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Admissibilidade da prova ilícita no processo penal

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Agenda 31/10/2016 às 10:27

4. DAS PROVAS ILÍCITAS NO PROCESSO PENAL

Existem espécies de provas que por excelência são proibidas por lei, tais como as provas ilícitas e as derivadas destas. São aquelas, cuja obtenção sofreu uma violação da norma de direito material ou processual, tais como as provas obtidas mediante as práticas de delitos criminais, civis, comerciais ou administrativos ou que são contrários aos princípios constitucionais. Ou ainda, aquelas obtidas por derivação das ilícitas, conhecidas como teoria dos frutos da árvore envenenada, teoria norte-americana, fruits of the poisonous tree, que faremos um estudo pormenorizado mais adiante.

4.1 CONCEITO DE PROVA ILÍCITA

Pela reforma proclamada pela Lei nº 11.690/08, o artigo 157[3] caput do CPP, traz um conceito bastante elucidativo a respeito de prova ilícita. Neste entendimento, Silva (2010, p. 11), apresenta um conceito de prova ilícita, bastante peculiar:

Por prova ilícita, em sentido estrito, indicaremos, portanto, a prova colhida infringindo-se normas ou princípios colocados pela Constituição e pelas leis, frequentemente para a proteção das liberdades públicas e dos direitos da personalidade e daquela sua manifestação que é o direito à intimidade. Constituem, assim, provas ilícitas as obtidas com violação do domicílio (Art. 5º, XI, CF/88) ou das comunicações (art. 5º, XII, CF/88); as conseguidas mediante tortura ou maus tratos (art. 5º, III, CF); as colhidas com infringência à intimidade (art. 5º, X, CF), etc.

É inquestionável a previsão limitadora, a respeito da prova, de acordo com o artigo 5º, Inciso LVI, da Constituição Federal do 1988:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LVI - São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos.

As limitações quanto à produção de prova de qualquer espécie está de acordo com o amparo legal previsto no texto constitucional vigente, a qual determina que não seja admitida qualquer prova obtida por meios ilícitos, ou seja, são inadmissíveis, no processo, devendo ser desentranhadas quando obtidas por meios ilícitos.

No tocante à prova documental, de acordo com (art. 233 caput do CPP), não será admitida em juízo, a juntada de cartas particulares, interceptadas ou obtidas por meios criminosos. Neste entendimento, preleciona Silva (2010, p. 08):

Se, por um lado, qualquer prova lícita e legítima deverá ser apreciada pelo juízo para chegar à verdade sobre determinado fato, por outro essa prova deverá ser analisada minuciosamente para saber se ela é verdadeira e se poderá produzir efeito no mundo jurídico.

Segundo Aury Lopes Jr (2011, p. 576) (apud. SCARANCE FERNANDES, p. 78):

A prova “ilegal” é o gênero, do qual são espécies a prova ilegítima e a prova ilícita. Assim: Prova ilegítima: quando ocorre a violação de uma regra de direito processual penal no momento da sua produção em juízo, no processo. A proibição tem natureza exclusivamente processual, quando for imposta em função de interesses atinentes à lógica e a finalidade do processo. Exemplo: juntada fora do prazo, prova unilateralmente produzida (como o são as declarações escritas e sem contraditórios) etc.

Prova ilícita: é aquela que viola regra de direito material ou a constituição no momento de sua coleta, anterior ou concomitantemente ao processo, mas sempre exterior a este (fora do processo). Nesse caso, explica Maria Thereza, embora servindo, de forma imediata, também a interesses processuais, é vista, de maneira fundamental, em função dos direitos que o ordenamento reconhece aos indivíduos, independentemente do processo. Em geral, ocorre uma violação da intimidade, privacidade ou dignidade (exemplos: interceptação telefônica ilegal quebra ilegal de sigilo bancário, fiscal etc).

Importante colacionar aqui, o questionamento de Aury Lopes Junior (2011, p. 578):

A questão é saber se uma prova legítima, pois corretamente produzida no processo (juntada no prazo etc.), mas ao mesmo tempo ilícita (na medida em que houve a violação de uma norma de direito material ou a Constituição no momento de sua obtenção) pode ser valorada pelo juiz no julgamento?

Cabe a demonstração a respeito do assunto, mais um argumento sobre o que venha a ser prova ilícita na ótica de Polastri (2010, p. 432):

Melhor exemplificando: se o vício se deu na colheita da prova, por ofensa a uma norma material, como no caso de uma confissão obtida sob tortura, o que é constitucionalmente proibido, teremos a prova ilícita. Por outro lado, se o vício se der quando da produção ou inserção da prova no processo, por desobediência a uma norma processual, como o caso da oitiva de testemunha proibida de depor por dever de sigilo, a prova será ilegítima.

Começam a surgir certos entendimentos de que as provas ilícitas e ilegítimas, dependendo de cada caso concreto, estariam sendo vislumbradas por outros ângulos, e Polastri (2010, p. 434), faz a seguinte colocação:

Em não havendo impedimento em nível da lei processual, somente a prova ilegítima poderia ser excluída do processo, já que, no que tange à prova ilícita, ficaria reconhecido o vício material, punindo-se o autor de sua produção, mas a prova permaneceria válida no processo. Assim justificava o italiano Franco Cordero, defensor desta teoria: male captum, bene retentum, ou seja, mal colhida, mas bem produzida.

