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O equívoco da decisão judicial que suspendeu o uso dos faróis baixos acesos nas rodovias durante o dia

Agenda 05/09/2016 às 17:07

O presente artigo analisa a decisão judicial que suspendeu liminarmente a obrigatoriedade do uso dos faróis baixos acesos, durante o dia, nas rodovias e demonstra o equívoco do fundamento sobre o qual foi alicerçada.

 

 

 

 

 

O EQUÍVOCO DA DECISÃO JUDICIAL QUE SUSPENDEU O USO DOS FARÓIS BAIXOS ACESOS NAS RODOVIAS DURANTE O DIA

   

 

 

                                                                             Adriano Aranão[*]

 

 

 

 

No último dia 02 de setembro, o Juiz Federal Substituto da 20ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal, no curso da ação civil pública nº 0049529‐46.2016.401.3400, ajuizada pela Associação Nacional de Proteção Mútua aos Proprietários de Veículos Automotores – ADPVAT, concedeu ordem liminar para suspender a obrigatoriedade do uso dos faróis baixos acesos nas rodovias durante o dia, conforme prescrito pela Lei n° 13.290/16.

Acolhendo o pedido da autora e fazendo referência  ao disposto no art. 90 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), o eminente julgador apontou como fundamento da sua decisão  a ausência de sinalização regulamentadora acerca da obrigatoriedade do uso dos faróis baixos acesos nas rodovias, in verbis:

Portanto, sem imiscuir-me na validade da Lei nº 13.290/2016, mais conhecida como “Lei do Farol Baixo”, fato é que não é possível penalizar o condutor até que haja a escorreita sinalização das rodovias.

 

Seguindo os caminhos trilhados pelo magistrado, nesta sucinta digressão sobre a decisão prolatada não se ingressará na análise da validade da Lei nº 13.290/16 e tampouco da sua eficácia na prevenção de acidentes de trânsito. Apenas  e tão somente serão traçadas breves linhas sobre a razão que o eminente julgador invocou para fundamentar a sua ordem liminar.

Pois bem. O art. 90 do CTB não exige a instalação de placas de regulamentação para a obrigatoriedade do uso dos faróis baixos acesos, durante o dia, nas rodovias e, consequentemente, a aplicação da penalidade decorrente do seu não uso não está adstrita à existência de tal sinalização.

Assim prescreve o art. 90 do CTB

Art. 90. Não serão aplicadas as sanções previstas neste Código por inobservância à sinalização quando esta for insuficiente ou incorreta.

§ 1º O órgão ou entidade de trânsito com circunscrição sobre a via é responsável pela implantação da sinalização, respondendo pela sua falta, insuficiência ou incorreta colocação.

§ 2º O CONTRAN editará normas complementares no que se refere à interpretação, colocação e uso da sinalização. (grifo nosso)

 

Anote-se que o caput do art. 90 do CTB é literal ao estabelecer que não serão aplicadas sanções (penalidades e medidas administrativas) por inobservância da sinalização quando esta for insuficiente ou incorreta. Trata-se, por evidente, de infração que se consuma justamente em razão da inobservância da própria sinalização regulamentadora, v.g., da placa “PARE” (CTB, art. 208) ou da ultrapassagem realizada em local sinalizado com  linha contínua amarela contínua (CTB, art. 203, V).

Nesse sentido, manifesta-se Arnaldo Rizzardo nos seus comentários ao art. 90 do CTB, in verbis:

Mas convém explicitar a isenção inserida no dispositivo: restringe-se unicamente à inobservância da sinalização, e não a outras infrações inseridas no Código ou decorrentes de procedimento culposo. (2010, p. 205)

 

Insista-se, o art. 90 do CTB veda a imposição de sanções em razão da inobservância da sinalização de regulamentação quando esta for insuficiente ou incorretamente instalada. Neste ponto, é importante recordar as espécies de sinalizações e  seus efeitos, sendo que, considerando o objeto de análise deste ensaio, circunscrever-se-á à sinalização vertical (placas).

A sinalização vertical é classificada em (i) de regulamentação, (ii) de advertência e (iii) de indicação. Sinteticamente, as  placas de regulamentação são as de fundo branco e sinais (letras, números e desenhos) vermelhos; as de advertência são as de fundo amarelo e sinais pretos; e as de advertência são as de fundo verde ou azul e sinais brancos.

Dentre todas, a única que dirige comandos obrigatórios e que suscita a aplicação de sanções próprias quando da sua inobservância é a sinalização de regulamentação. Nesse sentido, prescreve o Anexo II do CTB:

1.1. SINALIZAÇÃO DE REGULAMENTAÇÃO: Tem por finalidade informar aos usuários as condições, proibições, obrigações ou restrições no uso das vias. Suas mensagens são imperativas e o desrespeito a elas constitui infração. (grifo nosso)

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Nas rodovias, a responsabilidade pela implantação da sinalização de regulamentação é do diretor do órgão executivo rodoviário de trânsito da União (DNIT-Rodovias Federais), do Estado (DER-Rodovias Estaduais) e, onde houver, do Município (Rodovias Municipais) e decorre do seu dever/poder de regulamentar o uso das vias públicas sob sua circunscrição (CTB, art. 21, II).

