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Os dilemas da corrupção e o controle da administração pública pelos Tribunais de Contas

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Agenda 21/09/2016 às 11:57

O presente artigo tem como objetivo aprofundar a discussão sobre o tema Corrupção e Controle Externo pelos Tribunais de Contas.

RESUMO

O presente artigo tem como objetivo aprofundar a discussão sobre o tema Corrupção e Controle Externo pelos Tribunais de Contas. O tema abordado neste artigo – situa-se no campo da reflexão política, que busca investigar a relação de causalidade entre o poder político, econômico e social. Nesse esforço, busquei analisar os escândalos mais recentes de corrupção e seus estragos no orçamento público, a partir da análise das estratégias mais adequadas para a estruturação de um programa de combate à corrupção no Brasil. Evidenciando os impactos da corrupção em setores como nas prestações de serviços públicos e na qualidade da democracia brasileira, apresentando um paradoxo entre os valores dos tributos arrecadados e o repasse aos órgãos prestadores dos respectivos serviços. Analisando, também, a reputação dos conselheiros dos Tribunais de Contas e seu efetivo envolvimento com os setores mais corruptos do governo, diminuído assim, a credibilidade do principal órgão responsável pelo controle e combate a corrupção no Brasil. Concluímos assim que o aumento do controle social sobre os governantes, bem como a reforma do Estado por meio de medidas legislativas, na gestão política e administrativa, tais como: leis penais mais rígidas; reforço no controle contábil, interno e externo da administração pública; aparelhamento e estruturação dos órgãos judiciais e agências especializadas na luta contra a corrupção. São medidas imprescindíveis para a diminuição do nível de corrupção em nosso país e, por conseguinte, melhoria da qualidade dos serviços públicos em geral.

Palavras-chave: Corrupção; Controle Externo; Tribunal de Contas; Democracia.

ABSTRACT

This article aims to deepen the discussion on the topic Corruption and Control by External Audit Courts. The issue addressed in this article - is located in the field of political reflection, which aims to investigate the causal relationship between the political, economic and social power. In this effort, I sought a review of recent corruption scandals and its damage to the public budget, based on the analysis of the most appropriate strategies for structuring an anti-corruption program in Brazil. Showing the impacts of corruption in sectors such as the public provision of services and quality of Brazilian democracy, presenting a paradox between the amount of taxes collected and the transfer providers bodies of their services. Analyzing also the reputation of directors the General Accounting Offices and their effective engagement with government most corrupt sectors, thus diminished, the credibility of the main body responsible for controlling and combating corruption in Brazil. We conclude that the increase in social control over governments and state reform through legislative, political and administrative management, such as stricter criminal laws; strengthening the accounting, internal and external control of public administration; rigging and structuring of the judicial bodies and specialized agencies in the fight against corruption. Measures are essential to reducing the level of corruption in our country and therefore improving the quality of public services in general.
Keywords: Corruption; External Control; Court of Auditors; Democracy.

SUMÁRIO:

1. Considerações Iniciais; 2. Corrupção e Violação dos Princípios Constitucionais; 2.1. Corrupção e Qualidade da Democracia; 2.2. Brasil: O País dos Paradoxos; 3. Controle da Administração Pública no Combate a Corrupção; 4. Controle Externo Exercido por Tribunais de Contas; 5. Considerações Finais; 6. Bibliografia:

1.    CONSIDERAÇÕES INICIAIS:

O assunto corrupção não algo novo na imprensa brasileira e mundial, muito meno é um debate recente entre os mais diversos seguimentos da sociedade. Segundo Tanzi (1998, p. 559-560), a corrupção não é um fenômeno novo; por exemplo, a cerca de dois mil anos, Kautilya, o primeiro ministro de um rei indiano, já havia escrito um livro sobre o tema - Arthashastra.

Na última década, uma série de escândalos abalam as estruturas políticas/administrativas brasileiras, nas mais diversas esferas governamentais, seja ela federal, estadual ou municipal. Entre eles, o “mensalão” em 2005 no governo Luiz Inácio Lula da Silva, e mais recentemente, ganharam as manchetes dos jornais o escândalo de corrupção da Petrobras[1].

