1.A sociedade limitada no direito brasileiro
A sociedade limitada constitui a sociedade empresária mais utilizada no Brasil atualmente. O sucesso dessa espécie societária entre os empreendedores brasileiros justifica-se, principalmente, em razão de dois fatores: limitação da responsabilidade de todos os sócios e facilidade de constituição. Quando comparada à sociedade anônima, a sociedade limitada destaca-se por exigir menos formalidades na sua administração, constituição simplificada e contabilidade menos complexa, tornando-se mais adequada à exploração da atividade econômica quando os sócios possuem o capital suficiente para o desenvolvimento da empresa, não necessitando da captação de recursos junto ao mercado de capitais, e no caso do objeto social não exigir a adoção obrigatória da sociedade anônima, como ocorre, por exemplo, no caso das seguradoras, empresa de leasing e instituições financeiras.
Criada na Alemanha em 1892 para atender aos interesses de pequenos e médios empreendedores, a sociedade limitada foi introduzida no direito brasileiro por meio do Decreto n° 3.708, de 10 de janeiro de 1919 (BRASIL, 2003, 87), que a exemplo do direito português, a denominou de sociedade por quotas de responsabilidade limitada. Referido diploma legal caracterizou-se por ser bastante sucinto (possuía apenas 19 artigos) e deixou de tratar de várias questões, prevalecendo a autonomia de vontade dos sócios expressa no contrato social para regular inúmeros aspectos societários.
O tratamento legal do Decreto n° 3.708 de 1919 despertava algumas divergências em razão da previsão de aplicação subsidiária do Código Comercial e da lei das sociedades anônimas - Lei n° 6.404, de 15 de dezembro de 1976 (BRASIL, 2003, 453), para determinadas hipóteses. Diante da ausência da previsão legal sobre vários e importantes temas do direito societário e da insegura aplicação subsidiária de outras leis, a doutrina indicava como solução preventiva para o problema a elaboração de um contrato social que tratasse expressamente dos principais aspectos omissos no Decreto n° 3.708 (REQUIÃO, 1998, p. 405).
Esses fatores trouxeram grande importância para a elaboração do contrato social, permitindo que os sócios, orientados por advogados, moldassem a sociedade empresária de acordo com o perfil desejado. Questões referentes à política de distribuição dos lucros, cessão de quotas, consequências pelo falecimento de sócio, penhora de quota, pagamento do reembolso, deliberações de sócios sobre os assuntos mais importantes e restrições à alteração do contrato social sempre apresentaram grande importância na elaboração do contrato social.
O caráter lacunoso do Decreto n° 3.708 privilegiava a autonomia da vontade dos sócios, permitindo que principalmente os minoritários, assegurassem os seus direitos sociais no momento da negociação das cláusulas do contrato social. Entretanto, nem sempre os sócios se dispunham a discutir as cláusulas dos atos constitutivos das sociedades empresárias e muitas vezes os contratos sociais baseavam-se em modelos padrões que deixavam de se referir a importantes aspectos da vida societária.
Com a entrada em vigor do novo Código Civil brasileiro, Lei n° 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (BRASIL, 2002, 25) a sociedade por quotas de responsabilidade limitada teve a sua denominação alterada para sociedade limitada e ganhou um tratamento legal mais abrangente e complexo em capítulo específico do Livro II da Parte Especial (Do Direito de Empresa). O novo Código Civil revoga tacitamente o Decreto n° 3.708/1919 e apresenta inovações importantes para a administração, expulsão e deliberações dos sócios, proporcionando maior transparência e profissionalismo à administração da sociedade limitada, além de prever mecanismos legais destinados a resguardar, de certa forma, os interesses dos sócios minoritários.
As novas exigências previstas pelo novo Código Civil para a validade das mais importantes deliberações dos sócios, como a realização de assembléias ou reuniões de sócios, convocação mediante publicação, previsão de diversos quóruns, registro das decisões em atas e arquivamento das atas no Registro Público de Empresas, gerou inúmeras críticas, em razão do aumento das formalidades e dos custos da sociedade limitada. Para muitos, a informalidade das deliberações sociais e a prevalência da autonomia da vontade para disciplinar os mais variados assuntos não previstos na antiga legislação mostravam-se mais adequados ao tipo societário mais utilizado no Brasil, sendo uma das razões do seu sucesso.
