Como é de conhecimento geral, para resolução de algumas questões judiciais necessita-se de conhecimento técnico específico.
Para transportar este conhecimento técnico específico para o mundo jurídico inteligível, o Magistrado vale-se de um perito: pessoa idônea de confiança do Julgador com conhecimento suficiente para exercer o múnus.
Hodiernamente, a principal dificuldade da realização de uma perícia é o pagamento dos honorários do expert.
Na Justiça do Trabalho existem Tribunais Regionais que condicionam a realização da perícia ao depósito prévio dos honorários periciais, enquanto outros somente aprovam o pagamento após a realização da perícia pela parte sucumbente em seu objeto.
No TRT da 3ª Região, não se exige a antecipação dos honorários periciais.
A falta de exigência da antecipação de honorários periciais por quem requereu a perícia, acarreta por via de conseqüência, a necessidade do perito receber os honorários periciais (se receber) após a sentença da parte que sucumbiu no objeto da perícia conforme o Enunciado n.º 236 do TST (cancelado).
Este formato é de todo inviável, haja vista que se o objeto da perícia não for favorável ao Reclamante (na maioria das vezes sem condição econômica), o perito não receberá qualquer pagamento por seus serviços!!!
Afronta de morte o princípio constitucional da razoabilidade e as máximas de experiência (art. 335 do CPC) acreditar não ter o perito interesse no desfecho da causa, uma vez que a improcedência do pedido da perícia faria com que o mesmo não recebesse nenhuma contraprestação.
Esse entendimento é compartilhado pela jurisprudência:
"HONORÁRIOS PERICIAIS, DESCABIMENTO DE DISPENSA DE PAGAMENTO – Os benefícios da justiça gratuita concedidos ao Reclamante atingem as custas e demais despesas processuais, mas não aquelas decorrentes da atividade de particulares, mormente quando ele próprio reclamante requereu a realização de perícia. Entendimento contrário resultaria no absurdo de se estabelecer que o Perito só recebe honorários pelos serviços prestados quando decidir a favor do trabalhador, o que afetaria a imparcialidade do laudo. Ademais, há que se observar que o Obreiro não está assistido nos termos da dos termos das Leis n.º 1.060/50, alterada parcialmente pela de n.º 7.510/86. e art. 14 da Lei n.º 5.584/70. (TRT 23ª R. – RO 3767/99 – (1011/2000) – TP – Rel. Juiz Nicanor Fávero – DJMT 25.05.2000)
O juiz do TRT da 3ª Região, Darcio Guimarães de Andrade também entende que a forma de remuneração do Enunciado n.º 236 do TST (cancelado) pode levar à falta de imparcialidade do laudo pericial:
"Melhor dizendo, sendo o objeto da perícia desfavorável ao reclamante, o pagamento dos honorários periciais ficará a cargo dele, comprometendo, muitas vezes, o recebimento desta parcela, na medida em que a hipossuficiência pode ser fator de baixo arbitramento ou até mesmo de isenção destes honorários.
A partir daí, pode ocorrer favorecimento do objeto da perícia, em prol do obreiro, o que podemos apontar como um desvio de conduta ética por parte do perito oficial.
" [1].Também é importante salientar que um laudo pericial tendencioso pode levar a indução do Magistrado em erro e na ocorrência de uma injustiça conforme as palavras do culto Juiz do TRT da 3ª Região, Dárcio Guimarães de Andrade:
"O parecer enganoso pode ocasionar falsas informações, levando o Juiz a cometer erros, confiado no profissional que o elaborou". [2]
Soma-se também que alguns Reclamantes, estimulados pelo fato de saberem que o perito oficial não receberá seus honorários se não der a perícia favorável ao obreiro, fazem constar em sua inicial (quase com a mesma freqüência do pedido de citação da parte adversa) pedido envolvendo doença e/ou acidente de trabalho e/ou insalubridade e/ou periculosidade.
Desta forma, além de ter que suportar pesadíssimos encargos trabalhistas, uma legislação altamente protecionista ao empregado, risco de insucesso do empreendimento, falta de estabilidade econômica, arcar com pagamento de assistente técnico e advogados, excesso de proteção ao empregado, ainda se predispõe a ter uma perícia parcial caso não se disponha a pagar os honorários periciais (mesmo tendo certeza do descabimento do pleito).
Este formato de obrigação do pagamento de honorários periciais por quem sucumbiu no objeto da perícia afronta um dos mais sagrados pilares do Direito, o da "imparcialidade do Juízo e de seus auxiliares".
Desde a extinção da autotutela como meio de solução de conflitos e do surgimento do monopólio estatal na prestação jurisdicional, o mínimo exigido é a análise das questões postas em Juízo por Julgadores e auxiliares imparciais!!!
Desta forma, mostra-se que o antigo Enunciado n.º 236 é de todo inviável, somente transferindo o problema do Reclamante (falta de condições de arcar com a perícia) para o Reclamado (necessidade de pagar os honorários periciais sob pena de se deparar com laudos periciais tendenciosos), o que é inadmissível.
Como acreditamos vazia a crítica sem solução, entendemos que a criação do cargo de perito permanente (principalmente em áreas onde há grande demanda: médica e de engenharia do trabalho), seria altamente proveitosa para todos: Reclamante, Julgadores e Reclamados.
Seria altamente proveitoso para o Reclamante pelo fato de não necessitar de arcar com honorários periciais antecipadamente, pois em algumas regiões condiciona-se a realização da perícia ao depósito prévio dos honorários, favorecendo o acesso á justiça.
Também seria muito interessante para os Reclamados pelo fato de saberem que o perito não necessita dar a perícia favorável ao Reclamante para perceber seus honorários periciais, o que também se trata de acesso á justiça sob a ótica subjetiva do empregador.
Para o Julgador também restará o mesmo sentimento, haja vista que o expert já estará recebendo remuneração do Estado, independente do resultado de seu laudo, trazendo grande grau de imparcialidade.
Enquanto a criação do cargo de perito permanente não ocorre, a Jurisprudência e a doutrina devem procurar minimizar as injustiças.
O TST, verificando na prática a irrazoabilidade de deferir o pagamento de perícia pela parte sucumbente em seu objeto, cancelou por meio da Resolução 123/2003, o Enunciado n.º 236 que imputava a obrigação de pagamento da perícia à parte sucumbente.
Assim, entendemos que o dever de pagamento dos honorários periciais é da parte que requereu a diligência, não se podendo transferir o ônus do Reclamante para o Reclamado.
No entanto, aguardamos com esperança, o dia em que ocorrer a criação do cargo de perito judicial permanente.
Notas
1 ANDRADE, Dárcio Guimarães de. Ética na perícia judicial. TRT da 3ª Região, Belo Horizonte. Disponível em <http:/www.trt.gov.Br/Download/artigos/perito.rtf>.Acesso em 16 de abril de 2.004.
2 Idem.