Por outro lado, a corrupção no país não vive apenas de grandes escândalos como este da Petrobras, a grande maioria dos atos corruptos que geram grandes e pequenos os prejuízos à sociedade em geral, não espaço na mídia e sequer chegam a conhecimento da grande parte da população. São estes atos, pequenos em prejuízos ao contribuinte, mas de grandeza exorbitante em sua quantidade, que assolam o Brasil e deixam o país com a maior carga tributária mundial entre os piores em qualidade de serviços prestados.

O presente artigo tem como objetivo estudar os impactos da corrupção na sociedade e na prestação dos serviços públicos prestados em nosso país. Dando enfoque, as formas de controle e transparência existentes em nosso regime jurídico, em especial, ao controle exercido pelos Tribunais de Contas, apontando acertos e falhas na investigação e responsabilização das autoridades corruptas em nosso país.

2.    CORRUPÇÃO E VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS:

A corrupção surge como verdadeiro monstro das velhas e novas democracias. O conhecimento geral nos mostra que ela envolve o abuso do poder público para qualquer tipo de benefício privado, inclusive, vantagens para os partidos de governo em detrimento da oposição.

É comum as pessoas começarem a relacionar corrupção como uma categoria de pessoas que corrompem o sistema democrático, escândalos políticos. E quando procura-se o verdadeiro significado de corrupção, os resultados decorrentes, na maioria das vezes, nos remetem a políticos corruptos, à notícias de fraudes, práticas de tirania, roubos, caixas dois, dentre outras coisas, que acontecem nacional e internacionalmente.

            Muitos autores se preocuparam em estabelecer um conceito para o termo “corrupção”, o dicionário Aurélio estabelece inúmeros sinônimos para este termo, são eles: depravação; suborno; Alteração e sedução. É bem verdade que está não apresenta nenhum significado fechado, podendo ter inúmeros significados e inferências.

            Não obstante, é sempre comum os conceitos apresentarem termos e significados bem semelhantes. Vejamos, para Huntington (1968, pág. 377): a corrupção pode ser definida como o comportamento dos funcionários públicos que se desviam das normas administrativas a fim de buscar benefícios privados. Já Kurer (1993, pág. 260) define a corrupção como um comportamento que viola leis e regras administrativas com a finalidade de obter ganhos privados. Sem fugir muito dos dois conceitos básicos anteriores, Tanzi (1998, pág. 559-560) define que o termo corrupção vem do verbo latino “rumpere” - romper, que significa a quebra de algo. Este algo pode ser um código de conduta moral, social ou ainda uma regra administrativa; para haver quebra de uma regra administrativa, ela deve ser precisa e transparente (grifos nosso).

            Conforme pode ser observado nos conceitos acima, há um elo em comum entre eles. Sendo assim, podemos extrair que corrupção é o comportamento ou conduta, de funcionário ou agente público, que desviam, rompem ou violam normas, regras ou princípios administrativos preexistentes, com o intuito de obter ganhos ou benefícios privados.

            De forma sucinta, podemos inferir que o ato corrupto viola os princípios administrativos. Tais como os princípios da impessoalidade[2], moralidade[3], legalidade e outros implícitos na Constituição.

            O princípio da impessoalidade visa assegurar que os atos administrativos não sejam vinculados ao interesse administrativo da autoridade que o pratica, estabelecendo que todos os administrados devem ser tratados indistintamente e de forma impessoal.

Nas palavras do Prof. Celso Antônio Bandeira de Mello:

“Nele se traduz a ideia de que a administração tem que tratar a todos os administrados sem discriminações, benéficas ou detrimentosas. Nem favoritismo nem perseguições são toleráveis. Simpatias ou animosidades pessoais, políticas ou ideológicas não podem interferir na atuação administrativa e muito menos interesses sectários, de facções ou grupos de qualquer espécie.[4]

 

Um exemplo concreto do princípio da impessoalidade na CF/88, é o mandamento constitucional do artigo 37, II da Magma Carta, ao estabelecer que:

“II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;”

            Ao praticar o ato administrativo o administrador deverá observar a moralidade administrativa. Isso significa  que em sua atuação o administrador público deve atender aos ditames da conduta ética, honesta, exigindo a observância de padrões éticos, de boa-fé, de lealdade, de regras que assegurem a boa administração e a disciplina interna na Administração Pública (MARINELLA, 2013, p. 37)[5]. Moralidade administrativa está ligada ao conceito de bom administrador, honesto e íntegro em suas ações, que visa o bem comum e não seus anseios privados.