Entretanto, muitas das exigências formais introduzidas são dispensadas para as sociedades limitadas formadas por até dez sócios, em que cláusulas do contrato social podem prever a substituição das assembléias pelas reuniões de sócios, estabelecendo regras de convocação, quórum de instalação e registro dos trabalhos de forma diferente da previsão legal. Sociedades limitadas com mais de dez sócios são encontradas com menos frequência no país, onde prevalecem as sociedades formadas por dois a três sócios. Assim, se o novo Código Civil tornou mais complexa e dispendiosa a sociedade limitada, também apresenta dispositivos que permitem o afastamento de alguns dos novos e indesejados rigores formais, conforme será analisado.
2. A essência da sociedade limitada no novo Código Civil
As novidades introduzidas pelo Código Civil de 2002 conservam as características essenciais da sociedade limitada previstas no Dec. n° 3.708/1919, dentre as quais destacam-se: natureza contratual quanto ao ato constitutivo, responsabilidade limitada dos sócios, divisão do capital social em quotas, possibilidade de utilização de nome empresarial da espécie firma social ou denominação social acrescido da expressão "limitada" por extenso ou de forma abreviada, composição por no mínimo dois sócios.
De acordo com o atual tratamento legal, a sociedade limitada pode ser definida como a sociedade empresária contratual formada por dois ou mais sócios (pessoas físicas ou pessoas jurídicas) que possuem responsabilidade limitada ao valor de suas quotas, mas todos os sócios respondem solidariamente pela integralização do capital social. A responsabilidade dos sócios é subsidiária à da sociedade (art. 1024 do Código Civil de 2002 e art. 596 do Código de Processo Civil) e solidária entre eles pela integralização do capital social.
Em relação à limitação da responsabilidade dos sócios, o art. 1052 do novo Código Civil prevê
Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social
A redação do referido dispositivo deixa claro que a responsabilidade dos sócios é restrita ao valor das quotas subscritas, respondendo todos de forma solidária pela integralização do capital social subscrito no caso de falência da sociedade limitada. De acordo com o art. 1052, uma vez integralizado o capital social subscrito, os sócios, em regra, não respondem pelas dívidas contraídas pela sociedade limitada, ainda que essas dívidas ultrapassem o patrimônio da sociedade. O limite máximo da responsabilização dos sócios é o valor do capital social, que, estando integralizado, não permite que as obrigações contraídas pela sociedade empresária sejam estendidas aos bens particulares dos sócios. Entretanto, os sócios respondem pessoalmente se comprovada que a redução do capital social resultou de prática fraudulenta, conforme prevê o art. 1059 do novo Código Civil.
Na vigência do Dec. n° 3.708/1919, o art. 2° previa ao seu final, que o ato constitutivo da sociedade limitada deveria estipular "ser limitada a responsabilidade dos sócios à importância total do capital social". Ao prever a limitação ao total do capital social, esse dispositivo fez com que Fran Martins entendesse que, estando a sociedade impossibilitada de honrar seus compromissos, os credores sociais poderiam cobrar dos sócios a importância equivalente ao capital social, ainda que já estivesse este totalmente integralizado (MARTINS, 1999, p. 206).