É sabido que os direitos de índole constitucional devem ser respeitados, pois que essa é a segurança de todas as pessoas, não só daquele que está sendo investigado, mas o objetivo que deve ser perquirido é punir aquele que cometeu ato ilícito e não em primeira instância apurar responsabilidades do autor da produção da prova.

4.2 DIREITO DE PUNIR DO ESTADO versus DIREITO DE LIBERDADE

O direito-dever de punir do Estado, para ser considerado legítimo, deve estar colimado com os bons costumes e princípios que não violem a ordem constitucional vigente, para tanto, é salutar que seja observado o respeito à dignidade da pessoa humana. Nesse contexto, leciona Silva (2010, p. 18):

A proibição da utilização de prova obtida por meio ilícito é uma garantia do particular contra o Estado. Daí, partindo-se desse pressuposto, a prova obtida por meio ilícito só não poderia ser utilizada pelo Estado em desfavor do acusado. Depois da vida, a liberdade é o bem mais importante que o homem possui. A liberdade é protegida pela Constituição Federal através de vários dispositivos. Podemos destacar, dentre outros, o do princípio do devido processo legal, que já engloba o do contraditório e da ampla defesa, o da presunção de inocência, o da legalidade, o Habeas Corpus etc.

O princípio da dignidade da pessoa humana deve pressupor que o Estado é o garantidor das necessidades básicas e por consequência deve privar pelo bem estar de seus cidadãos. Segundo, Rangel (2014, p. 471): “O direito da pessoa acusada ou investigada de não ser submetida à tortura, tratamento desumano ou degradante é absoluto”. Nenhuma pessoa pode abrir mão desse direito e o Estado não pode utilizar meios ilícitos para descobrir a verdade. As limitações impostas na Lei Maior tem o objetivo de garantir as liberdades fundamentais do indivíduo próprias de um Estado Democrático de Direito, e também impor um filtro na própria atividade probatória estatal, que deve sempre se pautar pela legalidade e moralidade na busca da justiça social.

4.3 PRINCÍPIO DA INADIMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍCITAS

A lei 11.690, de 09 de junho de 2008 produziu importantes alterações na matéria probatória do processo penal, conforme art. 157. “São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais”, Tasse (2009, p. 23), apresenta comentários importantes relacionados às reformas trazidas:

Determina que as provas somente sejam valoradas pelo juiz quando produzidas sobre o crivo do contraditório; na sequência, o art. 156 da nova redação do CPP tomou a cautela de limitar o poder de produção de prova do juiz, marcando claramente o processo penal brasileiro como um processo de partes.

Processo de partes significa dizer que as provas devem ser produzidas por quem acusa, quanto às razões para a condenação, e por quem defende, quanto aos fundamentos impeditivos da condenação, cabendo a quem julga receber a prova e não produzi-la e aceitar somente aquelas que foram submetidas ao crivo do contraditório e, então, proceder a um julgamento racional com base nas provas do processo, ofertando a solução mais razoável para o conflito existente.

E neste entendimento parece salutar a aplicação do princípio da razoabilidade, quando se tratar do acolhimento da prova e seus meios de produção, uma vez que nem sempre é possível desprezar a prova, mas sopesar e dimensionar as consequências:

Foi mais longe a lei 11.690, de 09/06/08, ao determinar o desentranhamento da prova ilícita, o que faz ruir a malfadada jurisprudência que vinha sendo construída no Brasil com inegável base autoritária, com supedâneo em postulados teóricos da escola nazista alemã, em torno do princípio da razoabilidade.

[...] Assim, a prova ilícita, no sentido de acusar alguém, passou a ser, na prática processual brasileira, muitas vezes, aceita numa total subversão da ordem democrática, em que o princípio da razoabilidade existe para proteger os cidadãos do Estado e não, o Estado dos cidadãos, (TASSE, 2009, p. 23).

A despeito de que, alguns doutrinadores entendem que nenhum direito ou garantia em nosso ordenamento jurídico é absoluto, a possibilidade de sofrer restrições se configura justamente na formalização da inadmissibilidade das provas ilícitas. Aparentemente, no que tange a teoria obstativa, pode-se afirmar que formam a corrente majoritária, segundo estes, sustentam que a prova ilícita deve ser repudiada independentemente da proporção do delito, haja vista, que as normas constitucionais relevantes ao processo penal proclamam a garantia que impera na ordem social e esse entendimento é o que se coaduna com o devido processo legal. Nos termos do artigo (5°, incisos III, X, XI, XII, XXXV, XXXIX, XLI, LIV, LV, LVI, LVII, LXIII etc...) da CF/88. A contrariedade a essas normas acarreta abuso das liberdades fundamentais ao indivíduo e por consequência a ineficácia do ato processual, seja por nulidade absoluta, seja pela própria inexistência, tendo em vista que a Lei Maior clama pela inadmissibilidade da prova obtida por meios ilícitos.

