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Notas sobre intervenção e liquidação extrajudicial em entidades fechadas de previdência complementar (EFPC)

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Agenda 30/11/2016 às 10:23

9. SUSPENSÃO DE AÇÕES JUDICIAIS

A análise da legislação conclui ser obrigatória a suspensão de ações judiciais em curso quando da decretação da liquidação extrajudicial de entidade fechada de previdência complementar.

A suspensão de ações judiciais tem previsão na liquidação extrajudicial de plano de benefícios de EFPC (LC 109/01, art. 49, I; Lei 6.435/77, art. 66, I); na liquidação extrajudicial de entidades do sistema financeiro (Lei 6.024/74, art. 18, “a”) e na falência de empresas de modo geral (Lei 11.101/05, art. 6º e 99). Exceto nas atuais liquidações de planos de benefícios, uma vez que a LC 109/01 suprimiu tal exigência, em todos os demais casos a previsão de suspensão de ações judiciais vem acompanhada de proibição de novas demandas.

O sistema legal adotado, portanto, em caso de quebra de instituições ou empresas, deveria paralisar toda e qualquer demanda – e impedir novas - até o término da liquidação ou falência, uma vez que cabe ao liquidante ou ao síndico a análise e classificação dos créditos, inclusive, evidentemente, os que estão sendo discutidos em juízo. Somente depois da decisão a respeito das habilitações e classificações dos créditos, publicizada no Quadro Geral de Credores, e após a fase de recursos contra essa decisão (Lei 6.024/74, art. 26) é que o credor da massa tem a opção de, caso se sinta prejudicado, prosseguir nas ações que tenham sido suspensas ou propor outra que entender cabível (Lei 6.024/74, art. 27).

A jurisprudência, entretanto, entende que a suspensão de ações judiciais de que trata o art. 18, “a”, da Lei 6.024/74, não deve se dar de modo automático, mas, sim, deve ocorrer levando-se em conta o caso concreto.

Por analogia, e na falta de jurisprudência específica acerca da matéria relativamente às EFPC, entendemos ser este o entendimento mais seguro juridicamente na interpretação do art. 49, I, da LC 109/01.

O Superior Tribunal de Justiça tem o seguinte posicionamento sobre a matéria:

“A norma que determina a suspensão das ações contra a entidade que se encontra sob liquidação extrajudicial (Lei 6.024/74, art. 18), não deve ser interpretada na sua literalidade. Assim, não se justifica suspender processo de conhecimento, que já se encontra em estado adiantado de composição, para determinar que o credor discuta seu direito em processo administrativo de habilitação junto ao liquidante”. 18

“A suspensão das ações e execuções relativas a direitos e interesses do acervo de entidade em regime de liquidação extrajudicial preconizada no art. 18, “a”, Lei 6.024/74, há que ser aplicada com certo temperamento, de modo a ressalvar as lides que, em razão de sua natureza, não tenham repercussão na massa liquidanda.” 19

O entendimento predominante é que processos de conhecimento não se suspendem, pois trazem valor ilíquido (RESP 601.766; RESP 7467; RT 749/309). Também as execuções fiscais não são suspensas (RT 546/130; RT 746/427) assim como ações propostas pela massa que, se paralisadas, poderiam prejudicar os credores da mesma (RT 623/108).

Luiz Tzirulnik20 elenca ainda jurisprudência que indicam o entendimento dos tribunais pátrios nos seguintes pontos:

Evidentemente, a suspensão do processo não se dá em face de ações ou débitos de natureza tributária, por expressa determinação legal (LC 109/01, art. 49, § 2.º), o que não se dava à luz da Lei 6.435/77, e não consta também da Lei 6.024/74. Mesmo sem esta previsão explícita, nas intervenções perante o sistema financeiro a jurisprudência entende que “a liquidação extrajudicial não suspende a execução de créditos tributários (RT 546/130) tampouco a execução fiscal movida pela Previdência Social (RT 746/427)”.21

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Pelo que dispõe a legislação atinente à matéria, nas intervenções em EFPC, somente caso houvesse discordância sobre o crédito, após a divulgação do Quadro Geral de Credores, é que as ações poderiam ser retomadas (Lei 6.024/74, art. 27). Ou propostas outras, cujo prazo decadencial para interposição é de trinta dias (Lei 6.024/74, art. 27, parágrafo único).

O assim denominado Quadro Geral de Credores é um documento elaborado pelo liquidante que contém a relação de todos os créditos e débitos da entidade liquidanda. A seleção sobre quais são – e quais os respectivos valores - os débitos e créditos que constarão do Quadro Geral de Credores é prerrogativa do liquidante (Lei 6.024/74, art. 16). Fará isso com base em critérios legais – para a hierarquização dos mesmos, com base na Lei de Falências – e outros não previstos em lei, mas orientados por princípios racionais, éticos e econômicos.