Nas palavras do professor cearense:
Infelizmente, em face dos termos taxativos do art. 2° do Dec. n° 3.708, somos de opinião que, enquanto não for modificada a lei brasileira, a responsabilidade dos sócios, no Brasil, é sempre pelo total do capital social e, assim, mesmo integralizado o capital da sociedade, se, posteriormente, esse for desfalcado, os sócios poderão ser compelidos, solidariamente, a completá-lo. O artigo 2° do Dec. n° 3708, ao declarar que a responsabilidade dos sócios é pelo total do capital social, traçou norma geral, dando aos sócios responsabilidade subsidiária até o total do capital social, diversa, portanto, da responsabilidade imposta pelas leis que serviram de base para a nossa – a lei alemã (arts. 19 a 24) e a portuguesa (arts, 15 e 16), em que o sócio responde não pelo total do capital social, mas pela efetivação desse capital, cada um sujeitando-se a, solidariamente, completá-lo, se por acaso um dos sócios deixar de pagar as suas quotas. (MARTINS, 1999, p. 206)
Ainda que esse entendimento do jurista cearense não prevalecesse, era destacado pela doutrina (NEGRÃO, 2001, p. 302). Além de motivar alguns julgados, o posicionamento de Fran Martins parece ter sensibilizado o legislador, que acertadamente prevê a limitação da responsabilidade dos sócios no art. 1052 sem referir-se ao total do capital social, adequando o tratamento da responsabilidade dos sócios na sociedade limitada às legislações estrangeiras.
A regra da limitação da responsabilidade dos sócios prevista no art. 1052 do Código Civil de 2002 não é absoluta. Em determinadas hipóteses, algumas previstas em lei, outras determinadas pela força da jurisprudência, os sócios da sociedade limitada respondem de forma ilimitada pelas obrigações contraídas pela sociedade limitada. Dentre as exceções à regra da limitação da responsabilidade dos sócios, destacam-se a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica (art. 50, Código Civil de 2002; art. 28, Lei n° 8.078/1990; art. 18, Lei n° 8.884/94, art. 4°, Lei n° 9.605/98), dívidas tributárias (art. 135, Código Tributário Nacional), dívidas previdenciárias (art. 13, Lei n° 8.620/93) e trabalhistas (por força da jurisprudência).
Em relação às dívidas trabalhistas, cumpre ressaltar que a hipótese da responsabilização pessoal dos sócios não é prevista na lei e algumas decisões ofendem a regra legal da limitação da responsabilidade, autorizando a penhora de bens particulares de sócios diante da simples inexistência de bens livres da sociedade limitada. Como bem destaca o advogado Gustavo Saad Diniz:
Concessa venia, criou-se uma inadmissível presunção de estado insolvência pela falta de indicação de bens para penhora e garantia do juízo na fase da execução trabalhista, permitindo-se avançar sobre os bens dos sócios. Todavia, não há esta presunção positivada na legislação, tampouco se pode criar esta situação presumida de um fato não conhecido. Presumir, em outros termos, é obter ilação de uma fato conhecido, para depois se demonstrar o fato desconhecido dentro de um processo. Por este motivo que se invoca a imprescindível necessidade de percurso de devido processo legal, para se demonstrar o uso abusivo ou fraudulento da pessoa jurídica para frustrar o juízo executivo. (DINIZ, 2003, p. 118).
Quando se trata da questão da responsabilidade, deve-se destacar que limitada é a responsabilidade dos sócios, não da sociedade empresária (pessoa jurídica). Com a aquisição da personalidade jurídica mediante o arquivamento do ato constitutivo no Registro Público de Empresas (arts. 45, 985 e 1.150 do Código Civil de 2002) a sociedade limitada adquire titularidade patrimonial, obrigacional e processual, passando a ter vida distinta da dos sócios, como previa o art. 20 do antigo Código Civil de 1916. Correspondendo a um dos efeitos da personalização, a autonomia patrimonial da sociedade limitada determina a separação entre o patrimônio dos sócios e o da sociedade, que não se confundem, agora, de acordo com o art. 1024 do novo Código Civil. Segundo o Professor Luiz Antonio Soares Hentz, o novo direito mantém o princípio da separação patrimonial no art. 1024 basicamente nos mesmos termos (HENTZ, 2003, 102).
O nome atribuído a essa espécie societária pode ser objeto de críticas por conduzir os mais desatentos a conclusão de que ocorre a limitação da responsabilidade da pessoa jurídica. Na sociedade limitada todos os sócios possuem, em regra, responsabilidade limitada, mas a responsabilidade da sociedade perante terceiros é plena, respondendo a pessoa jurídica pelas obrigações contraídas no desenvolvimento da atividade empresarial com todo o seu patrimônio, que não se confunde com o patrimônio pessoal dos sócios.
