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Empresários, políticos e seus familiares vão poder repatriar e legalizar dinheiro escondido no exterior, inclusive nos casos da Lava Jato

Agenda 14/10/2016 às 13:20

A nova lei sobre regularização de bens no exterior é descaradamente uma lavagem oficial de dinheiro, prevendo-se uma anistia penal ampla.

Está vencendo o prazo para que os delinquentes endinheirados (plutocracia criminosa) regularizem seus bens mandados para o exterior ilicitamente (em regra, para paraísos fiscais como Suíça, Bahamas, Panamá etc.). A lei de repatriação no Brasil foi aprovada em janeiro/16.

A repatriação de bens é algo corriqueiro na experiência internacional. Mudam as regras e as condições conforme cada país e cada momento histórico. Mas o direito penal, de qualquer modo, no mundo todo, trata as castas e os privilegiados de forma sempre diferenciada.

O governo já arrecadou com a regularização mais de R$ 7 bilhões de reais. A primeira lei que cuidou do tema já gerou muita polêmica, mas nada se compara em termos de despudor com o projeto de lei que está sendo discutido pelo novo bloco de poder (PMDB, PSDB, DEM etc.), que deve aprovar o novo texto com o possível apoio até mesmo do lulopetismo.

O corrupto lulopetismo caiu de paraquedas na presidência do clube das castas cleptocratas e lá permaneceu durante 13 anos (surrupiando o dinheiro público). Mas quem realmente mantém a linhagem escravocrata das regras do jogo da cleptocracia é o novo bloco de poder, que já tem mais de 500 anos de experiência na arte de roubar o dinheiro público e ficar impune.

Desse novo bloco de poder podemos esperar tudo, porque eles são institucionalmente mais fortes e moralmente tão depravados quanto os exploradores coloniais.

O que estão querendo aprovar?

  1. novo prazo para a regularização dos bens no exterior;
  2. uma equação fiscal mais favorável aos delinquentes, que pagariam menos impostos (menos que os 22% já previstos na lei vigente);
  3. revogação do artigo que proíbe a repatriação em favor de agentes públicos e políticos e seus familiares;
  4. mais flexibilização em relação à origem dos bens, o que permitiria repatriar ativos envolvidos inclusive com corrupção;
  5. isso afeta a Lava Jato intensamente (porque deixará de recuperar grande parcela do dinheiro desviado);
  6. a nova lei é descaradamente uma lavagem oficial de dinheiro, prevendo-se uma anistia penal ampla.

Por que todo mundo está querendo regularizar ativos ilícitos mandados para o exterior?

Porque os países estão fartos de tanta evasão fiscal e estão querendo controlar os trilhões de dólares que estão depositados em paraísos fiscais.

O Congresso brasileiro aprovou recentemente a Convenção Multilateral sobre Assistência Mútua Administrativa em Matéria Tributária, que foi assinada pelo Brasil durante Reunião de Cúpula do G-20, em Cannes, no ano de 2011.

A Convenção Multilateral constitui hoje o instrumento mais abrangente no âmbito da cooperação tributária internacional para combater a evasão fiscal e o planejamento tributário agressivo.

A entrada em vigor da Convenção permitirá ao Brasil o acesso a informações tributárias e financeiras de quase uma centena de países e jurisdições, com destaque para os modelos de intercâmbio automático de informações: o “Padrão para o Intercâmbio Automático de Informações Financeiras para Fins Tributários” (“Standard for Automatic Exchange of Financial Account Information in Tax Matters”), que permitirá à Receita Federal receber dados financeiros de interesse de todas as jurisdições signatárias, inclusive as de tributação favorecida; e o relatório de operações de grupos multinacionais (“Country by Country Reporting”), que incluirá as informações sobre as operações globais de tais grupos, sempre que possuam filiais no País (ver fazenda.gov.br).

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Assim, com a internalização da Convenção Multilateral, o Brasil estará ampliando a sua rede de intercâmbio de informações e fortalecendo sua imagem internacional quanto à transparência em matéria tributária, confirmando seus compromissos perante o G20 e o Fórum Global sobre Transparência e Intercâmbio de Informações para Fins Tributários (ver fazenda.gov.br).

A Associação dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Unafisco) ameaça acionar o Ministério Público e o Supremo Tribunal Federal (STF) caso o Congresso Nacional aprove a flexibilização da lei de repatriação que permite a regularização de dinheiro enviado ilegalmente ao exterior. Em nota de repúdio, a Unafisco classifica de desfaçatez a tentativa de parlamentares de aprovar mudanças na lei permitindo a redução da tributação que é cobrada pela Receita em troca da regularização do dinheiro não declarado.

Os políticos, se aprovarem o novo texto como anunciado, estarão legislando em causa própria. Estão aprovando uma lei de anistia penal em benefício deles mesmos (e de seus familiares). A imoralidade é evidente.

Considerando-se o total desprestígio dos políticos assim como a contaminação de todos os poros do corpo social pelos princípios da desorganização, da anomia e da anaxia, é evidente que sua postura deveria ser outra, se quisesse restabelecer o princípio de autoridade e da moralidade.

Em lugar de buscar mais confiança o Parlamento brasileiro distingue-se pela prática do mal vil, desprezível, pelo lodo, pela baixeza, pela degradação e pela corrupção. A imoralidade se espalha pelos quatro cantos, expondo em suas vísceras toda casta de vícios que exasperam a cada dia mais a indignação da população brasileira.

Se a sociedade civil nada fizer, novos desmandos vão se consumar. Restaria contar com o STF para julgar a inconstitucionalidade dessa lei de anistia. Mas o STF vai ter coragem de enfrentar as castas corruptas intocáveis?

Sobre o autor
Luiz Flávio Gomes

Doutor em Direito Penal pela Universidade Complutense de Madri – UCM e Mestre em Direito Penal pela Universidade de São Paulo – USP. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Jurista e Professor de Direito Penal e de Processo Penal em vários cursos de pós-graduação no Brasil e no exterior. Autor de vários livros jurídicos e de artigos publicados em periódicos nacionais e estrangeiros. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998), Advogado (1999 a 2001) e Deputado Federal (2019). Falecido em 2019.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GOMES, Luiz Flávio. Empresários, políticos e seus familiares vão poder repatriar e legalizar dinheiro escondido no exterior, inclusive nos casos da Lava Jato. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4853, 14 out. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/52461. Acesso em: 25 nov. 2024.

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