A Lei nº 11.690/08, já trouxe avanços que outrora pareciam distantes de serem alcançados. No entendimento de Tasse (2009, p. 21): “na matéria probatória do processo penal brasileiro, fixa a mensagem da vontade do legislador infraconstitucional de finalmente atender às reivindicações da Carta de 1988 e estruturar o sistema brasileiro com fundamento no modelo acusatório”. Segundo, Rangel (2014, p. 472):

O legislador constituinte, ao estatuir como direito e garantias fundamentais a inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos, estabelece uma limitação ao princípio da liberdade da prova, ou seja, o juiz é livre na investigação dos fatos imputados na peça exordial pelo titular da ação penal pública – princípio da verdade processual -, porém, essa investigação encontra limites dentro de um processo ético movido por princípios políticos e sociais que visam a manutenção de um Estado democrático de Direito.

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A prova é um direito subjetivo constitucional assegurado através do princípio do devido processo legal e inerente aos princípios da verdade processual e do contraditório, pois contradizer é dizer e provar o contrário.

A liberdade da prova encontra limites, restrições e vedações pelo próprio legislador, e, uma delas, além das que vimos acima, tem assento constitucional: inciso LVI do art. 5º:

O professor Aury Lopes Junior (2011, p. 580), faz uma crítica que vale lembrar, a respeito da inadmissibilidade da prova ilícita:

A crítica é exatamente em relação à “absolutização” da vedação, num momento em que a ciência (desde a teoria da relatividade) e o próprio direito constitucional negam o caráter absoluto de regras e direitos. Para nós, desde Einstein, não há mais espaço para tais teorias que têm a pretensão de serem “absolutas”, ainda mais quando é evidente que todo saber é datado e tem prazo de validade e, principalmente, que a Constituição, como qualquer lei, já nasce velha, diante da incrível velocidade do ritmo social. Logo, a inadmissibilidade absoluta tem a absurda pretensão de conter uma razão universal e universalmente, que pode(ria) prescindir da ponderação exigida pela complexidade que envolve cada caso na sua especificidade.

A responsabilidade para filtrar o sistema probatório caberá ao magistrado. Sendo constatada a ilicitude da prova esta deverá ser desentranhada, pois, que o § 3º do artigo 157 do CPP, expressamente determina o desentranhamento. Assim, ensina Silva (2010, p. 15) “[...] Essa prova, após a preclusão da decisão de desentranhamento, será inutilizada por decisão judicial, podendo as partes, caso queiram, acompanhar o incidente”.

Entretanto, restou demonstrado, que tanto na doutrina quanto na jurisprudência, o entendimento majoritário, é pela inadmissibilidade das provas ilícitas no processo penal, mesmo que sejam relevantes para se chegar à verdade processual. A despeito disso, a própria doutrina nos apresenta a hermenêutica de autores que defendem a chamada Teoria da Proporcionalidade que será desenvolvido na sequência, argumentos favoráveis a aplicação do princípio da proporcionalidade.

4.4 POSICIONAMENTO FAVORÁVEL A ADMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍCITAS

Em que pese às interpretações em sentido estrito, frisa-se que os direitos e garantias fundamentais não podem ser entendidos em sentido absoluto, em face da limitação resultante do princípio da proporcionalidade, que exige a interpretação harmônica das liberdades constitucionais. Visto que, que a Teoria permissiva busca certo equilíbrio entre os interesses sociais e os direitos e garantias fundamentais do indivíduo. Tal teoria reconhece a ilicitude da prova, entretanto, tendo em vista o interesse social predominante, admite que tal prova seja produzida utilizando-se uma interpretação literal, dependendo de cada caso concreto.

Na sequência, de forma a vislumbrar o conteúdo pretendido, busca-se um entendimento conceitual entre gravação clandestina e interceptação telefônica, uma vez que essas denominações estão presentes na linguagem jurídica e, portanto, admitidas por parte da doutrina e jurisprudência, demonstrada através de teorias:

A mera gravação clandestina e não a interceptação da conversa telefônica por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro, que pode ser entre presentes ou não. Neste caso, não há que se falar em interceptação, pois, conforme definição de Luiz Francisco Torquato Avolio, em sentido amplo, interceptação é a captação da conversação entre duas pessoas, executado por terceiro.

A interceptação exige sempre a presença do terceiro, que fará a escuta ou a gravação, sendo que, se é um dos interlocutores que grava a sua própria conversa com outrem ocultamente, não haverá interceptação, mas mera gravação clandestina, sendo que esta última não se encontra protegida pela garantia do dispositivo constitucional, não configurando crime, e, assim, tão somente a divulgação da conversa é que poderá configurar uma violação de segredo, e, se tal ocorrer, poderá ser ilícita como prova, desde que o agente não esteja ao amparo de uma excludente de ilicitude ou justa causa (v.g., a única forma de a vítima provar que estava sendo extorquida ou chantageada era gravar a conversa), (POLASTRI, p. 453).

