O filme Minority Report (2002) explora com maestria as contradições decorrentes da tentativa de impedir crimes antes que eles sejam cometidos. A idéia não é nova. De fato, isto já ocorreu no Brasil como noticiado no livro Estratégias da Ilusão, cuja resenha divulguei no GGN em 2013:
A reação policial à revolta de 1935 foi instantânea e brutal. “Como nas limpezas de 1925 e nas denúncias apresentadas perante o Tribunal de Segurança Nacional, as prisões eram determinadas por uma simples classificação de delito. Não é a realização do crime, mas a sua expectativa provável fundada na periculosidade construída sobre os delitos perpetrados anteriormente.” Mais adiante o autor detalha melhor o expediente policial: “É o currículo do antigo criminoso ou o potencial criminoso de um suspeito que determina a prisão. É o antigo sonho de uma lei penal que prevê e impede que o cidadão pratique o crime.” Esta tradição bem brasileira de punir sem processo, julgar sem instrução criminal e incriminar por suspeita poderia render bons filmes. Mas como estamos no Brasil, fomos obrigados a assistir o ator Tom Cruise encarnar o herói que se dedica a impedir que os crimes aconteçam como se isto fosse algo que ocorreria num futuro distante.
Volto ao assunto por causa da estranha sentença proferida pelo juiz Sérgio Moro no caso de um dos réus da Lava Jato. A condenação de Youssef a uma pena menor com restrição "ele fica impedido de cometer novos crimes num prazo de 10 anos" é uma evidente aberração jurídica.
Todos os homens são livres para agir. Nenhum deve deixar de arcar com as consequencias de seus atos. Aqueles que infringiram a Lei Penal devem ser denunciados, julgados e condenados em processo regular com direito de se defender e de produzir provas.
Não é possível impedir o crime antes que ele aconteça, pois a Lei Penal incide sobre fatos que aconteceram e não sobre aqueles que irão acontecer. Também é absurdo condenar alguém a não cometer novos crimes. Todo cidadão está sujeito ao risco de sofrer uma condenação injusta que pode ser revogada nas instâncias superiores. É por isto, aliás, que existe o duplo grau de jurisdição.
Sou advogado há 25 anos e nunca militei na área penal, mas creio ter aprendido o suficiente para concluir que Moro proferiu uma condenação inspirada no filme de Steven Spielberg. Em Minority Report, o réu preso antes de cometer o crime é colocado num estado de animação suspensa em que não poderá voltar a delinqüir. Esta é a idéia sugerida pela condenação imposta a Youssef.
O problema é que no Brasil ainda não existe nem legislação, nem prisão capaz de realizar o ideal desejado por Moro. Ao proferir esta decisão, portanto, o juiz demonstra ter perdido contato com a realidade. O Direito Penal do Inimigo deu lugar, portanto, ao Sci-Fi Movie Penal Law ensinado pelos norte-americanos nos cursos realizados por Moro nos EUA.
Só resta saber uma coisa. Moro já negociou os direitos de sua história com um produtor de cinema ou ele tem medo de ser processado por plágio?