O Supremo Tribunal Federal traz o aborto mais uma vez à luz do debate público. A Primeira Turma decidiu por não configurar como crime a interrupção dolosa da gravidez durante os primeiros três meses, na qual resulta na morte do feto. Em síntese, entendeu-se que a conduta pode, e deve, ser relativizada pelo contexto social da gestante, mesmo que o Código Penal Brasileiro proíba expressamente o aborto. Isto porque, sabidamente, o Brasil é um país desigual que seleciona apenas um extrato social para sofrer os impactos do aborto clandestino, sejam essas consequências sociais, penais, ou mesmo risco de morte.
A Corte justifica que a proibição da prática da forma como está prevista na lei pode violar diversos direitos da mulher, bem como o princípio da proporcionalidade. É preciso esclarecer que o novo posicionamento não atinge somente gestantes que optam pelo aborto. Os profissionais de saúde que auxiliam na conduta estão no centro da questão. Dado que os artigos 125 e 126 do Código Penal tratam da penalização da conduta provocada por terceiros, com ou sem consentimento da grávida.
O julgamento também não significa a liberação irrestrita do aborto no país. De fato, a decisão já causa comoção social e inclusive já há movimentos no Poder Legislativo para discutir o tema. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirma que irá instalar uma comissão especial na tentativa de reverter o entendimento do STF. Logo, não se pode utilizar a sentença como “salvo conduto” para a prática do aborto durante o primeiro trimestre. Deve-se analisar, de forma cautelosa, a evolução jurisprudencial e legislativa da questão até que haja algum posicionamento definitivo.