicional.

1.1.5 Princípio da Patrimonialidade

Dando continuidade ao estudo sobre os princípios aplicáveis ao processo civil de execução, dar-se-á ênfase, nesse item, ao denominado princípio da patrimonialidade, encontrado também em outras doutrinas, como princípio da realidade.

De forma bom objetiva, tal princípio preconiza que a execução deve incidir sobre o patrimônio do executado. A rigor, tal finalidade pode até mostrar-se obvia, na realidade dos dias e dos avanços processuais, todavia, cumpre destacar que nem sempre foi assim, pois, muitas vezes, em outros países, por exemplo, os devedores respondiam com a sua própria vida às execuções, então intentadas contra eles.

Desta feita, tal princípio evidencia, justamente, que hoje, a pessoa não mais irá responder com seu próprio corpo pela execução, mas sim com o seu patrimônio. Logo, responde pela satisfação da obrigação será sempre o patrimônio e jamais o corpo do devedor ou do responsável patrimonial, que, às vezes, nem é o devedor, tendo, portanto, referido princípio, intrínseca ligação com a denominada humanização da execução.

Analisando, pois, de forma detida o histórico da humanização da execução, pode-se pontuar que, no início era o corpo do devedor que respondia, tal assim se mostrava lá na Lei das XII Tábuas, onde havia a previsão de morte, entregando o corpo para o credor, e, na eventualidade, de haver mais de um credor, havia o esquartejamento.

Com o avançar do tempo, passou-se a considerar a morte uma sanção muito forte, de modo que passaram a trabalhar com a ideia de escravidão, em decorrência das dívidas, e essas era perpétua. Ou seja, eram vendidos os devedores para os povos inimigos para que fossem por eles escravizados.

Por conseguinte, surgiu a compreensão de que a escravidão não mais deveria ser perpetua e sim temporária, proporcional ao valor da dívida. Por fim, chegou-se a ideia de execução patrimonial, saindo, portanto, da pessoa, e passando a incidir sobre todo o patrimônio do devedor, que deveria ser vertido em função de adimplir a dívida, pois, vigorava o preceito de que haveria ali uma ideia sancionatória, de vingança na execução.

A posteriori, continuando sendo patrimonial, passou-se a corresponder tão somente ao valor da dívida, deixando, assim, o devedor de ter que verter todo o seu patrimônio. E, atualmente, chegou-se ao estágio de humanização, segundo o qual há de existir um patrimônio mínimo, que nada mais seria que um desmembramento do princípio da dignidade da pessoa humana, de modo que haja a existência de um patrimônio mínimo que permita a sobrevivência digna do executado.

Assim, a efetivação da ideia de patrimônio mínimo encontra-se atrelada, sobretudo, aos conceitos de bens impenhoráveis previstos, atualmente, nos artigos 833[5], do NCPC.

       Somado a isso, tem-se ainda que após a Constituição de 1988, foi revelando cada vez mais premente, a necessidade de conservação de um mínimo existencial para preservar a dignidade da pessoa do devedor. Nesse contexto, conforme já mencionado, há, portanto, a previsão legal de bens impenhoráveis, assim como, outra lei traz um rol de bens de família[6], também impenhoráveis, pois garantem o mínimo existencial.

  1. Princípio do Desfecho Único

Partindo-se do pressuposto que nas ações de conhecimento, o respectivo resultado pode ser o julgamento procedente ou improcedente, haja vista a discussão sobre quem, de fato, detém o direito. Na execução, resta consolidado que o único resultado almejado é, justamente, a satisfação do crédito do exequente.

Desse modo, em tal ação, o executado é citado para realizar o pagamento e não para discutir o crédito sugerido. Com efeito, na execução de título extrajudicial, o devedor pode ajuizar embargos à execução, que corresponde a uma nova ação, na qual o devedor poderá discutir diversas matérias, inclusive, produzir provas.

Por sua vez, no cumprimento de sentença, o devedor se limita a apresentar sua impugnação ao cumprimento de sentença, sendo, este, um processo incidente. Além disso, resta possível também, através de simples petição, sem nova ação ou incidente processual, o devedor possa apresentar sua execução de pré-executividade alegando matérias que o juiz poderia reconhecer de ofício, como a prescrição, por exemplo. Na eventualidade, pois, do juiz reconhecer tal pedido, profere-se sentença de mérito na execução.

Outrossim, o princípio do desfecho único também é entendido como o de resultado único, qual seja, a busca da satisfação do direito do credor, no qual o desfecho normal é, portanto, a satisfação. Contudo, resta possível que ocorra um denominado fim anômalo, qual seja, aquele que continua sendo uma extinção terminação do mérito, que não satisfaça o direito do credor.

       Nesta senda, cumpre, ademais, pontuar acerca da denominada “Exceção de pré-executividade”, através da qual, se discutirá o mérito executivo, no sentido da existência e extensão do direito exequendo, quando se alega, por exemplo, que não há direito exequendo visto que houve o pagamento ou porque já se encontra prescrita a pretensão.

       O Superior Tribunal de Justiça, a seu turno, entende que se houver uma exceção de pré-executividade, que corresponde a um incidente processual que se desenvolve na própria execução, ocorrendo o acolhimento da exceção de pré-executividade, o juiz proferirá uma sentença de mérito, rejeitando, na ocasião, o pedido do autor.

       Com efeito, uma vez ocorrendo a situação apresentada, se estará diante de uma exceção ao próprio princípio do desfecho do único, porquanto acabou por permitir que na própria execução, o executado, obtivesse tutela jurisdicional. Assim, esse dito desfecho único, centrado na satisfação do credor, pode não ser tão único assim, a exemplo da plausibilidade de uma exceção de pré-executividade.

       Por fim, na hipótese de impugnação ao cumprimento de sentença, o que poderá acontecer é se a defesa apresentada tiver objeto matéria de mérito executivo e ela for acolhida, a sentença rejeitará o pedido do exequente, desvirtuando, portanto, a finalidade única do processo executivo.

  1. Princípio da Disponibilidade da Execução

Partindo-se do pressuposto anteriormente mencionado, de que ao executado não compete a busca da tutela jurisdicional, visto que o exequente é que o faz, pois seria a execução um processo dele, no qual, querendo ele dispor, desistir, o faria quando quisesse.

Assim, o princípio da disponibilidade da execução significa, a rigor, que o exequente pode desistir a qualquer momento da execução, enfatizando-se, ademais, que tal desistência independe da anuência do executado.

Com efeito, contrapondo o processo de execução ao de conhecimento, tem-se que, neste último, como o autor e o réu podem obter a tutela, depois de um determinado momento, autor e réu tem que concordar quanto à possibilita de desistência da ação. A seu turno, no processo de execução, sobressai o entendimento de que o autor pode desistir a qualquer momento.

Somado a isso, destaca-se que, partindo-se da máxima do quem pode mais, pode menos, o executado por poder desistir de toda a execução, dispõe da faculdade de desistir tão somente de determinados meios executivos, de modo que o próprio é quem determina quais os meios serão ou não utilizados por ele.

No entanto, subsistem hipóteses legais, nas quais não restará possível ao exequente promover a desistência da execução. É o caso, pois, do Ministério Público, quando atuando na tutela coletiva, depara-se com o princípio da indisponibilidade, com base no qual tal Instituição jurídica tem o dever funcional de executar a sentença coletiva, representando, portanto, princípio inverso ao ora explanado.

Por fim, sobreleva-se na doutrina a discussão se a desistência da execução poderia ocorrer a qualquer momento. A resposta, inicialmente, é positiva, tendo em vista não haver expressamente qualquer vedação a isso. Todavia, cumpre apontar que diante da oposição de embargos à execução pendente de julgamento, sustenta-se que os embargos pendentes de julgamento não impedem a desistência da execução, passando-se a discutir, entrementes, quais seriam os efeitos da desistência da execução em tal hipótese.

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Desse modo, tem-se que se a desistência da execução afetará os embargos, de acordo com as matérias ventiladas. Assim, se as alegações são referentes tão somente a matérias exclusivamente processuais, ou seja, se esteja apontando vícios formais de procedimento da execução, tem-se que os embargos serão extintos, em decorrência da perda superveniente do objeto, já que sendo as matérias exclusivamente de vícios procedimentais, o máximo que o executado embargante conseguiria seria uma sentença terminativa da execução.

No entanto, se os embargos tiverem como matéria o mérito executivo, acontecerá a intimação do embargante e se ele concordar, haverá, portanto, a extinção dos embargos. Contudo, não havendo a concordância do embargante, pois pode ele querer continuar com a ação, pois, sobressai a possibilidade de ele conseguir uma sentença de mérito que a desistência da execução não lhe daria,

Assim, na hipótese de os embargos continuarem a tramitar, parte da doutrina afirma que eles ganham natureza de ação autônoma, uma vez que a execução não mais existe. Tal fato, todavia, tem reflexos importantes, a exemplo, dos efeitos do recebimento do recurso de apelação dos embargos, que teriam duplo efeito e não apenas efeito devolutivo.

