INTRODUÇÃO
O Brasil é um país em que afloram as manifestações religiosas mais variadas, desde a religião católica de maior visibilidade social até as mais recônditas práticas de religião afro-brasileira. Associa-se a esta efervescência religiosa, que não é necessariamente maléfica, condições socioeconômicas adversas, criando um contexto propício ao acentuado crescimento numérico das instituições eclesiásticas. Se por um lado, atendem a demanda espiritual do povo, por outro aproveitam de condições de miséria, por meio de pregações de sugestionamento psicológico, para aferirem vultoso ganho financeiro.
Prevista na Constituição Federal, está a imunidade tributária sobre templos de qualquer culto, cuja finalidade consiste de tutelar a liberdade religiosa em um Estado declaradamente laico, embora vigore a opinião de ele não figura como rigorosamente laico, ou seja, trata-se de um estado concordatário. Ocorre que devido à vagueza semântica de termos tais como templo, culto e finalidades essenciais, o Estado acaba se cumpliciando com a ganância de líderes religiosos inescrupulosos que percebem nesta imunidade ótimas possibilidades de locupletação.
Há um entendimento majoritário de que tal imunidade tributária sobre os templos de qualquer culto enseja condição de direito individual e consequentemente é protegida pela rigidez característica das cláusulas pétreas. Por outro lado, apresenta-se como plausível do ponto de vista jurídico que o direito individual a ser mantido em sua incolumidade é relativo à liberdade de escolha religiosa, ou seja, a manutenção do principio de laicidade do Estado. A não ocorrência da imunidade tributária sobre os templos de qualquer culto não cerceia a liberdade do cidadão de expressar sua confissão religiosa.
Cabe ao Estado, repensar os resultados desta aplicação subjetiva de imunidade tributária religiosa e reavaliar se não seria mais producente tratar esta questão como sendo eminentemente econômica.
Este estudo, busca demonstrar que há injustiça fiscal e anacronismo social na aplicação subjetiva da imunidade tributária sobre templos de qualquer culto no Brasil.
CAPÍTULO 1 O SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL: ABORDAGEM DE TÓPICOS ELUCIDATIVOS
1.1 O Sistema Tributário Nacional
O Estado brasileiro, tal como concebido na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, arroga, como um dos aspectos de sua soberania, o poder de tributar o patrimônio de particulares de modo a custear o desempenho de funções estatais essenciais. A consecução dos objetivos de interesse público, por parte do Estado brasileiro, viabiliza-se na obtenção de recursos financeiros por meios de arrecadação tributária previstos no ordenamento jurídico. Sob a égide do Sistema Tributário Nacional, circunscrevem-se as práticas legais de tributação. Kiyoshi Harada define Sistema Tributário Nacional como
[...] conjunto de normas constitucionais de natureza tributária, inserido no sistema jurídico global, formado por um conjunto unitário e ordenado de normas subordinadas aos princípios fundamentais, reciprocamente harmônicos, que organiza os elementos constitutivos do Estado, que outra coisa não é senão a própria Constituição. (HARADA, 2010, pg. 303)
A idéia de sistema está relacionada a um conjunto de elementos dispostos de maneira organizada e regidos na sua totalidade por princípios harmônicos. As entidades políticas tributantes limitar-se-ão aos princípios tributários, limitadores do exercício da competência impositiva. Não é possível prescindir, em nenhuma medida, do Sistema Tributário Nacional sem incorrer em delito grave contra sua estrutura. Dada a sua importância, buscou-se resguardar legalmente toda a complexidade da matéria envolvida. Neste sentido, assevera o Professor Rodrigo Leal Teixeira:
O Sistema Tributário Nacional é analítico e exaustivo, devendo ser estudado pelos princípios específicos do Direito Tributário, que irão funcionar como diretrizes. Qualquer desrespeito a estes princípios se caracterizará como agressão máxima ao sistema. (TEIXEIRA, 2013, pg.17)
1.2 Tributos
Conforme se depreende do disposto no artigo 145 da Constituição Federal, a cobrança de tributos corresponde ao modo escolhido pelo Estado brasileiro para auferir compulsoriamente prestações pecuniárias, ou seja, recursos financeiros que custeiam suas atividades essenciais.
De acordo com Kiyoshi Harada, não há, por parte da doutrina, interesse prático em configurar uma conceituação de tributo, posto que o Código Tributário Nacional normatizou tal definição. Segundo ele “o conceito de tributo não é uniforme. Contudo, a doutrina em geral inclui em seu conceito o traço característico da coercitividade.” Conclui-se a partir de então que, coercitividade impõe-se como característica imprescindível ao Sistema Tributário do Estado cuja satisfação de necessidades essenciais se mostra tão definitivamente premente. Da coerência e eficiência arrecadadora do Estado depende a satisfação social. Se por um lado, o Sistema Tributário Nacional não se afirma em termos de mera sanha recolhedora de recursos, por outro não se priva de agir com austeridade dentro dos limites estabelecidos na Legislação Tributária. No próximo tópico serão explicitadas algumas elaborações conceituais a partir da análise do disposto no Código Tributário Nacional concernente a tributo que corroboram, respeitadas as divergências, a sobriedade tributária brasileira.
1.2.1 Definição
Este trabalho não tem como escopo nenhuma análise exaustiva de quaisquer aspectos, nem mesmo os selecionados como relevantes ao tema. Porem, sinteticamente busca-se compreender, em certa medida, o quanto o Sistema Tributário, a partir de sua própria definição, harmoniza-se com valores inerentes a dignidade humana imiscuídos na Constituição Federal. Pela definição oferecida pelo Código Tributário Nacional em seu artigo 3º “Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.”
Conclui-se por meio de uma revisão mais analítica que tributo se caracteriza pela:
1.2.1.1 Prestação pecuniária
O pagamento do tributo se efetiva através do dinheiro e conforme diz Kiyoshi Harada, “representando a obrigação de dar”. Embora o Código Tributário Nacional, em seu artigo 156, XI, ressalve a possibilidade de dação em pagamento de bem imóvel, de modo a promover a extinção do crédito tributário, via de regra, tal extinção se limita ao uso da moeda vigente. Cumpre ressaltar que esta “Dação em pagamento” referente a bem imóvel, depende de lei, não viabilizando, em principio, o pagamento de tributos por outra forma, senão a pecuniária.
1.2.1.2 Compulsoriedade
Conferiu-se à prestação do tributo, o caráter compulsório. Trata-se de um dever do contribuinte e, portanto, não sujeita a opções contratuais. O Estado impõe o tributo em sentido não voluntário buscando assegurar que cada contribuinte tenha participação em seu custeamento. Não há condescendência aos que tem o dever de contribuir segundo previsão legal. Não é possível permitir que apenas parte da sociedade arque com o financiamento permitindo o beneficio de outra parte omissa. Qualquer que incorrer em fato gerador estará obrigado à prestação compulsória.
1.2.1.3 Obrigatoriedade ex lege
O tributo detém natureza ex lege, ou seja, somente através da lei poderá ser cobrado. A Constituição Federal, em seu artigo 150, I, veda aos entes federativos a exigência ou majoração de tributos sem devida previsão legal. A lei válida, em sentido estrito, constitui instrumento idôneo no processo arrecadatório. Assevera Kiyoshi Harada que “o principio da legalidade tributária, por configurar um direito fundamental do contribuinte, é protegido pela cláusula pétrea, pelo que não é passível de supressão por emendas (artigo 60, §4°, IV, da CF).” (HARADA, pg. 358)
1.2.1.4 Caráter não sancionatório
O tributo não se apresenta ao contribuinte como sanção a ato ilícito e não pode ser confundido com multa. Seu pagamento se dá em virtude de o contribuinte incorrer em situação prevista em lei, que por sua vez, não pode ensejar ato ilícito como fato gerador. A lei não pretende promover o financiamento do Estado à custa de um conceito punitivo de tributo que inculque no cidadão a sensação de fardo. A proposta legal é que todos, segundo previsão legal, participem do custeamento. Esta democratização do custeio implica, inclusive, que, frutos de uma atividade ilícita podem ser objeto de tributação. O Código Tributário Nacional demanda a compreensão de que fato gerador deve ser interpretado abstraindo-se “da validade jurídica dos atos efetivamente praticados pelos contribuintes, responsáveis, ou terceiros, bem como da natureza do seu objeto ou dos seus efeitos;” (CTN, art. 118, I), ou seja, o que importa não é a validade do negócio. O STF fez uso do principio da pecunia non olet (dinheiro não tem cheiro) quando julgou o habeas corpus: HC 77530 RS. Evocou-se o principio da isonomia, pelo qual deve-se tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida de sua desigualdade. Diz a ementa:
Sonegação fiscal de lucro advindo de atividade criminosa: "non olet". Drogas: tráfico de drogas, envolvendo sociedades comerciais organizadas, com lucros vultosos subtraídos à contabilização regular das empresas e subtraídos à declaração de rendimentos: caracterização, em tese, de crime de sonegação fiscal, a acarretar a competência da Justiça Federal e atrair pela conexão, o tráfico de entorpecentes: irrelevância da origem ilícita, mesmo quando criminal, da renda subtraída à tributação. A exoneração tributária dos resultados econômicos de fato criminoso - antes de ser corolário do princípio da moralidade - constitui violação do princípio de isonomia fiscal, de manifesta inspiração ética. (DJ 18-09-1998 PP-00007 EMENT VOL-01923-03 PP-00522)
1.2.1.5 Cobrança mediante atividade administrativa vinculada
Não é possível que no ato de arrecadação tributária opere a discricionariedade da autoridade administrativa. É vedado ao agente publico qualquer margem de discrição, devendo este, portar-se de modo fidedigno ao mandamento legal “para a edição do ato do lançamento, que é a constituição do crédito tributário” (HARADA, 2010, pg. 305). Oportunidade e conveniência como elementos característicos aos atos discricionários não se visualizam aqui. Aprouve ao Estado, não apenas instituir por meio de lei, mas assegurar que tributos sejam recolhidos mediante atividade administrativa plenamente vinculada.
1.2.2 Natureza Jurídica
Posto que tributo seja gênero que comporta várias espécies, segundo enumera o próprio CTN em seu artigo 5°, sua natureza jurídica especifica será determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação. A atuação do poder público tributante condicionar-se-á ao exame do fato gerador, impedindo, deste modo, as exações fiscais, conforme assevera Kiyoshi Harada “baseadas em rotulagens e com vinculação do produto de suas arrecadações a determinados órgãos, fundos ou serviços” (HARADA, 2010, pg. 306). Depreende-se da leitura do artigo 4° do CTN que maior segurança foi dada aos contribuintes. Não é aceitável que impostos denominados taxas, escapando da rígida discriminação constitucional, se avolumem por mero capricho de arrecadação.