Não há, na legislação, obrigatoriedade de se elencar no Quadro Geral de Credores as ações judiciais ainda em curso como crédito ou débito. Por pressuposto lógico, tal classificação deverá ocorrer apenas após o trânsito em julgado das mesmas.

Não obstante, deve-se fazer o respectivo provisionamento no balanço da entidade, visando resguardar-se quanto à hipótese de perda da ação. É o que determina o mencionado caput do art. 27. da Lei 6.024/74, assim disposto:

Art . 27. Os credores que se julgarem prejudicados pelo não provimento do recurso interposto, ou pela decisão proferida na impugnação poderão prosseguir nas ações que tenham sido suspensas por força do artigo 18, ou propor as que couberem, dando ciência do fato ao liquidante para que este reserve fundos suficientes à eventual satisfação dos respectivos pedidos.

Embora tal dispositivo se refira à hipótese contemplada pela lei de suspensão de ações, o provisionamento nos balanços da entidade deve ser aplicado também quando a ação não é suspensa. É o que diz o “Plano Contábil das Instituições do Sistema Financeiro Nacional – COSIF”, consolidado pelo Banco Central22, em seu item 29 (“Empresas em Liquidação Extrajudicial”), item 3 (“Critério de Avaliação e Apropriação Contábil durante o Processo de Liquidação Extrajudicial”), ponto 5 (“Critérios para Registro do Passivo”), alínea I, inciso V:

“V – as ações ajuizadas ou prosseguidas, com base no art. 27. da Lei 6.024/74, são objeto de constituição de provisão dentro dos títulos próprios”.

O registro das ações judiciais como passivo exigível no balanço de uma entidade cujo plano esteja em liquidação extrajudicial é facultativa, conforme o item 5 do Anexo I da Circular BACEN n.º 2.246, de 05 de novembro de 1992,23 que “estabelece a obrigatoriedade da elaboração e remessa de demonstrações financeiras e fixa critérios de avaliação e apropriação contábeis para empresas em liquidação extrajudicial”. Mas há necessidade, porém, de se justificar a sua não ocorrência, assim como é obrigatória a justificativa em nota explicativa quando não for possível estimar a perda. Vejamos:

“5 – CRITÉRIOS PARA REGISTRO DO PASSIVO

.................................

e) A formação de provisão para contingências deve ser feita desde o fato gerador ou ato de sua constituição, mesmo que ainda em fase de contestação,observado que:

I - para os lançamentos fiscais "ex-officio", autos de infração, notificações e citações legais e judiciais, bem assim de decisão desfavorável em instância administrativa, constituindo-se a provisão adequada, como passivo exigível, quando julgada necessária e relevante à luz dos princípios fundamentais de contabilidade, mesmo que ainda pendentes de decisão administrativa;

II - na ocorrência dos fatos previstos no item anterior, se julgada desnecessária a constituição de provisão, o fato deve ser consignado em nota explicativa nas informações gerenciais, explicitando os prováveis efeitos no patrimônio e nos resultados da instituição, acompanhando o balancete ou balanço da data-base da liquidação extrajudicial e seguintes, enquanto perdurar a pendência relativa a essa contingência;

III - em caso de decisão desfavorável em primeira instância judicial a constituição da respectiva provisão é feita em bases e valores adequados, na data-base em que ocorrer o fato, atualizada nos balancetes e balanços subseqüentes;

IV - nos casos em que a contingência não for passível de estimativa, o fato deve ser objeto de evidenciação em nota explicativa, nas informações gerenciais, juntamente com as razões que impossibilitaram sua quantificação;“


10. CORREÇÃO MONETÁRIA

A vedação da incidência de correção monetária das dívidas do plano em liquidação, constante da lei anterior de regência da previdência complementar, já havia sido tacitamente revogada quando da promulgação da Constituição de 1988, pois se tornou inconstitucional pela entrada em vigor do art. 46. do ADCT, que assim assevera:

“Art. 46. São sujeitos à correção monetária desde o vencimento, até seu efetivo pagamento, sem interrupção ou suspensão, os créditos junto a entidades submetidas aos regimes de intervenção ou liquidação extrajudicial, mesmo quando esses regimes sejam convertidos em falência.

.........................................”

Tal dispositivo foi reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal como norma de eficácia plena, verbis:

“Trabalhista. Débitos de empresas submetidas aos regimes de intervenção ou liquidação extrajudicial. Correção monetária. Art. 46, parágrafo único, inc. III, do ADCT/88. Norma de eficácia imediata, pela qual os referidos débitos, objeto de processo em curso, ainda que anteriores a nova Carta, independentemente da regência legal a que estavam submetidos, ficaram sujeitos a correção monetária desde o vencimento até seu efetivo pagamento. Recurso conhecido e provido.” 24

Por tais razões, atualmente é necessário corrigir monetariamente todas as dívidas do plano em liquidação.