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            Ademais, violar a moralidade administrativa é violar a própria probidade administrativa, hipótese de responsabilização do agente público em sentido amplo, devendo este responder “imporão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função publica, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível” (art. 37, § 4º).

            A legalidade administrativa se apresenta como a base do estado democrático de direito, e representa verdadeiro mandamento legal, abstrato e de comando geral, devendo ser obedecida de forma integral pelo administrador, não podendo praticar ato que não esteja assentado na lei.

            Nas palavras do ilustre José dos Santos Carvalho Filho, “O princípio da legalidade é certamente a diretriz básica da conduta dos agentes da administração. Significa que toda e qualquer atividade administrativa deve ser autorizada por lei. Não o sendo, a atividade é ilícita”[6].

            Ao cometer um ato corrupto, o administrador rompe com inúmeros princípios, não só os explicitados acima, como também uma sequência de princípios implícitos como: o princípio da supremacia do interesse público; da indisponibilidade do interesse público; princípios da boa administração[7]; princípio da finalidade e etc.

2.1. CORRUPÇÃO E QUALIDADE DA DEMOCRACIA:

           

Escândalos como o “mensalão” em 2005, escândalo do “lava-jato[8]” em 2014 e dias atuais, bem como os observados em governos anteriores (governos Collor e FHC), e inúmeros outros escândalos que assolam o Brasil de norte a sul, assustam e deixam a sociedade em geral estarrecida pelo volume de dinheiro público desviado.

Notícias como está de nosso país, surgem em vários outros países, mostrando que independentemente de seus níveis de desenvolvimento, a corrupção afeta um grande número de nações democráticas. Nas últimas três décadas uma sucessão de escândalos abalou os governos da Itália, Grã-Bretanha, Japão, França, Alemanha, Bélgica e Estados Unidos, mostrando que a questão também envolve as instituições que, em tese, podem assegurar ou não maior controle sobre as decisões que mobilizam grandes somas de recursos públicos.

            No Brasil, os dois escândalos não foram suficientes para impedir a reeleição dos candidatos que tiveram seus governos ligados a tais atos. Fato este que, põe em cheque a verdadeira percepção pública da real importância dos atos de corrupção.  Isso, junto com a liberdade de imprensa, demonstra o grau de maturidade das democracias, mas não impedem a prática de atos políticos corruptos. Entretanto, quando ambas existem e são vigorosas, se não impedem completamente a existência da corrupção, oferecem claras alternativas para que a sociedade a controle e puna os seus responsáveis.

“Alguns analistas atribuíram o suposto crescimento da corrupção no continente a três fatores: a) às oportunidades criadas pela dispersão de poder decorrente da democratização, permitindo que maior número de agentes públicos pudesse transacionar favores em troca de benefícios privados; b) à onda de reformas neoliberais que teria ampliado o poder de decisão desses agentes sobre bens como as empresas públicas, cuja privatização teria criado oportunidades de extração de vantagens dos interessados em comprá-los; e c) à emergência de novas lideranças personalistas ou carismáticas que, sobrepassando os partidos políticos e os grupos de interesse, teriam chegado à presidência de seus países pela mobilização de massas via televisão ...[9]

 

            É indiscutível que, países mais desenvolvidos apresentam índices relativamente mais baixos da corrupção do que os menos desenvolvidos. Contudo, esse fator sozinho não é suficiente para explicar por que países relativamente desenvolvidos como Argentina, Brasil, México e Venezuela são classificados por índices como a Transparência Internacional como muito corruptos. Aparentemente, portanto, a experiência democrática sozinha, mesmo com o passar do tempo, não garante a diminuição dos índices de percepção da corrupção, significando que outros fatores devem ser identificados para explicar o fenômeno.

Os efeitos da corrupção inegavelmente afetam a legitimidade do Estado democrático, fraudando os princípios, entre eles a igualdade política inerente ao regime, pois os seus protagonistas podem manter o poder e benefícios políticos desproporcionais frente aos que alcançariam através de modos legítimos de competir politicamente; e distorcem a dimensão republicana da democracia porque faz as políticas públicas resultarem, não da disputa aberta de projetos diferentes, mas de acordos de bastidores que favorecem interesses espúrios.

