~~UM ASSASSINATO NO SENADO
Rogério Tadeu Romano
O senador Delcídio Amaral foi o terceiro senador a ser preso no Brasil. Os primeiros foram Arnon de Melo, pai do ex-presidente Fernando Collor de Melo, e Silveste Péricles, ambos de Alagoas, Eles ficaram detidos por causa da discussão que causou a morte do senador acriano José Kairala.
Depois de um bate boca na sessão do Senado de 4 de dezembro de 1963, Arnon de Melo sacou o revólver e disparou três tiros em direção ao seu desafeto político. Mas acertou Kairala.. A prisão em flagrante foi decretada pelo presidente do Senado Auro de Moura Andrade.
Silvestre Péricles foi enviado para o quartel da Aeronáutica em Brasília, onde ficou pouco mais de um mês. Em janeiro de 1964, ele foi para o Hospital do Exército no Rio de Janeiro, onde passou por algumas cirurgias. Em 16 de abril daquele ano foi inocentando e solto. De licença médica voltou ao Senado em 7 de junho..
Já a prisão de Arnon de Melo foi mais longa, quase sete meses. Logo após o crime ele foi levado ao quartel do Exército e depois transferido para a Base Aérea de Brasília, onde ficou até ser inocentado pelo assassinato de Kairala, em 30 de julho de 1964. O Senado abriu processo para cassação dos senadores, mas ela foi rejeitada. Arnon de Melo retornou ao Senado no dia seguinte à sua absolvição.
Era um exemplo do instituto penal intitulado aberratio ictus, veja-se erro na execução.
Em artigo que publiquei sobre o tema “aberratio ictus e resultado diverso do pretendido”, disse:
“Discute-se a questão da legitima defesa e da incidência da aberratio ictus. Dir-se-á que é reconhecível, mesmo quando por erro na execução, terceira pessoa vem a ser atingida(RT 600/321).
À propósito, discutiu-se, no passado, sob o império da Constituição de 1946, caso rumoroso em que o Senador Arnon de Mello foi acusado da morte do senador José Kairala(morto por arma disparada pelo Senador Arnon de Mello durante a briga deste com o senador Silvestre Péricles) e acabou absolvido, pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal, por estar provada legítima defesa de agressão injusta da honra e do direito. Entendeu-se que quanto a morte do Senador Kairala(PSD – AC), Arnon de Mello responderia como se tivesse atingido Silvestre Péricles, o seu verdadeiro alvo”
O Senador José Cairala, do PSD do Acre, morreu às 20 horas e 10 minutos do dia 4 de dezembro de 1963, depois de haver sido atingido por um dos tiros com que o Senador Arnon de Melo, da UDN de Alagoas, procurava alcançar o Senador Silvestre Péricles de Gois Monteiro, do PSD, de Alagoas, seu inimigo politico desde 1950.
O incidente ocorreu pouco depois das 15 horas, quando o Senador Arnon de Melo iniciava um discurso com que pretendia refutar as acusações que lhe haviam sido feitas pelo Senador Silvestre Péricles: o orador preveniu que desejava falar na frente de seu desafeto, que por sua vez aproximou-se da tribuna, ocasião em que se ouviram dois disparos.
O Senador Silvestre Péricles jogou-se no chão e rastejou entre as fileiras de poltronas, já com o seu revólver na mão, mas foi contido pelo Senador João Agripino, da UDN da Paraíba, que, depois de alguns instantes de quase luta e da promessa de que não iria trair o parlamentar alagoano, conseguiu desarmá-lo.
Dezenas de guardas do Senado e parlamentares cercaram e desarmaram o Senador Arnon de Melo, que já procurava proteger-se da pontaria do Senador Silvestre Péricles, jogando-se ao chão, quando alguém gritou ao fundo do Plenário:
- Senhor Presidente, o Senador José Cairala está gravemente ferido.
Enquanto o Senador Arnon de Melo era levado à sala da Presidência, onde foi lavrado o auto da prisão em flagrante, e o Senador Silvestre Péricles conduzido para a sala do líder da Maioria, de onde saiu para ser custodiado pelo Comando da Guarnição Militar de Brasília, o Senador José Cairala era levado ao Hospital Distrital de Brasília.
Não havia falta de advertência.
Em coluna “Coisas de Política”, no periódico Jornal do Brasil, já se advertia que o clima entre os dois senadores era péssimo e uma tragédia poderia acontecer.
Disse, á época da tragédia, o Senador Silvestre Péricles, no gabinete do Comandante da Guarnição Militar de Brasília, que os Senadores Arnon de Melo e Auro de Moura Andrade são os responsáveis pelo incidente, informando que no dia 22 de novembro daquele ano, escrevera ao Ministro da Guerra, prevenindo-o do que afinal iria acontecer.
Em 1930, ocorreu outra tragédia quando o Deputado gaúcho Simões Lopes abateu a tiros, na Câmara dos Deputados, o líder da bancada de Pernambuco, Deputado Souza Filho. Naquele ano, sob o manto da Constituição de 1891, a Câmara deu permissão para que o Deputado Simões Lopes fosse processado pela Justiça.
São notas da tragédia política.