Em relação à constituição da sociedade limitada, o novo Código Civil conserva a natureza contratual desse tipo societário, evidenciada pela disposição do parágrafo único do art. 1053: "O contrato social poderá prever a regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade anônima". Por sua vez, o art. 1054 prevê que "O contrato mencionará, no que couber, as indicações do art. 997, e, se for o caso, a firma social."
Para o arquivamento no Registro Público de Empresas, a cargo das juntas comerciais, o contrato social deve conter, além dos requisitos previstos no art. 997 do Código Civil, os previstos no art. 53, III, do Decreto n° 1.800, de 30 de janeiro de 1996 (BRASIL, 2003, 846). Assim, o contrato social deve apresentar, essencialmente, os seguintes requisitos: qualificação completa de todos os sócios com a indicação do regime de casamento (art. 968, I, Código Civil de 2002); espécie de sociedade empresária adotada; o nome empresarial; endereço da sede e das filiais; descrição precisa e detalhada do objeto social; valor do capital social, a forma e o prazo de sua integralização; a participação de cada sócio no capital social, com a indicação do número de quotas e respectivos valores; a extensão da responsabilidade dos sócios; designação e qualificação do(s) administrador(es); referência ao prazo da sociedade; indicação da data do término do exercício social, quando não coincidente com o ano civil; eleição de foro para dirimir as controvérsias entre os sócios.
Além desses requisitos, o contrato social também deve apresentar uma declaração dos sócios de não se encontrarem condenados pela prática de crime que vede a exploração de atividades econômicas (art. 1.011, Código Civil de 2002) e deve conter o visto de um advogado (art. 1°, §2°, Lei n° 8.906, de 4 de julho de 1994), com exceção das sociedades enquadradas como microempresa ou empresa de pequeno porte, dispensadas do visto de advogado no ato constitutivo pelo art. 6°, parágrafo único, da Lei n° 9841, de 5 de outubro de 1999.
A existência no ato constitutivo da sociedade limitada dos requisitos previstos acima constitui a estrutura básica do contrato social e assegura, juntamente com os demais documentos exigidos, o seu arquivamento pela Junta Comercial. Entretanto, os sócios devem prever no ato constitutivo outras cláusulas, que embora não sejam essenciais, são importantes para assegurarem os direitos dos sócios minoritários, estabelecerem a regência supletiva da lei da sociedade anônima, preverem o pagamento de pro labore, consequências pelo falecimento de sócio, condições para o pagamento do reembolso, possibilidade de expulsão extrajudicial por justa causa de sócio minoritário, possibilidade da administração da sociedade por pessoa que não seja sócia, forma de distribuição de lucros, e, principalmente, a previsão que as deliberações previstas no art. 1071 do Código Civil serão tomadas em reunião de sócios, estabelecendo as regras para convocação, quórum de instalação e forma do registro dos trabalhos nas sociedades formadas por até 10 sócios.
Durante a existência da sociedade limitada o contrato social pode ser alterado por deliberação dos sócios, desde que todos, ou a maioria dos sócios entendam necessária a alteração para o melhor desenvolvimento da sociedade. Antes do Código Civil de 2002, qualquer cláusula do contrato social poderia ser alterada pela vontade dos sócios que representassem mais da metade do capital social, somente era necessária a concordância de todos os sócios ou de uma maioria qualificada quando o contrato expressamente exigisse mediante a previsão de quorum qualificado ou por cláusula de unanimidade, conforme o art. 35, VI, da Lei n° 8934/94 e o art. 53, VII, do Dec. n° 1.800/1996.
Com o novo Código Civil a matéria tornou-se mais complexa, devendo-se apresentar quatro hipóteses de alteração contratual: designação de administrador não sócio; destituição de administrador sócio; expulsão extrajudicial de sócio minoritário; demais alterações. Para cada um desses temas, a lei estabelece condições diferentes para se alterar o contrato social. Quando tem por objeto a designação de administrador não sócio, que é possível somente se houver previsão expressa no contrato social, a alteração contratual depende da vontade unânime dos sócios, enquanto o capital social não estiver totalmente integralizado, e da aprovação de sócios ou titulares de 2/3, no mínimo, do capital social, após a sua total integralização, conforme dispõe o art. 1061 do Código Civil de 2002.