2.2. BRASIL: O PAÍS DOS PARADOXOS:

            É comum ouvir em noticiários e da população em geral que o Brasil é o país com a maior carga tributária do mundo. Porém, a verdade não é bem essa, o país tem sim uma carga tributária pesada, mais não chega perto dos países que cobram os maiores impostos. Contudo, quando se a análise tem por base o PIB (Produto Interno Bruto) ou a qualidade de prestação de serviços, as coisas se invertem e despencamos nos rankings como um dos países que cobram mais tributos e prestam serviços de péssima qualidade.

Tabela 1: Levantamento entre as maiores cargas tributárias, Produto Interno Bruto (PIB) e ao Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) = Índice de Retorno de Bem Estar à Sociedade (IRBES)

País

Carga Tributária (% PIB)

IDH

IRBES

Noruega

42,80%

0,943

145,94

Áustria

42,00%

0,885

141,93

Finlândia

42,10%

0,882

141,56

Suécia

44,08%

0,904

141,15

Dinamarca

44,06%

0,895

140,41

França

43,15%

0,884

140,52

Hungria

38,25%

0,816

140,37

Bélgica

43,80%

0,886

139,94

Itália

43,00%

0,874

139,84

Brasil

35,13%

0,718

135,83

Fonte: Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT)

Segundo relatório da consultoria KPMG[10]. Quem ganha até US$ 100 mil por ano pode dizer que o Brasil tem altos impostos. Estamos em 16º lugar no mundo, à frente da Áustria, Finlândia e Suécia. Essa conta inclui os 27,5% de imposto de renda somados aos 11% pagos em seguridade social ao INSS. Para os mais ricos, com renda de até US$ 300 mil ao ano, a carga diminui e ficamos na 28ª posição. Países como Zimbábue, Peru e Equador cobram mais impostos dessa faixa de renda. Em relação à América do Sul, nossos impostos são baixos: apenas o Uruguai cobra menos taxas de seus cidadãos. O Chile é o recordista, com até 40% de cobrança sobre a renda.

Quando se considera todos os impostos, no entanto, a situação do Brasil muda um pouco. Tendo por base o ranking da consultoria Price Waterhouse and Coopers (PwC)[11], que agrega todas as taxas cobradas em 189 países do mundo e o número de horas trabalhadas para pagá-las. Somos o 30º dessa lista, com uma carga total de impostos de 68,3%. Nela estão incluídos os impostos sobre produtos e serviços que, dependendo do estado, chegam a 25%.

Quando levamos em conta o imposto para pessoa jurídica de 34%, o Brasil fica em sexto lugar entre os países que mais tributam empresas[12].

            Analisando o tributo referente ao Imposto de Renda, se os 99 países que têm imposto de renda fossem “ranqueados” segundo a alíquota máxima do imposto, o Brasil ficaria lá atrás: com a alíquota máxima de 27,5%, seria apenas o 58º do ranking. Entre os países emergentes, apenas a Rússia tem imposto de renda menor (13%), segundo levantamento da KPMG.

Proporcionalmente falando, os Estados Unidos, a nação mais rica do mundo, arrecadam proporcionalmente menos impostos que o Brasil — a carga tributária brasileira é de 36% do PIB e a americana, de 27%.  Podemos citar também a Suíça, sinônimo de riqueza e bem-estar no imaginário brasileiro, suga menos de seus cidadãos na forma de tributos — lá, a carga é de 29% do PIB.

No tocante ao Índice de Qualidade de Vida da Economist Intelligence Unit é baseado em uma metodologia única que liga os resultados subjetivos de pesquisas de satisfação de vida com os determinantes objetivos de qualidade de vida entre os países. O índice foi calculado em 2013 e inclui dados de 111 países e territórios. O Brasil aparece em 37º, atrás de países como Kuwait, Chile, Chipre e outros em que tem uma economia bem menos imponente como a nossa.

3.    CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NO COMBATE A CORRUPÇÃO:

 

Iniciando o estudo do controle da administração pública, cabe se utilizar do conceito da palavra controle, em tema de administração pública, utilizado pelo Professor Hely Lopes Meirelles, dizendo que controle “é a faculdade de vigilância, orientação e correção que um Poder, órgão ou autoridade exerce sobre a conduta funcional de outro” (MEIRELLES, 1990, Pág. 362).

Existem diversos tipos e formas de controlar a administração pública. Estes variam conforme o Poder, órgão ou autoridade que o exercitará, ou também pelo sua fundamentação, modo e momento de sua efetivação. Assim, a classificação das formas de controle se dará, portanto, conforme: sua origem; o momento do exercício; ao aspecto controlado; à amplitude.