1.2.3 Espécies de tributos
Conforme anteriormente dito, tributo é gênero de que são espécies os impostos, as taxas e as contribuições de melhoria. Estas espécies tributárias estão previstas no CTN em seu artigo 5°, porém o STF atesta a existência de mais duas espécies tributarias, a saber: contribuições, com previsão no artigo 149 da CF e empréstimo compulsório, com previsão no artigo 148 da CF. Não se pretende conceituar tributos nesta seção de modo pormenorizado, apenas, por meio de conceituação simples, contribuir para o entendimento maior deste trabalho, ou seja, em termos gerais, a existência de harmonia com princípios de dignidade humana.
1.2.3.1 Imposto
Conforme de depreende da dicção do art. 16 do CTN, “Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte.” São exações não vinculadas à atividade estatal e compreende a função jus imperii do estado. Para o seu recolhimento, é necessário apenas que o particular realize fato gerador. Há uma lista taxativa de impostos na Constituição Federal. O detalhamento dos impostos bem como suas diversas classificações apresentadas pela doutrina não oferecem, neste ponto, oportuna relevância a este trabalho.
1.2.3.2 Taxa
Trata-se, segundo disposto no artigo 145, II da CF/88 e artigo 77 do CTN, de espécie tributária cujo fato gerador funda-se no exercício regular do poder de policia ou na utilização efetiva ou potencial, de serviço público especifico e indivisível prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição. Fundamentalmente, taxa e imposto se diferem no sentido de que aquela é tributo vinculado a uma atividade especifica ensejada pelo Estado. O imposto por sua vez é tributo desvinculado.
1.2.3.3 Contribuição de melhoria
Esta espécie tributária decorre de fato gerador fundado em valorização imobiliária decorrente de obra pública. Sendo assim, diz Eduardo de Morais Sabbag que “o critério prevalecente no tributo em comento é o critério da valorização, e não o do beneficio.” (SABBAG, pg. 43). A previsão deste tributo verifica-se tanto na Constituição Federal, artigo 145, III, como no Código Tributário Nacional, artigo 81, conforme citado abaixo.
Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: III - contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas.
Art. 81. A contribuição de melhoria cobrada pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, é instituída para fazer face ao custo de obras públicas de que decorra valorização imobiliária, tendo como limite total a despesa realizada e como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado.
1.2.3.4 Contribuições
Estas contribuições, em regra, somente a União pode instituir, excetuando as contribuições sociais previdenciárias do servidor, previstas na Constituição Federal, no parágrafo 1º do artigo 149 e a COSIP mencionada no artigo 149-A do mesmo diploma. Estas contribuições são gênero do qual fazem parte as seguintes espécies citadas no artigo 149 em questão:
- Contribuições sociais
- Contribuição de intervenção no domínio econômico – CIDE
- Contribuição de categoria profissional e econômica
- Contribuição para custeio de serviço de iluminação pública
1.2.3.5 Empréstimos Compulsórios
Tal espécie de contribuição federal, criada pela União, por lei complementar, está prevista no artigo 148 da Constituição Federal nos seguintes termos:
A União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos compulsórios:
I - para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência;
II - no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional, observado o disposto no art. 150, III, "b".
Parágrafo único. A aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório será vinculada à despesa que fundamentou sua instituição.
O tributo em questão, conforme se depreende do texto constitucional supracitado não se respalda em acordo de vontade, mas em fenômeno compulsório, carregando ainda, caráter distintivo, a saber, a restituibilidade. A sua natureza jurídica, segundo apresenta Eduardo de Morais Sabbag “portanto não é definida pelo seu fato gerador, como ocorre com as taxas, impostos e contribuição de melhoria, uma vez sendo tributo atrelado a uma finalidade especifica, de cunho emergencial ou urgente, portanto, tributo finalístico.” (SABBAG, 2003, pg. 87).
1.3 Competência tributária
Questão de relevância diz respeito ao modo pelo qual o tributo é inserido no ordenamento jurídico. Sinteticamente é plausível afirmar que tal inserção se verifica por meio da competência tributária, ou seja, a outorga de poder pela Constituição Federal aos entes federativos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) para que possam instituir ou majorar tributos. Cumpre salientar que somente os entes federativos detêm poder legislativo e tributos, por sua vez, somente podem ser instituídos por lei. Segundo leciona o Professor Rodrigo Leal Teixeira,
Competência tributária é um limite ao exercício do poder de tributar. É uma qualidade atribuída às pessoas de Direito Público para instituir prestações pecuniárias, nos limites da lei. É o poder para a instituição de determinado, atribuído pela Constituição a um ente político como forma de prestação e contra prestação, tendo, de um lado, o Estado como o prestador de serviços públicos aos indivíduos e a coletividade; e o cidadão como contribuinte. (TEIXEIRA, 2013, 23).
Segue algumas características da competência tributária que são relevantes para o discernimento da tese de que a arrecadação auferida pelo Estado promove a segurança do contribuinte de modo compatível com a dignidade humana. São citadas resumidamente nesta seção apenas para corroborar este entendimento.
1.3.1 Indelegabilidade
O Ente Federativo, de nenhum modo, transferirá sua competência tributária a outrem. Apesar de as funções administrativas de arrecadar, fiscalizar tributos e executar leis que compreendem a capacidade ativa tributária serem delegáveis, a competência tributária que consiste na criação, instituição e majoração de tributo é indelegável. Esta previsão encontra-se no CTN, artigo 7°.
1.2.3 Facultatividade
Desta característica, depreende que os Entes Federativos não estão obrigados a instituir os tributos, cuja competência tributária lhe foi atribuída pela Constituição Federal. O texto disposto no artigo 145 da CF assinala, pelo uso do verbo “poderão” que, à União, Estados, Distrito Federal e Municípios é facultada a instituição dos tributos. Isto posto, a doutrina diz que a competência tributária no Brasil é facultativa. Um exemplo que elucida este fato diz respeito ao Imposto sobre Grandes Fortunas – IGF, que sendo da competência da União ainda não foi instituído.
1.3.3 Incaducabilidade
Quer se dizer que o direito do Ente Federativo instituir o tributo pode ser exercido a qualquer tempo. Recordando o exemplo citado no tópico anterior, é preciso ressaltar que o fato de a União não ter instituído o IGF, em 1988, quando da promulgação da Constituição Federal, não lhe retira o direito de instituí-lo agora, passados mais de 20 anos.
1.3.4 Inalterabilidade
Por meio desta característica, assina-se que a competência tributária não pode ser alterada por lei infraconstitucional. A segurança advém ao contribuinte mediante ciência de que apenas uma emenda a própria Constituição poderá promover alteração.
1.3.5 Irrenunciabilidade
A competência tributária é irrenunciável. Equivale dizer que Ente Federativo não poderá, em nenhuma hipótese, renunciar sua competência tributária em favor de outro Ente. Conforme já mencionado exemplo anterior, é possível apenas o não exercício da competência. Destarte, o fato de a União não ter criado ainda o Imposto sobre grandes fortunas não confere o direito aos outros entes federativos de fazê-lo. Nisto consiste a competência irrenunciável.
1.4 Princípios De Direito Tributário
Comenta Kiyoshi Harada que “o legislador constituinte esculpiu o Sistema Tributário de forma completa, nada deixando à eventual colaboração do legislador ordinário.” (HARADA, 2010, pg. 358). Vê-se que, alem de ter constitucionalmente conferido ao contribuinte segurança decorrente das limitações ao poder de tributar, o legislador pautou-se pela observação de princípios tributários “visando à preservação do regime político adotado, à saúde da economia, ao respeito aos direitos fundamentais e à proteção de valores espirituais” (HARADA, 2010, pg. 358). Uma análise sintética destes princípios tem como objetivo demonstrar a proteção que conferem ao contribuinte, restringindo o Estado em seu poder de tributação. A doutrina comumente conhece esses princípios como limitações constitucionais ao poder de tributar.
1.4.1 Princípio da Legalidade
O principio da legalidade tributária se evidencia como extremamente relevante não apenas por estabelecer vedação de instituição ou majoração de tributos sem prévia autorização legislativa, mas, sobretudo por perseguir elaboração de uma ordem jurídico-tributária mais justa. Acentua Kiyoshi Harada que “A origem deste principio, de natureza nitidamente política, está ligada a luta dos povos contra a tributação não consentida, desde a idade média”. (HARADA, 2010, pg. 359). A previsão constitucional deste princípio se verifica no artigo 150, I da CF/88 e no principio genérico da legalidade presente na dicção do artigo 5°, II deste mesmo diploma legal:
Art.150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;
Art. 5º II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
1.4.2 Princípio da Isonomia
Associado ao principio genérico da igualdade de todos perante a lei, segundo prescreve o artigo 5° da CF/88, este principio veda o tratamento jurídico distinto aos contribuintes sob mesmas condições fatuais, objetivando inviabilizar qualquer privilégio ou favorecimento de quem quer que seja. Conforme ensina Kiyoshi Harada, do principio da generalidade da tributação infere-se o principio da igualização dos contribuintes do mesmo modo que do principio da legalidade infere-se isenção. Mesmo quando promove a isenção é mister obedecer ao principio da isonomia, posto que a lei não pode estabelecer tratamento diferenciado a pessoas que incorrem nos mesmos pressupostos fáticos sob pena de inconstitucionalidade. Prescreve a Constituição vigente:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;
1.4.3 Princípio da Irretroatividade
O principio da irretroatividade está previsto no artigo 150, III, alínea “a” da CF/88 e estabelece o seguinte:
Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
III - cobrar tributos:
a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;
Embora haja exceção prevista no CTN, confirmada pelo STF, a lei tributária não pode alcançar fatos pretéritos e não existe esta possibilidade na Constituição Federal. Mesmo em se tratando das exceções acatadas pelo STF, um exame superficial é suficiente para demonstrar que não absurdos jurídicos aptos a ensejar danos de qualquer natureza ao contribuinte.
1.4.4 Princípio da Anterioridade
Segundo este princípio, o tributo que for instituído ou majorado somente poderá ser exigido no próximo exercício financeiro e desde que tenham transcorrido noventa dias conforme o estabelecido no principio correlato da anterioridade nonagesimal. Veja as previsões constitucionais mencionada abaixo, respectivamente nas alíneas “b” e “c” do artigo 150, III, da CF/88:
Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
III - cobrar tributos:
b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou; (Vide Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)
É verdade que há, como frequentemente ocorre em Direito Tributário, exceções a este principio que se justificam em função de sua natureza emergencial. São exemplos que excetuam a regra, os empréstimos compulsórios requisitados em tempos de guerra e os impostos cujo controle sejam regulatórios de mercado. Entretanto, subsiste por este principio o impedimento de surpresas tributárias desastrosas ao contribuinte, ao sabor imediatista do legislador.