Em síntese, portanto, resta patente que a finalidade da execução é a satisfação do credor, sendo amplíssima a disponibilidade do mesmo em relação à ação executiva e aos executivos a ela inerentes.

  1. Princípio da Menor Onerosidade

Cotejando-o ao princípio da patrimonialidade, anteriormente explanado, tem-se que a execução não pode ser utilizada como forma de vingança privada do exequente, devendo, pois, o executado suportar prejuízos nos limites da satisfação do direito. No atual CPC, o princípio está consagrado no art. 805.[7]

À vista disso, destaca-se que o princípio da menor onerosidade tem por finalidade assegurar a defesa do patrimônio do executado de boa-fé, possibilitando a satisfação do débito de forma menos gravosa. Para tanto, atendendo ao referido princípio, a própria lei confere ao executado a possibilidade de nomeação de bens à penhora, que serão aceitos, conquanto observada a ordem legal prevista no art. 11 da Lei Nº 6.830/80.

Depreende-se, portanto, que nos casos em que o credor detiver vários meios para promover a execução, deve esta seguir pelo modo menos gravoso para o devedor, sendo esta a princípio finalidade de tal princípio, que visa, conforme já apontado, impedir a execução abusiva.

Entretanto, muito embora, a menor onerosidade da execução seja mencionada como um princípio, tem-se que a mesma é uma regra de execução, de modo que, assim se apresentando, deve ser aplicada de maneira restrita e entendida como uma norma de proteção do executado e não como fonte de todas as outras.

Nesse sentido, preceitua Freiem Didier[8]: "não se deve entender essa norma como uma cláusula geral de proteção ao executado, que informa todas as demais regras de tutela do executado (princípio do favor debitoris) espalhadas pela legislação."

Em verdade, tem-se que o processo de execução, per si, causa ônus ou gravame ao executado, não se podendo, assim, falar em execução sem que haja meios de coerção. Outrossim, a aplicação da norma se volta a determinados momentos processuais de realização de atos de constrição patrimonial, a exemplo, do momento de penhora de bens, sendo, nesse caso, a onerosidade excessiva aferida no caso em concerto.

A propósito, em sede de entendimento jurisprudencial encontra-se posicionamentos no sentido anteriormente apontado, de sustentar que a cláusula de proteção ao executado não poder ser entendida como uma norma geral, in verbis:

 

PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. PRINCÍPIO DA MENOR ONEROSIDADE.ABRANGÊNCIA.1. A regra do art. 620 do CPC não constitui autorização genérica dotada de aptidão para subverter a ordem preferencial listada no art. 655 do CPC e no art. 11 da Lei 6.830/1980. É indispensável que a executada demonstre, em concreto, como e por que o meio utilizado é o mais oneroso.2. O Tribunal de origem considerou fundamentada a discordância manifestada pela Fazenda Pública em relação à nomeação à penhora e determinou recaísse livremente a constrição sobre quaisquer bens da devedora. Inviável cogitar da violação do Princípio da Menor Onerosidade antes da efetivação da penhora.3. Agravo Regimental não provido. (AgRg no Ag 1091502/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 24/03/2009, DJe 20/04/2009.

 

Somado a isso, rememora-se o entendimento existente na doutrina e jurisprudência de que há uma crescente tendência no sentido de garantir um mínimo patrimonial indispensável a efetividade dos direitos, de modo que a pessoa física não fique privada de uma vida digna e para que a pessoa jurídica também possa sobreviver. Logo, não se deve ocorrer retrocessos, no sentido de privar o devedor de sua dignidade ou de seus direitos fundamentais.

Entrementes, a discussão que se avoluma é sobre de que forma se pode encontrar a medida razoável e eficaz para conduzir à justiça, coibindo os abusos do direito de defesa na execução.

Dito isso, pontua-se, destarte, que o princípio da menor onerosidade decorreu da mencionada humanização da execução, sendo, pois, decorrência direta do princípio da dignidade humana, razão pela qual há de se preservar na execução, o patrimônio e a dignidade do devedor.

  1. Princípio da Boa-Fé e Lealdade Processual

De se revelar, na verdade, que ao se falar no princípio da boa-fé se está a falar de um princípio que é da teoria geral, devendo existir em qualquer processo. Contudo, como o enfoque desse trabalho é o processo de execução, o princípio da boa-fé será centralizado sob tal aspecto.

A compreensão, pois, de tal instituto, aplicado ao processo executivo, encontra fundamento, sobremodo, nos artigos. 772, inc. II e art. 774, do NCPC, que preceituam a consagração do chamado ato atento atentatório à dignidade da justiça, uma espécie de ato que só pode ser praticado pelo executado, tanto na execução, quanto nos embargos à execução.

Depreende-se, pois, que executado ao atentar contra a dignidade da Justiça estaria praticando atos de deslealdade processual, bem como deixando de balizar sua conduta no primado da boa-fé, uma vez que o Direito ao reconhecer a importância dos valores que regem as relações interpessoais e cotidianas, os incorpora como regras a serem observadas nas relações jurídicas existentes.

2.2.10              Princípio da Máxima Efetividade

De certo, ênfase principal desse estudo, a discussão sobre o princípio da máxima efetividade se inicia com o questionamento sobre qual seria a destinação do processo de execução. Indaga-se, pois, qual seria a ordem de interesses a ser satisfeita por essa espécie de processo. Partindo, destarte, de tais questionamentos, a resposta, invariavelmente, é encontrada, inicialmente, no art. 797, do NCPC, que preceitua que:

Art. 797.  Ressalvado o caso de insolvência do devedor, em que tem lugar o concurso universal, realiza-se a execução no interesse do exequente que adquire, pela penhora, o direito de preferência sobre os bens penhorados.

Parágrafo único.  Recaindo mais de uma penhora sobre o mesmo bem, cada exequente conservará o seu título de preferência.

Diante do exposto, pois, resta evidente que, por expressa disposição legal, bem como por sua própria natureza, todo o processo de execução possui um unívoco desiderato, qual seja, o de satisfazer o interesse do credor, realizando, assim, seu crédito.    

  Cuida-se, ademais, de entendimento pacífico, tanto na doutrina quanto na jurisprudência, e, exemplificativamente, o Superior Tribunal de Justiça – assim como em geral os demais Tribunais – tem-se manifestado nesse sentido:

 

EXECUÇÃO FISCAL. AGRAVO REGIMENTAL. PENHORA DE IMÓVEL SITUADO EM COMARCA DISTANTE. RECUSA DO CREDOR. LEGALIDADE. PRECEDENTES. 1. A execução visa a recolocar o credor no estágio de satisfatividade em que se encontrava antes do inadimplemento. Em consequência, realiza-se a execução para atender seus direitos como credor. 2. Assiste ao credor o direito de recusar a nomeação à penhora de bens localizados em comarca diversa, no caso de haver bem penhorável situado no foro da execução. 3-A execução deve se realizar da forma menos gravosa para o devedor (art. 620 do CPC). Mas não se pode, sob essa alegação, prejudicar os interesses do credor. 4. Agravo regimental desprovido. (STJ – 1ª Turma, AGRESP 311.486/MG, j. 06/04/2004, DJU 26/04/2004, p. 146, rel. Min. Denise Arruda, decisão unânime)

 A propósito, no campo doutrinário colhe-se também a posição de Alexandre Freitas Câmara[9], que, assim, discorre sobre o Princípio da Efetividade da Execução:

A execução forçada, destinada que é a satisfazer o direito de crédito do exequente, só será efetiva à medida que se revelar capaz de assegurar ao titular daquele direito exatamente aquilo que ele tem direito de conseguir. Assim, na execução por quantia certa, o processo de execução só será efetivo se for capaz de assegurar ao exequente a soma em dinheiro a que faz jus. 

Nesse sentir, infere-se, pois, que a função executiva do processo compreende o conjunto de atos estatais através de que, com ou sem o concurso da vontade do devedor (e até contra ela), invade-se seu patrimônio para, à custa dele, realizar-se o resultado prático desejado concretamente pelo direito objetivo material.

Ovídio Baptista da Silva[10], por sua vez, conclui, citando José Alberto dos Reis, que a finalidade da execução “consiste em obter para o exequente precisamente aquele benefício que lhe traria o cumprimento da obrigação por parte do devedor ou, se isto não for possível, ao menos um benefício equivalente”.

            Desta maneira, cogita-se que tal princípio corresponde a um desdobramento do princípio da máxima utilidade da atuação jurisdicional, condensada na afirmação de que o processo deve proporcionar a quem tem direito tudo aquilo e exatamente aquilo a que tem direito. 