A classificação da forma de controle administrativo referente a sua origem, se divide em: controle interno e controle externo. O primeiro é aquele que é exercido pela entidade ou órgão que é o responsável pela atividade controlada, no âmbito de sua própria estrutura. O controle  que as chefias exercem nos atos de seus subordinados dentro de um órgão público é considerado um controle interno. O segundo é o controle externo, e ocorre quando outro Poder exerce controle sobre os atos administrativos praticados por outro Poder. Ou seja, é o que se realiza por órgão estranho à Administração responsável pelo ato controlado.

Para o presente trabalho, utilizarei apenas a classificação quanto a origem, mais especificamente o controle externo exercido pelos Tribunais de Contas. Ademais, falarei sobre o controle interno e externo apenas para facilitar didaticamente e expor com mais clareza as ideias presentes neste trabalho.

4.    CONTROLE EXTERNO DOS TRIBUNAIS DE CONTAS:

O controle externo da administração pública compreende ao controle exercido por órgãos desvinculados do órgão que os praticou. Sendo assim, primeiramente os controles externos são: o parlamentar direto, o controle pelo tribunal de contas e por fim o controle jurisdicional. São órgãos externos que fiscalizam as ações da administração pública e o seu funcionamento.

Os atos da administração pública quando postos a produzir efeitos, devem obedecer as lei e os princípios da administração pública. O controle externo da administração pública não pode revisar os atos por conveniência e oportunidade, devendo se limitar ao controle de legalidade. de da instituição componente da administração pública. Nas palavras magistrais de Marçal Justen Filho “O controle-fiscalização envolve, portanto, a verificação do exercício regular da competência atribuida pela lei”[13].

O presente artigo científico tem como objetivo expor, apenas, a modalidade de controle externo da administração pública exercida pelo Tribunal de Contas, órgão de importância impar na regime jurídico brasileiro.

A nossa Magma Carta de 1988 conceitua Tribunal de Contas como instituição brasileira prevista na Constituição Federal para exercer a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e administração indireta, quanto à legalidade, à legitimidade e à economicidade e a fiscalização da aplicação das subvenções e da renúncia de receitas. Auxiliando o Congresso Nacional no planejamento fiscal e orçamentário anual. Tanto pessoa física quanto pessoa jurídica, seja de direito público ou direito privado, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária tem o dever de prestar contas ao TCU.

Os Tribunais de Contas tem como função essencial realizar a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial dos entes federativos, da Administração Pública direta e indireta. As empresas públicas e sociedades de economia mista também estão sujeitas à fiscalização dos Tribunais de Contas.

No tocante a competência fiscalizadora dos Tribunais de Contas, refere-se à realização de auditorias e inspeções em entidades e órgãos da Administração Pública direta e indireta.  Os Tribunais de Contas fiscalizam também procedimentos licitatórios, podendo expedir medidas cautelares para evitar futura lesão ao erário e garantir o cumprimento de suas decisões.

Os Tribunais de Contas possuem, ainda, competência judicante que é a de realizar o julgamento das contas anuais dos administradores e demais responsáveis pelo erário na Administração Pública.

A competência sancionatória dos Tribunais de Contas se refere a aplicação de sanções por ilegalidades de contas e despesas. As decisões sancionatórias dos Tribunais de Contas tem eficácia de título executivo, apesar de os Tribunais de Contas não terem competência para executá-las. Quem executará tais decisões serão as entidades públicas beneficiárias

A respeito do regime constitucional dos Tribunais de Contas, seguem as palavras do excelentíssimo senhor ex-ministro do STF, Carlos Ayres Brito:

“Feita a ressalva, começo por dizer que o Tribunal de Contas da União não é órgão do Congresso Nacional, não é órgão do Poder Legislativo. Quem assim me autoriza a falar é a Constituição Federal, com todas as letras do seu art. 44, litteris: ‘O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, que se compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal’ (negrito à parte). Logo, o Parlamento brasileiro não se compõe do Tribunal de Contas da União.

...