1.4.5 Princípio do não-confisco
Visto que o tributo não pode inviabilizar o direito de propriedade, dá-se a relevância deste principio disposto no art. 150, IV da CF. É bem verdade que o conceito de tributo confiscatório é um tanto subjetivo. Alem do mais, é fundamental que se estabeleça o cumprimento da função social da propriedade, daí, alguns tributos como o ITR ou mesmo o IPTU poderem ter alíquotas elevadas em determinados contextos. Quanto a este tema, diz o texto constitucional:
Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...)
IV - utilizar tributo com efeito de confisco;
Tal princípio decorre do direito de propriedade, que coíbe o confisco ao estabelecer prévia e justa indenização na desapropriação. Verifica-se, ainda, que a Constituição Federal ao tratar sobre o princípio do não-confisco em seu artigo 150, IV, refere-se, de modo expressamente limitado ao termo “tributo”, implicando dizer que, de acordo com a literalidade desse dispositivo constitucional, apenas os tributos devem respeitar o não-confisco. Nesse sentido, questiona-se se as multas estariam sujeitas ao princípio do não-confisco. Não se deve olvidar que mesmo em se tratando de multa tributária, esta não é tributo, mas sanção exigível pelo descumprimento de obrigação tributária. De qualquer maneira, o STF tem frequentemente demonstrado avesso às multas com caráter confiscatório, partindo do pressuposto de que devem ser baseadas em princípios de proporcionalidade e razoabilidade.
1.4.6 Princípio da Liberdade de Tráfego
Certamente, por meio deste principio, fica em evidencia a proteção da liberdade de locomoção constitucionalmente admitida no artigo 5°, LXVIII da CF/88. Expressa em seu artigo 150, V, a Constituição Federal:
Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
V - estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público;
Objetiva este princípio, segundo se depreende do exposto no artigo supracitado que,
a intermunicipalidade e a interestadualidade não poderão configurar-se fatos geradores de tributos (Federais, Estaduais ou Municipais). Dessa forma, aperceba-se de que o postulado se refere a todos os tributos, e não apenas a tributos Municipais ou Estaduais. (SABBAG, 2003, pg. 43)
A cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público constitui ressalva importante. Conforme assevera Eduardo de Morais Sabbag, tal importância se justifica “haja vista o fato de ser gravame exigido pela utilização ou conservação das rodovias, e não pela mera transposição de Município ou Estado.” (SABBAG, 2003, pg. 43)
1.4.7 Princípio da uniformidade Geográfica
Em consonância com os demais princípios de Direito Tributário, este, segundo prescreve o artigo 151, I da CF/88, veda a União de
instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional ou que implique distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento de outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a promover o equilíbrio do desenvolvimento sócio-econômico entre as diferentes regiões do País;
Certamente não carrega grande complexidade em seu significado, mas constitui-se de tamanha importância, posto que ao preconizar a mesma alíquota em todo território nacional não fere o “Principio Constitucional da Uniformidade Tributária, corolário do Principio do Federalismo de Equilibrio, vigente em nosso território, como cláusula pétrea” (SABBAG, 2003, pg. 44). É importante ressaltar que é cabível tratamento diferenciado entre os entes federativos em se tratando de incentivos fiscais, o que é perfeitamente harmonioso com a máxima: tratar desigualmente os desiguais na medida de sua desigualdade.
1.4.8 Princípio da Capacidade Contributiva
A justiça fiscal, provavelmente seja o objetivo mais imediato na observação deste principio. A existência do tributo se justifica no custeamento das necessidades públicas essenciais tuteladas pelo Estado e para tanto se submete ao principio da justiça social. Os tributos são graduados conforme a capacidade econômica dos contribuintes, de modo que, paga-se mais quem aufere maior renda. O Imposto de Renda serve de amostra para este principio quando estabelece desde a isenção até a alíquota de vinte e sete por cento da renda do particular. O texto constitucional a este respeito, no artigo 145, parágrafo primeiro, assinala:
Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.
O STF entende que o principio da capacidade contributiva deve ser verificado nas demais espécies tributárias sob pena de violar o principio da isonomia. Embora o disposto constitucional em questão fale apenas em impostos, este principio é aplicável a todas as outras espécies de tributo.
A expressão usada “sempre que possível” remete ao fato de que tal princípio sempre será observado. É tarefa complexa a aplicação do principio da capacidade contributiva ao caso dos impostos indiretos, uma vez que, geralmente valores são repassados ao consumidor final. Contudo, o Estado aplica também, no caso dos impostos indiretos, o principio em questão. Quem compra um barco de luxo certamente incorrerá, comparativamente, em maior carga tributária sobre veículos automotores.
1.4.9 Princípio da Proibição das Isenções Heterônomas
Segundo o que se depreende deste principio, a União não pode conceder isenção a tributos que não estejam em seu âmbito de competência tributária, ou seja, não pode conceder isenção para tributos estaduais ou municipais, sob pena de violar o princípio do pacto federativo. A concessão de isenção de determinado tributo somente se viabiliza se Ente Federativo tiver competência para sua instituição. Assim confirma o artigo 151, III da CF/88.
CAPÍTULO 2 IMUNIDADE TRIBUTÁRIA AOS TEMPLOS DE QUALQUER CULTO
2.1 Imunidade Tributária
A Imunidade diz respeito ao Tributo, ou seja, gênero do qual são partes as espécies tributárias (imposto, taxa, contribuição de melhoria, contribuições e empréstimos compulsórios). Trata-se de equívoco comumente experimentado, pensar em imunidade tão somente no âmbito dos impostos. A partir do conceito de Imunidade Tributária, melhor abordado na seção: 2.2.1 Conceito e natureza jurídica, vê-se que o próprio legislador empregou erroneamente o termo na Constituição como se pode verificar no artigo 195, §7° que diz: “São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei.” O texto constitucional mencionado, além de outros exemplos, faz menção de imunidade em relação à contribuição social, o que por sua vez demonstra que imunidade tributária não se circunscreve apenas a impostos.
Classifica-se, em termos doutrinários, a imunidade tributária em dois grupos genéricos, a saber, o das imunidades específicas e o das imunidades genéricas. O primeiro é relativo a determinado tributo, como é o caso do mencionado no artigo 195, §7°, e o segundo alcança exclusivamente os impostos. Detalhes desta classificação serão avaliados na seção espécies de imunidade.
Conforme elabora Eduardo de Morais Sabbag, “as imunidades representam uma delimitação negativa da competência tributária”. (SABBAG, 2003, pg. 47). A Constituição Federal delimitou expressamente a competência tributária e bem afirma, neste sentido, Rodrigo Leal Teixeira: “É certo que a competência tributária é esquematizada também por normas negativas, que o Sistema brasileiro denominou de imunidades tributárias”.
Faz-se mister nesta seção, antes de uma compreensão mais analítica, que se estabeleça distinção entre imunidade, isenção e não incidência. Resumidamente pode-se propor a seguinte definição:
- Não-incidência – o fato não corresponde à descrição legal com perfeição, de modo a não configurar a tipicidade. Eduardo de Morais Sabbag oferece a seguinte definição: “é a ausência de subsunção do fato imponível ao conceito descrito na hipótese de incidência” (SABBAG, 2003, pg. 47).
- Isenção – a autoridade legislativa evita que o sujeito passivo da obrigação tributária seja submetido ao tributo, ou seja, a lei determina que certas situações ou determinados sujeitos não serão tributados, portanto, evita-se o lançamento. Geralmente, segundo previsão do artigo 178 do Código Tributário Nacional, a regra prevista legalmente pode ser revogada ou modificada por lei, salvo se tratar de isenção onerosa, ou seja, aquela concedida por prazo determinado e sob certas condições. O objetivo neste caso é a preservação da segurança jurídica. Visto que isenção está prevista na lei, estabelece-se que somente poderá ser interpretada literalmente.
A isenção tributária, capitulada no Código Tributário Nacional, como uma modalidade excludente do credito tributário (art. 175), representa a vontade do legislador de particularizar uma determinada atividade econômica dentre as outras que integram a norma tributaria, configurando-se a redução da carga tributaria em uma subvenção, em dinheiro, concedida de maneira indireta. O mecanismo que se estabelece, em ultima analise, é através da função extrafiscal, em que, adequando a carga tributaria, o legislador protege determinado segmento ou resolve problemas sociais e econômicos dos menos capazes de contribuir. (CALMON; COELHO, 1990, pg. 455).
- Imunidade – Embora o conceito e natureza jurídica de imunidade tributária serão melhores analisados no próximo tópico, cumpre aqui, sinteticamente mencionar a distinção conforme estabelece Eduardo de Morais Sabbag: “Imunidade é uma não-incidência constitucionalmente qualificada. É o obstáculo, decorrente de regra da Constituição, à incidência de tributos sobre determinados fatos ou situações.” (SABBAG, 2003, pg. 48)
2.1.1 Conceito e natureza jurídica
Em termos conceituais, Eduardo de Morais Sabbag afirma que imunidade é “instituto de sede constitucional de pagamento de tributo” (SABBAG, 2003, pg. 52). Segundo a conclusão que se propõe neste trabalho, cumpre dizer que há determinadas áreas de competência nas quais não poderá incidir tributação. Assevera Eduardo de Morais Sabbag que “são áreas de incompetência tributária, delimitadoras de zonas de intributabilidade”. (SABBAG, 2003, pg. 47).
Yoshiaki Ichihara assinala:
A imunidade é uma norma constitucional expressa, na qual determina a incompetência das pessoas de Direito Público detentor da competência tributária. A norma constitucional da imunidade atua dentro do campo da competência, delimitando negativamente e estabelecendo os contornos das normas atributivas da competência tributária. Fixa o limite da abrangência tributária, não se confundindo com não-incidência, proibição, vedação ou exclusão, pois possuem natureza jurídica e características próprias. E por fim as imunidades tributárias são espécie do gênero limitações constitucionais ao poder de tributar. (ICHIARA, 2000, 173)
Uma vez compreendido que o texto constitucional tem, entre outros, o objetivo de vedar, segundo se depreende do artigo 150, VI, a imposição de impostos a pessoas, bens ou fatos representativos, afirma Rodrigo Leal Teixeira:
Ao afirmar que a imunidade tributária tem como a natureza jurídica a própria Constituição, pode se afirmar, consequentemente, que a imunidade é uma norma constitucional de interesse nacional. Portanto, tais imunidades funcionam por meio das limitações constitucionais, sendo especificas ao reduzir os tributos a certas pessoas, matérias ou fatos, colocando-os fora da tributação, sendo sempre ampla e individual, não comportando fracionamentos. (TEIXEIRA, 2013, pg. 27)
2.1.2 Espécies de Imunidade
Conforme sucintamente já se falou, existem duas classificações gerais de imunidade, a saber, as imunidades específicas que decorrem de alcance a um determinado tributo e as imunidades genéricas que por sua vez, estão relacionadas a vários tipos de impostos. É pertinente ressaltar que quaisquer pessoas que desfrutam desta imunidade genérica não estão excluídas da responsabilidade contributiva em relação às demais espécies tributárias. Objetiva-se nesta seção apresentar apenas uma abordagem sintética das imunidades genéricas, posto que são especificamente contributivas ao escopo deste trabalho.