Se o objeto é a destituição de administrador sócio, exige-se a aprovação de titular ou titulares de quotas representativas de 2/3 do capital social, salvo se o contrato estabelecer outro quorum, de acordo com o §1° do art. 1063. No caso de expulsão extrajudicial de sócio minoritário, a alteração contratual poderá ser assinada por sócio ou sócios titulares de mais da metade do capital social, se houver no contrato social cláusula prevendo a possibilidade de expulsão por justa causa, conforme previsto no parágrafo único do art. 1004. As demais alterações contratuais dependem da aprovação de sócio ou sócios titulares de ¾ do capital social, segundo o art. 1071, V, c/c o art. 1076, I. Independentemente da forma adotada pelo contrato social, a alteração contratual pode ser feita por instrumento público ou particular, sempre de acordo com a exclusiva escolha dos sócios signatários (Lei n° 8.934/94, art. 53).
Quanto ao capital social, como nas demais sociedades contratuais previstas no Código Civil, ele é dividido em quotas, podendo ser integralizado à vista ou a prazo, em dinheiro, bens ou créditos. Não há no novo Código Civil exigência da comprovação de depósito bancário ou da avaliação dos bens na formação do capital social, o que contribui para a realização de fraudes. Na tentativa de coibir fraudes na integralização do capital social em bens, o §1° do art. 1055 do Código Civil de 2002 prevê a responsabilidade solidária de todos os sócios pela exata estimação de bens conferidos ao capital social, até o prazo de cinco anos da data do registro da sociedade.
Quanto à cessão de quotas, o Código Civil revela o caráter personalístico atribuído à sociedade limitada ao prever no art. 1057:
Na omissão do contrato, o sócio pode ceder sua quota, total ou parcialmente, a quem seja sócio, independentemente de audiência dos outros, ou a estranho, se não houver oposição de titulares de mais de ¼ (um quarto) do capital social.
Confirmando o caráter personalístico, o art. 1028 do CC 2002 prevê que no caso de falecimento de sócio, a sua quota será liquidada, a menos que: o contrato prever de forma diferente; os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade ou, se por acordo com os herdeiros, existir a substituição do sócio falecido.
Ainda em relação ao caráter personalístico atribuído à sociedade limitada pelo Código Civil de 2002, destaca-se o art. 1026, prevendo que o credor particular do sócio pode, na insuficiência de outros bens do devedor, fazer recair a execução sobre o que a este couber nos lucros da sociedade, ou na parte que lhe tocar em liquidação. O parágrafo único do referido dispositivo permite que o juiz determine a dissolução parcial da sociedade na hipótese de não existirem outros bens livres no patrimônio do sócio devedor, quando a sociedade não estiver dissolvida. No caso a sociedade deve realizar um balanço de determinação para apurar o saldo cabível ao sócio devedor e depositar em dinheiro, no juízo da execução até 90 dias após a liquidação.
Todos esses dispositivos atribuem caráter personalístico à sociedade limitada por: sujeitar, em regra, a cessão de quotas à anuência de sócios que representem ¾ do capital social; prever, desde que não exista outra previsão no contrato social, a dissolução parcial da sociedade e, por fim, estabelecer a liquidação da quota do sócio devedor sem prever a possibilidade da entrada de um estranho na sociedade mediante a arrematação da quota penhorada. Em todas essas hipóteses, veda-se, a princípio, a entrada na sociedade de um terceiro estranho aos sócios.
A exemplo do que ocorria no regime do Decreto n° 3.708/1919, a sociedade limitada continua a ser identificada por nome empresarial da espécie firma social ou denominação social. O art. 1.158 do novo Código Civil, permite que a sociedade limitada adote firma ou denominação, integradas pela palavra "limitada" ou sua abreviatura no final do nome empresarial. A firma será composta pelo nome civil de um ou mais sócios, desde que pessoas físicas. A denominação deve designar o objeto da sociedade, sendo permitido nela figurar o nome de um ou mais sócios. A omissão da palavra "limitada" determina a responsabilidade solidária e ilimitada dos administradores que assim empregarem a firma ou a denominação da sociedade (art. 1.158, §3°).
