A MANDALA E O CRIME CONTRA A ECONOMIA POPULAR
Rogério Tadeu Romano
No site "finanças femininas" pode-se ler o que se segue:
" Em um mundo no qual as mulheres são maltratadas, é fundamental que nos apoiemos e nos conectemos à nossa espiritualidade. Essas palavras soam muito bonitas, não é mesmo? Agora, e se disséssemos que esse discurso está sendo usado para sustentar um esquema de pirâmide financeira? A “Mandala da Prosperidade”, também chamada de “Tear dos Sonhos”, já é velha conhecida nos Estados Unidos e em outros países da América Latina, mas chegou há pouco tempo no Brasil e vem ganhando espaço – secretamente, já que as participantes são orientadas a não falar sobre o assunto em público.
O esquema é camuflado em um ideal que mistura conceitos de feminismo – alegando que a “Mandala” rompe o sistema econômico tradicional que oprime as mulheres –, a elementos de espiritualidade new age, como a ideia do “Sagrado Feminino”. Defende-se que a energia da união das mulheres seria capaz de trazer prosperidade e evolução espiritual.
O discurso que envolve sororidade e misticismo conquista mulheres bem intencionadas, que não percebem que prejudicarão as demais para que elas consigam o dinheiro prometido. Muitas delas, inclusive, estão em situação econômica ou emocional vulnerável. Foi o caso da profissional de comunicação e multimeios Juliana Farias, convidada para participar de um desses grupos em 2014, quando morava nos Estados Unidos.
Uma grande amiga fez o convite enquanto ela passava por dificuldades emocionais por estar em um país estrangeiro. “A princípio, o que ela me contou era muito mais sobre o lado espiritual, que essas mulheres se uniram para ajudar umas às outras a construírem seus sonhos”, relata. A conversa sobre dinheiro só veio depois.
A promessa é de que as participantes multiplicarão o dinheiro, evoluirão espiritualmente e ainda ajudarão outras mulheres. Para isso, é preciso convidar amigas para participar da “mandala” – grupo de 15 mulheres organizadas em hierarquias. Imagine um círculo de quatro camadas: oito mulheres na camada mais externa e, sucessivamente, quatro, duas e uma no centro. Cada uma dessas camadas recebeu o nome de um elemento da natureza – respectivamente, fogo, ar, terra e água. Isso acontece porque, de acordo com o sistema, as integrantes “desbloqueiam” os elementos em si mesmas cada vez que passam de etapa, dando a impressão de que a mulher que chega ao centro alcança um estágio de evolução superior.
Quando uma mulher chega ao centro, fatura uma bolada, que promete ser de oito vezes o valor “investido”. “Disseram que isso acontece por causa da Lei da Atração. Quando você coloca energia boa no mundo, ajudando as pessoas, o Universo devolve para você”, elucida Juliana. Porém, logo a comunicadora captou que a história era boa demais para ser verdade. Quem entra no esquema precisa doar (ou “dar de presente”, usando o linguajar do esquema) US$ 1.700 (aproximadamente R$ 5.540 na atual cotação do dólar).
Cada vez que uma mulher ganha o montante, ela sai da “mandala” e todas as demais sobem um nível. Agora, aquelas que fizeram a doação por último devem convidar duas novas integrantes, que também terão de desembolsar o valor. “Por mais amor e confiança que eu tenha nas mulheres e por mais incrível que a ideia fosse, não dá pra entregar tanto dinheiro na mão de alguém que você nunca viu e esperar que o Universo devolva”, argumenta Juliana.
Sua percepção estava correta. Bastam alguns cálculos para perceber que a conta não fecha. A única maneira de todas terem lucro seria se a população feminina da Terra fosse infinita! “Não existe dinheiro fácil e rápido. Se você consegue isso, tenha certeza de que alguém está sendo prejudicado. Em uma escala de 1 a 10, provavelmente, só duas pessoas se dariam bem”, alerta Neiva Maróstica, coach e professora da IBE-FGV. A atriz Sheylli Caleffi fez um vídeo no YouTube mostrando como, matematicamente, é impossível que todas levem vantagem. "
A “Mandala da Prosperidade”, esquema de pirâmide financeira que vem ganhando adeptos no Rio Grande do Norte, está sendo investigada pelo Ministério Público potiguar. O promotor de Defesa do Consumidor, Leonardo Cartaxo, confirmou no dia 14 de dezembro que já está encaminhando a apuração sobre o esquema e que isso deverá ocorrer também em outros estados do país.