2.1.2.1 Recíproca
Os entes federativos simplesmente não podem cobrar impostos entre si. A União, por exemplo, não paga IPTU dos seus imóveis ao município. O STF entende que os entes federativos não pagam nenhum imposto que possa vir onerá-los, não importa qual seja a sua incidência. Esta imunidade está prevista na alínea “a” do artigo 150, VI, da Constituição Federal que assinala:
Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
VI - instituir impostos sobre:
- patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;
A imunidade recíproca se estende a mais duas pessoas segundo dispõe o artigo 150, 2°, III da CF/88, a saber: autarquias e fundações públicas desde que cumpram quatro requisitos cumulativamente previstos no disposto constitucional. São eles:
- Cumprimento de funções essenciais
- Instituição e manutenção pelo poder público
- Não estipulação de preço ou tarifa
- Abstenção de concorrência privada.
2.1.2.2 Templos de qualquer culto
De modo pormenorizado, esta imunidade será abordada em seção específica, uma vez que está estritamente ligada ao objetivo geral deste trabalho. Aqui, cumpre apenas mencioná-la. Discutir-se-á oportunamente, a respeito do objetivo geral da imunidade tributária, qual seja, a preservação da liberdade religiosa; da abrangência do seu alcance (templos e atividades essenciais) bem como a posição do Supremo Tribunal Federal e jurisprudência.
Esta espécie de imunidade genérica está prevista na alínea “b” do artigo 150, VI, da Constituição Federal que assinala:
Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
VI - instituir impostos sobre:
- templos de qualquer culto;
2.1.2.3 Subjetiva
O termo imunidade subjetiva se justifica ante o fato que se aplica a pessoas. Esta imunidade está prevista na alínea “c” do artigo 150, VI, da Constituição Federal e que assinala:
Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
VI - instituir impostos sobre:
- patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;
As pessoas que são contempladas pela Imunidade Subjetiva precisam atender cumulativamente três requisitos presentes no artigo 14 do Código Tributário Nacional, a saber:
- Não distribuição de lucros;
- Não remessa de valores ao exterior;
- Manutenção em dia dos livros contábeis. Hoje se compreende que trata de todas as obrigações acessórias. São deveres formais que o sujeito passivo está obrigado para facilitar a fiscalização.
Os partidos políticos, além dos requisitos comuns as outras três pessoas, devem cumprir mais dois requisitos:
- Devida inscrição no Superior Tribunal Eleitoral
- Observância aos princípios e costumes do Estado brasileiro.
2.1.2.4 Objetiva
O termo imunidade objetiva se justifica ante o fato que se aplica neste caso, não a pessoas, mas coisas. Equivale dizer que livros, jornais, periódicos e papel destinado a sua impressão não estão sujeitos a incidência de impostos tais como: Imposto sobre Produto Industrializado, Imposto sobre Importação e sobre Exportação, se for o caso. A condição imprescindível a imunidade objetiva diz respeito a necessária transmissão de pensamento (idéias formalmente orientadas). O objetivo é claramente a divulgação de cultura, educação e informação. Uma vez que a Constituição Federal não delimitou a matéria, o conteúdo do livro não interessa, podendo, inclusive material de cunho pornográfico ser imune a tributação. Embora o único insumo mencionado no texto constitucional seja o papel, o Supremo Tribunal Federal já se manifestou favorável a imunidade tributária de filmes e papeis fotográficos. Esta imunidade está prevista na alínea “d” do artigo 150, VI, da Constituição Federal que assinala:
Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
VI - instituir impostos sobre:
- livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.
2.2 Imunidade aos templos de qualquer culto
2.2.1 Objetivo geral: preservação da liberdade religiosa
Surge a questão: qual é a razão finalística da imunidade aos templos? Por qual motivo, pretendeu o Legislador conferir imunidade religiosa aos templos de qualquer culto? Por que foi ela incluída no âmbito das limitações do poder de tributar do Estado? Sendo verdade que, imunidade é uma garantia fundamental, uma cláusula pétrea que não pode ser revogada e no que se refere à interpretação, está sujeita a todo método interpretativo utilizado no ordenamento jurídico, inevitavelmente conclui-se pela relevância deste tema. Segundo se pode inferir do artigo 5°, VI, VII e VIII da Constituição Federal, há uma correlação necessária com a liberdade religiosa. Constitui-se de peculiar importância o texto constitucional em questão:
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva;
VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;
Controvérsias à parte, laicidade constiui-se característica fundamental da idealização do Estado Brasileiro e, conforme expõe Eduardo de Morais Sabbag, “com esta regra imunitória, o legislador pensou em beneficiar a religiosidade” ampliativamente, desde que o discurso religioso apregoado “seja consentâneo com os bons costumes.” Há na Constituição Federal, dispositivos diversos, cuja essência, supõe-se ser, por sua natureza, balizamento genérico aos discursos e as liberdades religiosas no País. A simples leitura dos artigos constitucionais abaixo está apta a introjetar no consenso jurídico, em termos gerais, a noção de que valores religiosos não devem antagornizar-se aos valores orientadores de dignidade humana previstos na Constituição Federal.
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
III - a dignidade da pessoa humana;
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:
II - prevalência dos direitos humanos;
VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo;
Diz Kiyoshi Harada que “essa imunidade visa à proteção dos valores espirituais. A religiosidade do povo brasileiro é um de seus traços característicos”. (HARADA, 2010, pg. 371). Confirma esta tese o fato de que invocação a proteção de Deus é matéria recorrente no preâmbulo das várias Constituições que o Brasil já teve, inclusive no da atual:
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL
2.2.2 Abrangência: templos e atividades essenciais
A imunidade tributária aos templos de qualquer culto está expressamente delineada no texto constitucional, na alínea “b” do artigo 150, VI que diz:
Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
VI - instituir impostos sobre:
- templos de qualquer culto;
Pertinente torna-se a questão da abrangência da vedação tributária de impostos aos templos de qualquer culto. Quanto ao imposto como espécie tributária, objeto desta imunidade genérica, já não se faz necessário mais esclarecimentos, porém, qual é de fato o alcance da imunidade pretendida pelo legislador constituinte, quando emprega a palavra “templo” e a expressão “de qualquer culto”? De acordo com o entendimento de Eduardo de Morais Sabbag “a imunidade atingirá o templo e seus anexos (exemplo: casa paroquial, casa do Pastor, do Rabino etc.)” (SABBAG, 2003, 52). Kiyoshi Harada, de modo mais analítico observa que:
A expressão templos de qualquer culto abrange não só o edifício onde se realiza a prática religiosa, como também o próprio culto, sem qualquer distinção de ritos. Aliomar Baleeiro inclui na imunidade o convento, os anexos, inclusive a residência do pároco ou pastor, assim como a embarcação, o avião ou o veículo utilizado como templo móvel exclusivamente para a prática do culto. (HARADA, 2010, pg. 371)
Alem do texto constitucional da alínea “b” do artigo 150, VI, já mencionado, cumpre citar o parágrafo quarto deste mesmo artigo, uma vez que lança mais luz a respeito da abrangência desta imunidade pretendida pelo legislador. Diz o texto em questão:
§ 4º - As vedações expressas no inciso VI, alíneas "b" e "c", compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas.
Parece inevitável a compreensão de que tudo o que estiver em nome da instituição religiosa e cumprir a sua finalidade essencial não está sujeito ao pagamento de impostos, ou seja, não apenas o templo deverá ser tutelado. No tocante a abrangência da imunidade tributária aos templos religiosos relacionada a atividades essenciais, comenta Eduardo de Morais Sabbag:
Deve-se enaltecer que a regra imunizadora abarcará a atividade essencial da difusão de religiosidade, consoante ao §4° do art. 150 da CF/88. Portanto, a propriedade rural adquirida pela igreja e utilizada para retiros espirituais estará protegida pelo manto da regra imunizante. Por outro lado, se tal gleba rural for destinada à criação de animais ou plantações, será devido o ITR. (SABBAG, 2003, pg. 52)
2.2.3 Posição do Supremo Tribunal Federal e Jurisprudência
Reveste de fundamental importância para o tema, o posicionamento assumido pelo Egrégio Superior Tribunal Federal. Este defende a necessidade de aplicação de uma teoria ampliativa, conforme comenta Eduardo de Morais Sabbag, “não restritiva quanto à extensão dos efeitos imunitórios a atividades estranhas a difusão de religiosidade que venham a ser exercidas pelas entidades religiosas”.
RE 144.900-SP, Rel. Min. Ilmar Galvão, 22.04.97; RE 218.503-SP, Rel. Min. Moreira Alves, 21.09.99: O STF considerou alcançados pela imunidade serviços não enquadrados em suas atividades essenciais, quando a receita destes serviços destine-se ao financiamento daquelas atividades, afastando a incidência do ISS sobre serviço de estacionamento de veículos prestado por hospital em seu pátio interno;
Apregoa o STF que, deverá ser promovida a extensão da regra imunizante, conferida a Igreja, bem como às atividades diversas por ela exercidas, desde que se cumpram os requisitos, abaixo mencionados por Eduardo de Morais Sabbag:
1) prova de que as rendas oriundas de atividades outras, não essenciais, são aplicadas integralmente na consecução dos objetivos institucionais (difusão da religiosidade); 2) prova de que não há ofensa à livre concorrência. Exemplo: Imunidade ao bem locado de propriedade da igreja- estende-se a imunidade ao bem, desde que prove tratar-se de uma unidade locada, e não duas, três ou centenas delas. (SABBAG, 2003, pg. 53)
A questão, segundo elabora Sabbag, diz respeito à preservação dos princípios da isonomia e da livre concorrência. Caso a igreja possua centenas de imóveis locados e ainda assim se beneficie da imunidade, de que forma pode-se falar em justiça tendo em vista o que está disposto no artigo 170, IV associado ao disposto no artigo 173, §4° da Constituição Federal?
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
IV - livre concorrência;
Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.
§ 4º - A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.