Assim, resta evidenciado que o princípio da efetividade, de igual modo, está intrinsecamente ligado ao direito à razoável duração do processo, porquanto a efetividade requer não apenas a satisfação de um direito, mas também a sua efetivação em razoável tempo. 

            A seu turno, embora tais posicionamentos, tanto da doutrina quando da jurisprudência, sejam de solar intelecção, a práxis forense tem demonstrado que os processos de execução apresentam pouco efetividade, resultando, não raro, na completa frustração do credor quanto ao recebimento da tutela jurisdicional que lhe é assegurada pelo ordenamento jurídico.

 Dito isso, sobressai-se que o princípio da efetividade da execução vislumbra, justamente, amparar a credibilidade da tutela jurisdicional, na medida em que a execução deve ser direcionada para a quitação da dívida legitimamente reconhecida em título executivo judicial ou extrajudicial e, para tanto, o magistrado deve ter a disposição todos os meios hábeis para se alcançar esse objetivo.

            Porém, se por um lado a execução, de modo geral, poderá representar medida de extrema força contra o devedor, na medida em que implica invasão de sua esfera patrimonial, por outro foram criados obstáculos limitadores a tal poder, visto que a execução não pode levar o devedor e sua família a uma situação que fira a dignidade humana, havendo, assim, um suposto privilegio do menor sacrifício do executado sobre a própria efetividade da tutela executiva.

            Nesse contexto, evidencia-se que a inadimplência fomentada pela facilidade em se embaçar ou até mesmo inviabilizar a execução forçada, acaba por diminuir a credibilidade na realização dos conflitos executivos pela via judicial, além de que, a ocorrência de um processo de execução desprovido de efetividade, repercute seus efeitos não apenas na esfera jurisdicional, mas também na esfera socioeconômica, visto que enseja risco ao oferecimento do crédito.

            Com efeito, o cenário se acirra ainda mais, quando o polo passivo do processo de execução é ocupado por integrantes da Fazenda Pública, a exemplo da União, que por disporem de prerrogativas materiais e processuais próprias, acabam, ao usá-las, de forma desarrazoada, comprometendo a efetividade da tutela vindicada, sobretudo, diante da postergação de atos processuais.

            Demais disso, pode-se pontuar ainda, que a tradicional lentidão do judiciário brasileiro e do sistema processual civil contribuem, consideravelmente, para a impunidade e permitem, o que o executado consiga protelar, por anos, o cumprimento de sua obrigação.

            Nesse viés, tal crise de efetividade, na qual se encontra o processo executivo, evidencia que a busca do equilíbrio entre a máxima efetividade e a menor onerosidade ao executado tem sido, sobremaneira, a sua tônica.

2. Contextualização das Prerrogativas Processuais da União.

2.1 Conceito de Fazenda Pública

De início, convém destacar que a locução Fazenda Pública, quando empregada no bojo processual civil, abrange tanto a administração pública direta nas três esferas, fazenda federal, estadual, municipal, inclusive a distrital, quanto as autarquias e fundações públicas.

Dito isso, resta-se pacificado que a expressão Fazenda Pública se refere às pessoas jurídicas de direito público, isto é, aquelas descritas no art. 41 do Código Civil Brasil. Nesse sentir, Goncalves (2011, p.83[11]), aduz que essas pessoas:

São divididas em administração direta, compreendendo a União, Estados, Distrito Federal, Territórios, Municípios e em administração indireta que são as autarquias, as associações públicas, fundações públicas e demais entidades de caráter público criadas por lei.

 

Demais disso, enquadram-se como “demais entidades de caráter público criadas por lei”, as agências executivas ou reguladoras, pois são consideradas autarquias especiais e com relação às associações públicas, são consideradas de direito público aquelas constituídas na forma da Lei nº 11.107 de 6 de abril de 2005. (CUNHA, 2011, p. 18).

Por sua vez, atrelando o conceito de Fazenda Pública a sua situação em juízo, cumpre destacar a anotação de Hely Lopes Meirelles[12], segundo o qual:

 

 A Administração Pública, quando ingressa em juízo por qualquer de suas entidades estatais, por suas autarquias, por suas fundações públicas ou por seus órgãos que tenham capacidade processual, recebe a designação tradicional de Fazenda Pública, porque seu erário é que suporta os encargos patrimoniais da demanda.

Outrossim, conforme pontua Leonardo Cunha[13]: “a expressão Fazenda Pública é utilizada para designar as pessoas jurídicas de direito público que figurem em ações judiciais, mesmo que a demanda não verse sobre matéria estritamente fiscal ou financeira”.

À vista disso, pode-se assentar que a expressão Fazenda Pública corresponde ao nome genérico das finanças do ente público, bem como a sua designação quando atua em juízo. Assim, faz parte de tal conceito somente as pessoas jurídicas definidas como direito público, visto que em relação aos entes da administração indiretas, notadamente, as empresas públicas e sociedades de economia mista, por serem pessoas jurídicas de direito privadas, não integram tal conceito, ao contrário, das autarquias e fundações, que são pessoas de direito público.

Todavia, no que diz respeito às fundações, comporta-se uma ressalva, visto que só adentra ao conceito, as fundações públicas, excluindo-se, assim, as privadas. Ademais, igualmente, não está englobada as sociedades de economia mista, a exemplo do Banco do Brasil e Petrobras, bem coo as empresas públicas, como a Caixa Econômica Federal, porquanto seus bens são considerados de natureza privada e, dessa forma, sujeito à penhora.

Entrementes, cumpre destacar que a Empresa Brasileira de Correio e Telégrafos (ECT), que é uma empresa pública, se reveste de outra exceção, pois tendo os mesmos privilégios que a Fazenda Pública para litigar em juízo, por força do antigo Decreto Lei nº 506 de 20 de março de 1969.  

            Portanto, cinge-se o conceito Fazenda Pública a designação para União, Estados, Municípios, suas autarquias, fundações públicas, agências executivas ou reguladoras e a Empresa Brasileira de Correio e Telégrafos, quando atuando em juízo.

  1. Conceito de Prerrogativas Públicas

Uma vez compreendida o alcance da locução Fazenda Pública, pode-se verificar que o termo prerrogativa pública está atrelada, justamente, a uma posição especial que a Administração Pública ostenta na relação jurídico-administrativa, quando atua contra o particular.

Desse modo, em razão dessa condição tida favorável advinda de suas prerrogativas, a Administração fica desnivelada ao particular, ocupando uma posição vertical, preponderante, bem destoante da posição horizontal em que fica o particular diante do particular.

Portanto, pode-se sintetizar o entendimento de que as prerrogativas públicas correspondem às circunstâncias propicias, que os sistemas jurídicos atribuem às pessoas jurídicas, com a finalidade de que com o melhor modo e com a maior economia possível, possam concretizar o interesse público, por intermédio de limitações impostas ao interesse do particular.

Outrossim, à despeito do tema, leciona Marçal Justen Filho[14] que:

O regime jurídico de direito público consiste no conjunto de normas jurídicas que disciplinam o desempenho de atividades e de organizações de interesse coletivo, vinculadas direta ou indiretamente à realização dos direitos fundamentais, caracterizado pela ausência de disponibilidade e pela vinculação à satisfação de determinados fins.

 

Por fim, expõe Di Pietro[15] que:

Ao mesmo tempo em que as colocam a Administração em posição de supremacia perante o particular, sempre com o objetivo de atingir o benefício da coletividade, as a que está sujeita limitam a sua atividade a determinados fins e princípios que, se não observados, implicam desvio de poder e consequente nulidade dos atos da Administração. O conjunto das prerrogativas e restrições a que está sujeita a Administração e que não se encontram nas relações entre particulares constitui o . Muitas dessas prerrogativas e restrições são expressas sob a forma de que informam o direito público e, em especial, o Direito Administrativo.

  1. Do Princípio da Isonomia e a Fazenda Pública

De modo tradicional, a referência inicial ao princípio da isonomia é a sua previsão no art. 5º, I, da CF, quando, ao dispor que todos são iguais perante a lei, evidenciando um conceito formal de igualdade. Ademais, é cediço também, que o princípio da isonomia é aplicável ao processo, passando a garantir a denominada “paridade de armas”, visto que o NCPC, também prevê no art. 7º[16], que o juiz deve assegurar às partes igualdade de tratamento.

Contudo, sobressaem argumentos no sentido de que a isonomia não pode se esgotar no seu aspecto formal, segundo o qual bastaria tratar todos igualmente, que restaria ela respeitada. Tal assim se afigura porque, existe a necessidade de garanti-la sob o aspecto material, onde ela só poderá ser alcançada na ocasião dos sujeitos desiguais também receberem um tratamento desigual, medida de suas desigualdades.

Nesse sentir, restariam, pois alguns sujeitos processuais agraciados por prerrogativas, muitas vezes, denominadas pejorativamente de privilégios, ao tratar-se da Fazenda Pública.