Ocorre que a obrigatoriedade do uso dos faróis baixos acesos, durante o dia, nas rodovias decorre diretamente da Lei nº 13.290/16, que deu nova redação aos artigos 40, I e 250, I, “b” do CTB, e não da implantação da sinalização de regulamentação, que, ressalte-se, é inexistente para a hipótese. Trata-se, desta feita, de uma regra geral de circulação e conduta e caracteriza-se como uma obrigação ex lege.

Na verdade, no caso da obrigatoriedade do uso dos faróis baixos acesos nas rodovias, a autoridade de trânsito poderá instalar a sinalização de advertência, cujo modelo-padrão ainda precisaria ser criado, alertando os motoristas a acederem os faróis baixos do seu veículo.

Registre-se, entretanto, que a instalação da sinalização está adstrita ao princípio da necessidade ou suficiência, posto que tanto o excesso quanto a falta de sinalização são fatores de risco para a segurança viária. Nesse sentido, prescreve o caput do art. 80 do CTB:

Art. 80. Sempre que necessário, será colocada ao longo da via, sinalização prevista neste Código e em legislação complementar, destinada a condutores e pedestres, vedada a utilização de qualquer outra. (grifo nosso)

 

Na mesma trilha, a Resolução nº 243/07 do CONTRAN esclarece que o princípio da suficiência da sinalização se caracteriza por “permitir fácil percepção do que realmente é importante, com quantidade de sinalização compatível com a necessidade.” (grifo nosso)

Mas, insista-se, trata-se de ato discricionário da autoridade de trânsito e que somente o fará se entender necessário para “alertar os usuários da via para condições potencialmente perigosas, indicando sua natureza” (CTB, Anexo II, Item 1.2).

Aliás, foi nesse sentido um dos argumentos utilizados pela Associação Nacional de Proteção Mútua aos Proprietários de Veículos Automotores para fundamentar a petição inicial da epigrafada ação civil pública, in verbis:

Em cidades como Brasília, exemplificativamente, as ruas, avenidas, vias, estradas, rodovias, etc. penetram o perímetro urbano e se entrelaçam. Absolutamente impossível, mesmo para os que bem conhecem a Capital da República, identificar quando começa uma via e termina uma rodovia estadual, de modo a se ter certeza quando exigível o farol acesso e quando dispensável. Para se evitar infringir a lei, não há outra forma senão os faróis ligados em todos os momentos. Não só na Capital, mas em grande parte das cidades brasileiras, o cerne das reclamações é que os motoristas precisam manter os faróis acessos nas cidades, pois no Brasil é muito comum as Estradas “cortarem” as cidades, visto que em suas origens, as cidades “nasceram e cresceram” em torno das Estradas, pois sempre foram rotas de comércio.

 

Não parece restar dúvidas que a implantação da sinalização de advertência se mostra conveniente e oportuna, consequentemente necessária,  naqueles trechos em que a rodovia atravessa a área urbana de um município, causando, não raras vezes, incertezas sobre ser aquela via pública uma rodovia ou uma avenida, com o que se avulta indevida a imposição de qualquer sanção decorrente do não uso dos faróis baixos acesos.

 Assim sendo, em sentido inverso, naquelas hipóteses em que não há quaisquer dúvidas sobre ser a via pública uma rodovia, o motorista deve utilizar os faróis baixos do seu veículo acesos e, na hipótese de inobservância deste dever legal, cometerá infração de natureza média (CTB, art. 250, I, “b”), sujeitando-se à penalidade de multa.

Vale destacar que a Lei nº 13.290/16 foi publicada no Diário Oficial da União de 24 de maio e entrou em vigor no dia 08 de julho de 2016, tendo, neste período, ocorrido ampla divulgação da obrigatoriedade do uso dos faróis baixos acesos durante o dia nas rodovias, não sendo crível a alegação de desconhecimento da lei.

Por fim, se, a despeito dos resultados positivos já registrados em outros países, o uso dos faróis baixos acesos durante o dia será eficaz ou não para auxiliar na  redução dos acidentes de trânsito nas rodovias brasileiras somente o tempo poderá confirmar. Mas, até que a lei seja alterada ou revogada, deve ser cumprida, não podendo o seu descumprimento ser justificado sob o pueril, recorrente e infundado argumento de que seu único objetivo é o arrecadatório.  

Vamos esperar a revisão da decisão prolatada e aguardar a sua correção.   

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

BRASIL. Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9503.htm>. Acesso em: 05. setl. 2016.

CONTRAN, Resolução nº 243, 22 de junho de 2007. Disponível em: < http://www.denatran.gov.br/resolucoes.htm>. Acesso em: 05. set. 2016.

RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao Código de Trânsito Brasileiro. 8.ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.

 


[*] Major da Polícia Militar do Estado de São Paulo, exercendo a função de Coordenador Operacional do 2º Batalhão de Polícia Rodoviária. Mestre em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública. Mestre em Ciências Jurídicas. Coordenador e Professor do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Ourinhos – FIO.

Sobre o autor
Adriano Aranão

Mestre em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública pelo Centro de Altos Estudos de Segurança (CAES) da PMESP, Mestre em Ciências Jurídicas pela Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP), Coordenador e Professor do Curso de Direito das Faculdades Integradas de Ourinhos (FIO)

Informações sobre o texto

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