Observando-se a jurisprudência abaixo citada, pode-se ter uma compreensão melhor a respeito do entendimento do Supremo Tribunal Federal no que concerne ao bem locado. Este entendimento é, inclusive, ratificado pela Súmula 724 deste mesmo tribunal que diz: “Ainda quando alugado a terceiros, permanece imune ao IPTU o imóvel pertencente a qualquer das entidades referidas pelo art. 150, VI, c, da Constituição, desde que o valor dos aluguéis seja aplicado nas atividades essenciais de tais entidades.”
CAPÍTULO 3 PROBLEMÁTICA DA APLICAÇÃO SUBJETIVA DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA AO CULTO E SUAS FINALIDADES ESSENCIAIS
3.1 Imunidades tributárias como garantia dos direitos fundamentais
Entende-se fundamentalmente importante a discussão quanto ao prestígio das imunidades tributárias frente aos direitos fundamentais. A suposição de que as imunidades tributárias são direitos fundamentais e por isso ensejam condição de cláusula pétrea impõe conseqüências funestas a sociedade. Deve-se reavaliar se o direito individual a ser tutelado é a liberdade condizente com um país laico ou se trata de imunidade tributária.
3.1.1 Conceito de direitos fundamentais
Existem posicionamentos diversos sobre a correlação existente entre direitos humanos e direitos fundamentais. Há os que afirmam haver entre ambos uma identificação semântica e os que acatam designações distintas. Rodrigo Leal Teixeira expõe sua compreensão nos seguintes termos:
Apesar de vários autores considerarem que “direitos humanos” e “direitos fundamentais” se confundem, a nosso ver a expressão direitos humanos é usada para designar o momento em que estes surgiram ou foram reconhecidos pela comunidade humana. Relaciona-se mais próximo de posições filosóficas e históricas e da expressão direitos fundamentais para marcar a positivação, a constitucionalização desses direitos. Direitos fundamentais nascem a partir da sua institucionalização, do reconhecimento pelas legislações positivas de direitos considerados inerentes à pessoa humana. (TEIXEIRA, 2013, pg. 34).
Perfilhando este raciocínio, acata-se a idéia de direitos fundamentais a partir de sua positivação em determinado ordenamento jurídico ao passo que direitos humanos designam elementos conceituais constitutivos da condição humana. Seguindo este entendimento, comenta José Joaquim Gomes Canotilho:
As expressões direitos do homem e direitos fundamentais são frequentemente utilizadas como sinônimas. Segundo a sua origem e significado, poderíamos distingui-las da seguinte maneira: direitos do homem são direitos válidos para todos os povos e em todos os tempos; direitos fundamentais são os direitos do homem, jurídico-institucionalmente garantidos e limitados espacio-temporalmente. Os direitos do homem arrancariam da própria natureza humana e daí seu caráter inviolável, intertemporal e universal; os direitos fundamentais seriam os direitos objetivamente vigentes numa ordem jurídica concreta. (CANOTILHO, 1998, pg. 259).
Conclusivamente, deve-se asseverar nesta seção, pelo entendimento de que direitos fundamentais, conforme expõe Rodrigo Leal Teixeira, “apenas surge para a humanidade quando estes são positivados por um ordenamento jurídico específico, geralmente garantidos em normas constitucionais frente a um Estado.”
3.1.2 – imunidades tributárias como cláusulas pétreas
Em sua dissertação de mestrado, apresentada ao Curso de Pós-Graduação da Universidade FUMEC, de modo um tando perquiridor, Rodrigo Teixeira Leal suscita a seguinte questão: “Existem direitos fundamentais em todos os países, e em poucos lugares se concedem imunidade às entidades religiosas. Sob esta ótica, somente esses países que concedem tais privilégios estão respeitando esses direitos?” (TEIXEIRA, 2013, pg, 37). Torna-se premente discutir a questão das imunidades como sendo ou não cláusulas pétreas.
Desde tempos remotíssimos, conforme narra Fustel de Coulanges em sua conhecida obra: A Cidade Antiga, que homens empreendem aguerridamente a conquista por direitos fundamentais enaltecedores da dignidade humana. Revela a historia da humanidade, que em épocas de consciências bastante primitivas, o homem já trazia como um constitutivo essencial de sua humanidade, a capacidade de transcender, de extrapolar limites, de suplantar paradigmas, enfim, de alcançar o pedestal de justiça, tal como vislumbramos hoje.
Na Constituição Federal vigente, os direitos fundamentais relativos à dignidade humana são desdobramentos de lutas árduas, de reflexões que ao longo de anos se materializaram gradativamente como lei positivada. O texto constitucional, no artigo 5°, inciso VI, da Constituição Federal, diz que:
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
Conforme se vê, nitidamente exposto está o principio da liberdade de crença, da liberdade de culto, da liberdade de liturgias e de organização religiosa, e salienta Rodrigo Leal Teixeira, liberdades “insertas no catálogo constitucional das liberdades públicas” (TEIXEIRA, 2013, pg. 32). Duas ponderações são apresentadas pelo autor, a saber:
- Laicidade do Estado – Na primeira Constituição Republicana de 1891, o Brasil assumiu a condição de estado laico, deste modo abolindo formalmente a idéia de religião oficial. Fica assim caracterizado que a subjetividade religiosa se restringe ao âmbito de escolha pessoal dos cidadãos. A radicalidade com a qual esta matéria foi tratada pelo legislador pode ser percebida no artigo 19, inciso I da Constituição Federal.
É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;
- Poder de policia – este é o teor da parte final do inciso VI, do artigo 5° supracitado. Na forma da lei, incumbe ao Estado garantir a proteção aos locais de culto e suas liturgias. Trata-se do poder de policia do Estado sobre os locais de encontro religioso, ou seja, a concessão de licenças de funcionamento, inspeção de normas de segurança, registros, entre outros. Proteção as suas liturgias implica em preservação, no espírito de laicidade, das exteriorizações ritualísticas da religiosidade subjetiva.
A questão de extrema relevância, tal como apresentada por Rodrigo Leal Teixeira, fundamenta-se sobre a intensidade de prestigio constitucional das imunidades, ou seja, no que tange a procedência ou não de sua qualificação como cláusula pétrea. A aferição da relevância temática das cláusulas pétreas é proporcionada pela própria Constituição Federal ao impor, no contexto da significativa rigidez ao processo legislativo de emenda constitucional, o fundamento da preservação de disposições constitucionais relativas ás garantias fundamentais. Consoante ao conceito de rigidez da Constituição Federal, Luiz Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Júnior, dizem que:
A Constituição que exige para sua alteração um critério mais solene e difícil do que o processo de elaboração da lei ordinária. Exemplo de Constituição rígida é a brasileira. Essa rigidez pode ser verificada pelo contraste entre o processo legislativo da lei ordinária e da emenda constitucional. Enquanto aquele se submete as regras da iniciativa geral (artigo 61 da CF) e a aprovação por maioria simples, a outra reclama iniciativa restrita (artigo 60 da CF) e aprovação por maioria qualificada de três quintos. Vê-se, por esse e por outros aspectos, que é muito mais fácil aprovar uma lei ordinária do que uma emenda constitucional. (ARAUJO; NUNES JÚNIOR, 2005, pg. 4)
O significado de cláusula pétrea é depreendido do próprio texto constitucional. Ao tratar do processo de emenda a Constituição, o legislador acaba por demonstrar a sua intenção de que as chamadas cláusulas pétreas deveriam ser preservadas de alteração por parte do Poder Constituinte Derivado Reformador. As disposições que exprimem garantias fundamentais, ao serem reputadas como cláusulas pétreas, inviabilizam quaisquer transformações. O artigo 60, caput e incisos I, II, e II elucidam sobre a rigidez das emendas e o parágrafo IV, por sua vez, a significação de cláusula pétrea:
Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal;
II - do Presidente da República;
III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros.
§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais.
“Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir os direitos e garantias individuais” (CF/88, art. 60, §4°). Da compreensão desta disposição constitucional depende fundamentalmente o escopo deste trabalho, ou seja, a admissão ou não do enquadramento das imunidades tributárias aos direitos e garantias individuais. Alguns posicionamentos doutrinários favoráveis e desfavoráveis serão apresentados a seguir.
3.1.2.1 Argumentação favorável
Há alguns doutrinadores que sustentam que as imunidades tributárias são clausulas pétreas, tais como Roque Antônio Carraza que afirma: “Em termos mais precisos, o direito a imunidade é uma garantia fundamental constitucionalmente assegurada ao contribuinte, que nenhuma lei, Poder ou autoridade pode anular”. (CARRAZA, 2008, pg. 710). Ricardo Alexandre afirma que:
Boa parte das limitações constitucionais ao Poder de tributar está protegida contra mudanças que lhe diminuam o alcance ou a amplitude, por configurarem verdadeiras garantias individuais ao contribuinte. [...] A imunidade denominada religiosa protege a liberdade de culto que é um direito individual. (ALEXANDRE, 2009, pg. 99 – 100)
Assevera José Maior Borges:
Sistematicamente, através da imunidade resguardam-se princípios, idéias-força ou postulados essenciais ao regime político. Consequentemente, pode-se afirmar que as imunidades representam muito mais um problema do Direito Constitucional do que um problema do Direito Tributário. Analisado sob o prisma do fim, objetivo ou escopo, a imunidade visa assegurar certos princípios fundamentais ao regime, a incolumidade de valores éticos e culturais consagrados pelo ordenamento constitucional positivo e que se pretende manter livre das interferências ou perturbações da tributação. (BORGES, 1980, pg. 185).
Regina Helena Costa apresenta sua argumentação do seguinte modo:
[...] quando a exoneração tributaria é outorgada por uma Constituição, pretende-se seja perene. Se a constituição é rígida, tal perenidade está assegurada em termos mais consistentes, diante do maior grau de dificuldade estabelecido para sua modificação. [...] No caso da Constituição Brasileira, no que tange as imunidades tributarias, a rigidez constitucional atinge seu grau máximo. Isto porque as normas imunizantes são cláusulas pétreas, autênticas limitações materiais ao exercício do Poder Constituinte Derivado. (COSTA, 2006, pg. 68).
O Supremo Tribunal Federal acolheu o entendimento de que, conforme comenta Rodrigo Leal Teixeira, “há vinculação das imunidades tributárias com os direitos fundamentais, donde resulta a impossibilidade da retirada dessas garantias constitucionais do Texto de 1988”.