Indubitavelmente, pois, a Fazenda Pública é o sujeito processual que possui o tratamento jurisdicional mais diferenciado. Suas prerrogativas, contudo, decorrem da aplicação do princípio da isonomia, nos precisos termos do NCPC em seu art., os quais preceitua que o juiz assegurará às partes igualdade de tratamento, na medida em que tal igualdade é alcançada ao se conferir tratamento igual aos desiguais e desigual ao desiguais, de modo que os entes públicos quando partes no processo tem tratamento diferenciado.

  1. A Fazenda Pública e o Interesse Público

A princípio, tem-se que a noção de interesse público apresenta uma importância central, figurando-se como condição de validade dos atos administrativos. Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello[17], “o sistema de Direito Administrativo Brasileiro se constrói sobre os princípios da supremacia do interesse público sobre o privado e da indisponibilidade do interesse público pela Administração”.

Com efeito, por interesse público entende-se que é o interesse de que todos compartilham, referindo-se, portanto, aos beneficiários da atividade administrativa, e não aos entes que a exercem, a fim de alcançar as metas de manter a boa convivência dos indivíduos que compõem a sociedade. (CUNHA, 2011, p. 33).

Nesta senda, portanto, é que germinam as chamadas prerrogativas processuais da Fazenda Pública, máxime porque, caso não fossem conferidas determinadas normas especiais, tampouco fossem criados determinados institutos, o interesse público não receberia a proteção apropriada com a estrutura principiológica apresentada.

  1. Legitimidade das Prerrogativas Processuais da Fazenda Pública

Por todo o exposto, pode-se apontar que o tratamento diferenciado, mediante suas prerrogativas, repousa sua justificativa na razão de que o Estado está a agir de acordo com o interesse público.  Corroborando, pois, o entendimento supra, Parahyba; Viana (2006, pag. 4277)[18], preceituam que:

 

Observa-se que esses institutos processuais favoráveis à Fazenda Pública, comumente denominados na doutrina de “prerrogativas”, se originaram em face da necessidade de estabelecer a igualdade na relação processual em que o Poder Público fosse parte, com o objetivo precípuo de resguardar o interesse público.

Assim, pode-se inferir que o uso de tais prerrogativas se encontra pertinente ao atingimento da finalidade pública, o que acaba por denotar sua característica instrumental, de modo que não há que se falar em caráter de privilégios, conforme apontados por muitos.

  1. Prerrogativas em espécie

            Posteriormente, destarte, à conceituação e delimitação do termo Fazenda Pública, mister se torna uma explicação sobre os tidos direitos especiais que os entes públicos detêm quando em juízo, para melhor compreensão das diferenças previstas quando a execução é contra a Fazenda Pública, em especial, contra a União.

  1. Do Juiz Privativo

No que tange ao juiz privativo, resta consolidado que nas Justiças Estaduais, em diversas comarcas existem varas especializadas da Fazenda Pública, com a exceção das hipóteses nas quais titule a União, entidade autárquica federal ou empresa pública, visto que, em tais casos, remanesce a competência da Justiça Federal.

O fundamento, portanto, de necessidade de juízo dito privativo, refere-se ao grande volume de processos movidos contra a Fazenda Pública, em especial, contra a União, atrelado ao fato do quantitativo reduzido de magistrados.

Dessa forma, havendo a divisão de competência das varas, pressupõe-se que tal fato facilitará o trabalho do magistrado, visto que não teria de se deparar com os litígios mais diversificados possíveis.

Dito isso, pode-se pontuar que essa prerrogativa de juízo privativo se mostra até razoável, contribuindo, inclusive, com a efetividade do respectivo processo executivo, pois, cuidando-se de uma temática só, sobressaísse a probabilidade de que melhor será o grau de especialidades do magistrado que analisará tais pleitos.

  1. Da Remessa Necessária

Por conseguinte, o duplo grau de jurisdição ou remessa necessária, previsto no art. 496 do NCPC, constitui-se em mais uma prerrogativa processual (ARAÚJO, 2010, p. 1288) da Fazenda Pública.

Desta feita, fazendo-se uma releitura dos ensinamentos Dinamarco (2002, p. 211-212), tem-se que tal duplo grau de jurisdição contempla a situação de que “uma sentença proferida em primeiro grau de jurisdição não passa em julgado, nem é exequível, quando contrarie os interesses da Fazenda Pública”.

Logo, aplica-se o duplo grau aos processos julgados com resolução do mérito, quando a sentença é desfavorável à Fazenda Pública. Nesse sentir, o entendimento de Cunha (2011, p. 207) “esse reexame necessário condiciona a eficácia da sentença à sua reapreciação pelo tribunal ao qual está vinculado ao juiz que a proferiu. Enquanto não for procedida a reanálise da sentença, esta não transita em julgado, não contendo plena eficácia”.

Tal assim se afigura porque, o Juiz, ao proferir a sentença, ordenará a remessa dos autos ao Tribunal, havendo ou não apelação, devendo o Presidente do Tribunal competente avocar os autos de ofício no caso de omissão do Juiz.

O processamento da remessa necessária, portanto, continua sendo regido pelo Regimento Interno dos Tribunais, com a aplicação do rito da apelação, não se admitindo, contudo, embargos infringentes do acórdão que, por maioria de votos, julga o reexame necessário (Súmula 390/STJ). Outrossim, consoante o entendimento do STJ, caberia recurso especial em face de acordão proferido em reexame necessário.

Com efeito, mister se torna pontuar que o novo CPC, trouxe considerável modificação a despeito do tema, visto que diminui consideravelmente as possibilidades da remessa necessária, na medida em que apenas as sentenças de maio vulto serão atingidas pelo duplo grau de jurisdição obrigatório.

Assim, se no Código de 1973, os artigos correspondentes limitavam a remessa oficial ao valor certo e não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, o novo Código[19] a limita ainda mais, pois, não mais haverá necessidade de remessa oficial quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e liquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, tratando de União, 500 (quinhentos) no âmbito estadual, assim como para os Municípios que constituam capitais dos Estados e, por fim, 100 (cem) salários para os demais municípios.

Ademais, o novo CPC preceitua também que não haverá remessa oficial quando a decisão for fundamentada em sumula de tribunal superior, acórdãos do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça em recursos repetitivos, em entendimento vinculado do próprio entre público, em resoluções de demandas repetitivas ou de assunção de competência, aumentando, assim, o rol de situação nas quais não se fará necessária a remessa. 

  1. Da dispensa de custas processuais em antecipação

Incialmente, cumpre destacar que despesa processual diz respeito a gastos relativos ao dos honorários dos peritos e das diligências realizadas pelo oficial de justiça, atos que são realizados por uma terceira pessoa, fora do cartório judicial, ao passo que são gastos relativos a emolumentos, taxas e despesas judiciais necessárias ao trâmite normal do processo dentro do cartório judicial.

A seu turno, tratando-se, pois, de pagamento de despesas processuais, de preparo, entre demais taxas, o art. 91 do NCPC manteve a regra do código antigo, de que as despesas dos atos processuais, efetuados a requerimento da Fazenda Pública, serão pagas ao final pelo vencido, não precisando, portanto, adiantar o pagamento.

No entanto, merece destacar, ademais, a hipótese do §1º, de acordo com o qual, as perícias requeridas pela Fazenda Pública poderão ser realizadas por entidade pública ou, quando houver previsão orçamentária, ter os valores adiantados por aquele que requerer a prova.

  1. Das restrições à antecipação de tutela

No que diz respeito à sistemática da antecipação de tutela, cumpre, incialmente, trazer à baila as lições de Marioni[20], no sentido de que:

A técnica antecipatória permite que se dê tratamento diferenciado aos direitos evidentes e aos direitos que correm risco de lesão. O direito que pode ser evidenciado de plano exige uma tutela imediata e o legislador responde a tal necessidade tornando viável a antecipação quando, evidenciado o direito, a defesa é exercida de modo abusivo.

             

Dito isso, pontua-se que a técnica antecipatória exsurge, justamente, dessa necessidade de se tutelar o próprio direito material, de modo efetivo e célere, podendo ser conceituada como um suposto “adiantamento dos efeitos da decisão final, a ser proferida em processo de conhecimento com a finalidade de evitar dano ao direito subjetivo da parte”. (DONIZETE[21], 2011, pa. 404)

Com efeito, cotejando o tema em comento com a situação da Fazenda Pública, em especial, da União, tem-se que tal instituto, per si, não é incompatível com a atuação dessas em juízo.

3. Conceito de Execução

Execução, segundo MEDINA[22] (2015) “consiste na prática de atos jurisdicionais tendentes à realização material do direito atual ou potencialmente violado”. Por sua vez, Cássio Scarpinella de Bueno[23] preceitua que a execução: “descreve a atividade jurisdicional voltada à satisfação do direito tal qual reconhecido, a prestação concreta da tutela jurisdicional executiva”.