Neste sentido, deixa claro que o julgador fica adstrito à doutrina de modo a respeitar todas as limitações impostas pelo legislador, ou seja, nesta situação a prova ilícita encontra amparo:

A gravação clandestina não encontra óbice legal à sua admissibilidade no processo penal, enquanto meio atípico de prova, assim como outros meios não são previstos em lei, a exemplo das perícias com base no DNA, hoje disseminadas no âmbito da moderna polícia científica como eficiente instrumento para o esclarecimento dos crimes.

Mas tudo dependerá se houve ou não afronta às garantias constitucionais, devendo ser preservado o princípio da intimidade e do direito ao silêncio, além da máxima de que ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo. Nemo tenetur se detegere, (POLASTRI, p. 453).

É interessante que praticamente existe uma unanimidade na doutrina quando se fala na proteção das garantias constitucionais, ou seja, o resguardo do direito à intimidade e a máxima do direito de silêncio assistido àquele que está em vias de investigação ou até mesmo sentado no banco dos réus. Ademais, não acontece na mesma proporção para dizer que a garantia constitucional não deve dar guarida para a prática delituosa, pois somente deve permanecer o direito à intimidade em sua plenitude às pessoas, cuja idoneidade moral não deixa dúvida.

4.5 DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

O Princípio da Proporcionalidade está colimado com a harmonia que deve existir entre os princípios constitucionais, as normas legais e a sua aplicabilidade no caso concreto e deve ser utilizado pelo magistrado na ponderação dos valores probatórios que deverão prevalecer em cada questão, inclusive quando da necessidade de se considerar a prova ilícita ou ilegal.

Silva (2010, p. 18) faz uma importante consideração sobre o princípio da proporcionalidade:

Se for possível ao acusado demonstrar sua inocência através de uma prova obtida ilicitamente, certamente ela poderá ser utilizada no processo, haja vista a preponderância do direito à liberdade sobre a inadmissibilidade da prova ilícita no âmbito processual. Trata-se de aplicação do princípio da proporcionalidade em benefício do acusado.

Contudo, a problemática da prova ilícita deve permanecer nos casos polêmicos de muitos juristas, mas algumas doutrinas ainda aceitam a admissibilidade da prova ilícita, invocando o princípio da proporcionalidade, quando a prova for favorável ao acusado, que, dependendo do caso concreto, vem, sistematicamente, sendo acolhida com bastante parcimônia, não apenas junto aos doutrinadores como também sob a ótica de jurisprudência, em obediência ao direito de defesa, pro reo.

4.5.1 O Princípio da Proporcionalidade em Favor do Réu

Da analise no tange a vedação das provas obtidas por meios ilícitos observa-se um discurso padrão no sentido de proteger os direitos daquele transgrediu a lei. Entretanto, com a intenção de corrigir determinados defeitos há que se considerar em contrapartida que a impunidade ao criminoso seja tão quanto ou maior que a condenação de um inocente. Baseado no Princípio da Proporcionalidade prevê suposições em que as provas ilícitas, quando se tratar de casos excepcionais e extremamente graves, poderão ser aproveitadas, uma vez que não existe garantia absoluta, ou seja, há a possibilidade, inclusive, em casos delicados, quando se denota que o direito a ser perquirido é mais importante do que o direito à intimidade, à liberdade de comunicação ou ao segredo, de autorizar o emprego da prova ilícita ou ilegal em favor do réu. No dizer de Aury Lopes Jr (2011, p. 582). “Trata-se da proporcionalidade pro reo, em que a ponderação entre o direito de liberdade de um inocente prevalece sobre um eventual direito sacrificado na obtenção da prova (dessa inocência)”, Mas, aqui é preciso salientar que o discurso é com relação ao inocente e não ao infrator da lei. Segue uma complementação deste entendimento, segundo Lopes Jr (2011, apud RANGEL, 2010, p. 431):

Aponta acerto da chamada teoria da exclusão da ilicitude, em que a conduta do réu ao obter a prova ilícita está amparado pelo direito (causa da exclusão da ilicitude) e, portanto, essa prova não pode mais ser considerada ilícita. Assim, por exemplo, pode ser admitida a interceptação telefônica feita pelo próprio réu, sem ordem judicial, desde que destinada a fazer prova de sua inocência em processo criminal que busca a sua condenação. Ou ainda, quando comete um delito de invasão de domicílio ou violação de correspondência, para buscar elementos que demonstrem sua inocência, estaria ao abrigo do estado de necessidade, que excluiria a ilicitude de sua conduta e conduziria à admissão da prova.

Seguindo nesse prisma, é desnecessário argumentar que a condenação de um inocente fere de morte o valor “justiça”, pois o princípio supremo é o da proteção dos inocentes no processo penal, e não resta dúvida que no desespero de querer provar sua inocência, existe a possibilidade de cometer certos erros judiciários e, esses equívocos configuram-se no meio utilizado em busca da prova dos fatos pretéritos, mas a intenção principal não é livrar-se da acusação e sim de demonstrar a inocência daquele que está sendo acusado.