Data de publicação: 18/03/1994
Ementa: - Direito Constitucional e Tributário. Ação Direta de Inconstitucionalidade de Emenda Constitucional e de Lei Complementar. I.P.M.F. Imposto Provisorio sobre a Movimentação ou a Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira - I.P.M.F. Artigos 5., par.2., 60, par.4., incisos I e IV, 150, incisos III, b, e VI, a, b, c e d, da Constituição Federal. 1. Uma Emenda Constitucional, emanada, portanto, de Constituinte derivada, incidindo em violação a Constituição originaria, pode ser declarada inconstitucional, pelo Supremo Tribunal Federal, cuja função precipua e de guarda da Constituição (art. 102 , I , a , da C.F. ). 2. A Emenda Constitucional n. 3 , de 17.03.1993, que, no art. 2 ., autorizou a União a instituir o I.P.M.F., incidiu em vício de inconstitucionalidade, ao dispor, no parágrafo 2. desse dispositivo, que, quanto a tal tributo, não se aplica "o art. 150 , III , b e VI ", da Constituição , porque, desse modo, violou os seguintes princípios e normas imutaveis (somente eles, não outros): 1. - o princípio da anterioridade, que e garantia individual do contribuinte (art. 5., par.2., art. 60, par.4., inciso IV e art. 150, III, b da Constituição); 2. - o princípio da imunidade tributária reciproca (que veda a União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a instituição de impostos sobre o patrimônio, rendas ou serviços uns dos outros) e que e garantia da Federação (art. 60, par.4., inciso I,e art. 150, VI, a, da C.F.); 3. - a norma que, estabelecendo outras imunidades impede a criação de impostos (art. 150, III) sobre: b): templos de qualquer culto; c): patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei; e d): livros, jornais, periodicos e o papel destinado a sua impressão; 3. Em consequencia, e inconstitucional, também, a Lei Complementar n. 77 , de 13.07.1993, sem redução de textos, nos pontos em que determinou a incidencia do tributo no mesmo ano (art. 28) e deixou de reconhecer as imunidades previstas no art. 150 , VI , a , b , c e d da C.F. (arts. 3., 4. e 8. do mesmo diploma, L.C. n. 77/93). 4. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente, em parte, para tais fins, por maioria, nos termos do voto do Relator, mantida, com relação a todos os contribuintes, em caráter definitivo, a medida cautelar, que suspendera a cobrança do tributo no ano de 1993....
Encontrado em: TRIBUTÁRIA, IMPOSTO PROVISÓRIO SOBRE MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (IPMF). POSSIBILIDADE, UTILIZAÇÃO, EMENDA... do mesmo diploma (LC n. 77 /93) por haverem deixado de excluir, da incidência do I.P.M.F., as pessoas... CONSTITUCIONAL, CRIAÇÃO, IMPOSTO, AUSÊNCIA, SUBMISSÃO, PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE TRIBUTÁRIA,...
3.1.2.2 Argumentação desfavorável
Posicionamento desfavorável ao entendimento de que as imunidades tributárias são cláusulas pétreas, é assumido por Rodrigo Leal Teixeira que, juntamente com Antônio Carlos Diniz Murta escreve:
Muito embora possamos admitir que determinadas cláusulas (ou dispositivos) constitucionais, por uma questão de segurança jurídica e de mínima previsibilidade política e social, devem estar protegidas de interesses modificativos circunstanciais, motivados por grupos de pressão entendemos, como poucos, que não podemos da uma interpretação demasiadamente abrangente e elastéria ao alcance destas denominadas cláusulas pétreas. Inicialmente, pelo simples fato de nossa
Constituição ser exaustiva e analítica em suas disposições.
Este texto cuida de praticamente tudo. Se alargamos o conceito de disposição imodificável, a própria sociedade civil, cambiante, dinâmica e modificável em seus padrões de relacionamento e funcionamento cada vez mais em tempo mais curto, se dissociará, de fato, do documento que sustenta sua estrutura mínima de organização. Partimos do princípio que uma Constituição, como a brasileira (prolixa e cansativa), deve estar sempre sujeita a alterações (obedecidos os trâmites para tal, cuja implementação exige varias composições políticas). (MURTA, TEIXEIRA, 2012, pg. 10)
Segundo sustenta este mesmo autor, a apresentação do disposto no artigo 5°, inciso VI ganha contornos interpretativos diferenciados e lança nova luz ao que de fato deve ser compreendido como direito individual. Expressa ele, o que de fato constitui esse direito fundamental: “Tem-se por um lado, o Direito individual de escolha da religião a qual o cidadão deseja seguir e, por outro lado, a positivação desses direitos.” (TEIXEIRA, 2013, pg. 39). Conclui-se pela não aceitação da imunidade religiosa como um direito individual e consequentemente, como cláusula pétrea de que trata o § 4º do artigo 60 da Constituição Federal, a saber: “Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: IV - os direitos e garantias individuais.” O direito tutelado, na verdade, não é o da imunidade religiosa, mas é a preservação por parte do Estado, do direito de escolha religiosa de cada cidadão.
Por qual razão a imunidade tributária deve ser considerada um direito fundamental? Em qual sentido, faz-se necessário desconsiderar a renda auferida por templos religiosos como fato gerador? Há, em alguma proporção, dano a liberdade de expressão religiosa do individuo caso ocorra incidência de tributação ao templo do qual ele faz parte? Não deve a imunidade tributária, ser tratada apenas em seu aspecto econômico? A ponderação oferecida por Fernando Lemme Weiss sugere de modo um tanto convincente que tributação compulsória inclusiva é salutar nas sociedades modernas.
A inclusão compulsória de todas as pessoas na estrutura de uma sociedade organizada, natural conseqüência da divisão do mundo em Estados, faz com que todos sejam credores e devedores solidários dos direitos fundamentais, de forma irrenunciável. A sociedade contemporânea constitui um condomínio indissolúvel entre todos os cidadãos, na medida em que titularizam o patrimônio material e imaterial do Estado. A posição devedora de cada um é caracterizada tanto pelo necessário respeito aos direitos alheios quanto pela contribuição pecuniária compulsória, denominada tributo. Por meio dos tributos cada pessoa retribui à sociedade em razão do que obteve a partir de sua inserção social. (WEISS, 2009, pg. 01-02).
Ante tal declaração, é pertinente questionar o que torna os templos de qualquer culto no Brasil dignos de imunidade, privando-os da condição de credores, em uma sociedade na qual são também titulares de tantas benesses. Para custeamento de necessidades essenciais e comuns a todos, sob qual justificativa deve-se onerar, excessivamente certos segmentos sociais em detrimento de outro que aufere tanto recurso financeiro? Partindo do pressuposto de que há uma séria distorção de princípios, comenta Rodrigo Leal Teixeira:
Perante tais entendimentos, observa-se distorção principiológica de alguns pontos constitucionais. Para vários doutrinadores e pela Suprema Corte, as imunidades são essenciais à preservação das liberdades e direitos fundamentais, sendo elas imprescindíveis a um Sistema Tributário justo. Mas estas pessoas não observam, como é injusto pensar que outros cidadãos muito mais necessitados devam pagar por aqueles que são abraçados por tais ditames. Uma questão lógica: quanto mais ampliações houver no rol das imunidades, maior será a carga tributária no país, e pior distribuída será. (TEIXEIRA, 2013, pg. 40).
3.2 Aplicação subjetiva da imunidade tributária aos templos de qualquer culto
A inexistência de elementos objetivos para que se delineie a aplicação da imunidade tributária aos templos de qualquer culto constitui agravante à problemática outrora suscitada, ou seja, a de reputá-la como cláusula pétrea. Nas palavras de Ricardo Lobo Torres, esta questão poder ser, assim, sintetizada:
A imunidade dos templos de qualquer culto classifica-se como subjetiva, sem embargo de a própria Constituição lhe traçar alguns limites objetivos. A imunidade se subjetiviza na pessoa jurídica, regularmente constituída, que promova a prática do culto ou mantenha atividades religiosas. (TORRES, 1999, pg. 240).
Cumpre discutir nesta seção, o entendimento de termos usados pelo próprio legislador. Expressões que se caracterizam por evidente vagueza semântica e acabam corroborando desdobramentos anacrônicos em sua aplicação no caso concreto. Dessa forma, muitas instituições religiosas se beneficiam convenientemente dessa panacéia hermenêutica. O texto expresso na Constituição Federal, em seu artigo 150, inciso VI, alínea “b” e parágrafo 4° diz:
Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
VI - instituir impostos sobre:
b) templos de qualquer culto;
§ 4º - As vedações expressas no inciso VI, alíneas "b" e "c", compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas.
Uma apreciação, mesmo que não tão analítica, deste texto constitucional parece sugerir que os termos “patrimônio e renda” carregam concretude semântica bem menos controvertida do que os termos “templo, culto e finalidades essenciais”. Não há interesse, em termos conceituais, sobre o que seja patrimônio ou renda. Patrimônio é patrimônio e renda é renda. Quanto ao alcance semântico de termos como templo, culto e finalidades essenciais, toda ambigüidade é bem vinda àqueles que auferem autos lucros às custas da imunidade tributária.
3.2.1 Subjetividade do termo “templos de qualquer culto”
3.2.1.1 Significado de templo
A assunção da premissa constitucional fundamental de que “todos são iguais perante a lei”, segundo dispõe o artigo 5°, inciso VI da CF/88, demanda inexoravelmente abrangência significativa da palavra “templo”. Ante a miscelânea religiosa característica do povo brasileiro, vê-se necessário conceituar “templo” não simplesmente a partir da catedral católica, mas incluindo toda e qualquer ambiência de expressão religiosa, ou seja, desde o terreiro de candomblé da periferia mais distante até o mais imponente templo religioso da Igreja Universal.
Nem sempre, o templo como geografia referencial de manifestação religiosa, ocupou lugar de relevância sagrada na expressão sócio-espiritual das pessoas. Em tempos remotíssimos, como os descritos por Fustel de Coulanges em sua obra “A Cidade Antiga”, não era assim. O livro demonstra como das antigas crenças dependeram vários princípios normativos quanto à conduta geral do homem antigo. Ficou claramente evidenciado que, com base nas crenças a respeito da alma e da morte, havia a necessidade da sepultura como algo fundamental a felicidade da alma. Não era o templo que gozava deste status. Era sublime, o direito de ser sepultado e havia punição severa para o crime de privação da sepultura. Havia ritos tradicionais e proferição de fórmulas fundamentais para o perpetuo bem estar da alma. Os mortos adquiriam condição de deuses e seus túmulos eram templos onde ocorriam os cultos com oferendas cuja não realização incorria em sansões. O fogo sagrado, como um deus tutelar, era obrigação continua e sua extinção significava também a extinção da família. Associadas as crenças antigas, essas regras de conduta se caracterizavam por extrema domesticidade e produzia vinculo intenso entre todas as gerações. Negligenciar a pratica das tradições implicava parricídio. Não se tratava de uma religião institucionalizada nos templos.