Visto isso, pode-se inferir que tais mecanismos, tendentes a proporcionar no plano prático o cumprimento efetivo daquilo previsto no título executivo, leva o nome de Execução, de modo que, executar encontra-se atrelado ao sentido de satisfazer. Não se objetiva, portanto, com tal procedimento conferir direitos, atividade típica do processo de conhecimento, mas tão somente outorgá-los a quem possui uma situação jurídica de vantagem.

Assim, cumpre anotar que em sua definição mais ampla, execução significa realizar, cumprir, tornar a efeito. Nesse sentir, Araken de Assis, citando Pontes de Miranda, preceitua que a força executiva “retira valor que está no patrimônio do demandado ou dos demandados, e põe-no patrimônio do demandante”[24].

Por fim, convém explicitar ainda, o entendimento de Liebman ao conceituar a execução como: “conjunto de medidas pelas quais se invade o patrimônio do devedor, com o objetivo de extrair dali o necessário para a satisfação do credor, independente do concurso da vontade daquele ou mesmo contra ela”.[25]

Por conseguinte, ultrapassadas essas considerações iniciais a despeito do conceito de execução, passasse adiante a discorrer acerca da denominadas técnicas de execução, a fim de melhor sistematizar o presente estudo, diante de um raciocínio linear.

3.1     Técnicas de Execução

Tratando-se do biônimo débito-responsabilidade, em latim, respectivamente, o “debitum” e o “obligatio”, quando o devedor não cumpre espontaneamente a obrigação, os meios dos quais pode-se valer o credor diante do judiciário para promover a satisfação do seu crédito, dependem do tipo de tutela vindicada.

Desse modo, em sentido amplo, existem duas categorias para tal finalidade, quais sejam: a execução tida por direta, ou seja, a sub-rogação e a execução indireta, por intermédio da coerção.  Nesse sentir, bem leciona Misael Montenegro Filho (2005, p. 400):

 

A diferença que há entre as espécies é orientada pelo objeto da execução, indicando a prestação a ser satisfeita pelo credor (pagar, entregar coisa, fazer ou não fazer). Nas subespécies, temos regras específicas, que se originam da preocupação de serem tutelados os interesses de uma das partes do processo, em vista da necessidade de uma prestação jurisdicional mais célere e efetiva (como ocorre na situação que envolve a execução de prestação alimentícia), do interesse público revelado na lide (na execução fiscal) ou na impossibilidade de ser efetivada a penhora em bens da parte devedora (na execução contra a Fazenda Pública.

4.2.1 Execução por sub-rogação ou direta

 A princípio, cumpre rememorar que a execução pode ocorrer com ou sem a participação do executado. Na hipótese de execução direta, ou seja, por sub-rogação, o Poder Judiciário não necessita da colaboração do executado para a devida efetivação da prestação devida, de modo que o magistrado toma as providencias que deveriam ter sido tomadas pelo devedor, sub-rogando-se na sua posição, o que gera a efetivação do direito do executado.

Outrossim, em sentido estrito, a execução direta pode ser dividida em: a) por expropriação, na qual bens do devedor se submetem a atos executivos, autorizando-se a realização de atos de transparência forçada de tais bens para a satisfação de crédito; b) por apossamento, onde ocorre a identificação, localização  e retirada do bem da posse do executado com entrega ao exequente; c) por transformação, que objetiva mudar a realidade fática presente, onde a tutela jurisdicional visa, de acordo com a natureza da obrigação, coagir a parte em fazer ou não fazer algo para mudar a realidade.

4.2.2 Execução por coerção ou indireta

       Por seu turno, denomina-se execução indireta ou por coerção, aquela na qual o Estado Juiz pode promover a execução com a colaboração do executado, forçando a que ele próprio cumpra com a prestação devida.

       Pode operar através de coerção dita patrimonial, que incide sobre a esfera patrimonial do executado, a exemplo das multas. Assim como, pode ocorrer por intermédio de coerção pessoal, que incide sobre a liberdade do executado, tratando-se, entrementes, de meio primitivo, mas previsto CF como forma de coagir o devedor a pagar o que deve, como na hipótese de prisão civil de devedor de alimentos.

4.3  A Execução no Novo Código de Processo Civil

Diante da divisão presente no Código de Processo Civil, ora vigente, tem-se que o Processo de Execução figura no Livro III, ao passo que a execução do título judicial é regulamentada no Livro II, mais precisamente no título II – Do Cumprimento de Sentença, que comporta, todavia, divisão em quatro capítulos, quais sejam: Capítulo I (Das disposições gerais), Capitulo II (Do cumprimento provisório da sentença condenatória em quantia certa), Capitulo III (Do cumprimento definitivo da sentença condenatória em quantia certa); Capítulo IV (Do cumprimento definitivo da sentença condenatória de fazer, não fazer ou entregar coisa), onde este último subdivide-se, ainda, em duas seções: Seção I (Do cumprimento de sentença condenatória de fazer e não fazer) e Seção II (Do cumprimento da sentença condenatória de entregar coisa).

De igual modo, o Livro III, atinente à Execução também comporta divisões, quais sejam: Título I (Da execução Geral), dividido nos seguintes capítulos: Capitulo I (Das disposições gerais e do dever de colaboração), Capítulo II (Das partes), Capítulo III (Da Competência), Capítulo IV (Dos requisitos necessários para realizar qualquer execução), Capítulo V (Da Responsabilidade patrimonial).

Ademais, no que diz respeito à divisão do Título II (Das diversas espécies de divisão), tem-se a existência de cinco capítulos, respectivamente: Das disposições gerais – Capítulo I; Da execução para entrega de coisa – Capitulo II; Da execução das obrigações de fazer e não fazer – Capítulo III; Da execução por quantia certa contra devedor solvente – Capitulo IV; e Da Execução contra a Fazenda Pública - Capitulo V. 

Nesse viés, tendo em vista que o principal objetivo desse presente trabalho é tecer considerações sobre a efetividade do processo de execução contra a União, enquanto integrante do conceito de Fazenda Pública, concentrar-se-á a atenção do capítulo em comento nas peculiaridades da execução civil contra a União, com supedâneo, especialmente, no supracitado Capítulo V, que trata da Execução contra a Fazenda Pública.

4.4  Peculiaridades do Processo Cível de Execução contra a União

De modo geral, o trâmite de execução contra a Fazenda Pública, em especial, a União segue o rito dos art. 90 do NCPC, no que se refere à título extrajudicial e também nos artigos 534 e 535 do NCPC, os quais tratam, sobre o instituto do Cumprimento de Sentença que Reconheça a Exigibilidade da Obrigação de Pagar Quantia Certa pela Fazenda Pública, com aplicação do art. 100 da CF/88, além dos demais títulos do NCPC e de leis e artigos esparsos, que sejam correlatos ao tema.

4.4.1    Da Execução da obrigação de pagar quantia certa contra a União

Inicialmente, cumpre destacar que a despeito da obrigação de pagar quantia certa, representadas em títulos executivos judicias ou extrajudiciais, quando não adimplidas voluntariamente pelo devedor, tem-se que, tão logo se tornem exigíveis, resta possível provocar o Estado-Juiz para que este realize atos coercitivos concretos voltados à execução forçada, por meio de determinação de procedimentos executivos preestabelecidos em lei.

Todavia, tratando-se de execução da obrigação de pagar quantia certa, tem-se que uma vez exigível o título executivo – judicial ou extrajudicial -, o credor terá, necessariamente, de recorrer à via judicial para receber seu crédito, na hipótese de ser devedora a Fazenda Pública.

Nesse sentir, não resta possível que ocorra o pagamento de tais créditos sem que sejam perpetrados os atos procedimentais na Constituição Federal e na legislação correlata. Assim, leciona Humberto Theodoro Junior[26] que:

Quando se trata de obrigação de pagar soma de dinheiro, seja qual for sua origem (sem excluir aquelas provenientes da conversão de obrigações de fazer ou de entregar coisa) a execução contra a Fazenda Pública sempre estará sujeita ao procedimento especial previsto no art. 730 do CPC e no art. 100 da CF. Tal procedimento desenvolveu-se por medidas processuais e administrativas, que não incluem penhora ou outros expedientes de expropriação judicial imediata de bens do patrimônio. Apenas em situações muito especiais o CPC e a CF cogitam da possibilidade de sequestro de verbas públicas, como incidente dessa modalidade de execução forçada, pois a regra básica é a impenhorabilidade de todos os bens e valores que compõem o patrimônio público.

Realizando, entretanto, a leitura do posicionamento de Theodoro Junior, à luz do Novo Código de Processo Civil, tem-se que a menção ao art. 730 do CPC deve ser compreendido como ao art. 910, do NCPC.