4.5.2 O Princípio da Proporcionalidade em Favor da Sociedade

De acordo com o caput do art. 157[4], do CPP, a prova ilícita deve ser desentranhada do processo, segundo entendimento doutrinário, somente poderá ser aproveitada buscando-se amparo pelo princípio da proporcionalidade, em determinados casos. Mas, este somente deveria ser argumentado em favor do réu pro reo. Polastri (2010, p. 435) diz que a razão para isso é em função “[...] de que o Estado deve ater-se ao princípio da moralidade, não podendo utilizar meios ilícitos nem para combater o crime [...]”. Esse entendimento busca guarida em princípios para a justificativa da prova ilícita, com a seguinte argumentação:

Ocorre que, segundo o referido princípio da proporcionalidade, também chamado de princípio da razoabilidade, poderá restar anulada a vedação probatória se existirem outros valores que se igualem ou devam se sobrepor (de maior relevância) à vedação legal.

Assim, para esta teoria, que na verdade tenta equilibrar as posições antagônicas de admissibilidade e inadmissibilidade da prova ilícita, quando coexista outro interesse, como, v.g., a gravidade de certos delitos ou a maior necessidade da repressão estatal, ou mesmo se determinada prova for privilegiada naquele processo, poderia ser admitida a prova obtida ilicitamente no processo, (POLASTRI, 2010, p. 435).

Observa-se que existe uma tendência em dizer que a violação de regras processuais, regras essas que o legislador por paixão disse: - a violação implicará em anulação do processo, ou seja, a lei é uma norma que deve ser antes, analisado o caso concreto e não concluir a despeito do crime que esteja sob investigação. Se comprovadamente, existirem ilicitudes na produção da prova é necessário que seja alegado pela parte que se sente prejudicada e levada ao crivo do magistrado para análise. Reconhecida a ilicitude de prova constante dos autos, cabe à parte o direito de vê-la desentranhada dos autos, se for o caso. Nesse entendimento, conclui da seguinte forma:

Ultimamente, a doutrina e a jurisprudência brasileiras, inclusive o Pretório Excelso, admitem o princípio da proporcionalidade somente em relação à defesa, e, assim, a prova ilícita só seria admissível se viesse a favor da defesa, ou seja, pro reo, mas nunca a favor do Estado, ou pro societate, (POLASTRI, 2010, p. 436).

Apesar da corrente majoritária, e a abalizada doutrina, verifica-se nos argumentos dos mais renomados autores não apontarem somente um único norte. O que deve ser admitido é que, do ponto de vista teórico não se pode fechar as portas para a aplicação do princípio da proporcionalidade pro societate, no que tange para admitir uma prova ilícita de conteúdo contrário à defesa, até mesmo porque, se estaria negando validade ao fundamento que embasou a construção balizada no princípio da proporcionalidade.

Entretanto, nos casos concretos, se deve reconhecer realmente, as dificuldades na sua aplicação, vez que o magistrado deve fazer uso do referido princípio com muita cautela e de acordo com o caso concreto, até porque essa é a tese, para que a defesa possa argumentar a anulação do processo, sem o que seria uma possibilidade a menos para a defesa.

4.6 DA ADMISSIBILIDADE DAS PROVAS ILÍCITAS

A lei 11.690/08 foi produzida para dar nova redação ao art. 157, do CPP: “São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas em violação a normas constitucionais ou legais”, ou seja, a lei determina a inadmissibilidade das provas ilícitas, bem como, aquelas que foram contaminadas por derivação, consagrando a Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada.

Neste mesmo diploma, considera a possibilidade de aproveitar as provas colhidas por fonte independente e, por fim, a adequada destinação, determinando as possibilidades e limitações do caso concreto, que devem ser conjugadas por apreciação fundamentada. E isso significa dizer que as provas ilícitas e ilegais, em princípio, devem ser desentranhadas do processo.

É importante ressaltar que a corrente majoritária é pela não admissibilidade da prova ilícita ou ilegítima, mas dentro desse pensamente da teoria obstativa, existe uma série de percalços para a destinação da ilicitude, quando encontra-se em conflito garantias fundamentais e Badaró (2014, p. 286) faz uma abordagem ontológica:

Do ponto de vista da dinâmica procedimental, sob o aspecto cronológico da imposição da sanção, não haverá diferença prática entre o desentranhamento (e não a inadmissibilidade) e a nulidade.

Mesmo a alegada impossibilidade de renovação da prova ilícita (sancionada com a inadmissibilidade) não é uma regra absoluta. A não repetição da prova ilícita não decorre de uma característica ontológica de tais provas. Como o vício da ilicitude costuma ocorrer na obtenção da fonte de prova, o fator surpresa desaparece após a sua produção e, no caso, o posterior reconhecimento judicial da ilicitude. Seria de todo inútil, anos após a realização de uma interceptação telefônica ilícita, que o juiz autorizasse uma nova interceptação para tentar captar o mesmo conteúdo de conversa entre as mesmas partes. Mas não seria impossível! Por outro lado, não são todos os meios de obtenção de prova em que o fator surpresa é decisivo. De fato, dificilmente teria êxito uma interceptação telefônica ou uma busca ou apreensão em que o investigado soubesse previamente da autorização judicial. Entretanto, na quebra de sigilo bancário e fiscal, a surpresa não é fator determinante. Assim, caso se reconhecesse a ilicitude na obtenção de dados bancários ou fiscais de um investigado (por exemplo, porque obtido sem ordem judicial), nada impediria que houvesse, posteriormente, uma ordem judicial válida determinando o fornecimento dos mesmos elementos de prova.