Em tempos veterotestamentários, a ideia de templo fixo como referencial de culto por muito tempo foi ignorada. A etimologia da palavra “hebreu” sugere mobilidade em detrimento da fixidez característica do templo. Segundo o Dicionário Bíblico Universal, hebreu significa:
Vindo de outro lado. A mais antiga menção que se faz deste qualificativo vê-se em Gn 14.13. É o nome pelo qual eram designados os filhos de Israel pelas nações circunvizinhas, embora fossem igualmente empregados os termos Israel e israelitas. A própria palavra é derivada de Héber (homens vindos do outro lado, do Eufrates), que é também o nome dum lugar (Nm 24.24), e secundariamente o nome dum dos avós dos hebreus (Gn 10:20). Héber significa, realmente, a parte marginal dum rio, e deriva-se duma raiz que significa atravessar. Supõe-se, geralmente, que deste nome proveio chamar-se Abraão, o hebreu, isto é, aquele que atravessou o rio, vindo da outra banda, o que aconteceu quando aquele patriarca emigrou da Mesopotâmia (Gn 14.13); mas também pode ser que muito antes tenha sido dado o nome aos seus ascendentes pelos babilônios, quando eles saíram da península arábica e dirigiram para o oriente, atravessando o Eufrates. (BUCKLAND, 2003, pg. 184)
Relatos históricos do Velho Testamento dão conta de que por séculos, o templo como construção fixa não representava nenhuma convergência de fé para o judaísmo, até que por volta de 956 a.C, por força da demanda social e religiosa dos judeus e pela influência de outros povos, deu-se a construção do primeiro templo judaico por Salomão.
Em tempos neotestamentários, inaugurados pela mensagem pungente e subversiva de Jesus, o templo como designação de um lugar físico de adoração foi totalmente relativizado. Esta é uma das razões pelas quais foi hostilizado pelo seu próprio povo que atribuía ao templo um significado ostensivo de genuína fé. O ensino de Jesus se antagonizava à sacralização de espaços físicos a medida que proponha uma espiritualidade introspectiva e cuja exteriorização somente se validava em atos de amor e misericórdia. A relativização do templo e o conceito de adoração são claramente percebidos no texto do Evangelho de João, capítulo 4, conforme se vê a seguir.
Disse-lhe a mulher: Senhor, vejo que és profeta.
20 Nossos pais adoraram neste monte, e vós dizeis que em Jerusalém é o lugar onde se deve adorar.
21 Disse-lhe Jesus: Mulher, crê-me, a hora vem, em que nem neste monte, nem em Jerusalém adorareis o Pai.
22 Vós adorais o que não conheceis; nós adoramos o que conhecemos; porque a salvação vem dos judeus.
23 Mas a hora vem, e agora é, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque o Pai procura a tais que assim o adorem.
24 Deus é Espírito, e é necessário que os que o adoram o adorem em espírito e em verdade. (BIBLIA, 1969, João 4.20-24)
Posteriormente, quando o cristianismo tornou-se a religião oficial do Império Romano, na época do Imperador Constantino, o templo, como referencial físico de expressão religiosa, voltou a ser prestigiado como elemento fundamental de validação da fé cristã.
Eis o significado da palavra templum em latim:
Edifício público destinado à adoração a Deus e ao culto religioso; Igreja e qualquer edifício em que se presta culto a uma divindade. Lugar descoberto e sagrado entre os romanos, de onde de podia alongar a vista. Maçon, a loja ou sala onde os maçons se reúnem para celebrar as suas sessões. A ordem dos templários. Lugar misterioso e respeitável. (MICHAELIS, 1998)
Para Fernando Lemme Weiss:
Somente constituem templos os locais destinados diretamente ao culto divino (de alguma divindade), seja em razão de consagração habitual,como áreas naturais ou urbanas, ou de bênção (escolha), situação dos locais especificamente destinados ao culto. É importante também que sejam livremente abertas ao público e que se prestem ao culto, o que exclui aquelas utilizadas de forma residencial ou comercial, como salões de festas e estacionamentos. (WEISS, 2004, pg. 82)
A questão relevante diz respeito a qual o alcance de sentido da palavra “templo”. Rodrigo Leal Teixeira comenta que segundo o que se pode depreender do texto constitucional, “a alínea b do artigo 150 em comento faz referencia apenas a templos, levando ao entendimento de que as imunidades serão concedidas apenas aos templos, fisicamente consideradas, sendo somente templo o local onde se destina o culto”. Para Kiyoshi Harada, “a expressão templos de qualquer culto abrange não só o edifício onde se realiza a prática religiosa, como também ao próprio culto, se qualquer distinção de ritos.”
3.2.1.2 Significado de culto
Vale à pena salientar novamente que dada a laicidade do Estado, deve-se dar ao sentido da palavra “culto” amplitude suficiente para abarcar todos os credos religiosos. A assunção da premissa constitucional fundamental de que “todos são iguais perante a lei”, segundo dispõe o artigo 5°, inciso VI da CF/88, demanda inexoravelmente abrangência significativa da palavra “culto”. Ante a miscelânea e o sincretismo religioso, característico do povo brasileiro, vê-se necessário conceituar “culto” não simplesmente a partir da liturgia católico-romana, mas incluindo todo e qualquer rito de expressão religiosa, ou seja, desde o culto aos orixás até a ministração da eucaristia em uma igreja católica.
Nem sempre o culto esteve associado a um local público denominado templo. Segundo Fustel de Coulanges, em épocas antigas, o culto estava associado invariavelmente a família. Era eminentemente doméstico e privativo. A moral a ser observada, assim como a religião, era de natureza familiar. Sendo a continuidade do culto aos antepassados uma tarefa masculina a ser exercida pelo filho legitimo. O adultério se caracterizava por especial gravidade e o filho bastardo não tinha nenhum valor de parentesco. Era reservado ao pai o direito de punir a adúltera com morte. O adultério e o divorcio por motivo não legitimo eram os maiores delitos que se podia cometer contra o matrimonio cujo objetivo maior era a perpetuação da religião bem como do culto domestico. Os antigos, embora não primassem pela caridade como expressão religiosa para com os estranhos, davam o nome de piedade às virtudes domesticas. A respeito do significado das gens para o culto, o autor diz:
Essa família indivisível, que se desenvolvia através das idades, perpetuando de século em século seu culto e seu nome, era verdadeiramente a gens antiga. A gens era a família, mas a família conservando a unidade ordenada pela religião e atingindo todo o desenvolvimento que o antigo direito privado lhe permitia atingir. (COULANGES, 1961, pg..166).
Como parte integrante da família, havia os escravos e a clientela. Partindo do pressuposto que nenhum estranho poderia comungar da mesma fé doméstica, os escravos eram submetidos a um rito de iniciação e por meio de cultos religiosos estavam ligados eternamente a família, usufruindo de todos os direitos pertinentes a ela, inclusive o de ser sepultado no tumulo doméstico. Cliente era a condição do escravo liberto, ou seja, mesmo livre das obrigações de trabalho não estava livre das obrigações da fé e à família continuava atrelado.
Na época do Velho Testamento, entre os judeus, o culto tinha características de itinerância, como designa o próprio sentido da palavra hebreu (aquele que caminha). A idéia do tabernáculo movente privava o culto de qualquer fixidez. Com a construção de um templo, na era de Salomão, o culto vinculou-se a idéia de lugar sagrado destinado aos ritos típicos do judaísmo.
Quando do advento do Novo Testamento, o ideal de culto ganhou significado diferente. Segundo aquele, a quem se atribui a origem do Cristianismo, culto não se restringe aos exercícios ritualísticos desprovidos de significado afetivo. Com a relativização das geografias sagradas, Jesus associa o culto às expressões de amor ao próximo como liturgia da vida diária. Com o passar do tempo, os que pretenderam reproduzir seus ensinos, vincularam novamente culto a um espaço determinado e de presença compulsória. Tornou-se assim, desde épocas Constantinianas, em que culto passou a ser credencial social de aceitação no Império Romano.
Rodrigo Leal Teixeira comenta sobre qual deve ser o sentido de culto hodierno, digno de imunidade tributária, com as seguintes palavras:
Assim, o culto deve prestigiar a fé e os valores transcendentais que a circulam, sem colocar em risco a dignidade das pessoas e a igualdade entre elas, além de outros pilares do Estado. Com efeito, é imprescindível à seita a obediência aos valores morais e religiosos, no plano litúrgico, conectando-se as ações calcadas em bons costumes (artigos 1°, III; 3°, I e IV; 4°, II e VIII, todos da CF), sob pena do não reconhecimento da qualidade de imune. (TEIXEIRA, 2013, pg. 50)
Mediante brilhante ponderação por parte do autor supracitado, é mister a indagação sobre a natureza dos cultos neo-pentecostais no Brasil. Rápidas olhadelas em jornais e televisão bastam para que se comprove a afronta a dignidade humana, desde mercantilização da fé dos incautos até os discursos de teor homofóbico que instigam a discriminação. Em seu trabalho de dissertação de mestrado, Rodrigo Leal Teixeira apresenta ampla pesquisa, fundamentada em dados estatísticos, sobre a locupletação de líderes evangélicos e as volumosas quantias de dinheiro arrecadados em função do que se denomina “culto”.
3.2.2 Subjetividade do termo “finalidades essenciais”
A inexistência de elementos objetivos para que se delineie a aplicação da imunidade tributária aos templos de qualquer culto encontra no termo “finalidades essenciais” tamanha justificativa para o abuso. Visto que a imunidade tributaria se subjetiviza na pessoa jurídica regularmente constituída, e não se funda em critérios constitucionais objetivos, torna-se inviável delimitar por meio de uma expressão tão vaga, o que realmente se cumpre como finalidade essencial e o que é pretexto para o enriquecimento puro e simples. Conforme já salientado, a expressão “finalidades essenciais” usada pelo legislador se caracteriza por evidente vagueza semântica e acaba corroborando desdobramentos anacrônicos em sua aplicação no caso concreto. Dessa forma, cumpre reafirmar, muitas instituições religiosas se beneficiam oportunamente dessa imprecisão terminológica. É válido rever o termo “finalidades essenciais” em seu contexto constitucional. O texto expresso na Constituição Federal, em seu artigo 150, inciso VI, alínea “b” e parágrafo 4° diz:
Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
VI - instituir impostos sobre:
b) templos de qualquer culto;
§ 4º - As vedações expressas no inciso VI, alíneas "b" e "c", compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas.