Entretanto, não há dispositivo legal que imponha qualquer índice de correção monetária nas liquidações extrajudiciais. Caberá ao liquidante, dentro de critérios de razoabilidade e justiça, adotar um índice que seja o mais adequado para repor a inflação.


11. JUROS

A regra que vigora no quesito juros é a disposta no art. 49, IV, da LC 109/01, ou seja, não correm juros contra a massa enquanto não integralmente pago o passivo. E também a que consta no mesmo artigo, inciso VI, segundo o qual as multas e juros em relação às dívidas da entidade estão suspensas.

Em um e outro caso, entendemos que devem ser aplicados os juros legais. Pelo Código Civil anterior (arts. 1.062. e 1.063), os juros legais eram de 6% a.a, sem capitalização (a Lei da Usura – Dec. 22.626/33 – permitia que fosse cobrado o dobro sem que significasse crime de usura, daí porque era padrão constar em contratos juros de 1% ao mês).

O Código Civil atual (Lei 10.406/02), alterou substantivamente a matéria, dispondo, em seu art. 406, que os juros legais serão os mesmos utilizados pela Receita Federal, verbis:

“Art. 406. Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional”.

Ora, sabe-se que a Fazenda Nacional se utiliza da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC, criada pela lei nº 9.065, de 20 de junho de 1995:

Art. 13. A partir de 1º de abril de 1995, os juros de que tratam a alínea c do parágrafo único do art. 14. da Lei nº 8.847, de 28 de janeiro de 1994, com a redação dada pelo art. 6º da Lei nº 8.850, de 28 de janeiro de 1994, e pelo art. 90. da Lei nº 8.981, de 1995, o art. 84, inciso I, e o art. 91, parágrafo único, alínea a.2, da Lei nº 8.981, de 1995, serão equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC para títulos federais, acumulada mensalmente.

Embora pareça cristalino que, com a edição do novo Código Civil os juros legais passaram a ser a SELIC, o tema ainda comporta discussão. Na “Jornada de Direito Civil”, por exemplo, promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, em setembro de 2002, sob a coordenação do Ministro Ruy Rosado, do STJ, foi emitido o Enunciado n.º 20, que diz:

"Art. 406: a taxa de juros moratórios a que se refere o art. 406. é a do art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional, ou seja, 1% (um por cento) ao mês”.25

De fato, o Código Tributário Nacional, em seu art. 161, § 1.º, afirma que sobre os créditos tributários não pagos no vencimento incidirão juros de 1% ao mês, “se a lei não dispuser de modo diverso”:

“Art. 161. O crédito não integralmente pago no vencimento é acrescido de juros de mora, seja qual for o motivo determinante da falta, sem prejuízo da imposição das penalidades cabíveis e da aplicação de quaisquer medidas de garantia previstas nesta Lei ou em lei tributária.

§ 1.º Se a lei não dispuser de modo diverso, os juros de mora são calculados à taxa de 1% (um por cento) ao mês.

.........................”

Evidencia-se, portanto, a fragilidade do mencionado Enunciado n.º 20, uma vez que há lei dispondo de modo diferente do CTN, qual seja, a lei 9.065/95, que estabelece a taxa SELIC. Se não houvesse, sem dúvida seria aplicado o CTN. Mas como há, aplica-se a lei existente.

De todo modo, a questão encontra-se pacificada pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, cuja Corte Especial, ao julgar os EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Nº 727.842 - SP, assim decidiu:

CIVIL. JUROS MORATÓRIOS. TAXA LEGAL. CÓDIGO CIVIL, ART. 406. APLICAÇÃO DA TAXA SELIC.

1. Segundo dispõe o art. 406. do Código Civil, "Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional".

2. Assim, atualmente, a taxa dos juros moratórios a que se refere o referido dispositivo é a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC, por ser ela a que incide como juros moratórios dos tributos federais (arts. 13. da Lei 9.065/95, 84 da Lei 8.981/95, 39, § 4º, da Lei 9.250/95, 61, § 3º, da Lei 9.430/96 e 30 da Lei 10.522/02).

3. Embargos de divergência a que se dá provimento.

Sobre o autor
Alexandre Maimoni

Alexandre Brandão Henriques Maimoni, Advogado especializado em Direito Administrativo e previdência complementar fechada, Membro titular da Câmara de Recursos da Previdência Complementar, Possui graduação em Direito pela Universidade de São Paulo(1993), graduação em Comunicação Social - Jornalismo pelo Centro Universitário de Brasília(1999), especialização em Direito da Medicina pela Universidade de Coimbra(2014), especialização em Health Strategic Management for the Executive Manager (HESTRAM) pela University of Miami(2015) e aperfeicoamento em Curso Avançado de Direito Constitucional pelo Instituto Brasiliense de Direito Público(2001). Atualmente é Sócio em escritório de advocacia da Maimoni Advogados Associados. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Público.

Informações sobre o texto

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