A importante colocação acima demonstra ainda o quanto o legislador deve evoluir diante de determinadas situações, no que tange à produção de leis, ou seja, o fator oportunidade deve ser determinante e não ser tratados todas as reservas do direito à intimidade de forma genérica. Haja vista, que quando se tratar de produção de provas para se assegurar da autoria e materialidade da prática delitiva, deve-se entender se o procedimento é possível aguardar que se recorra às legalidades formais, ou não. E continua autor:

De outro lado, embora os autos processuais nulos devem ser, em regra, retirados, para sua realização válida, tal regra não é indefectível. Basta pensar na nulidade de uma sentença ultra petita. O ato é inegavelmente nulo, e não haverá qualquer necessidade de renovação. Basta que o tribunal, ao reconhecer o vício, exclua do julgado a parte em que se foi além do pedido (por exemplo, o reconhecimento de uma causa de aumento de pena), mantendo, no mais, intacta e sem necessidade e renovação, a sentença. Mesmo no campo probatório, não é desarrazoado considerar que, em relação a determinados meios de prova, a violação de uma regra processual poderá comprometer definitivamente a capacidade epistêmica de tal meio. Por exemplo, um reconhecimento pessoal realizado sem a observância do rito probatório do art. 226 do CPP, em que o único suspeito seja levado à presença da vítima para que esta o reconheça – ou não – como o autor do crime. Mesmo que tal prova, com resultado positivo, seja anulada, é de se questionar a possibilidade se repetir tal ato posteriormente, segundo o rito adequado, em virtude do grande potencial de sugestionabilidade que a prova ilegitimamente produzida causa. No segundo ato de reconhecimento, a vítima provavelmente reconheceria o acusado não porque se lembraria dele na cena delitiva, mas porque se recordaria no reconhecimento ilegítimo anterior (BADARÓ. 2014, p. 286).

Contudo, se não existem garantias absolutas, os direitos constitucionais devem ter precedência, ante as provas ilícitas, garantias essas, conforme bem salienta Badaró (2014, apud Miranda Estrampes, p. 288): “as garantias constitucionais dos acusados, que integram o devido processo legal: juiz natural, contraditório, ampla defesa, presunção de inocência, motivação e publicidade etc”, que certamente não são mais importantes do que os direitos fundamentais vilipendiadas das vitimas.

Para contribuir com o entendimento, Rangel (2014, p. 486), faz a seguinte observação:

Na Alemanha Federal, desenvolveu-se a teoria da proporcionalidade, também chamada de razoabilidade na doutrina americana, significando a colocação, em uma balança, dos bens jurídicos que estão contrastando-se e verificar qual tem o peso maior.

A liberdade de locomoção tem um peso maior diante do sigilo das comunicações telefônicas e, portanto, é razoável que se possa quebrá-lo com o escopo de resguardar a liberdade de locomoção do réu.

A regra do inciso LVI do art. 5º da CF/88 não é, assim, nem poderia ser, absoluta. Deve ser interpretada de forma coerente e razoável, mostrando proporção entre os bens jurídicos que se contrastam. (grifo no original)

Dentre os bens jurídicos, encontra-se o resguardo à intimidade domiciliar, previsto no artigo 5º, inciso XI da Constituição Federal de 1988, constituindo crime a inobservância das formalidades legais. Segundo Silva (2010, p. 50). Discute-se muito na jurisprudência e doutrina quanto aos flagrantes realizados no interior da residência sem ordem judicial [...]. Nesse sentido acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:

PROVA CRIMINAL – Obtenção de forma ilícita – Ingresso de policiais na residência do acusado, mediante violência, por volta das 22:00 horas – Ação motivada por denúncia anônima de tráfico de entorpecente - Inexistência de fundada suspeita de situação de flagrância – Violação do artigo 5º, incisos XI e LVI, da Constituição da república – Absolvição mantida.

Para o professor Silva, é inadmissível concordar com esse entendimento, visto que “[...] O crime de tráfico de drogas, por exemplo, tem natureza eminentemente clandestina, certo que dificilmente, alguém se mostra disposto a denunciá-lo, exceto anonimamente”. E desta forma, quem está sendo protegido não são os direitos do cidadão, mas a garantia para a prática delituosa.

Em sentido contrário, cabe aqui, transcrever um parecer de um desembargador, citado na obra de Silva: embora com voto vencido, nos autos da apelação nº 83.624-3, da Comarca de Guarulhos-SP, RT 670/273, o Desembargador Ary Belfort, declarou o seu voto:

Exigir da autoridade policial, nos casos de entorpecentes ou afins, sempre a ordem judicial, pode equivaler a tornar írrita, inoperante, risonhamente inútil, a luta estoica, perigosa, repleta de surpresas e riscos, patriótica, nobilitante que é essa contra a comercialização funesta. Cujas características deletérias não se necessita de destacar.