Depreende-se da analise deste texto constitucional que a alínea “b” deve ser interpretada em conexão com o disposto no parágrafo quarto, a saber, que a imunidade tributária alcança o patrimônio, a renda e os serviços relacionados com as finalidades de toda a entidade religiosa, não apenas do templo religioso. Não se pode olvidar que haja um leque de elementos proporcionados por este parágrafo associado à alínea “b”, ou seja, a imunidade atinge não apenas o templo em seu sentido físico, mas também o convento, a casa pastoral ou paroquial, a residência do monge, do rabino, lotes, salões de festa, bibliotecas de estudo, alojamentos para a recepção de fieis e muito mais. Conforme comenta Rodrigo Leal Teixeira,
Considerando a subjetividade do termo “atividade essencial” do §4°, os cultos religiosos estão, hoje, autorizados a incluir, no âmbito da referida imunidade, praticamente todo o seu patrimônio, a sua renda e os seus serviços. Importantes as disposições doutrinárias sobre o assunto “imunidades do templo de qualquer culto” com posições antagônicas, de uma parte adotando a interpretação ampliativa e, de outra, restritiva, enfrenta-se o tema, especialmente diante da CF/88, artigo 150,b,§4°. (TEIXEIRA, 2013, pg. 51)
Sobre qual deve ser, então, o sentido de atividade essencial, Rodrigo Leal Teixeira complementa:
Suas finalidades essenciais são os seus objetivos estatutários. Devem ter o caráter social e não lucrativo como uma forma de concessão do Estado no tocante à parte assistencial à sociedade. Tais finalidades são a prática do culto, a formação de padres e ministros, o exercício de atividades filantrópicas e a assistência moral e espiritual aos crentes. (TEIXEIRA, 2013, pg. 51)
O que se constata na prática, é que em geral vale o custo-benefício. Igrejas usam pequenos projetos sociais que mascaram e ocultam a amplitude de seus negócios lucrativos, conferindo-lhes vinculação aparente às atividades essenciais, mas que na verdade, são instrumentos de enriquecimento de uns poucos. Obviamente, toda a transação financeira, é feita em nome da entidade religiosa, como se em prol de suas finalidades essenciais fosse, mas nem de longe, os benefícios são revertidos à massa de fieis.
Além do mais, o discurso preponderante no meio neo-pentecostal favorece a ganância dos seus líderes. Trata-se da cultura religiosa do “intocável ungido do Senhor”. Assim, como se não bastasse serem considerados profetas especiais, dignos de riqueza, não enfrentam, geralmente, oposição dos fieis e não precisam dispor de nenhuma lisura contábil frente a sua congregação.
Sobre esta questão, alguns posicionamentos ainda podem ser citados, tais como o de Ricardo Lobo Torres que diz:
O tratamento conferido aos templos, livros e publicações foi diretamente dispensado às instituições de educação e assistência social, pois estas tem o gozo da imunidade condicionado ao atendimento dos ‘‘requisitos da lei’’, enquanto aqueles são imunes de forma absoluta ,sem qualquer referência à regulamentação mental.
A plena eficácia da imunidade concernente aos templos demanda do aplicador um cuidado conceitual, para evitar enriquecimento sem causa em detrimento da sociedade e de seu Erário, pois não há margem para a regulação por lei.A única orientação interpretativa estabelecida pelo Constituinte foi no sentido de atender ás ‘‘finalidades essenciais’’ (TORRES, pg. 254).
Rodrigo Leal Teixeira compartilha do pensamento doutrinário de Yoshiaki Ichiara, que por sua vez afirma o seguinte:
Não deve, assim, o interprete distinguir aquilo que a lei distingue. Assim uma entidade como, por exemplo, a Igreja que aluga parte do imóvel para estacionamento e instalação de um supermercado, sem dúvida alguma, por não estar esta atividade vinculada á sua finalidade essencial, não pode ser contemplada pela imunidade prevista no artigo 150, VI, letras b e c, da Constituição Federal de 1988. [...] As rendas, ganhos ou lucros obtidos em aplicações financeiras bem como os alugueis de imóveis não vinculados á finalidade essencial podem ser tributados. (ICHIARA, 2000, pg. 333).
Segundo o entendimento de Ives Gandra da Silva Martins:
Apenas se as atividades puderem gerar concorrência desleal ou as finalidades das entidades imunes não forem beneficiadas por tais resultados é que a tributação se justifica, visto que, de rigor, tais atividades refogem ao campo de proteção tributária que o legislador supremo objetivou ofertar a essas finalidades da sociedade. (MARTINS, 1998, pg. 45).
E exemplifica:
Se uma entidade imune tem um imóvel e o aluga, tal locação não constitui atividade econômica desrelacionada de seu objetivo nem fere o mercado ou representa uma concorrência desleal. Tal locação do imóvel não atrai, pois a incidência do IPTU, sobre gozar a entidade de imunidade para não pagar imposto de renda. (MARTINS, 1998, pg. 45).
Ressalta então, Rodrigo Leal Teixeira que, a neutralidade estatal, no que concerne este tema, causa grandes transtornos. Sugere que normas gerais podem causar impactos contrários em minorias, ao invés de, favorecer grupos mais tradicionais. Conclui dizendo que: “O desafio consiste em encontrar um filtro que permita a passagem apenas dos enunciados normativos que nem inibam nem promovam denominações ou benefícios religiosos” (TEIXEIRA, 2013, pg. 55).
3.2.3 Teorias acerca da imunidade religiosa
Dada a imprecisão no emprego de termos vagos e a conseqüente subjetivização aplicativa da imunidade tributária, tem-se um terreno fértil para posicionamentos doutrinários diversos quanto a esta temática. Qual deve ser a abrangência da imunidade tributária aos templos de qualquer culto é a questão. Existem duas teorias principais que contemplam esta divergência doutrinária, quais sejam a teoria ampliativa e a teoria restritiva da imunidade religiosa.
3.2.3.1Teoria ampliativa
Por esta teoria, toda a entidade mantenedora do templo está imune a tributação. O conceito templo-atividade que corrobora o conceito da teoria ampliativa, a saber:
Teoria clássico-liberal (concepção do templo-atividade): conceitua o templo como tudo aquilo que, direta ou indiretamente, viabiliza o culto. Nessa medida, desonera-se de impostos o local destinado ao culto e os anexos deste (universitas júris, ou seja, o conjunto de relações jurídicas, afetas a direitos diversos). (CARRAZA, 1198, pg. 433.).
Comenta Rodrigo Leal Teixeira:
A imunidade concedida pelo artigo 150, VI, b e §4°, imunidade de caráter subjetivo, se for vista de forma ampla, entende-se que alcançará a entidade, e não a um determinado bem, dando o entendimento de que tempos de qualquer culto é um expressão ampla que abrange não somente o templo em si, como também as lojas maçônicas, cada do pastor, convento, centro de formação de rabinos, seminários, casa paroquial e imóveis. São locais que facilitam o culto, veículos utilizados para atividades pastorais, como o templo móvel, lotes vagos, entre outros. Assim, os anexos dos templos também são abrangidos no amplo entendimento da imunidade subjetiva. (TEIXEIRA, 2013 pg. 87).
3.2.3.2 Teoria restritiva
Por essa teoria, a imunidade tributária deverá ser concedida apenas ao local onde se efetua o culto, isto é, o templo. Flavio Campos oferece um conceito de coisa-templo que corrobora a visão da teoria restritiva da imunidade tributária:
Teoria restritiva (concepção do templo-coisa): conceitua o templo como o local destinado à celebração do culto. Pauta-se na coisificação do templo religioso (universitas retum, ou seja, conjunto de coisas), que se prende, exclusivamente, ao local do culto. Exemplo: não deve haver a incidência de IPTU sobre o imóvel – ou parte dele, se o culto, v.g., ocorre no quintal ou terreiro da casa – dedicado à celebração religiosa; não deve haver incidência de IPVA sobre o chamado templo-móvel (barcaças, caminhões, vagonetes, ônibus, etc.), entre outras situações. (CAMPOS, 2000, pg. 44 – 53)
Em defesa da teoria restritiva, apregoa Celso Ribeiro Bastos a seguinte:
Superadas as questões suscitadas pelo vocábulo “culto”, passemos enfocar aquelas decorrentes do conceito de “templo”. Aqui a matéria não é de tão difícil aclaramento. É que o texto constitucional não se referiu a ordens religiosas ou a associações com tais fins, mas circunscreveu-se ao local em que se efetua o culto, isto é, o templo. Vale dizer: o templo que é imune e não a entidade em si. (BASTOS, 2002, pg. 43)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Através do estudo da dinâmica do Sistema Tributário Nacional é possível a constatação de que, embora haja controvertida sanha arrecadatória por parte do Estado, os princípios tributários, orientadores do sistema, propiciam justiça contributiva possível dentro do Estado democrático de Direito. Não há, em termos gerais, ocorrência de desarmonia com princípios constitucionais de dignidade humana de modo a inviabilizar o custeamento do estado brasileiro por meio de seus cidadãos contribuintes.
Cumpre, porém ressaltar que, em aplicando a imunidade tributária aos templos de qualquer culto no Brasil, o Estado incorre em prejuízo a sociedade que se vê mais onerada, embora o objetivo premente da imunidade em questão seja o de tutelar a liberdade religiosa. Devido à vagueza semântica de termos usados no dispositivo legal, o Estado subjetiviza, de maneira anacrônica, na pessoa jurídica religiosa, as benesses decorrentes da imunidade tributária.
Conquanto não seja majoritária, a compreensão de que imunidades tributárias não ensejam condição de direitos fundamentais, precisa ser amplamente discutida. E mister verificar que as implicações desta imunidade aos templos de qualquer culto no Brasil são muito mais econômicas do que cerceadoras de liberdade religiosa. A garantia constitucional de laicidade do Estado brasileiro, além de não ser mitigada pela não aplicação desta imunidade, constitui o real direito fundamental a ser preservado pela rigidez imposta na Constituição Federal de 1988.
Entrementes, em um país de acentuadas injustiças sociais, o oportunismo de verdadeiras franquias de religião de massa impera. Os cultos religiosos tornam-se ambiência em que pregações imiscuem-se com práticas, às vezes veladas, de sugestionamento psicológico. Por meio de promessas de sucesso financeiro fundadas na teologia da prosperidade, atualmente em voga, quem, beneficiando-se de imunidade tributária, se locupleta são uma minoria de lideres. É necessário questionar a quem a imunidade tributária aos templos de qualquer culto presta serviço: aos cultos de exploração financeira que atentam contra a dignidade humana ou à liberdade religiosa como direito fundamental em um Estado laico? A aplicação subjetiva da imunidade tributária aos templos e suas vagas finalidades essenciais dá ocasião a gravíssimo anacronismo social. Dada a fortuna que arrecadam para o beneficio de seus lideres, tais instituições devem ser tratadas como empresas e não como ambientes de culto em que a dignidade humana é prestigiada. Se bem que empresas podem ser humanitárias.
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