Assim, existe uma dita disciplina peculiar para a execução por quantia certa contra a União, visto que não incide sobre ela a penhora ou a expropriação de bens para alienação judiciosa, com o intuito de satisfazer o crédito executivo.

Tal assim se afigura porque, o regime de especial de bens da União, assim como, dos demais entes da Fazenda Pública, acaba por inviabilizar a técnica expropriatória, uma vez que, conforme mencionado alhures, os bens públicos, ao contrário dos bens dos particulares, são inalienáveis, porquanto estarem vinculados ao interesse público, repercutindo, ademais, na sua impenhorabilidade.

Estes são, portanto, um dos fundamentos para que União não se sujeite às regras gerais de execução forçada alicerçadas na técnica da expropriação de bens do patrimônio do devedor para a satisfação do credor.

Somado a isso, tem-se ainda que o próprio pagamento, a ser realizado pela União, necessita de prévia inclusão da dívida em lei orçamentaria, bem como da criação de um sistema que fixe critério, que de acordo com a máxima da isonomia, permita o pagamento dos seus inúmeros credores.

Disto, depreende-se que a impossibilidade de imediato pagamento da condenação pela União e a necessidade de estrita observância ao regime previsto no art. 100 da CF/88, acarretam consequências na própria aplicação da NCPC, tendo em vista as especificidades no regime de execução contra a própria Fazenda Pública.

Logo, em razão do seu regime constitucional, nas execuções para pagar quantia certa, a União sempre será citada, nos termos do art. Para opor embargos. Contudo, embora a citação seja obrigatória, revela-se não ser obrigatória de embargos à execução por parte da União, visto que a mesma pode, visto que a mesma pode, simplesmente, anuir com os cálculos apresentados pelo credor, circunstância na qual tal débito será inscrito na ordem cronológica dos créditos.

            Nesse sentir, era dado a União o prazo de 30 (trinta) dias para a oposição dos embargos à execução. Contudo, não sendo embargada a execução, ou, na eventualidade, destes terem sido rejeitos, não se falaria em penhor, devendo o juiz requisitar o pagamento por meio Presidente do Tribunal, por meio de precatório.

            Por sua vez, recebido o precatório, o Presidente do Tribunal deve requisitar à União, revelando-se obrigatória a inclusão deste no orçamento, na medida em que tais verbas incluídas no orçamento são repassadas ao Tribunal de Justifica, para que determine o pagamento das dívidas, de acordo com as possibilidades de depósito e na ordem dos precatórios apresentados.

            Com efeito, ao chegar ao Tribunal respectivo, o precatório será submetido a uma numeração sequencial, que respeitam à duas ordens numéricas, nas quais um é destinada aos precatórios de natureza alimentícia, que devem ser pagas primeiro, e outra para os ditos créditos de natureza diversas, pagas, portanto, empós o adimplemento das de caráter alimentar.

            Por fim, na eventualidade, de o credor ser preterido na ordem de preferência, o respectivo Presidente do Tribunal, responsável pela expedição da ordem, depois de ouvido o Ministério Público, ordenará o sequestro do valor da quantia necessária à satisfação do débito, em desfavor do credor que recebeu fora da ordem preestabelecida.

            4.4.2    Do Cumprimento de Sentença que reconheça a exigibilidade de pagar quantia certa pela União

            A rigor, dentre as inovações do novo Código de Processo Civil, sobressai a referente à inserção da obrigação de pagar quantia certa contra a Fazenda Pública, disciplinada no título relativo ao Cumprimento de Sentença, no qual se pauta o procedimento em face da Fazenda Pública em, sendo através de sentença transitada em julgado, quando o título executivo for judicial.

Desta feita, uma vez ocorrendo o trânsito em julgado da sentença que reconhece o dever de pagar quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre parcela incontroversa, tem-se que a obrigação respectiva se torna exigível, de modo que o cumprimento definitivo da sentença se fará a requerimento do exequente, sendo, pois, o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver.

Nos termos do NCPC, os arts. 534 e 535 estão inseridos no capítulo que disciplina, portanto, o “cumprimento de sentença que reconheça a inexigibilidade de obrigação de pagar quantia certa pela Fazenda Pública”.

Assim, havendo sentença condenatória em processo de conhecimento, o autor não mais precisará promover a execução contra a Fazenda, visto que o NCPC determina que o ora exequente, por ocasião do cumprimento de sentença, deverá apresentar demonstrativo discriminado e atualizado do crédito, seguida da intimação da Fazenda Pública para “querendo, no prazo de 30(trinta) dias e nos próprios autos, impugnar a execução” (art.535, caput), lembrando que os prazos no NCPC são sempre contados em dias úteis.

A propósito, de acordo com o NCPC, ao se impugnar o Cumprimento de Sentença, a Fazenda Pública alegar excesso de execução, deve a mesma, na oportunidade, declarar de imediata o valor que entende correto, sob pena de não conhecimento da alegação (artigo 535, §2º do NCPC). Dessa forma, o valor incontroverso poderá, desde logo, seguir para cumprimento, através da expedição de precatórios ou requisição de pequeno valor.

À vista disso, depreende-se que tais mudanças apresentadas pelo NCPC não diferem muito daquelas previstas no CPC/73 e na jurisprudência já consolidada sobre o tema. A título ilustrativo, destaca-se que a previsão de que se tratando de impugnação parcial, a parte não questionada pela executada será, desde logo, objeto de cumprimento, representa uma regra de positivação da jurisprudência do STF.

  4.4.3 Das matérias de defesa na execução por parte da União

            Cuidando-se de execução contra a Fazenda Pública, no caso do presente estudo, contra a União, tendo a mesma base em titulo judicial, tem-se que as defesas a serem arguidas nos respectivos embargos estão previstas no art. 910, § 2 do NCPC[27], ficando, naturalmente, restritas às matérias autorizadas pelos art. 534 e 535 do mesmo Código.

            Com efeito, a imposição de limitações dos temas manejáveis na interposição de embargos, na ocasião, decorre da impossibilidade de se reabrir discussão sobre o mérito da dívida declarada na sentença, porquanto sobre os efeitos desta incide a autoridade da res judicata.

            Nesse sentir é que, destarte, é permitido que seja arguida a nulidade da citação no processo de conhecimento, ou a inexigibilidade do título, ou acumulação indevida de execuções, ou até mesmo o excesso de execução e sua nulidade posterior à penhora.

            Logo, tem-se que outras defesas, fundadas em causas extintivas do próprio direito obrigacional, estas só são admissíveis nos embargos à execução de sentença na eventualidade de se referirem a fatos supervenientes à condenação.

            Outrossim, conforme o NCPC, podem ser arguidos pela União, como defesa, tanto na impugnação quanto nos embargos, a falta ou nulidade da citação se, na fase de conhecimento, o processo correu à revelia; a ilegitimidade da parte; a inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação; o excesso de execução ou cumulação indevida de execuções; a incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução; assim como, qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação, a exemplo de pagamento , novação, compensação, transação ou prescrição, desde que supervenientes ao transito em julgado da sentença, conforme já exposto alhures.

            Ademais, cumpre anotar que a União é citada para apresentar embargos, no prazo de 30 (trinta) dias, devendo ser feita através da Advocacia Pública, responsável por sua representação judicial. Por sua vez, na hipótese de Cumprimento de Sentença, a intimação é considerada como meio hábil para provocação da defesa por parte da Executada, enquanto na Execução fundada em titulo extrajudicial, a citação corresponde a meio hábil para tal finalidade. 

            4.4.4. Do rito dos precatórios e da requisição de pequeno valor

            De se revelar, inicialmente, que o processo dos débitos judiciais sofreu uma significativa mudança, desde 2001, resultando, basicamente, na edição da Emenda Constitucional Nº30/200, que acabou por alterar a redação do art. 100 da CF e acrescentou o art. 78 ao ADTC – Ato de Disposições Constitucionais Transitórias.

            Praticamente, a EC Nº 30/2000 trouxe a inovação em relação à atualização do débito até a data de efetivo pagamento, bem como passou a distinguir os débitos judiciais em duas espécies, quais sejam: a) os Precatórios e b) as Requisições de Pequeno Valor.

            Somado a isso, trouxe a EC Nº 30/2010 alterações no que diz respeito ao parcelamento do pagamento dos precatórios, em parcelas anuais no prazo máximo de dez anos, nos precisos termos do caput do art. 78 do ADCT, in verbis:

 

Art. 78, caput: Ressalvados os créditos definidos em lei como de pequeno valor, os de natureza alimentícia, os de que trata o art. 33 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e suas complementações e os que já tiverem os seus respectivos recursos liberados ou depositados em juízo, os precatórios pendentes na data de promulgação desta Emenda e os que decorram de ações iniciais ajuizadas até 31 de dezembro de 1999 serão liquidados pelo seu valor real, em moeda corrente, acrescido de juros legais, em prestações anuais, iguais e sucessivas, no prazo máximo de dez anos, permitida a cessão dos créditos

 

            Por sua vez, a EC nº 37/2002 introduziu, no texto constitucional, a vedação de expedição de precatório complementar ou suplementar, bem como de fracionamento do valor da execução, de modo a evitar que parte do pagamento se faça por meio de precatório e parte por meio de RPV, nos seguintes termos:

Art. 100, § 4º: São vedadas as expedições de precatório complementar ou suplementar de valor pago, bem como fracionamento, repartição ou quebra do valor da execução, a fim de que seu pagamento não se faça, em parte, na forma estabelecida no § 3o deste artigo e, em parte, mediante expedição de precatório.