É inquestionável que a casa tenha que ser “o asilo inviolável” de todo cidadão e por isso, goza de imunidade enquanto não desfigurada sua condição de lar. E isso significa dizer que não existe direito absoluto e todo abuso e desvio dos preceitos legais, quando evidentes, os responsáveis deverão ser punidos na forma da lei, ainda que tenha que ser observado o princípio da proporcionalidade. No que tange o referido princípio no limiar da prova ilícita, vamos buscar guarida no seguinte enunciado:

Ora, se tivermos, de um lado, o direito à intimidade de um traficante de drogas, e, de outro, o direito à vida, segurança púbica e saúde da sociedade, certamente estes últimos deverão prevalecer, pois são bens mais importantes. Não há como aceitar que um criminoso venha acobertar-se em normas constitucionais para praticar crimes extremamente graves, (SILVA, 2010, p. 53).

Enfim, na possibilidade de admitir a prova ilícita ou ilegítima dentro do processo penal é uma questão que o magistrado precisa usar a inteligência emocional e dentro da razoabilidade, aplicar o princípio da proporcionalidade, cujos casos, somente após uma profunda análise devem-se perquirir com parcimônia e justiça. Em síntese, se o fim derradeiro do processo é a descoberta da verdade real, razoável é que, se a prova ilicitamente obtida mostrar a verdade plena dos fatos, seja ela admissível no processo, sem esquecer o Estado-juiz de que existem institutos garantidores dessa tese, em que pese os direitos do réu é importante salientar que o fim precípuo se configura no freio criminal. Porém, quando a vedação é permitida para acolher a prova contaminada, geralmente e excepcionalmente são naqueles casos extremamente graves, ainda assim, se a sua aquisição puder ser sopesada como a única forma, possível e admissível, para o abrigo de outros valores fundamentais, considerados mais urgentes na concreta avaliação do caso, não há porque e tão pouco se falar em injustiças quando se procede em prol da manutenção social e justo provimento.

O que não se pretende aceitar são os casos extremos, tão pouco a negativa peremptória de ficar adstrito à validade e eficácia da prova obtida sem o conhecimento do protagonista, por exemplo, na interceptação telefônica/gravação clandestina, nem a admissão pura e simples de qualquer gravação fonográfica ou televisiva que pretenda ultrajar o direito à intimidade. A proposta da doutrina quanto à teoria intermediária é a que mais se coaduna com o que se denomina o princípio da proporcionalidade. Destarte, devendo este prevalecer, sobre os abusos de autoridades e manobras radicais para se chegar à verdade.

4.7 DA CONFISSÃO SEGUNDO A LEI Nº 11.690/08

A confissão, no sistema inquisitivo era conhecida como a “rainha das provas”, hoje, é apenas a declaração espontânea feita pelo acusado, em relação ao crime que praticou. Segundo Badaró (apud, NUCCI, p. 80), confissão é “confessar, no âmbito do processo penal, é admitir contra si, por quem seja suspeito ou acusado de um crime, voluntária, expressa e pessoalmente, diante da autoridade competente, em ato solene e público, reduzindo a termo, a prática de algum ato criminoso”. E nesse processo da confissão Maluf (2000), “até a própria verdade é um conceito relativo, parece salutar, pois em questões menores, deixar a oportunidade do réu para que ele possa admitir a punição, mas que afaste de si a dificuldade, o peso de um processo. Um dos fundamentos da confissão é o alívio interior. Esta situação mostra que muitos réus confessam, apenas e tão somente para afastar o peso de um processo”.

O sistema probatório é marcado na história processualista com feição inquisitória e acusatória. Após a entrada em vigor da Lei 11.690/08, houve algumas mudanças significativas, no processo penal brasileiro, no que tange o sistema de provas. Basta nos remeter ao período da inquisição, surgido na Europa em que o exercício punitivo representava o poder e o interesse do Império Romano, também era o modelo para outros países. Não obstante, a inspiração fascista italiana se colocou de forma bastante marcante no Código de Processo Penal brasileiro de 1941. Segundo Tasse (2008, p. 16) Os estudos da Escola de Bolonha conduziram, de forma prática, à estruturação intelectual do movimento inquisitorial que o fim se justificava pelos meios:

É fato incontrastável que, durante o período inquisitorial, universos populacionais consideráveis realmente acreditaram que a espécie humana estava submetida a uma ameaça real de controle pelo demônio, o que produziria a própria extinção da raça humana, e que, portanto, era preciso combater aqueles que se aliaram ao mal e, como este, na sua imagem demoníaca, possuía poderes sobre humanos, necessária se tornava a utilização de métodos de força extrema para combatê-lo.