Diga-se mais: além de não ser órgão do Poder Legislativo, o Tribunal de Contas da União não é órgão auxiliar do Parlamento Nacional, naquele sentido de inferioridade hierárquica ou subalternidade funcional.”[14]

Nenhum Tribunal de Contas opera no campo da subalterna auxiliaridade. Tanto assim que na parte das competências que a Magna Lei confere ao Tribunal de Contas da União não passa pelo crivo do Congresso Nacional ou de qualquer das Casas Legislativas Federais (conforme citam os incisos III, VI e IX do art. 71). O TCU se posta é como órgão da pessoa jurídica União, diretamente, sem pertencer a nenhum dos três Poderes Federais. Exatamente como sucede com o Ministério Público, na legenda do art. 128 da Constituição, incisos I e II.

Com tais singularidades apresentadas sobre os Tribunais de Contas. Estes são compostos cidadãos brasileiros que preencham os requisitos dos artigos 71 a 75 da CF, são eles: ter entre 35 e 70 anos de idade e dez anos de experiência profissional correlata; idoneidade moral; reputação ilibada e notórios conhecimentos jurídicos, contábeis, econômicos e financeiros ou de administração pública.

No tocante a composição dos membros dos tribunais, dois terços dos integrantes são nomeados pelo Poder Judiciário e um terço pelo Poder Executivo.

Hodiernamente, é indiscutível a importância dos Tribunais de Contas como forma de controle externo para exercer a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e administração indireta auxiliando o Congresso Nacional no planejamento fiscal e orçamentário anual. Entretanto, a forte politização nos Tribunais de contas são estabelecidos para não funcionar, e servir, de quebra, como forma de apadrinhamento de correligionários, parentes e aliados políticos.

Usando como ponto de partida o relatório inédito “Quem são os conselheiros dos Tribunais de Contas”[15] da ONG Transparência Brasil[16], divulgada em abril de 2014. Este relatório traz um levantamento da vida pregressa de todos os 238 integrantes dos 34 Tribunais de Contas espalhados pelo Brasil:

► Tribunal de Contas da União;

► 26 Tribunais de Contas dos Estados e Tribunal de Contas do Distrito Federal;

► Tribunais de Contas das capitais São Paulo e Rio de Janeiro;

► Quatro Tribunais de Contas de municípios existentes nos estados da Bahia, Goiás, Ceará e Pará.

Logo abaixo, seguem as tabelas com as pesquisas realizadas junto aos Tribunais de Contas do relatório da ONG Transparência Brasil.

Tabela 2: Cargos políticos ocupados previamente por conselheiros

Cargo

Quantidade

Deputado Estadual

94

Secretário Estadual

52

Vereador

36

Prefeito

17

Secretário Municipal

15

Deputado Federal

13

Senador

4

Vice-prefeito

4

Vice-governador

1

Fonte: Transparência Brasil

Como prova cabal da ascensão política da maioria dos membros dos integrantes dos Tribunais de Contas, nota-se que 64% dos seus integrantes exerceram algum tipo de atividade política antes da nomeação para o respectivo tribunal. O que vêm a corroborar com o fato do ser uma forma de apadrinhamento político.

Dos 238 membros do tribunais detalhados nesta pesquisa, 47 (20%) respondem a processos na justiça ou no próprio Tribunal de Contas, alguns já condenados, indo dos mais variados crimes, entre eles improbidade administrativa e peculato.

Tabela 3. Estados com maior quantidade de conselheiros processados.

Estado

Conselheiros Processados

Goiás

5

Amapá

4

Espírito Santo

4

Mato Grosso

4

Roraima

4

Fonte: Transparência Brasil

Tabela 4. Lista de conselheiros afastados por serem réus em processo

Tribunal

Conselheiro

TC-DF

Domingos Lamoglia

TC-AP

Amiraldo da Silva Favacho

TC-AP

José Júlio de Miranda Coelho

TC-AP

Manoel Antônio Dias

TC-AP

Regildo Wanderley Salomão

TC-CE

Teodorico José de Menezes Neto

TC-ES

Valci José Ferreira de Souza

TC-MT

Humberto Melo Bosaipo

TC-RR

Henrique Manoel Fernandes Machado

Fonte: Transparência Brasil

Dos mesmos 238 conselheiros, 42 (17%) tem algum parentesco com político. Metade destes é pai ou filho de algum político influente. Os cargos mais comuns entre os parentes são ex ou atuais governadores e deputados estaduais. Sendo assim, uma porcentagem significativa dos conselheiros são parentes diretos de políticos responsáveis por sua nomeação.