            Outrossim, a dita ordem cronológica para pagamento apresenta algumas especificidades, na medida em que os ditos créditos “privilegiado” são os primeiros da lista, cujos débito representem até três vezes o limite fixado em lei para pagamentos de pequeno valor, que possam natureza alimentícias e cujos titulares possuam 60 anos de idade ou mais, ou sejam portadores de doença grave.

            Nesse contexto, ainda, tem que os créditos privilegiados, podem, conforme disposição constitucional (art. 100, §2º da CF/88) serem fracionado, a fim de se enquadra no valor limite do débito. Assim, poderá o credor receber à frente do demais credores até o valor do limite legal, devendo, pois, o restante do crédito ser pago na ordem cronologia de apresentação dos créditos preferenciais.

            Por conseguinte, créditos “preferencias”, são aquelas que ficam, na cronologia dos precatórios, posterior aos privilegiados, possuindo natureza alimentícia, sem, contudo, preencher os demais requisitos para ser considerados como “privilegiados”.

            Ademais, conforme com o parágrafo 1º do art.100 da CF/88, os débitos de natureza alimentícia devem ser pagos com preferência sobre todos os demais débitos, a exceção daquelas denominados como “privilegiados”.

            Por fim, pode-se destacar a existência dos ditos ‘créditos comuns”, últimos na cronologia de pagamento dos precatórios, cujos créditos não se enquadram nem como privilegiados tampouco como preferenciais.

            De outra banda, tem-se que fora das listas dos precatórios encontram-se as denominadas Requisições de Pequeno Valor. No entanto, antes da vigência do NCPC, o procedimento para expedição e pagamento de Requisições de Pequeno Valor é aquele construído pela doutrina e pela jurisprudência.

            No entanto, o NCPC trouxe um procedimento específico para o pagamento das requisições de pequeno valor pelas Fazenda Públicas, na medida em que determina que o juiz ordene à autoridade fazendária, na pessoa de quem o ente público for citado para o processo, para que proceda ao pagamento do RPV, em no máximo 2 (dois) meses, por meio de depósito na agência de banco oficial mais próxima da residência do credor, contados a partir da entrega da requisição.

            Em face do exposto, pode-se sinalizar que o regime de precatórios e requisições de pequeno valor representam, portanto, uma forma particular para o cumprimento de seus débitos pecuniários.

4. Panorama e Perspectivas Atuais do Princípio da Efetividade nas Execuções Cíveis contra a União

4.1 A Crise de Efetividade do Processo Cível de Execução

Nos dias atuais, a sociedade, sobretudo, a brasileira tem convivido, ainda mais, com o termo “crise”, cujo sentido tem sido utilizado, invariavelmente, para denunciar o processo de desestabilização socioeconômica, política, institucional, que estaria a passar a nação.

A rigor, como não poderia deixar de ser, os reflexos sociais repercutem, incontestavelmente, nas relações jurídicas e na forma com o Direito se coloca perante a sociedade, sendo, pois, este um fato ou fenômeno social, que não existe senão na sociedade e não podendo, outrossim, fora dela ser concebido.

Nesse sentir, é milenar a máxima, de que “ubi societas, ibi jus”, ou seja, onde está a sociedade está o Direito. Logo, mostra-se inconteste que a se discorrer sobre a crise de efetividade do processo cível de execução não restará possível desassociá-la da conjuntura atual do país, notadamente, quando as insurgências populares são também contra as instituições jurídicas.

Entretanto, convém apontar, que muito antes do termo “crise” ganhar as mídias e ser evocado nas ruas, nos seus mais variados sentidos, a fragilidade suscitada da prestação jurisdicional já se evidenciava, principalmente, no que diz respeito a morosidade que lhe acompanha, apontada, ademais, como um dos principais fatores para a sua falta de efetividade processual.

Tal assim se afigura porque, a própria Constituição Federal vigente, traz, de forma expressa, em seu artigo 5, inciso LXXVII, que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração dos processos e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

Disto, infere-se que a inquietação com a demora na efetividade dos processos, e sua duração razoável, foi tanta que recebeu tratamento constitucional, objetivando-se, portanto, dar-lhe a maior aplicabilidade possível, face à sua força normativa.

Trazendo, todavia, o enfoque de tal discussão, especificamente, para a tutela jurisdicional executiva, parte-se da premissa de que a sua finalidade é alcançada quando se consegue estabelecer a correspondência, mais próxima possível, entre a situação real e a indicada na norma jurídica concreta, a exemplo do credor receber, ao final da tutela jurisdicional, a importância que lhe era devida.

Desse modo, verifica-se, preliminarmente, que com esteio no já explanado princípio do desfecho único, pode-se pontuar que o tal resultado unívoco, isto é, a busca da satisfação do direito do credor se apresenta, portanto, como desfecho normal esperado.

Logo, quando tal desfecho demora a acontecer ou, na pior das hipóteses, não representa o resultado esperado, pode-se dizer que a efetividade da tutela executiva restou frustrada. Com efeito, diversas razões podem ser apontadas como responsáveis pela inefetividade do processo executivo, nas relações entres particulares, dentre quais, pode-se mencionar a dificuldade ou a não localização no patrimônio do devedor, de bens que possam ser utilizados para satisfazer o crédito exequendo.

Outras, porém, são as razões a serem apontadas, quando no polo passivo de um processo executivo se encontra a denominada Fazenda Pública, a exemplo da União, enfoque maior do o presente estudo, na referida condição. 

Tais justificativas, porém, encontram fundamento, sobretudo, nas intituladas prerrogativas processuais, reservadas à Fazenda Pública, quando parte processual. Nesse sentir, destacam-se os prazos diferenciados para tais entes públicos se manifestarem nos autos, o que, invariavelmente, repercutem no prolongamento da marcha processual, distanciando, assim, o desfecho final do mesmo.

Somado a isso, reverbera-se ainda na dita inefetividade de grande parte dos processos executivos contra a União, a circunstância de que, em determinadas hipóteses, anteriormente já mencionadas, algumas das sentenças desfavoráveis à Fazenda Pública ficam carecendo de eficácia enquanto não submetidas à reapreciação judicial, nos termos da famigerada remessa necessária ou duplo grau de jurisdição.

Desta feita, tem-se que se levando em consideração, desde logo, tão somente essas duas prerrogativas mencionadas, já se pode inferir o quanto de influxo as mesmas têm na duração dos processos executivos, no quais reste devedora/executada a Fazenda Pública. Outra percepção, portanto, não haveria de ser sentida, de que a demora na finalização de um processo executivo denota, em partes, o comprometimento da sua efetividade.

Por conseguinte, e adentrando ao cerne da questão, do mérito da efetividade do processo executivo, tem-se que preceituando tal princípio que a execução deve se destinar, dentre outros escopos, a tentar proporcionar o mesmo resultado que existiria caso a obrigação fosse adimplida espontaneamente pelo devedor, vê-se que as execuções contra a União, leia-se Fazenda Pública, impreterivelmente, resultam em pagamentos em dinheiro.

Isso porque, ao contrário dos particulares que podem ser submetidos à constrição judicial sobre seus direitos e bens, o regime constitucional da impenhorabilidade dos bens públicos acaba por inviabilizar a realização de tais atos de expropriação do patrimônio do executado, no caso, um ente público, em favor do credor.

Outrossim, tem-se que o gerenciamento, disposição e dispêndio dos recursos do orçamento público não ocorrem ao alvedrio do gestor ou da respectiva Administração Pública, tampouco semelhante às operações cotidianas dos orçamentos privados, nos quais se sobressai, naturalmente, a livre utilização dos recursos financeiros disponíveis, conforme as prioridades e finalidades do administrado.

Quando, portanto, a Fazenda Pública é chamada a dispor dos recursos do seu orçamento, evidencia-se a máxima de que aquela quantia corresponde à res publica, coisa pública, de modo que o gerenciamento da mesma deve estar submetido e realizado no mais estrito cumprimento dos preceitos legais correlatos.

Não por outra razão, portanto, é que as disposições sobre o orçamento e finanças públicas dos entes políticos da República Federativa do Brasil, comportam resguardo constitucional, a partir do qual decorrem todos as demais regulações a despeito da temática. Nesse sentir, é que a Constituição do Brasil/1988, traz em seu artigo 100, o preceito de que:  

Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.