O sistema inquisitivo utilizado no Brasil, durante muito tempo, foi semelhante ao modelo que era adotado no Império Romano, Tasse (2008, p. 17):

O modelo do Império Romano, que permitiu a manutenção do mais duradouro império da terra, se mostrou, então, como um método absolutamente eficaz para permitir o enfrentamento com o gigantesco mal representado pelo demônio. Assim, os mesmos métodos que conduziram Jesus à cruz passam a ser utilizados em nome Dele e a pretexto de glorificá-lo pelo Santo Ofício. A cruz cede espaço à fogueira; as chibatadas, com ossos nas extremidades para produzir mais dor ao flagelado, são substituídas por refinados métodos de tortura em que foram se desenvolvendo os mais sofisticados instrumentais de violação do corpo e da mente humana.

É indiscutível, que o propósito, de submeter o acusado ao sofrimento físico, como forma de obter a confissão do que lhe era imputado, e também com o cunho de aplicação da pena (pré-julgamento), o Estado obtinha apoio de grande parte dos pensadores da época mas, o sistema inquisitivo foi superado.

Segundo Tasse, o sistema processual brasileiro nunca se viu livre do modelo em que o acusado é um objeto, em que a verdade deve ser atingida a qualquer custo e em que a vítima é irrelevante ao processo, o que transformou o juiz em uma espécie de acusador coadjuvante [...] A Lei 11.690/08, veio para atender às reivindicações previstas na Constituição Federal de 1988 e reestruturar o sistema brasileiro com fundamento no modelo acusatório. Basta uma breve leitura no art. 186, do CPP, que veio trazendo um novo enunciado a respeito da confissão no interrogatório:

Art. 186. Depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem formuladas.

Parágrafo único. O silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa.

Acima, vê-se a perfeita sintonia com o princípio da presunção de inocência, muito embora isso não traga nenhuma garantia processual com relação à produção de provas, mas uma condição de que, para aquele que está sendo acusado possa produzir no sistema acusatório a dúvida de tudo aquilo que está sendo imputado contra si. Pois, para aquele que nenhum crime cometeu certamente desejará depor e a tudo contradizer às acusações que lhe estão sendo imputadas e argumentar todas as provas possíveis com o fim de proceder à sua defesa. Salientando que, para estes se conceda toda a garantia dos direitos fundamentais previstos constitucionalmente e, por conseguinte, do próprio valor da dignidade da pessoa humana.

4.7.1 Vícios da Confissão e suas Consequências Processuais Quanto à Ilicitude da Prova

Ao contrário do processo civil, não existe no processo penal a obrigatoriedade do contraditório, vez que ao acusado é assegurado o direito do silêncio e de mentir sobre a realidade dos fatos. Segundo Badaró (2014, p. 311) “Não são admitidos métodos como os “soros da verdade”, a hipnose, o lie detector, ou outros expedientes que tolham a liberdade do confitente”.

O ilustre Badaró faz uma importante observação, a repeito da confissão pessoal do acusado:

A confissão é o ato pessoal, devendo ser feita pelo próprio confitente, e não por terceira pessoa. Não se admite a confissão por procurador ou por preposto.

O objeto da confissão é a autoria delitiva, mas também podem ser objeto de confissão o próprio fato em si e o elemento subjetivo do tipo. É possível que, ao confessar a autoria, o acusado também faça uma narrativa pormenorizada do próprio fato, com todas as suas circunstâncias, tais como o modo pelo qual executou o delito, as razões que teve, as condições de tempo e lugar, ou seja, as circunstâncias (por exemplo, o crime ter sido cometido no período noturno) e qualificadoras do crime (por exemplo, que efetuou os disparos mediante emboscada). Também é possível e válida a confissão quanto ao elemento subjetivo do crime (por exemplo, que atirou, pois tinha a intenção de matar). Por outro lado, não tem relevância probatória a confissão sobre a materialidade delitiva nos crimes que deixam vestígios, ante a vedação do art. 158 do CPP.

Principalmente, agora que a Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso LXIII, reconheceu o direito de o acusado permanecer em silêncio, chega-se à conclusão de que o interrogatório seja apenas, um meio de defesa. E nesse confronto de ideias e fatos trazidos pelo(s) acusado(s), certamente irão ocorrer vícios que darão um contraste distorcido da verdade real, dentro do processo. Como por exemplo, muito bem salienta Badaró (2014, p. 285): “Se um padre prestar depoimento sobre algo que teve conhecimento durante uma confissão, o vício que acarretará a ilicitude da prova testemunhal se dará na própria produção do meio de prova”.

Sobre tudo, o magistrado deve estar motivado para julgar e condenar, se for o caso, com as provas produzidas no processo, mas, deve sempre levar em consideração primeiro, de que todos os acusados mentem, ou de que todos os acusados se retratam em juízo para na pretensão de uma sentença de absolvição, seja por orientação de seu defensor ou pela própria índole, pois, que as qualificações de bonzinho, honesto e querer fazer o que é correto não condizem com o caráter daqueles que estão sentados no banco dos réus.

Sobre o autor
Clesio Panatto

Atualmente estudando Pós Graduação pela Faculdade Legale, na área Trabalhista.

Informações sobre o texto

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Mais informações

Monografia apresentada à Faculdade Campo Real, de Guarapuava-PR, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito, na conclusão do Curso de Direito.Orientadora: Anna Flavia Camilli Oliveira Giusti

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