Segundo Cartaxo, o MP tomou conhecimento sobre a chamada “Mandala da Prosperidade” na terça-feira (13) e determinou o início do trâmite para a apuração imediata. Na opinião do promotor, o esquema é claro exemplo de pirâmide financeira.
“Pelo que se tem informação, é pirâmide e é crime contra a ordem econômica”, resumiu o promotor.
Apesar de não haver uma empresa gerindo os grupos da ‘mandala’, que atuam independentemente através do WhatsApp, o promotor disse que há como se verificar quem são os envolvidos e aplicar a lei.
“Ainda não temos muitos dados e teremos que fazer o levantamento sobre isso. Vamos apurar, ver quem são os responsáveis”, explicou Cartaxo.
Focando no principal crime que se esta tentando apurar é importante que se diga que tal atividade já existe e vem sendo praticada há muitos anos. Tanto é assim, que desde 1951, graças a lei nº 1.521 que disciplinou os crimes contra a economia popular, tal prática já ficou tipificada como crime, dizendo a lei:
Art. 2º. São crimes desta natureza:
IX - obter ou tentar obter ganhos ilícitos em detrimento do povo ou de número indeterminado de pessoas mediante especulações ou processos fraudulentos ("bola de neve", "cadeias", “pichardismo"e quaisquer outros equivalentes);
Pois bem, como dito, não se trata de uma nova figura criminosa surgida recentemente, muito pelo contrário, sua existência e sua prática já é reprovável penalmente há muitos anos.
Disse bem Fabrício da Mata Corrêa(Pirâmide Financeira):
"O motivo desse verdadeiro “boom” é decorrente das muitas redes virtuais que passaram a servir de verdadeiros chamarizes para novos adeptos. Daí o nome que se tem atribuído de “marketing virtual”, haja vista que impulsionado pelos muitos meios virtuais, redes sociais e até mesmo canais abertos de TV, o alcance atingido com as publicidades desses meios possibilitaram atingir um numero de pessoas nunca antes visto. Estima-se haver milhões de pessoas envolvidas nesses tipos de atividades.
De forma bem simples, pode-se dizer que tal prática normalmente tem seu início com poucas pessoas, que levam a promessa de investimento fácil e de retorno financeiro rápido e vantajoso. Algo que sem esforço é capaz de atrair várias pessoas. Ocorre que os responsáveis pelo início do esquema a media que vão atraindo mais participantes, e estes por sua vez vão fazendo igual, passam a receber não só por aqueles que efetivamente tenham captados como também pelos demais e assim sucessivamente. Seria o mesmo que pensássemos em uma cachoeira de dinheiro que possui curso inverso.
Por isso que se diz que uma das características de tal esquema é que ele não sobrevive se não houver novos adeptos. Basta pensar, se não há um produto real a ser comercializado que seja capaz de manter financeiramente estruturado todo o grupo, não há como ele continuar. Por isso da necessidade de se ter sempre o máximo possível de novos adeptos.
É inclusive daí que surge o nome mais popular de pirâmide, posto que os mais antigos no “negócio” vão ficando sempre por cima em uma espécie de estrutura onde os dividendos só correm para a parte de cima da pirâmide. Normalmente, até para se camuflar o negócio e dar a ele uma aparência de legalidade, o ingresso do interessado normalmente se da com o consumo de determinado produto ou então como investimento numa espécie de fundo de rendimento, mas que na realidade não passam de um engodo.
Deve-se dizer que a primeira vista parece ser algo tão vantajoso que as pessoas não pensam duas vezes antes de ingressar, principalmente porque a forma com que a idéia é passada, provoca verdadeira lavagem cerebral nas pessoas. E isso só contribui para o aumento em massa de novos participantes."
Nos crimes contra a economia popular a vítima é uma coletividade, com um número expressivo de vítimas, quando se tem o chamado estelionato massivo.
É o que se costuma denominar no mercado financeiro de “ciranda”, “corrente” ou “pirâmide”, por se tratar de negócio baseado sobre um conjunto crescente de investidores, que são ludibriados com a expectativa de ganhos irreais e impossíveis de serem gerados pelo funcionamento lícito e regular da economia.
As vítimas são induzidas e mantidas em erro quanto à situação da empresa, sendo-lhes sonegadas as informações, que são prestadas falsamente, além da conduta envolver veiculação, por intermédio dos meios de comunicação, de informações enganosas e, com isso, acarretam maior confiabilidade ao empreendimento, ludibriando, assim, centenas de consumidores, insuflando-os a ingressarem no negócio. A esse propósito, leia-se o artigo 2º, IX, da Lei 1.521/51.
Trata-se de crime material que exige o dolo como elemento do tipo penal