À vista disso, debruçando-se, destrate, sobre o regime jurídico dos precatórios e das requisições de pequeno valor, anteriormente explanados, pode-se pontuar que associada à demora do processo executivo, no qual a União é parte ré, a rigidez constitucional acerca dos pagamentos devidos pela Fazenda Pública, revela que além de demorado, o recebimento do crédito em desfavor dessas últimas, ainda está sujeita a uma serie de peculiaridades, que são justificadas, desarrazoadamente, em nome das prerrogativas do ente público, enquanto responsável pelo interesse público, próprio à sociedade como um todo.

Percebe-se, pois, uma verdadeira blindagem por parte de todo o arcabouço jurídico em favor da Fazenda Pública, em nítido detrimento à efetividade do processo executivo, sobremodo, quando esta é compreendida como o direito à duração razoável do processo e ao resultado mais próximo possível do que acontecia, na ocasião, da obrigação ser adimplida voluntariamente. 

Nesse sentir, compete, trazer à baila, a título de remate, o alerta de Candido Dinamarco[28], no sentido de que:  “não se pode chegar ao absurdo de buscar a preservação do devedor a todo custo, mormente quando isto implica na inefetividade do direito material do credor”.  

4.2       Perspectivas de Efetividade Executiva no Novo Código de Processo Civil em relação à União

Com efeito, uma vez apresentada a discussão sobre o atual panorama da crise de efetividade do processo executivo cível, passasse adiante à análise das implicações trazidas pelo Novo Código de Processo Civil acerca da União, enquanto executada.

De início, convém ressaltar que as principais alterações já foram apontadas em capítulo próprio desse trabalho, de modo que o presente objetivo, nesse estágio, é buscar compreender os seus alcances, sem que haja, todavia, a necessidade de pormenorizá-las novamente.

Disto, tem-se que dentre as modificações ocorridas, a redução do prazo de contestação, para a Fazenda Pública, deixando-o de ser em quadruplo para ser duplo, tão qual o prazo para recorrer, demonstra que houve uma preocupação no sentido de buscar reduzir a duração do processo, ao evitar, pois, a postergação exagerada de prazo para oferecimento de respostas.

Ademais, diante dessa nova conjuntura, pode-se apontar que as perspectivas da efetividade executiva, quando a União figura como parte ré, redirecionou suas atenções, não mais para o desfecho único do processo, que seja a satisfação do crédito do exequente.

Infere-se, pois, que mudança de perspectiva está atrelada à necessidade de que se sobressaia uma duração razoável do processo, que seja facultada à União o pleno acesso ao contraditório e a ampla defesa, sem, que, contudo, tais fruições das prerrogativas processuais sejam utilizadas para procrastinar a efetividade da tutela executiva.

Partiu-se, portanto, do pressuposto de que, a efetividade em tais circunstancias não se limita à satisfação do crédito, e sim na satisfação do mesmo, na maior brevidade possível, visto que a máxima “do antes tarde do que nunca”, não pode ser utilizada como subterfugio para legitimar uma atuação desarrazoada da União.

Assim, infere-se que as novas perspectivas sinalizam para a redução, fundamentadas e necessárias, de algumas prerrogativas da Fazenda Pública, de modo que não as anulando, tendo em vista a supremacia do interesse público que as legitimam, as concebam proporcionais, razoáveis e consoantes os direitos dos administrados, principalmente, quando estes tem créditos a receber.

Conclusão

A toda evidencia, o objetivo principal desse trabalho foi buscar compreender, inicialmente, quais seriam as finalidades do processo executivo em relação à União, na condição de executada, especialmente, o que representaria a máxima efetividade da tutela executiva em face da Fazenda Pública.

Nesse sentir, o presente estudo partiu, pois, de considerações a despeito dos principais princípios aplicáveis ao processo cível de execução, concentrando, todavia, a sua ênfase na discussão sobre o princípio da efetividade, cujo finalidade é de, justamente, buscar proporcionar ao credor aquilo que lhe seria devido, no caso de a obrigação ter sido adimplida voluntariamente pelo devedor.

 Disto, prosseguiram os questionamentos sobre de que forma uma execução contra a União poderia contemplar tal princípio, máxime porque há em relação a esta última, assim como em razão da Fazenda Pública, uma série de peculiaridades processuais a serem respeitadas.

No que disse respeito, destarte, a essas ditas peculiaridades, pode-se compreendê-las como prerrogativas processuais, as quais são deferidas à Fazenda Pública, tendo em vista que esta representa, em uma instância, o próprio interesse público.

Assim, no contexto de tais prerrogativas, perquiriu-se, a princípio, se as mesmas representariam uma afronta ao princípio da isonomia, que deve, por sua vez, pautar as relações jurídicas, em atenção à paridade das armas, uma das máximas do direito processual civil.

No entanto, diante das razões apresentadas com supedâneo, pois, no interesse público, pode-se dizer que não há afronta ao princípio da isonomia, uma vez que se está a tratar os desiguais na medida de suas desigualdades, atendendo, portanto, ao aspecto material de tal princípio.

Logo, não devendo a igualdade, principalmente no meio processual, ser concebida tão somente, sob seu aspecto formal, restam legitimadas as prerrogativas da União, desde que sejam utilizadas de forma razoável.

Nesse sentir, portanto, prosseguiu o presente trabalho questionando o alcance de tais prerrogativas, no sentido de dimensionar se, embora não afrontasse o princípio da isonomia, poderiam as mesmas contrariar outras finalidades, a exemplo da duração razoável do processo.

Dessa forma, o termo efetividade além de representar aquilo que melhor correspondesse ao que era devido, de fato, ao credor, passou a ser visto também no sentido de rapidez da prestação da tutela executiva, ganhando, portanto, contornos de agilidade no desfecho processual.

Nessa conjuntura, porém, tem-se que as prerrogativas processuais relacionadas aos prazos diferenciadas para se manifestar nos autos, a remessa necessária, afetam, diretamente, a efetividade da tutela executiva, pois acabam postergando a marcha processual, e, consequentemente, a entrega do bem jurídico pleiteado.

Com efeito, de análise das mudanças perpetradas pelo Novo Código de Processo Civil a despeito desses dois institutos, pode-se pontuar que a redução do prazo de contestação, bem como a redução das hipóteses de remessa necessária, ao passo que reconhecem que as mesmas, na forma como se apresentavam, comprometiam a efetividade do processo, apontam no sentido de que há uma preocupação de tornar os processo desse estipe mais rápidos, buscando, portanto, atender, dentre outras, as demandas sociais por maior agilidade do Judiciário.

Disto, depreende-se que alguns dos anseios sociais, no que diz respeito a tutela jurisdicional eficaz, foi um tanto atendida diante do cenário apresentado, revelando, assim, que, incontestavelmente, não pode o Direito afastar-se da sociedade, na medida em que não deve ser concebido fora dela e apesar dela. 

Demais disso, restou demonstrado no presente estudo que, conquanto as mudanças advindas do NCPC, restou ainda a União blindada, no diz que respeito a tutela executiva em seu desfavor.

Tal assim se afigurou porque, sendo a maioria das obrigações contra a União referentes a obrigações de dar coisa certa, sobretudo, dinheiro, tem-se que o regime especial de bens da Fazenda Pública não permite, a sua constrição judicial, para atender tal finalidade.

Por razões obvias, portanto, resta o patrimônio público revestido dos atributos da inalienabilidade, salvo as raras exceções, e, consequentemente, da impenhorabilidade, de modo que não se aplica frente à Fazenda Pública, integralmente, a regra de responsabilidade patrimonial.

Desta feita, devendo o credor receber da União dinheiro, o mesmo estará sujeito a todo um regime especial de adimplementos de seus créditos. Nesse sentir, merece todo destaque o sistema de precatórios e requisições de pequeno valor.

Nesse contexto, restou demonstrado, portanto, no presente estudo, que a efetividade da tutela executiva, nas hipóteses de a União figurar como ré, não está atrelado ao desfecho final, que corresponde ao recebimento do crédito pelo exequente e sim, no próprio desenvolvimento da tutela executiva que, visto que diante das prerrogativas, eminentemente, processuais, a Fazenda Pública tem como retardar o desfecho final, postergando o seu fim, não havendo, pois, efetividade na duração razoável do feito.

Desse modo, tem-se que há de ser percorrida uma vagarosa marcha processual para que se alcance a efetividade da tutela executiva em desfavor da União, tendo em vista os incontáveis instrumentos processuais de postergação de que dispõe o Estado.

Sobre a autora
Vanessa Maria Lucena Moreira

Graduada em Direito pela Universidade Regional do Cariri - URCA. Pós-graduada em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus. Advogada. Servidora Pública Federal.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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