            Como se vê, o Tribunal de Contas, órgãos imprescindível para o controle administrativo externo dos atos administrativos. Entretanto, conforme demonstra os dados acima, a maioria esmagadora dos conselheiros dos Tribunais de Contas tem algum vínculo político que põe em cheque sua capacidade de controlar e revisar atos eivados de vícios.

4.     CONSIDERAÇÕES FINAIS:

A discussão envolvendo o tema corrupção permite concluir que o Estado, em que pese, tenha algumas formas de controlar os atos e contratos administrativos, ainda não possui mecanismos capazes de driblar as influências políticas e troca de favores dentro das próprias instituições. O que deixa claro a necessidade de reforma do Estado. Apesar de possuir distintos mecanismos administrativos para combater as práticas corruptas, especialmente no âmbito dos poderes executivo e legislativo, o Estado brasileiro carece de diretrizes explícitas para a elevação do nível de transparência na administração pública. Acredita-se que essa desconexão nas relações Estado/sociedade possa ajudar a explicar por que o Brasil continua a posicionar-se entre os países com elevados níveis de corrupção.

Fica claro que a roubalheira que assola a vasta maioria dos municípios brasileiros traz tanto - ou mais - prejuízo ao País quanto os grandes escândalos como os utilizados como exemplo neste trabalho. É uma corrupção “nanica”, pois são pequenos esquemas, mas se alastram por todos os municípios brasileiro, como um vírus que se espalha pelo organismo receptor, causando estragos gigantes no orçamento público.

Apesar dos avanços na criação de informação e na adoção de políticas pública, orçamentos e gastos mais transparentes, bem como os mecanismo estabelecidos pela Constituição Federal de 1988, a corrupção permanece, sem que haja qualquer mudança no que diz respeito à responsabilização dos agentes públicos e privados perante a sociedade.No âmbito do projeto de reforma do Estado, o conceito de transparência surgiu como proposição universal, sem que se leve em conta realidades culturais, políticas e institucionais distintas.

            Portanto, conclui-se assim que o aumento do controle social sobre os governantes, bem como a reforma do Estado, por meio de medidas legislativas, na gestão política e administrativa, tais como: leis penais mais rígidas; reforço no controle contábil, interno e externo da administração pública; aparelhamento e estruturação dos órgãos judiciais e agências especializadas na luta contra a corrupção. São medidas imprescindíveis para a diminuição do nível de corrupção em nosso país e, por conseguinte, melhoria da qualidade dos serviços públicos em geral.

5.     BIBLIOGRAFIA:

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª Edição – 2012. Editora Atlas. São Paulo.

HUNTINGTON, S. 1968. Political Order in Changing Societies. New Haven : Yale University Press.

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 2ª ed. São Paulo: Saraiva.

MARINELA, Fernanda. Direito Administrativo. 7ª Edição. Revista, ampliada, reformada e atualizada ate 01/01/2013. Editora Impetus. Rio de Janeiro-RJ.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 17ª Ed. São Paulo: Malheiros, 1990.

MELO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 30ª Edição, revista e atualizada ate a Emenda Constitucional 71, de 29.11.2012. Ed. Malheiros.

MOISÉS, José Álvaro. “A corrupção afeta a qualidade da democracia?”. Revista – Em Debate – Opinião Pública e Conjuntura Política

PAIVA, Natália. SAKAI, Juliana. Quem são os conselheiros dos Tribunais de Contas. Disponível em: http://www.excelencias.org.br/docs/tribunais_de_contas.pdf. Acesso em 6 de outubro de 2014.

PEREIRA, José Matias. Reforma do estado e transparência: estratégias de controle da corrupção no Brasil. Disponível em: http://repositorio.unb.br/handle/10482/940. Acesso em: 3 de janeiro de 2015.

RICO, Bruno. O papel do controle interno no combate à corrupção: A experiência da Controladoria-geral da União no Executivo Federal Brasileiro. Disponível em: http://versila.com/josealvaromoises/13746-1442-5-30.pdf. Acesso em: 21 de dezembro de 2014.

SANCHEZ, Francisco Fonseca Oscar. O controle da corrupção e reforma do estado. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ln/n52/a05n52.pdf. 10 de dezembro de 2014.

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Sobre o autor
Adeilton de Oliveira Alves

Graduado em direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN. Especialista em Direito Administrativo pela Universidade Estácio de Sá.

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