Na formação do nome empresarial devem ser observados os princípios da novidade e da veracidade previstos no art. 34 da Lei n° 8.934/1994 e nos arts. 1.163 e 1.165 do Código Civil de 2002. De acordo com esses princípios o nome empresarial não pode transmitir uma informação falsa a respeito da sociedade empresária por ele identificado e não será igual ou semelhante a outro nome empresarial já existente. Pelo princípio da veracidade, a firma social não pode possuir nome civil de quem não seja sócio ou deixou de ser sócio e o objeto social presente na denominação social deve ser o previsto no contrato social. Assim, se a firma social apresenta nome civil de sócio que se retira da sociedade, falece ou é expulso, deverá ser alterado para a exclusão do nome civil do sócio que deixou a sociedade.
Diante disso, pode se mostrar mais adequada a utilização de denominação social pela sociedade limitada, já que essa espécie de nome empresarial permite a utilização de elemento ou expressão de fantasia (consistente em palavras de uso comum ou vulgar na língua nacional ou estrangeira – p. ex.: Arco-Íris, Cometa) na composição do nome empresarial, não exigindo alteração em razão de modificações no quadro de sócios, ainda que a denominação seja formada por nome civil de sócio, hipótese em que será tratado como expressão de fantasia, conforme prevê o art. 8° da Instrução Normativa n° 53, de 6 março de 1996, do Departamento Nacional de Registro do Comércio.
Nesse sentido, ressalta Sérgio Campinho:
A inclusão de nome civil em denominação deverá ser tratada como expressão de fantasia, razão pela qual a retirada, exclusão ou falecimento de sócio cujo nome figurou na sua composição não implica a sua alteração, podendo nela ser conservado. A regra do artigo 1.165 do Código Civil só se aplica às firmas sociais, como expressamente previsto no preceito. (CAMPINHO, 2003, 337).
Em relação à composição da sociedade, exige-se o número mínimo de dois sócios, que podem ser pessoas físicas ou pessoas jurídicas. Uma novidade a ser ressaltada refere-se a vedação prevista no Código Civil de 2002 em relação às sociedades formadas entre cônjuges. Segundo o art. 977 os cônjuges podem contratar sociedade entre si ou com terceiros, desde que não estejam casados sob o regime da comunhão universal de bens ou no da separação obrigatória. A previsão legal alcança as sociedades limitadas que forem constituídas na vigência do novo Código, as sociedades limitadas regularmente constituídas antes da sua vigência, não devem ser atingidas pela restrição legal, afinal, o art. 2035 do novo Código Civil prevê
A validade dos negócios e demais atos jurídicos, constituídos antes da entrada em vigor deste Código, obedece ao disposto nas leis anteriores, referidas no art. 2045, mas os seus efeitos, produzidos após a vigência deste Código, aos preceitos dele se subordinam, salvo se houver sido prevista pelas partes determinada forma de execução
O art. 977 prevê norma referente à constituição da sociedade, se a sociedade limitada antes da vigência do novo Código Civil apresentava entre os sócios, cônjuges casados sob regime de casamento não vedado em lei vigente na época da formação da sociedade, tem-se um negócio jurídico perfeito, que não poderá ser atingido por norma posterior. A restrição legal alcança a constituição de sociedade limitada ou alteração contratual realizadas a partir de 11 de janeiro de 2003.
O requisito da pluralidade de sócios na constituição da sociedade limitada é absoluto, não admitindo exceções, mas a sociedade limitada pode, durante a sua existência, temporariamente, ser formada por um único sócio em razão de retirada, falecimento ou exclusão do outro ou dos demais sócios. No caso da sociedade limitada ter o quadro de sócio reduzido a apenas um, poderá ficar nessa situação pelo prazo de 180 dias a contar do fato que motivou a unipessoalidade. Nesse prazo, o sócio remanescente deve encontrar pelo menos mais um sócio, devendo dissolver a sociedade se não conseguir atender nesse tempo o requisito da pluralidade.